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Nascimento apogeu e decadência da estrutura piramidal

ARTIGOS

Nascimento apogeu e decadência da estrutura piramidal* * Artigo traduzido do espanhol pelo Prof. Fernando C. Prestes Motta do Departamento de Administração Geral e Relações Industriais da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas.

Vicente L. Perel

Professor titular de Administração da Universidade Buenos Aires; doutor em Ciências Econômicas pela Universidade de Buenos Aires e especialização em Administração de Empresas na Universidade de Pittsburg, EUA

1. INTRODUÇÃO

A razão e o fundamento deste trabalho é a apresentação para a discussão pública de um tema que consideramos fundamental: a decadência da estrutura piramidal.

É sobre este esquema e aparato que se articula toda a metodologia da direção das organizações. Porém, se o sistema mantenedor não corresponde a nossos tempos, é cabível perguntar o que ocorrerá quando pretendermos utilizá-lo como apoio para tecnologias avançadas.

Este tema, ao qual demos o nome de nascimento, apogeu e decadência da estrutura piramidal, é o objeto primordial de nossa preocupação quotidiana. Para explicitá-lo de modo bem fundamentado, parece-nos necessário empreender uma incursão em antecedentes, terminologia e temas periféricos, embora muito relacionados com nossa preocupação central, tais como: complexidade da vida organizacional e suas razões, a verdadeira dimensão humana tal como se manifesta na empresa, e o homem que dirige e seus problemas.

O esclarecimento destes temas, o principal e os periféricos, constitui o motivo das páginas seguintes. Começamos pelo objeto, conteúdo e evolução das organizações porque acreditamos que sua descrição contribui para a melhor compreensão de nosso trabalho.

2. OBJETO

As organizações constituem o objeto da administração uma vez que são elas os sistemas sociais administrados.

Repetimos:

A administração é, pelo menos no presente, uma metodologia esclarecedora para a direção das organizações em suas fases de planejamento, execução e controle. A etapa de execução compreende uma primeira fase de estruturação da organização e uma segunda, de mando.

A direção tem lugar num contexto de valores sociais dados e conforma-se a esse contexto.

Vamos tornar claros dois dos termos de nosso conceito.

a) Significado do termo organização

Segundo Bakke:1 1 Bakke, E. W. Concept of social organization. In: Haire, Mason. Modern organization theory. New York, Wiley and Sons. 1959. 1. um sistema contínuo de atividades humanas; 2. a fusão de diversos recursos (humanos, naturais, financeiros etc.); 3. um todo único capaz de resolver problemas; 4. um sistema que se integra em outros para satisfazer necessidades humanas.

Segundo Puckey2 2 Puckey, W. Organization in business management. Londres, Hutchinson. 1970. refere-se a: 1. indivíduos; 2. inter-relações entre indivíduos e grupos; 3. grupos de indivíduos; 4. existência de um objetivo comum; 5. formalização de uma estrutura viva na qual se agrupam os indivíduos; 6. estabelecer objetivos comuns, planejar seu atingimento e alcançá-lo; 7. utilizar para o atingimento dos objetivos os recursos disponíveis.

Para Dale,3 3 Dale, E. Organization. New York, American Management Association. 1967. o tema deve ser compreendido em duas fases: uma teórica e outra prática. Teoricamente, as organizações constituem conjuntos humanos dotados de um sistema de comunicação, que conseguem resolver problemas e possuem meios facilitadores da tomada de decisões. Em termos práticos, a organização existe quando se determina o que deve ser feito para alcançar um objetivo desejado, quando se dividem as atividades necessárias para alcançar tal sorte de objetivos, graças a uma divisão do objetivo em partes tão pequenas que possam ser levadas a termo por uma única pessoa; e, além disso, quando se consegue utilizar meios de coordenação capazes de evitar o desperdício de esforços representado pela repetição de tarefas por pessoas diferentes.

Para Chapple,4 4 Chapple & Sayles. The measure of management. New York, Macmillan. 1961. a organização constitui um sistema de relações entre pessoas, no qual o inter-relacionamento humano constitui o fator integrador da tecnologia, estrutura e personalidade. Tal inter-relacionamento humano não ocorre num vazio; sua verdadeira existência está determinada em grande medida pela disposição física dos meios de produção, pelas técnicas, processos, informação etc.

Podemos conceituar melhor a organização, integrando e explicitando o que dizem os trechos transcritos dos autores já mencionados.

Sem homens, nada se compreende e, portanto, a organização é essencialmente um conjunto de indivíduos. Esses indivíduos realizam funções e exercem atividades, não ao acaso, mas de acordo com um sistema contínuo. Esse sistema e essa continuidade os inter-relacionam e agrupam. A inter-relação e o agrupamento só são possíveis dada a existência de objetivos comuns. O contrário implicaria dissociação e não o fundamental, isto é, associação para planejar, executar e atingir objetivos comuns.

Essa "estrutura viva" utiliza recursos de todo tipo, equipando-se de meios capazes de facilitar as decisões. Entre esses meios destaca-se a informação pela sua importância. É evidente que as técnicas de produção, a circulação de formulários etc. constituem elementos físicos que servem de base para a inter-relação de indivíduos e grupos.

b) Significado do vocábulo metodologia

Sabemos que, no momento presente, uma grande tarefa de penetração nas diversas ciências utilizadas pelas organizações já foi realizada, seja nas ciências físicas, seja na matemática. Tal penetração permitiu a utilização de recursos científicos variados, começando pelos concretos e terminando pelos abstratos.

Podemos dizer que um grande avanço foi feito na direção do atingimento de um método ordenado, seqüencial e cronológico de planejamento, execução e controle, ou seja, na identificação das coisas a serem feitas, de quando e de que modo devem ser feitas e das pessoas que devem fazê-las. De tudo isso já se tem um conhecimento adequado. Falta ainda, porém, alcançar um grau maior de previsibilidade, com a ajuda de pesquisas de campo mais numerosas e profundas, para elevar a metodologia atual ao nível de ciência organizada.

Ao começar este tópico dissemos que íamos esclarecer dois termos de nosso conceito de administração: organização e metodologia. Acreditamos tê-lo feito a contento através de uma explicação de seu objeto.

3. CONTEÚDO

Acreditamos ter deixado suficientemente claro que o objeto da administração são as organizações e que estas têm como conteúdo indivíduos e grupos humanos. Desses indivíduos e grupos obtemos como antecedentes uma história e, como projeção, um futuro, além de idéias e noções temporais (as idéias podem ser deste tempo ou de outro tempo) e toda a gama possível de recursos.

Listando as principais expressões de Bakke, e considerando que o campo da administração é delimitado pelo planejamento das organizações, pela execução de seus objetivos e por uma determinada estrutura, e mediante sistemas aceitos de autoridade, não esquecendo uma articulação adequada de controle, teremos construído um quadro que procura integrar o conteúdo da administração (figura 1).


