Acessibilidade / Reportar erro

Os incentivos às exportações de manufaturados: analise e sugestão

ARTIGOS

Os incentivos às exportações de manufaturados: analise e sugestão

A. Nilson Quezado CavalcanteI; Etienne F. CraccoII,* * Os autores agradecem, entre outras, a colaboraçio de Robert N. V. C. Nicol e Ary O. Mattos Filho. A responsabilidade por eventuais erros cabe, exclusivamente, aos autores.

IProfessor-assistente do Departamento de Economia da Escola de Adminstração de Emprêsas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

IIO Sr. Etienne F. Cracco está concluindo sua tese de doutoramento para a Michigan State University (EUA)

Nos últimos cinco anos, o Governo federal tem posto em prática uma política de incentivos às exportações de produtos manufaturados. De um modo geral, este programa tem sido bem sucedido. No entanto, uma análise cuidadosa dos efeitos prováveis dos diversos incentivos nas variáveis que influenciam as exportações poderia evidenciar graves deficiências na atual política. O objetivo deste artigo é proceder a essa análise bem A maior parte dessas como recomendar uma solução exportações destina-se àintegrada que deverá corrigir as Associação Latino-Americana de falhas do referido programa.

1. RESULTADOS DO PROGRAMAGOVERNAMENTAL

Sob o impacto dos incentivos oficiais, as exportações brasileiras de produtos manufaturados têm crescido significativamente nos últimos anos, como mostra o quadro 1.


A sua participação no valor total das exportações cresceu de 8,7% em 1966 para 16,8% em 1970.A taxa de aumento com relação ao ano anterior foi de 40% em 1969 e 60% em 1970, aproximadamente.1 1 Além dos incentivos, o sistema cambial de "taxa flexivel" (posto em prática a partir de 1968) muito contribuiu para o aumento das exportações. No sistema anterior, havia uma acentuada defasagem entre a elevaçio dos custos internos, resultante da inflaçio, e o reajuste da taxa de cambio, desencorajando assim as exportações.

A maior parte dessas exportações destina-se à Associação Latino-Americana de Livre Comércio (ALALC) e aos Estados Unidos (ver quadro 2). Estas áreas absorveram, em 1969, 38,4% e 27,7%, respectivamente, das nossas exportações de manufaturados. O Mercado Comum Europeu (MCE) e a Associação Européia de Livre Comércio (AELC) vieram em seguida, com 19,2 e 5,9%, respectivamente. É interessante observar que, nos últimos anos, os percentuais referentes à ALALC e MCE têm aumentado, enquanto o dos Estados Unidos tem decrescido.


2. DESCRIÇÃO DOS INCENTIVOS

Podemos classificar os incentivos às exportações de produtos industrializados em três categorias: fiscais, financeiros e outros. Apresentaremos uma descrição suscinta dos diversos incentivos em cada uma dessas categorias.2 2 Para uma descrição mais completa, ver o Manual do exportador, publicação da CACEX, Banco do Brasil S. A. Convém advertir que, como este artigo foi escrito em dezembro de 1970, não incorpora as modificações do sistema de incentivos realizadas após aquele período.

2.1 Incentivos fiscais

Estes incentivos consistem, essencialmente, na isenção ou redução de impostos para os produtos manufaturados destinados à exportação.

2.1.1 Isenção do imposto de renda

Os lucros obtidos na exportação de manufaturados são isentos desse imposto, cuja alíquota é de 30% para os lucros não distribuídos.

2.1.2 Dedução das despesas com a promoção de exportações

Para efeito de imposto de renda, as empresas industriais podem deduzir de seu lucro tributável as seguintes despesas relacionadas com a exportação de manufaturas: a) com a promoção e propaganda de seus produtos no exterior; b) com a participação em feiras e exposições internacionais; c) com a manutenção de filiais, escritórios e depósitos no exterior.

2.1.3 Redução do imposto sobre as transferências financeiras para o exterior

Está prevista a redução ou restituição do imposto de renda incidente sobre as transferências financeiras para o exterior, correspondentes ao pagamento de royalties, assistência técnica e juros, relacionadas com a produção de manufaturas para exportação, desde que essas operações sejam registradas no Banco Central.

2.1.4 Isenção do IPI

As exportações de manufaturas são isentas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). As alíquotas deste imposto, para a maioria dos produtos exportáveis, situam-se entre 12 e 24%. A isenção estende-se às vendas internas a residentes de países estrangeiros mediante pagamento em cheques de viagem e também às vendas internas pagas em cruzeiros resultantes da conversão de divisas oriundas de financiamento externo, a longo prazo, de instituições financeiras internacionais ou governo de outros países. Como o IPI incide apenas sobre o valor adicionado, as empresas industriais podem creditar-se do imposto pago anteriormente sobre os produtos intermediários utilizados em suas manufaturas para exportação. Este crédito, que equivale a um subsídio, pode ser utilizado para o pagamento do IPI relativo às vendas internas da empresa beneficiada, de empresas coligadas a essa empresa ou que lhe forneçam insumos.

2.1.5 Isenção do ICM

A alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM), imposto estadual, é normalmente de 14,5%. As exportações de manufaturados estão isentas desse imposto. Tal benefício estende-se às vendas internas pagas em cruzeiros resultantes da conversão de divisas provenientes de financiamento a longo prazo de instituições oficiais estrangeiras. O sistema de crédito fiscal, descrito no item anterior, aplica-se também ao ICM.

2.1.6 Importação de bens de capital livres de impostos

São isentas do IPI e tarifas aduaneiras as importações de bens de capital destinados à produção de manufaturas, desde que não haja similares nacionais.

2.1.7 Drawback

As tarifas aduaneiras pagas sobre bens intermediários utilizados na produção destinada à exportação são devolvidas às empresas, total ou parcialmente. Essas tarifas variam, geralmente, de 15 a 55%. esse incentivo aplica-se também às vendas internas pagas em cruzeiros resultantes da conversão de um financiamento internacional a longo prazo, concedido por organismos oficiais. Qualquer importação sob o regime de drawback é também isenta do IPI.

2.1.8 Isenção do imposto sobre operações financeiras

As taxas deste tributo variam de 0,5 a 1,0%. A isenção aplica-se às operações de câmbio, seguro e crédito, relativas a exportações de manufaturados.

2.1.9 Isenção do imposto sobre lubrificantes, combustíveis e energia elétrica

Este tributo é federal e aplica-se aos produtos mencionados, que estão isentos do ICM (estadual). Esse incentivo beneficia as indústrias que utilizam os referidos insumos em produtos para exportação, bem como os navios nacionais ou fretados com prerrogativas de bandeira brasileira.

2.1.10 Isenção de outros tributos, taxas, quotas, etc.

As exportações brasileiras eram oneradas por uma série de taxas, impostos, quotas, etc. Todos foram eliminados, permanecendo apenas as taxas referentes à efetiva prestação de serviço e às contribuições à previdência social.

2.2 incentivos financeiros

Os incentivos desta categoria consistem na oferta de linhas de crédito especiais, a juros mais baixos do que os normalmente cobrados pelos bancos comerciais.

2.2.1 Financiamento à produção pelos bancos comerciais

O Banco Central oferece redescontos especiais à taxa de 4% ao ano aos bancos comerciais, para que estes concedam empréstimos às empresas industriais que realizam exportações, a taxas que não ultrapassem 8% ao ano (incluindo comissões) e por períodos que não excedam um ano. A importância deste incentivo fica patente, quando se considera que a taxa de inflação em nosso País tem sido, nos últimos três anos, da ordem de 20% ao ano, sendo a taxa de juros normalmente cobrada pelos bancos particulares superior a 24%.

2.2.2 Financiamento à produção pelo Banco do Brasil

A Carteira de Crédito Agrícola e Industrial desse Banco fornece crédito para complementação de capital de giro das empresas que se comprometam a elevar sua produção de manufaturas para exportação. Os juros são de 12% ao ano mais correção monetária.

2.2.3 Financiamento à produção pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico

Semelhante ao item anterior.