Os x em cada um dos itens e em cada uma das colunas indicam que todos os elementos verticais desse quadro são necessários para cada uma das colunas que vão da esquerda para a direita, ou, em outras palavras, que a integração dos objetivos é necessária para o planejamento, bem como o são, igualmente, a integração das funções, indivíduos, grupos de indivíduos, recursos materiais, capital, recursos naturais, idéias e de sistemas de atividade, enfim. Da mesma forma, indicam que uma situação idêntica diz respeito à estrutura, ao mando e ao controle.

Eis aqui, portanto, o conteúdo da administração, integrado em todos os seus elementos componentes e em todas as suas fases técnicas.

4. EVOLUÇÃO

De onde viemos; quem somos agora; o que nos espera no futuro? Essas três questões justificam uma breve explicitação do tema "evolução"; isto é, se o nosso tema fundamental é a "mudança", é de se imaginar que sua direção seja sugerida pela "evolução".

Pouco depois da II Guerra Mundial, a administração entra no século XX. Tal afirmação, que parece falsa, é rigorosamente verdadeira. A administração do século XX tem poucos, muito poucos, anos de vida.

A divisão do trabalho é um legado do século XVIII, como a obra de Adam Smith nos recorda. O sistema de Estado Maior é um legado de Frederico, o Grande; a estrutura escalar, hierarquizada e departamentalizada é um legado das organizações ferroviárias americanas do século XIX, especialmente da Poor e McCallum. Pois bem: sobre essas premissas tais como divisão de trabalho, sistema de linha e staff e estrutura escalar e departamentalizada, estivemos trabalhando até há muito pouco tempo. Eram, praticamente, os temas de estudo e desenvolvimento na maioria das empresas, universidades e na literatura especializada.

A administração passou por três impactos importantes até a II Guerra Mundial, e graças a eles desenvolveu o que talvez seja até agora o "pão nosso de cada dia" para dirigentes de empresas e professores universitários, ou seja, tanto para seus práticos como para seus teóricos. Esses três impactos foram o desenvolvimento da fábrica moderna, com toda a sua tecnologia (época: princípios do século; personalidade marcante: Taylor); a explicitação de base científica dos objetos, conteúdos e técnicas da administração de empresas (época: I Guerra Mundial; personalidade marcante: Fayol); e a investigação (e divulgação do conhecimento dela resultante) das motivações não-econômicas do homem na situação de trabalho (época: década dos 30; personalidade marcante: Elton Mayo).

Tudo isso "já era". Nossos filhos não se preocupam com a tecnologia industrial porque o assunto lhes parece superado; o problema da "hierarquia de necessidades" do homem é ensinado no ginásio; e assim por diante... Por outro lado, esperam uma administração que não seja a "velha administração". Nossos filhos serão os administradores do futuro e não estão satisfeitos com a administração, tal como é praticada nas empresas, no governo, no exército, na igreja ou na universidade. Interessa-os, em turno, pela automação, pela energia nuclear, pela computação, pela cibernética, pela psicanálise. Eles sabem que o homem de hoje e dos próximos 10 ou 20 anos não é aquele da década de 50.

Torna-se cada vez mais patente a articulação industrial da vida moderna. Como todos sabemos, são cada dia mais evidentes as condições, circunstâncias e restrições do homem moderno. Este é um individuo condicionado por dois elementos principais: a cidade e a indústria.

Sendo o cidadão da década de 80 do século XX um homem de vida urbana industrialmente articulada (uma vez que a indústria constitui a base vertical e horizontal de sua existência, pois derivam seus estilos de vida, seu tipo de consumo e de lazer), as matérias sobre as quais toma partido, sobre as quais não permanece indiferente, que provocam sua evolução como homem organizacional são a automação, a energia nuclear, a computação, a psicanálise e a cibernética.

Existem razões muito fortes para que assim seja: a automação transferiu a habilidade manual do homem a uma máquina; a energia nuclear terminou com a escravização do homem pelos combustíveis antiquados; a computação transferiu parte da habilidade mental de um homem a uma máquina; a psicanálise significou o subsídio mais importante para a medicina no século XX, ligado à divulgação das raízes do comportamento humano em si ou relacionado à sociedade; e, finalmente, a cibernética, como bem a definiu Norbert Wiener, permitiu "o uso humano dos seres humanos", no sentido de conseguir sua liberação.

4.1 A administração como um sistema

O objeto da administração são as organizações. As organizações são concebidas como sistemas complexos. A administração também o é.

A administração considerada como um sistema tem a tarefa de integrar duas grandes partes: uma, muito elaborada, chegando mesmo ao nível da sofisticação e outra, ainda em processo de ser conhecida nos seus elementos constituintes e nos seus processos de interação.

A primeira parte apresenta um caráter ortodoxo, em função de ser conhecida e aceita. Compreede todo o sistema piramidal, com seus conceitos de estrutura, áreas, funções, tarefas etc...; abarca toda a gama de instrumentos que vão da contabilidade financeira até a pesquisa operacional. Inclui, igualmente, os ramos da psicologia, sociologia e antropologia dedicados aos problemas do homem e dos grupos humanos na sociedade industrial.

A segunda parte é aquela que trata da solução dos problemas ainda vigentes da administração entre os quais é fundamental o inter-relacionamento humano em grande escala. Dissecar esse tema implica o trato de temas de enorme importância para nós, tais como o da vigência e realidade da estrutura piramidal; a consideração, no seu nível real de importância, da complexidade da vida organizacional; o dilema atual do homem que dirige, que deriva da dificuldade de formação de grupos administrativos dotados de boa saúde mental e, enfim, de como experimentar sucessos legítimos no que poderíamos qualificar de "dimensão humana" das organizações.

Comecemos pelo princípio. Dissemos que concebíamos a administração como um sistema. Entendemos por sistema um conjunto de partes, identificáveis entre si e isoladamente, dispostas seqüencialmente e de acordo com processos de coordenação, controle e direção que permitem o atingimento de objetivos.

A ordem e a integração são os traços distintivos de um sistema. Estas circunstâncias permitem a planificação e a determinação de comportamentos e, através da informação do sistema, a tomada de decisões.

A administração como sistema obtém seus elementos da realidade empírica e, contemporaneamente, suas características são aquelas que descrevem o perfil da vida industrial. Descreveremos estas condições (realidade empírica e características da vida industrial) do sistema qualificado como "administração" prontamente, já que, como veremos posteriormente, suas conseqüências são de enorme importância e dizem respeito a um aspecto da mudança, estudada neste artigo, de alcance dificilmente imaginável.

5. O SISTEMA OBTÉM OS ELEMENTOS DA REALIDADE EMPÍRICA

Já analisamos o conteúdo da administração: objetivos, funções, grupos de indivíduos, recursos materiais, recursos financeiros, idéias e sistemas de atividade. Em resumo, os elementos da realidade empírica são os homens, a tecnologia e a informação.