2.2.4 Financiamento à exportação

Esses empréstimos são concedidos diretamente pela Carteira de Comércio Exterior (CACEX) para financiar as seguinte operações: a) exportações (normais ou em consignação) de bens de capital ou de consumo duráveis; b) venda no exterior de estudos e projetos técnico-económicos e de engenharia; c) programas de promoção e comercialização de nossos produtos no exterior. A taxa de juros acompanha a estabelecida entre exportador e importador, não podendo ser inferior a 7% ao ano.

2.2.5 Seguro de crédito à exportação

Este seguro cobre os riscos normais do comércio internacional: riscos comerciais (como a insolvência do importador) e riscos políticos e extraordinários. São beneficiários as entidades de crédito que financiam a exportação e os próprios exportadores.

2.3 Outros incentivos

Os incentivos dessa categoria consistem, principalmente, na eliminação ou simplificação de trâmites burocráticos bem como nas atividades dos órgãos de informação e promoção no campo do comércio externo.

2.3.1 Exportações em consignação

Admite-se a remessa de vários produtos manufaturados em consignação ao exterior. Caso a venda seja efetuada, a operação passa a ser uma exportação normal. Caso contrário, a mercadoria pode retornar ao País sem cobertura cambial.

2.3.2 Remessa de amostras sem formalidades

Os exportadores efetivos e em potencial podem remeter amostras e pequenas encomendas ao exterior, até o limite de US$ 100.00, sem guia de exportação ou qualquer trâmite burocrático.

2.3.3 Exportações sem formalidades nas zonas de fronteiras

Essas operações precisam ser realizadas nas cidades fronteiriças e estão sujeitas a limites quanto ao valor e natureza do produto. O pagamento pode ser feito em cruzeiros, dispensando formalidades cambiais.

2.3.4 Garantia a participantes em concorrências internacionais

Essa garantia é prestada pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) a empresas nacionais dentro dos seguintes limites: mínimos - US$ 200 mil; máximo - US$ 5 milhões. A firma beneficiada precisa satisfazer certas condições e pagar as despesas necessárias bem como uma taxa de 0,5 a 2% da importância garantida.

2.3.5 Serviços da CACEX

Este departamento publica um boletim que relaciona oportunidades comerciais para produtos brasileiros no exterior, além de fornecer outras informações de interesse para os exportadores. A CACEX possui ainda um fichário de exportadores, para os quais remete informações sobre oportunidades para seus produtos específicos.

2.3.6 Serviços consulares

Os consulados e escritórios comerciais do Brasil obtêm e divulgam informações de interesse comercial para o nosso País e dão assistência às empresas estrangeiras que desejam importar do Brasil. Além disso, colaboram para a participação do nosso País em feiras e exposições internacionais.

3. O IMPACTO DOS INCENTIVOS NAS EXPORTAÇÕES

Para analisar a eficácia dos incentivos, desenvolvemos no quadro 3 a matriz que apresenta o efeito provável de cada incentivo nas principais variáveis que afetam a oferta e a demanda externa de manufaturados produzidos no Brasil. Essas variáveis são as seguintes: insumos, produção, preço, produto (tipo, qualidade, forma de apresentação), promoção e distribuição. Cada efeito foi classificado, em função de sua intensidade, em "fraco", "médio" ou "forte". É necessário salientar que essa classificação é apriorística e, portanto, passível de refutação em bases empíricas. Passamos agora a avaliar a eficácia dos diversos incentivos, levando em conta, principalmente, a matriz apresentada no quadro 3.


3.1 Incentivos fiscais

As variáveis mais afetadas por esses incentivos são a produção e o preço. O efeito no produto, promoção e distribuição, é, com com poucas exceções, inexistente.

Com relação à isenção do IPI - como as alíquotas variam na razão inversa da essencialidade do produto - esse incentivo favorece mais a exportação de artigos não essenciais.

No caso do ICM, como as firmas não podem transferir o seu crédito fiscal para outras empresas, não há estímulo para que as empresas destinem sua produção exclusivamente, ou em maior parte, à exportação.

O drawback tende a beneficiar mais as empresas estrangeiras, pois estas podem, em vários casos, importar bens intermediários da matriz ou empresas associadas.

De um modo geral, os incentivos fiscais criam condições para que a indústria nacional possa concorrer no mercado internacional. Não são, todavia, suficientes para superar a inércia dos exportadores em potencial.

3.2 Incentivos financeiros

Os incentivos financeiros funcionam como lubrificantes do processo de exportação. Os seus efeitos concentram-se, quase que exclusivamente, sobre as seguintes variáveis: insumos, produção e preços. Com relação à primeira variável, o papel desses incentivos é oferecer às empresas capital de giro a baixo custo3 3 No caso do incentivo n.º 1, a taxa real chega mesmo a ser negativa, isto é, a taxi nominal é menor do que a de inflação. numa economia inflacionária, na qual a oferta de capital é extremamente limitada.

O efeito sobre a promoção consiste, basicamente, em as firmas poderem oferecer crédito juntamente com o seu produto no exterior.

Como as taxas de juro no exterior variam com freqüência, as taxas internas devem ser reajustadas periodicamente, de modo a manter a eficácia dos incentivos financeiros. Se, por exemplo, há uma redução das taxas no mercado financeiro externo, os exportadores brasileiros ficariam em desvantagem com relação à situação anterior, se as taxas que lhe são cobradas internamente não fossem igualmente reduzidas.

A diferença fundamental entre os efeitos dos incentivos fiscais e financeiros é que os financeiros têm um efeito intenso nos insumos, e nulo na distribuição.

3.3 Outros incentivos

Esta categoria atua, essencialmente, sobre a demanda externa através das variáveis promoção e distribuição. A única exceção é o incentivo para exportações em zonas de fronteira (item 3), o qual afeta, exclusivamente, a produção e os preços.

A política das empresas com relação ao produto não tem recebido influência dos incentivos governamentais. Estes poderiam favorecer a pesquisa, com vistas à adaptação dos produtos às preferências e condições externas, bem como ao desenvolvimento de novos produtos, e à análise da demanda estrangeira.

Quanto à promoção, os incentivos têm sido razoavelmente eficazes no tocante ao suprimento de informações. O Governo parece acreditar que, sendo competitivos os preços das mercadorias destinadas à exportação, informar é suficiente para garantir a realização de negócios. No entanto há atritos no mercado internacional. Fatores como a separação geográfica, hiatos culturais, inércia empresarial e obstáculos burocráticos, impedem que as forças da oferta e procura atuem livremente. É verdade que o Governo tem promovido amplamente a participação do Brasil em feiras e exposições internacionais. Não tem atuado, porém, no campo de propaganda e contatos de venda, talvez sob o pressuposto de que essas atividades se encontram no santuário da iniciativa privada.

Pode-se favorecer a distribuição das exportações de duas maneiras: facilitando a realização de transação em si e desenvolvendo o fluxo de mercadorias. Quanto à primeira, a permissão para exportações em consignação e a simplificação das formalidades burocráticas têm sido medidas de efeitos consideráveis. No entanto, a segunda maneira de melhorar a distribuição carece de maior atenção. Em particular, recomenda-se a melhoria do nosso sistema de transportes, inclusive instalações portuárias, tornando os portos capazes de operar com eficiência e a baixo custo.

4. REAÇÕES DAS EMPRESAS

A nossa análise mostrou que os incentivos fiscais e financeiros elevaram, significativamente, a lucratividade das exportações de manufaturados. Esses e os demais incentivos não parecem, entretanto, suficientes para promover as exportações das empresas exclusivamente brasileiras, devido aos atritos citados. São as empresas estrangeiras as mais capazes de aproveitarem os incentivos, pois já dispõem, em geral, de uma estrutura de comercialização montada no comércio internacional.

Para confirmar nossas hipóteses, realizamos uma série de entrevistas informais com executivos de empresas nacionais e estrangeiras. Os resultados são apresentados a seguir.