A administração obtém seu conteúdo do exterior das organizações, isto é, da sociedade. Os elementos da realidade empírica que selecionará serão aqueles que permitirão o atingimento de seus objetivos. Este sistema, como a realidade empírica, tem no crescimento um dado importante. Sem crescimento, sem desenvolvimento, a administração perderia seu sentido e sugeriria um retorno à Idade Média. Esta condição de crescimento é um produto da articulação industrial da vida do homem moderno. Sem ela sobrevêm a deteriorização, a perda de energia e enfim a morte.

6. O SISTEMA OBTÉM AS CARACTERÍSTICAS DA VIDA INDUSTRIAL

Faremos um breve retorno às características mais significativas da vida industrial:

Alta racionalidade.

Investigação da realidade empírica.

Crença na ciência.

Fixação e atingimento de objetivos.

Vida urbana, ou seja, grupos complexamente organizados.

Mudança abrupta esperada, influenciada pelo fator tecnológico.

Planejamento de atividades.

Execução esperada das atividades planejadas.

Sistema vertical de autoridade.

Controle do planejamento, da execução e do sistema de mando.

Esta listagem não necessita maiores esclarecimentos; com ela completamos o conceito de "administração como sistema".

A que se referia nossa expressão "aspectos da mudança de alcance dificilmente imaginável?" Ao fato de que todo sistema chamado "administração" sustenta-se e apóia-se em uma estrutura. A estrutura clássica é a piramidal e nos encontramos em uma época na qual tanto os que estão dentro das pirâmides quanto aqueles que estão fora expressam seu inconformismo em relação ao sistema de diversas maneiras, seja falando da falta de comunicações, de carência de informação, de lacunas na coordenação, de ineficiência, de baixa produtividade ou, simplesmente, lutando contra a pirâmide de forma estritamente física.

A guerrilha ou o Vietcong, lutando contra o sistema estabelecido, e ganhando muitas vezes a batalha, constituem expressões últimas e finais de um sistema de planejamento, estrutura, mando e controle, que parece estar perdendo força. O "estabelecimento" e a "ortodoxia" (ainda que a ortodoxia da década de 60) não resistem ao enfoque de sistemas aliado à mudança dos valores vigentes. Brechas e quebras, perda de respeito etc... são indícios dos novos tempos. Dirijamo-nos, pois, sem mais demora, ao cerne da situação, ou seja, à crise estrutural.

7. A ESTRUTURA PIRAMIDAL: NASCIMENTO, APOGEU E DECADÊNCIA

Entende-se por estrutura, neste trabalho, a distribuição e o ordenamento das partes que sustentam e apóiam o sistema qualificado como "administração".

Estas partes constituem fundamentalmente:

As áreas de atividade.

As funções correspondentes a cada área.

Os níveis hierárquicos entre áreas e funções.

As inter-relações entre áreas, funções e aqueles que as detêm.

Os mecanismos de comunicações, com seus sistemas de influenciação e seus processos de dotar a estrutura de coerência.

A autoridade que se exerce em seus tipos e níveis distintos.

Os objetivos da organização, sejam os gerais, sejam os setoriais e individuais.

A inter-relação entre a organização tratada e o ambiente.

Toda estrutura é o produto condicionado de vários fatores e variáveis. Por exemplo:

O tamanho da organização.

A tecnologia que esta utiliza.

As tradições existentes no ambiente.

A necessidade de incluir o desenvolvimento entre as metas.

A necessidade de manter, ao mesmo tempo, a organização em equilíbrio.

A necessidade de enfrentar as possibilidades de mudanças abruptas na tecnologia, no mercado, ou na situação política do país ou dos países vinculados.

A dimensão do aparato gerencial, medida tanto em termos de quantidade quanto de suas condições qualitativas.

A falta de conhecimento para agir melhor, pior, ou mais rapidamente, ou ainda, para tornar a conjuntura favorável.

Depois de esclarecer o termo estrutura e de delinear seus principais fatores condicionantes, podemos explicar a razão do título: nascimento, apogeu e decadência da estrutura piramidal.

A estrutura piramidal surge com a atividade humana, estando já mencionada na Bíblia. Porém, a estrutura piramidal de que estamos tratando não é a mesma a que se refere a Bíblia em sua Gênesis e que corresponde à vida tribal. A nossa estrutura é aquela da vida industrial moderna.

O século XIX é o período em que os países atualmente chamados "desenvolvidos" levam às suas últimas conseqüências a revolução industrial. Nos países não-desenvolvidos, tal processo ainda está em marcha. É nesse século XIX que os capitães de indústria constroem suas companhias para a exploração do ferro, do petróleo e das matérias-primas dos países subdesenvolvidos.

O século XX recebe essa herança, fortifica-a e sublima-a. Depois da II Guerra Mundial, assistimos à expansão e à instalação de um novo fenômeno organizacional: a empresa multinacional. Dotadas de fronteiras mais amplas que seu país de origem; de vida mais longa que a geração que a cria, a empresa multinacional converte-se no arquétipo da empresa utilitária sem bandeiras, dotada de uma estrutura piramidal por excelência.

A empresa multinacional é uma espécie de exército de ocupação de caráter econômico. Seu "pentágono" pode estar em Nova Iorque, em Chicago, em Londres, em Paris, em Berlim ou em Milão. Porém, seu caráter estrutural e suas táticas e estratégias não se diferenciam daquelas de um grande exército em operação internacional.

A estrutura piramidal, que experimenta sua formalização acadêmica básica com as primeiras empresas norte-americanas, especialmente com as companhias de estradas de ferro, atinge - depois desse nascimento - seu apogeu na empresa multinacional.

Seu nascimento é investigado, analisado e proclamado desde os princípios do século até o presente. Os grandes precursores, desde Poor e McCallum até Fayol, desagregam e dissecam as partes da pirâmide, a fim de conseguirem atingir (como efetivamente conseguiram) gerações sucessivas de dirigentes. Esta formação histórica culmina com a empresa multinacional.

Em pouco menos de um século, a estrutura piramidal, formalizada, nasce com a expansão ferroviária nos Estados Unidos e atinge seu apogeu com a empresa multinacional, também praticamente norte-americana, no campo do petróleo, das finanças, das comunicações e de outras atividades de alta especialização (e, logicamente, de utilidade).

As empresas de formação piramidal, o management americano, são estudadas em todo o mundo. Uma universidade adota o "estilo" do mundo dos negócios por necessidades bélicas. Na década de 40, Harvard adota o método do caso e forma administradores de acordo com os requisitos estabelecidos pelos negócios do mundo americano, nos Estados Unidos e no exterior. Harvard é exportada; instala-se em Barcelona, Milão, Buenos Aires e, além dessa instalação, forma, através de um sistema de bolsas de estudos, professores que ensinam a administração que as empresas americanas multinacionais requerem, para poder, dessa forma, contratar pessoal local treinado da mesma forma que seus colegas de origem americana.

A tecnologia da indústria estende-se à universidade e, além de penetrar na universidade em todos os países ocidentais, constitui centros paralelos para a formação de técnicos. E é ao tomar essa dimensão que parece sofrer o começo de um processo de decadência.

Se o estilo da empresa multinacional é o mesmo de um exército de operacionalidade internacional, se nos apresentam, abrupta e brutalmente, dois exemplos de decadência dos exércitos e dos tecnocratas.

Esses dois exemplos são o Vietcong e a guerrilha.

A luta do povo vietnamita contra as grandes potências é o exemplo de uma estrutura piramidal de grande escala, e de nível internacional, enfrentada por uma organização não-piramidal que a vence. Note-se, porém, que a derrota não é simplesmente técnica. Não se trata de que a França, primeiramente, e os Estados Unidos, posteriormente, não tenham conseguido vencer os pequenos vietnamitas menos equipados, mas sim do fato destes últimos lutarem com uma estrutura organizacional totalmente diferenciada e não-piramidal. Um fenômeno de muito maior ressonância é produzido: a conquista da simpatia do mundo não-comunista por parte dos vietnamitas e, além disso, um processo de decomposição da própria sociedade norte-americana, fundamentalmente devida a esta guerra desigual e desprovida de sentido aparente. Dentro desse processo de decomposição, alguns pontos são de grande relevância e merecem destaque:

1. A esquerda: maiores explicações são desnecessárias, a partir de a expansão da esquerda nos Estado Unidos alcançar uma extensão imprevista, principalmente nos meios intelectuais, não observada nem mesmo nos tempos de euforia comunista. O aprofundamento da esquerda alcança os Estados Unidos com 30 anos de atraso.

2. A informação: a informação escrita, televisada e oral alcança volume e difusão fabulosos. Considerou-se, com toda razão, que uma guerra, que pela primeira vez é vista pela televisão, demonstrou através desse meio sua verdadeira importância.

3. A sociologia: pelo seu estudo dos grupos sociais, de suas origens, mecanismos de funcionamento e possibilidades.

4. A psicanálise: pelo problema originado pelas tensões e traumas das sociedades dotadas de grandes recursos e alienadas pelo consumo; pela profundidade na análise das razões do comportamento individual e social.

Chegamos a um ponto de nosso desenvolvimento que nos obriga a uma pausa para a recapitulação e a ordenação de nosso pensamento. Explicamos o que eram as organizações; dissemos que estas constituíam o objeto da administração, cujo conteúdo era formado de homens atuando individualmente ou em grupos, dotados de uma história e de um futuro, de idéias, noções temporais e recursos de naturezas diversas. Dissemos, igualmente, que, em sua evolução, a administração havia chegado ao nível de sistema. Completamos o conceito afirmando que o sistema obtinha seus elementos da realidade empírica, com todas as características concretas da vida industrial.

Tendo nascido no apogeu da revolução industrial, o sistema adotou em suas origens uma forma piramidal que conservou.

Esta estrutura piramidal conservou-se. Todavia, o que mudou foi muito e fundamental:

1. Passou-se de uma habilidade principalmente manual a uma habilidade principalmente mecânica e transferível de máquina a máquina: automação.

2. Passou-se de uma habilidade principalmente mental e humana a uma habilidade transferida a máquinas que, em certos aspectos, podem levar a cabo atividades tradicionalmente mentais, de forma melhor e mais rápida que o homem: computação.

3. Passou-se de um sistema de energia antiquado ao sistema de energia atômica: energia nuclear.

4. Passou-se de um conhecimento generalizado a outro, produto da investigação empírica, em matéria de comportamento social, passando pela análise profunda da vida individual, levando em conta a análise mais profunda do homem em sociedade: psicanálise social.

5. Passou-se de sistemas parciais a um sistema total e integrado que permitiu concretizar a grande aventura da humanidade, colocando o homem no espaço e, logo após, na lua: cibernética.

E apesar de tudo - do homem na lua, da automação, da computação, da energia nuclear e da psicanálise social - como resultado da tradição, da resistência à mudança, talvez da ignorância, as organizações civis e militares continuaram apoiando-se em uma estrutura piramidal. No momento presente, atacada externa e internamente, derrotada em parte por organizações não-piramidais como o Vietcong e a guerrilha, essa estrutura piramidal, produto da tecnologia, não acompanhou o avanço tecnológico. Ao contrário, permaneceu no século XIX, senão totalmente, pelo menos no sistema de idéias: na divisão do trabalho, na linha de staff, na estrutura escalar, departamentalizada e hierárquica.

8. TECNOLOGIA DO SÉCULO XX, ESTRUTURA DO SÉCULO XIX

As sublimações da tecnologia do século XX (exército de ocupação internacional, com décadas de ocupação de território chamado inimigo; empresa multinacional, seguidora da vitória bélica) começam a rodear-se de inimigos, a sofrer ataques externos frontais e indiretos, a sentir os impactos de dissenções intestinais. E, para os que estudam este contexto, saber o que ocorrerá com a administração, estando conscientes de que esta sempre toma os elementos do contexto para utilizá-los nas organizações, implica colocar-se diante da pergunta crucial, intrínseca e radical: estamos assistindo à decadência da estrutura piramidal?

9. ESTADO ATUAL DO PROBLEMA

Se a estrutura piramidal está em decadência, acreditamos pelo menos que:

a) existe uma origem para tal fenômeno;

b) expressões desta origem já se concretizaram;

c) substituições ou mudanças importantes anunciam-se.

Como dissemos anteriormente, para nós a(s) origem(ns) surge(m) com:

a) a esquerda (por seus ataques ao sistema institucional);

b) a informação (pela atualização constante que proporciona às pessoas);

c) a guerrilha (como exemplo não-piramidal de estrutura);

d) a sociologia (pelas suas pesquisas sobre as formas e o comportamento dos grupos);

e) a psicanálise social (pela sua análise em profundidade dos problemas do homem).

No que se refere às expressões concretas, diremos que as mais significativas, além das já anunciadas, são:

a) as antinomias: as organizações exigem cada vez mais criatividade e, ao mesmo tempo, o sistema piramidal, compulsivamente, requer conformismo e adaptação. Tal antinomia (criatividade versus conformismo) repete-se em muitos outros casos (como, por exemplo, desenvolvimento versus equilíbrio);

b) a submissão como estratégia: a pirâmide é autoritária por natureza, mesmo quando pretende tomar formas democráticas. O autoritarismo e a verticalidade são características inalienáveis da forma piramidal. O choque entre o sistema de idéias sociais avançadas e progressistas e tais condições da pirâmide faz com que esta última não esteja, no momento, relacionada com o contexto mais amplo;

c) o uso indevido dos recursos humanos: as organizações, em função de seu sistema hierárquico e piramidal, estão usando as pessoas como há 1/4 de século, isto é, como se estas não tivessem a educação que atualmente têm. Existe um desperdício de recursos humanos, no que se refere à sua capacidade intelectual que poderia ser aplicada às organizações. Ao tratar as pessoas como homogêneas, considerando cada uma como equivalente a um posto ou posição, as capacidades individuais serão subestimadas. Não somente o desperdício de potencial intelectual é provocado, como também uma reação desfavorável ao sistema estrutural que o permite;