4.1 Empresas estrangeiras

Os incentivos foram recebidos com entusiasmo pela grande maioria das empresas entrevistadas. Sua aprovação manifestou-se em expressões como "solução inteligente para os problemas das exportações e desenvolvimento econômico", "os incentivos eliminam distorções", "o passo certo na direção certa"... No entanto, à pergunta "sem os incentivos, os senhores continuariam a exportar?" foram dados três tipos de resposta. Um grupo (aproximadamente 50% das firmas entrevistadas) declarou que seu objetivo era o mercado interno, sendo o seu programa de exportações um resultado direto dos incentivos. Admitia, todavia, a possibilidade de criar um centro de exportação para a América Latina, com o desenvolvimento da ALALC.

Um segundo grupo (30%), que em geral exportava bastante, continuaria a exportar se os incentivos fossem abolidos, por diversas razões: algumas empresas, porque operam sob um acordo de complementação da ALALC; outras, porque as matrizes as consideravam centros de produção para um produto específico; outras, porque são persuadidas a exportar por meio do Governo. Finalmente, os restantes 20% das firmas não estavam exportando, por uma das seguintes razões: a) os incentivos não chegavam a compensar o alto custo dos insumos e/ou sua baixa qualidade; b) os seus produtos não eram do tipo exportável; c) a matriz considerava outros centros de produção mais apropriados para a exportação, possivelmente por oferecerem maior margem de lucro.

4.2 Empresas nacionais

A atitude prevalecente entre os empresários é a de que a campanha na imprensa sobre os incentivos gera o interesse de ingressar no comércio de exportação. Mas essa disposição não é suficiente. Uma reação comum é a seguinte: "Agora, podemos concorrer em termos de preço, mas onde, a quem, o que e quando vamos vender?" Há preocupações com os problemas de adaptação do produto, trâmites burocráticos e a seleção de bons intermediários. Enquanto o desenvolvimento dos incentivos, particularmente os de ordem fiscal, resultou num imediato fluxo de exportação para as empresas com uma rede internacional de distribuição, as que não dispunham dessa vantagem (a maior parte, brasileiras) conseguiram, quando muito, resultados insignificantes e com produtos tradicionais (produtos alimentares, calçados, pedras lapidadas, etc). Outra queixa se referia à qualidade dos insumos industriais: a isenção de tarifas aduaneiras só se aplica aos bens de capital sem similar nacional.

5. UMA SOLUÇÃO: UMA COMPANHIA DE EXPORTAÇÃO

A análise do item 4 e o apanhado de opiniões empresariais evidenciaram falhas consideráveis no atual sistema de incentivos às exportações de manufaturados. Dois aspectos adicionais merecem destaque.

Em primeiro lugar, como os incentivos beneficiam em geral apenas empresas industriais e não as firmas dedicadas exclusivamente ao comércio de exportação, o sistema não estimula o estabelecimento de empresas puramente exportadoras, as quais, na ausência da solução que se vai propor, teriam uma contribuição considerável a dar ao incremento das exportações.

Outro aspecto de capital importância refere-se à possibilidade de outros países virem a eliminar as vantagens proporcionadas pelos incentivos às empresas brasileiras, concedendo benefícios similares às suas próprias empresas. É de se esperar, portanto, que, a longo prazo, o nosso País só consiga exportar os manufaturados que possa produzir a custos mais baixos que os concorrentes estrangeiros, de acordo com o princípio clássico das "vantagens comparativas".

Em face das deficiências do atual sistema de incentivos e tendo em vista as considerações dos dois parágrafos anteriores, acreditamos na conveniência da criação de uma companhia brasileira de exportação na forma que passamos a descrever.

O capital da Companhia de Exportação será financiado (participação acionária e empréstimos), em sua maior parte, com recursos governamentais. Com o tempo, as ações do Governo poderiam ser transferidas para os empregados das empresas e para o público em geral. O controle governamental na etapa inicial justifica-se pela amplitude do empreendimento e pela dificuldade de captar recursos privados para uma empresa de rentabilidade aleatória.