d) a estrutura planejada e a estrutura real: praticamente não existe organização que não possua duas ou mais estruturas, uma planejada e outras reais. Deu-se o nome de "formal" à primeira e de "informais" às segundas. Na verdade, o que ocorre é que a primeira é concebida segundo a ortodoxia organizacional: seções, departamentos, cargos, homens que agem de forma absolutamente previsível no exercício das funções que constituem seus cargos, ou seja, pessoas que mantêm um comportamento fixo enquanto permanecem ocupando os mesmos cargos. As segundas estruturas constituem o resultado da reação contra a estrutura piramidal: pessoas que mudam com o tempo e que procuram mudar de posição e de função, ao mesmo tempo que declaram obedecer à organização e a seu design: antagonismo adaptativo dos que não podem agir de forma planejada; líderes reais que têm autoridade efetiva ao lado de supervisores "legais" que não possuem poder concreto; níveis hierárquicos que não são respeitados e "centros de poder" que merecem aquiescência etc.;

c) desorganização e disfunção: se a estrutura piramidal fosse realmente vigente, a necessidade de "reorganizações sucessivas" não existiria ou, o que é mais importante, não existiria a necessidade de se manter a função de evitar a desorganização, como atividade permanente de toda instituição ou empresa de larga escala. A desorganização e a disfunção como constantes, reais e concretas de toda estrutura piramidal, e a necessidade de "voltar à situação normal" mediante "sistemas", "métodos", "auditoria operacional" etc., são provas evidentes da deterioração que o sistema de estrutura piramidal traz em si, como elemento constituinte.

10. AS MUDANÇAS OU SUBSTITUIÇÕES IMPORTANTES QUE SE MANIFESTAM

Classifiquemos as mudanças em passadas, presentes e futuras.

Parece um contra-senso referir-se ao passado tratando-se de mudança.

Porém, o fato de a estrutura piramidal não ser suficiente para o atingimento de determinados objetivos manifestou-se de forma evidentemente real nos grandes projetos de nosso passado imediato: por exemplo, nos vôos espaciais.

Assim, historicamente podemos referir-nos a algumas mudanças importantes:

a) a estrutura matricial;5 5 Lodi, João Bosco. Estrutura matricial e estrutura sistêmica. Revista de Administração de Empresas, Fundação Getulio Vargas, v. 12, n. 3, set./72.

b) a estrutura de grupos verticais interpenetrantes;6 6 Likert, Rensis. O fator humano na empresa. Deusto. Bilbao. 1968.

c) a estrutura referente aos critérios de decisão, caracterizada por um alto grau de descentralização e pela ênfase na rentabilidade, como se apresenta na empresa transnacional ou multinacional.7 7 Moore, Russel F. American Management Association Handbook. New York. 1970.

A mudança mais clara que observamos no presente é a procura de transformar cada área organizacional numa unidade administrável, sem que critérios ortodoxos impeçam a construção de estruturas de caráter híbrido: parcialmente descentralizadas, parcialmente funcionais etc. Repetimos: quando um país ou setor geográfico determinado experimenta os problemas do desenvolvimento, ou quando uma empresa deseja levar a cabo a consecução de um projeto em tempo escasso, tudo depende da possibilidade de manejar com eficiência e coesão a unidade organizacional adequada. Até os exércitos e as forças de segurança abandonaram parte de seus princípios fundamentais, em primeiro lugar, em função da guerrilha rural e em segundo, da guerrilha urbana, para adotar estruturas semelhantes às de seus inimigos.

Um exército tradicional com suas unidades de combate é um exemplo clássico de estrutura híbrida, evitando as desvantagens preexistentes e operando com a mesma velocidade de seus inimigos.

No que diz respeito ao futuro, podemos fazer a pergunta clássica: qual é a realidade empírica?

Colocamos esta hipótese. As organizações obtêm sua forma e sua estrutura do contexto. Se, socialmente, no que falta do século, as estruturas sociais resultaram ser instáveis, podemos dar a uma organização dedicada à produção de aço, por exemplo, uma estrutura estável?

Se um dirigente, para escalar a pirâmide, precisa passar por uma geração e, nesse espaço de tempo, modificam-se o nível de educação de seus subordinados, a tecnologia de produção e os hábitos de consumo da população, com que autoridade poderá exercer um poder vertical?

Se uma aceleração é produzida na mudança tecnológica, se transformações políticas profundas têm lugar, se o ritmo de mudança passa de 15 a sete ou a cinco anos, se esse tipo de modificação estrutural produz-se ao nível da sociedade global, como poderá manter-se - como tem-se mantido há quase um século - um sistema organizacional piramidal com suas características de vigência?

A hipótese é, portanto, que se a estrutura social termina por ser do tipo instável, a das organizações também o será e que os gráficos que descrevem a estrutura, como os organogramas, tenderão todos a um caráter provisório.

Se o avanço científico continua e a especialização torna-se mais profunda, a cúpula não será constituída de um líder supremo, a função não será de um líder supremo, mas provavelmente de um grupo de homens sem tarefas especificadas, mas dotado de um dado interesse dominante (como levar o homem à lua); grupos de trabalho instáveis serão aqueles que passarão de certos trabalhos ou projetos a outros de forma cronológica, modificando-se a constituição dos grupos conforme o interesse dominante de cada indivíduo.

Interesse dominante em lugar de função; instabilidade em lugar de estabilidade: estas são as mudanças importantes que se apresentam para o futuro, tais como o passado imediato e o presente as vão configurando.

A estrutura organizacional do futuro deverá adequar-se a duas variáveis fundamentais, que enunciaremos posteriormente, e, ao mesmo tempo, obedecer a dois imperativos: o social e o individual; ou seja, se a sociedade é instável, o imperativo social é a organização que não seja rígida; se o imperativo individual é satisfazer o interesse predominante no indivíduo, em vez de limitá-lo aos parâmetros de uma função estática, dever-se-á responder a esse imperativo, permitindo-lhe desempenhar uma atividade na qual seu interesse dominante possa ser plenamente satisfeito.

De forma extremamente simplificada, podemos dizer que a mudança futura é a conseqüência inevitável de três fatores:

1. Transformações políticas.

2. Educação científica e dinâmica social dos subordinados.

3. Articulação industrial da vida atual.

Lembremo-nos de que quando a estrutura piramidal esteve em sua plena vigência, a Europa era governada predominantemente por reis e a África e a Ásia eram dominadas pelos europeus e pelos americanos. Isso já não existe mais. Nessa mesma época, a educação científica e técnica estava limitada a uma elite reduzida; os utensílios domésticos, tão comuns para as crianças e às donas de casa de hoje, não existiam. E recordemo-nos de que não estamos falando do século passado, mas das primeiras décadas deste.

A mudança foi tão tremenda e profunda, alcançou tantos aspectos da vida social, que é simplesmente razoável e de se esperar que ela se aprofunde também nas estruturas das organizações.

11. A COMPLEXIDADE DA VIDA ORGANIZACIONAL

Dissemos anteriormente que a estrutura organizacional do futuro deverá responder a duas variáveis. São elas:

1. A complexidade da vida organizacional.

2. Os problemas do homem que dirige.

Expressado de outra forma, a estrutura deverá responder:

1. A realidade organizacional vigente (com seu complexo de homens, grupos e recursos).

2. A realidade do homem ou grupo que dirige a organização.

Em síntese: à realidade empírica.

Dissemos (e muitos outros o fizeram antes de nós) que a organização é um ente social complexo. Não que ela seja complicada, mas sim composta de partes múltiplas inter-relacionadas por processos, que fazem com que este ente seja complexo, no sentido de ser dotado de múltiplas partes cuja inter-relação recíproca faz com que a variação de uma tenha efeito sobre todas as demais.

O que foi dito vai contra a tendência de simplificar ou esquematizar a organização, em função de um problema de racionalidade, segundo o qual, quando não se pode considerar mentalmente todos os elementos de um universo, simplifica-se os dados para que seja possível apreendê-los conjuntamente.

Como já enunciaram muitos autores, mas principalmente Argyris e Chapple, a organização é uma teia complexa de fatores.

Vejamos os principais:

a) do ponto de vista do indivíduo na organização:

conseguir satisfazer suas necessidades (físicas, sociais e de seu ego);

conhecer as razões das atitudes e comportamentos individuais;

determinar as escalas de valores individuais;

b) do ponto de vista dos grupos na organização:

determinar objetivos;

analisar, interpretar e estabelecer normas grupais;

canalizar os processos de atividade do grupo;

conseguir e manter sua coesão;

c) do ponto de vista da organização, de sua política e de suas atividades:

o estabelecimento de um sistema de comunicações adequado;

a determinação do fluxo de trabalhos;

o sistema de recompensas e punições;

as formas, modos e meios de exercício do poder;

d) do ponto de vista das atividades não previstas, nem planejadas (atividades "informais"):

as "quotas" de produção;

a indiferença e a desconfiança;

o conformismo;

a adaptação inconformista ou mesmo antagonismo;

e) do ponto de vista da tecnologia:

a importância, em maior ou menor grau, da própria tecnologia;

a homogeneidade, ou sua ausência, no trabalho;

as dimensões da linha de montagem ou trabalho, considerando que uma pequena dimensão favorece a coesão do grupo, enquanto que uma grande dimensão a inibe;

a perfeição ou imperfeição do trabalho, considerando que a primeira reduz os conflitos, enquanto que a segunda os provoca e aumenta;

a existência ou não de técnicos ou especialistas considerados "indispensáveis";

f) do ponto de vista dos recursos:

obter e combinar os fatores de produção (materiais, instalações e equipamentos, chegando ao ponto mais próximo do ótimo);

fazer com que a organização fundamente sua existência, no tempo, com um apoio permanente dos recursos naturais (desde utilizar a temperatura até evitar a poluição);

coordenar seus objetivos, funções, atividades, produtos e processos, com o sistema de idéias, linguagem e cultura vigentes.

Eis aqui um conjunto de "famílias" de fatores que fazem com que a organização seja extremamente complexa. Como é lógico, não esgotamos a lista e nem mesmo chegamos próximos disso. Cada um dos subfatores (por exemplo: o ataque ao ego de um indivíduo) pode produzir efeitos em qualquer outro (no caso, por exemplo, o estabelecimento de "quotas" de produção ou a produção de imperfeições no trabalho).

O problema consiste em que a estrutura organizacional do futuro deve considerar a complexidade da vida organizacional, a fim de que no planejamento, direção e controle das organizações, o homem ou grupo dirigente possa efetivamente dirigir.

A compreensão da real e extrema complexidade organizacional, desprovida de simplificações mentais, permitirá a formalização de estruturas que estejam de acordo com a realidade empírica do homem e da sociedade atual.

Como resolver o problema? A nosso ver, através de um verdadeiro conhecimento da estrutura e do funcionamento do grupo de trabalho.

12. ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO GRUPO DE TRABALHO

O funcionamento do grupo de trabalho, de acordo com Puckey, depende principalmente de sua força, forma e estrutura.

Em termos gerais, a força é dada pelo número de pessoas que o compõem, pela área coberta e pela habilidade demonstrada na solução de problemas.

Sua forma é resultante do tamanho e do sistema de direção. Todo grupo grande é liderado por um número reduzido de pessoas. Se o sistema de direção não é monocrático, mas sim caracterizado por comitês, a forma também varia. Graficamente poderíamos exemplificar diferentes formas:

No que diz respeito à estrutura do grupo, constituem seus fatores:

o(s) produto(s) e o(s) serviço(s) da organização;

as funções que deve levar a cabo;

as áreas que deve cobrir;

as questões de tipo temporal (por exemplo: o tempo de duração das funções do grupo).

O processo principal responsável pela manutenção do grupo, aquele que provoca ações e obtém consenso, aquele que difunde a comunicação em todos os sentidos, é o processo de liderança, que também proporciona normas de comportamento para o grupo, através do que lhe assegura proteção, relações interpessoais e condições de status (denominação, horários, retribuição etc).

13. A VERDADEIRA DIMENSÃO HUMANA DA ORGANIZAÇÃO

Até agora estamos tratando da variável de mudança a que denominamos "complexidade da vida organizacional". Depois de expor de forma sucinta sua teia complexa de fatores, chegamos à conclusão de que o ponto nodal da questão estava na possibilidade de sua manipulação graças à formação de grupos de trabalho caracterizados por uma força, forma e estrutura conhecidas.

Se os elementos chamados força, forma e estrutura são conhecidos, se sabemos para que servem e como se comportam, podemos então fazer seu planejamento.

A base da organização, o grupo de trabalho, não é então produto da tradição, fruto do acaso ou das influências, mas sim o resultado de um planejamento.

Este planejamento poderá resultar, enfim, na maximização da utilização dos recursos humanos.

Até agora, esses recursos eram considerados bem empregados quando se conseguiam ganhos crescentes por decisões oportunas; ou tempo, energia e inteligência maiores do que exigido ou esperado de acordo com os estatutos; ou redução dos conflito pessoais graças a um estilo de mando determinado; ou, para acabar com os exemplos, reduções de custos e melhores rendimentos, graças a novos métodos de obtenção de capital, de matéria-prima ou de tempos de execução.

Permaneceu sempre misteriosa a utilização insuficiente da inteligência, da criatividade e da possibilidade de gerar mudanças em todos e em cada um dos membros da organização.

Esta possibilidade é a segunda variável a ser considerada para finalizar este artigo e decidimos chamá-la de "o problema do homem que dirige".

14. O PROBLEMA DO HOMEM QUE DIRIGE

A fim de possibilitar a compreensão do leitor sobre o desenvolvimento desse ponto, como o de todos anteriores, apresentamos sua síntese, classificando seus temas principais como segue:

1. A direção como sistema.

2. A informação e seus instrumentos.

3. O caráter e a representação da autoridade no exercício do poder.

4. A direção dos grupos de trabalho e a saúde mental do grupo.

14.1 A direção como sistema

Likert foi, em nossa opinião, quem melhor expôs o sistema de direção, tal como o quisemos ver no processo de mudança.