A companhia procurará desenvolver as exportações de manufaturados através de uma promoção ativa.4 4 Foram criadas, em 1970, duas empresas de promoção de exportações: a Companhia de Promoção de Exportações de Manufaturados do Estado de São Paulo (COPEME) e a Promo-Export (na área da SUDENE). Evidentemente, estas empresas teriam que atuar em consonância com a companhia de âmbito nacional aqui sugerida. Ela consistiria essencialmente, nas seguintes atividades: a) informar, com precisão, as empresas brasileiras sobre suas oportunidades comerciais em outros países; b) assessorar as empresas em todos os aspectos elacionados com o processo de exportação e a produção para a exportação; c) realizar, ela mesma, exportações nos casos em que as empresas isoladas não sejam capazes de fazê-lo.

Propomos para a companhia de exportação a seguinte estrutura: os acionistas delegarão poderes a um presidente, que supervisionará três vice-presidentes, os quais serão os diretores da Rede Interna, Rêde Externa e Departamento de Projetos Especiais.

A rede interna consistirá num conjunto de escritórios espalhados por todo o País, os quais manterão contato permanente com as empresas exportadoras, prestando-lhes informações e assessoria. Esses escritórios também implementarão programas de melhoria de qualidade e embalagem, bem como de desenvolvimento de novas exportações. A rede externa, por sua vez, procurará criar novos canais de distribuição para os nossos produtos nos mercados existentes e em potencial. Disporá de escritórios comerciais em diversos países,5 5 Os atuais escritórios comerciais do Ministério das Relações Exteriores seriam integrados na nova estrutura. os quais farão uma sondagem permanente do mercado, divulgarão os produtos brasileiros, prestarão assistência aos importadores e, o que é fundamental, funcionarão como ponto para a realização de negócios. O departamento de projetos especiais teria a seu cargo atividades diversas como estudos de mercado, programas de treinamento, organização de feiras e exposições, propaganda, assistência técnica, etc. Esse departamento atuaria ora em cooperação com as redes interna e externa, ora isoladamente.

O sucesso da companhia de exportação dependerá da dedicação e capacidade dos diretores e de seu pessoal. Para criar motivação, recomenda-se o sistema de participação dos empregados nos lucros da empresa. Por outro lado, a seleção de pessoal, principalmente de especialistas em comércio exterior, deverá ser extremamente criteriosa. Além disso, a companhia deverá promover o aprimoramento contínuo de seus técnicos no País e no exterior.

Evidentemente, os detalhes da organização de um empreendimento de tão elevadas proporções não poderiam ser dados num artigo como este. O nosso objetivo foi apenas descrevê-lo em linhas muito gerais.

Finalizando, gostaríamos de frisar que não se deve enxergar, na idéia de criação da companhia de exportação, uma ameaça à iniciativa privada no comércio exportador. O seu objetivo deve ser auxiliar e complementar a atuação das empresas particulares; jamais procurar substituí-las.

  • *
    Os autores agradecem, entre outras, a colaboraçio de Robert N. V. C. Nicol e Ary O. Mattos Filho. A responsabilidade por eventuais erros cabe, exclusivamente, aos autores.
  • 1
    Além dos incentivos, o sistema cambial de "taxa flexivel" (posto em prática a partir de 1968) muito contribuiu para o aumento das exportações. No sistema anterior, havia uma acentuada defasagem entre a elevaçio dos custos internos, resultante da inflaçio, e o reajuste da taxa de cambio, desencorajando assim as exportações.
  • 2
    Para uma descrição mais completa, ver o Manual do exportador, publicação da CACEX, Banco do Brasil S. A. Convém advertir que, como este artigo foi escrito em dezembro de 1970, não incorpora as modificações do sistema de incentivos realizadas após aquele período.
  • 3
    No caso do incentivo n.º 1, a taxa real chega mesmo a ser negativa, isto é, a taxi nominal é menor do que a de inflação.
  • 4
    Foram criadas, em 1970, duas empresas de promoção de exportações: a Companhia de Promoção de Exportações de Manufaturados do Estado de São Paulo (COPEME) e a Promo-Export (na área da SUDENE). Evidentemente, estas empresas teriam que atuar em consonância com a companhia de âmbito nacional aqui sugerida.
  • 5
    Os atuais escritórios comerciais do Ministério das Relações Exteriores seriam integrados na nova estrutura.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Maio 2015
    • Data do Fascículo
      Mar 1972
    Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rae@fgv.br