O "sistema" de Likert compõe-se de:

a) processos de liderança utilizados;

b) caráter das forças motivacionais;

c) características dos processos de comunicação;

d) características dos processos de interação e influência;

e) características do processo decisório;

f) características da fixação de objetivos e seu ordenamento;

g) características do processo de controle.

Este sistema de direção maximiza-se em relação crescente de participação dos integrantes do grupo e, conseqüentemente, de utilização mais adequada dos recursos humanos.

É óbvio que, para que isto ocorra, a constituição do grupo deva ser planejada e sua formação responda a condições de tipo específico, tais como as já detalhadas e como algumas que terminaremos de indicar nas páginas seguintes.

O processo de liderança a ser utilizado requer a obtenção de um alto nível de confiança nas subordinadas, de um amplo sentimento de liberdade por parte destes para a discussão dos aspectos importantes de suas tarefas com seu superior imediato e de uma freqüência real de consultas por parte do superior sobre as idéias e opiniões dos subordinados, sobre os modos e meios de solução dos problemas de trabalho.

O caráter das forças motivacionais depende das formas que assumam as motivações e do grau de responsabilidade sentida por cada membro da organização no que se refere ao atingimento dos objetivos desta.

As características dos processos de comunicação manifestam-se de acordo com o grau de exatidão das comunicações ascendentes, com o grau de aceitação pelos subordinados das comunicações descendentes, com a medida em que os superiores conhecem e entendem os problemas enfrentados pelos seus subordinados, com a quantidade de comunicações orientadas para atingir os objetivos organizacionais etc.

As características dos processos de interação e influência correspondem à importância do trabalho em equipe, à cooperação derivada deste modo de ação e à importância e ao caráter da interação individual que são os resultados de tudo o que foi dito anteriormente.

As características do processo decisório relacionam-se com o nível em que as decisões são formalmente tomadas, com o grau em que o conhecimento técnico e profissional é utilizado para sua tomada, com a medida em que seus subordinados participam nas decisões relacionadas a seu trabalho e os membros do escalão superior estão inteirados dos problemas existentes, especialmente daqueles que se produzem nos níveis inferiores da organização.

As características da fixação de objetivos ou de seu ordenamento dependem da existência de forças de aceitação, resistência ou inaceitação dos objetivos e, implicitamente, também da forma em que se realizam tal fixação e ordenamento.

As características do processo de controle podem ser enunciadas da seguinte maneira: grau em que as funções de controle estão concentradas; razões das funções de controle (se relativas à auto-orientação dos gerentes e solução por parte destes dos problemas do grupo ou ao exercício de um poder policial e punitivo); existência de uma "organização informal" que apóia os objetivos da "organização formal" ou se opõe a eles.

Em todos os enunciados de Likert observamos um traço comum: seu "sistema de direção" apóia-se em uma socialização adequada dos subordinados na adesão total dos superiores em um estilo de liderança não-autocrático, não-vertical e enquadrado em uma dinâmica social.

14.2 A informação e seus instrumentos

Em vários trabalhos anteriores8 8 Perel, Dr. V. L. Una estructura de información basada en centros de información. Facultad de Ciencias Económicas de Buenos Aires e Perel, Dr. V. L. Organización y control de empresas. Buenos Aires, Editorial Macchi. 1972. desenvolvemos com o detalhamento devido à idéia de que, para poder dirigir, deve-se não somente contar com a informação adequada (não volumosa; mas correspondente e adequada à situação decisória), mas também com o fato de esta informação estar instrumentalizada através de sistemas.

Como se sabe, os sistemas referem-se a:

controle superior;

controle operacional;

métodos;

economia da empresa;

planejamento e orçamento;

patrimônio;

custos;

impostos e outras exigências do Estado.

Em uma empresa de fins lucrativos, a informação deve servir para sua direção e controle. Com isto queremos deixar bem claro que a informação, além de poder ser utilizada para manter a empresa dentro dos limites ou parâmetros fixados apriorísticamente (por exemplo, planejamento, orçamento, programas, normas etc), deve poder ajudar a criação, a inovação e o desenvolvimento. A direção, portanto, deve ser entendida neste parágrafo como a capacidade para avaliar o cumprimento do plano, a medição dos desvios e a determinação de suas causas.

Nas empresas de caráter industrial, a informação pode ser classificada em quatro grupos principais:

a) a que corresponde aos produtos da empresa;

b) a pertencente aos clientes atuais ou potenciais;

c) a que se relaciona à estrutura interna da empresa;

d) a que se refere ao meio no qual se desenvolvem os negócios que desejamos realizar.

Esta concepção do sistema apóia-se, portanto, em uma forte estrutura interna, dotada de capacidade de conduzir, controlar e medir fundamentalmente:

1. Que produtos podemos e devemos vender a fim de maximizar os resultados.

2. A que clientes devemos vender esta ou aquela combinação ou combinações de produtos, com a mesma finalidade.

3. Qual deve ser a ordem, a metodologia e a cronologia do trabalho interno da empresa para o cumprimento das metas precedentes.

4. Que dados nos devem ser proporcionados para melhorar nossa capacidade de decisão.

14.3 O caráter e a representação no exercício do poder

O problema do homem que dirige não é mandar, mas poder mandar, isto é, força ou poder para mandar.

Do ponto de vista organizacional, recordemos a existência de:

um planejamento;

uma execução;

um controle.

E no que se refere à execução:

uma estrutura;

um comando.

Ter força ou poder para mandar é o que faz falta para poder executar o planejado. Todavia esse mando, força e poder só poderão ser efetivos se a estrutura servir de apoio e manutenção de todo o planejamento, do sistema de mando e dos meios de controle.

A autoridade confere-se; o mando consente-se. Portanto, poder mandar, ter força ou poder para tanto, não é um problema legal ou estatutário, mas sim um problema de planejamento, forma e estrutura do grupo de trabalho, porque o problema do mando é fundamentalmente a quantidade de poder que se concentra em uma pessoa.

Etimologicamente mandar significa praticamente estar em mãos de uma pessoa. E se esta foi a tradição do senhorio, da propriedade (na antigüidade dizia-se em latim: in manu esse e manus dare, de onde provém nosso vocábulo "mandar"), nosso século XX, porém, não admite socialmente a ditadura, e conseqüentemente sua admissão é tampouco possível nas organizações.

O mando por um grupo, já utilizado em grandes empresas dotadas de direção por comitês, é a colocação em prática de um velho aforismo: o poder tende a corromper; mas o poder absoluto sempre corrompe.

Dentro de nossa precupação (mando e/ou substituição da estrutura piramidal clássica) o problema do homem que dirige e o problema dos que são dirigidos ocupam um lugar prioritário.

Para um sistema de direção dotado de alta participação, é necessário poder mandar, mas também o é evitar o abuso do poder. O mando por um grupo, dentro de uma organização de certo tamanho constitui uma forma forte, saudável e honesta de operar. É a que verdadeiramente outorga consentimento e, portanto, poder para mandar.

14.4 A direção, os grupos de trabalho e a saúde mental do grupo

Este tema encontra aqui seu lugar e seqüência lógica e natural. A estrutura organizacional deve obedecer a uma realidade empírica constituída de duas variáveis:

1. A complexidade da vida organizacional, já explicada.

2. Os problemas do homem que dirige, que culminam com o planejamento, forma, força e estrutura do grupo de trabalho.

Sobre este tópico tão preocupante (a operacionalidade ou funcionamento de um grupo de trabalho) estender-nos-emos somente naquilo que for pouco tratado: a saúde mental dos componentes do grupo.

É pouco inteligível que o grupo funcione, desenvolva-se, seja criativo e, finalmente, possa exercer o mando sem uma saúde mental adequada. Isto quer dizer que, na planificação da composição do grupo, deve ser considerada como elemento fundamental uma plena saúde mental como patrimônio de cada um de seus mebros.

Levinson9 9 Levinson. Man management and mental health. Harvard University Press. Cambridge (Mass.). 1963. estabeleceu de forma adequada os parâmetros da saúde mental:

1. A característica das das pessoas que tratam as demais como a si mesmas, isto é, sem estereótipos, tais como os preconceitos que impedem o ingresso no grupo de amarelos, negros, judeus, católicos, pessoas que usem barba, ou que não pareçam "gente bem", "boas pessoas", ou não sejam "como nós".

2. É também fator de saúde mental a manutenção de flexibilidade quando se está submetido a tensões. Por exemplo: a morte de alguém de quem uma pessoa gosta não pode fazer com que esta perca de vista os interesses do grupo a que pertence.

3. É condição de saúde mental obter gratificação de um amplo e variado espectro de origens. As pessoas, as idéias, as tarefas, os interesses e os valores devem apresentar a gama do social.

Aquele que se fanatiza por algo termina por ver o mundo de forma muito estreita e, finalmente, seu equilíbrio emocional e mental acaba sendo duvidoso.

4. A saúde mental se expressa em termos de aceitar, cada um, suas próprias capacidades e limitações.

5. Finalmente, outro dos parâmetros do tema tratado consiste na atividade e produtividade espontâneas e naturais. Ao longo do tempo, sem necessidade dos incentivos que provocam as crises, os problemas ou as situações de emergência, a atividade e a produtividade devem ser autênticas e pessoais; ou seja, sãs.

E é assim, segundo esses requisitos e condições, que o grupo que se dirige deve ser constituído.

15. CONCLUSÕES FINAIS

Aqueles que, de uma ou outra maneira, preocupam-se com a administração têm, além da satisfação do que já conseguiram, a angústia e a preocupação de tudo o que ainda falta fazer.

Sabemos que, sem uma mentalidade adequada, não será possível avançar. Até agora, alguns instrumentos de controle foram levados a um alto nível de sofisticação, o que torna desnecessária sua discussão. Sabemos também que existe uma grande eficácia nos conteúdos e métodos de planejamento. Também conhecemos, vivemos e sofremos os problemas da execução, seja de área, de curto, médio ou longo prazo.

Se o problema que nos afeta pelas suas crises, suas insatisfações e suas ineficiências é o da execução, nosso problema é o da estrutura e mando.

O auge de uma tecnocracia administrativa, que em grande parte entra no terreno da "quantofrenia", pela sua opção decidida pelas fórmulas sem conteúdo nem aplicação, não provocou nada mais do que a sofisticação de determinados instrumentos, sem resolver nenhum dos dois aspectos fundamentais do nosso problema.

Constituem fatos fundamentais de nossos dias:

a) a articulação industrial de nossa vida social;

b) a mudança abrupta que, sem horizontes visíveis, estão produzindo as inovações tecnológicas;

c) a realidade da complexidade organizacional;

d) a realidade dos problemas dos homens que dirigem;

e) o uso crescente da informação além de seu desperdício; a devastação de florestas inteiras para conversão em celulose, com a qual se fabrica papel, em que se imprime a informação que poucos lêem e que termina em uma grande fogueira, de dimensões e profundidade piores que a da inquisição medieval ou dos censores oficiais dos nossos tempos.

Vemos também como fatos fundamentais de nosso futuro imediato:

1. A transformação do conceito de estrutura.

2. A introdução do princípio da instabilidade nas estruturas, no lugar da atual estabilidade presumida.

3. O planejamento e formação de grupos de trabalho sobre a base da idéia de saúde mental.

4. O dimensionamento humano das organizações; chamamos sobre-humano o crescimento que implica a impossibilidade de interação, de contato face a face, ao mito de uma "organização entre desconhecidos".

São estes os fatos que quisemos expor.

  • 2 Puckey, W. Organization in business management. Londres, Hutchinson. 1970.
  • 3 Dale, E. Organization. New York, American Management Association. 1967.
  • 4 Chapple & Sayles. The measure of management. New York, Macmillan. 1961.
  • 5 Lodi, João Bosco. Estrutura matricial e estrutura sistêmica. Revista de Administração de Empresas, Fundação Getulio Vargas, v. 12, n. 3, set./72.
  • 6 Likert, Rensis. O fator humano na empresa. Deusto. Bilbao. 1968.
  • 7 Moore, Russel F. American Management Association Handbook. New York. 1970.
  • 8 Perel, Dr. V. L. Una estructura de información basada en centros de información. Facultad de Ciencias Económicas de Buenos Aires e Perel,
  • Dr. V. L. Organización y control de empresas. Buenos Aires, Editorial Macchi. 1972.
  • 9 Levinson. Man management and mental health. Harvard University Press. Cambridge (Mass.). 1963.
  • *
    Artigo traduzido do espanhol pelo Prof. Fernando C. Prestes Motta do Departamento de Administração Geral e Relações Industriais da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas.
  • 1
    Bakke, E. W. Concept of social organization. In: Haire, Mason.
    Modern organization theory. New York, Wiley and Sons. 1959.
  • 2
    Puckey, W.
    Organization in business management. Londres, Hutchinson. 1970.
  • 3
    Dale, E.
    Organization. New York, American Management Association. 1967.
  • 4
    Chapple & Sayles.
    The measure of management. New York, Macmillan. 1961.
  • 5
    Lodi, João Bosco. Estrutura matricial e estrutura sistêmica.
    Revista de Administração de Empresas, Fundação Getulio Vargas, v. 12, n. 3, set./72.
  • 6
    Likert, Rensis.
    O fator humano na empresa. Deusto. Bilbao. 1968.
  • 7
    Moore, Russel F.
    American Management Association Handbook. New York. 1970.
  • 8
    Perel, Dr. V. L.
    Una estructura de información basada en centros de información. Facultad de Ciencias Económicas de Buenos Aires e Perel, Dr. V. L.
    Organización y control de empresas. Buenos Aires, Editorial Macchi. 1972.
  • 9
    Levinson.
    Man management and mental health. Harvard University Press. Cambridge (Mass.). 1963.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 1974
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