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Seguro de vida: um mercado a conquistar

ARTIGOS

Seguro de vida: um mercado a conquistar* * Resumo de um projeto de pesquisas contratado pela Federação Nacional de Seguros e Capitalizações (Fenaseg) à empresa de Consultoria Richers, Buarque de Almeida & Associados. O autor agradece à Fenaseg pela autorização de tornar público o presente trabalho, pelo qual se declara responsável. Outrossim, manifesta o reconhecimento aos seus colaboradores, em particular aos Profs. Eduardo Buarque de Almeida e Sérgio Roberto Dias, à Sra. Maria Magdalena E. Mischan Rodrigues e ao Sr. Maxim Castelnau, do IPOM.

Raimar Richers

Professor-fundador da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, Departamento de Mercadologia

Apesar de ter registrado um aumento real satisfatório nos últimos anos, tanto o ramo de seguros em geral, quanto o de seguros de vida, encontra-se diante de um vasto potencial inexplorado no Brasil.

Ciente deste fato, a Fenaseg resolveu investigar o mercado, não somente com o intuito de avaliar as suas tendências de evolução e de identificar os nichos mercadológicos insuficientemente cobertos, mas também para traçar algumas diretrizes e metas de dinamização, em particular daqueles tipos de seguros que se destinam a pessoas - como o seguro de vida, de acidentes pessoais e de saúde, acima de tudo.

O presente artigo focaliza algumas das principais conclusões desse projeto. Todavia, face à extensão do trabalho, concentrar-nos-emos nos seguintes aspectos:

determinação de metas de arrecadação de prêmios entre 1975 e 1985;

as principais características do mercado, de acordo com uma pesquisa de campo conduzida em 1974;

a identificação dos nichos de mercado para os seguros de vida;

a formulação de duas modalidades de estratégia mercadológica, destinadas a, gradativamente, preencher esses nichos;

algumas das implicações dos resultados gerais para a formulação da estratégia de uma seguradora (qualquer).

1. TRAÇOS GERAIS DO PROJETO

O projeto contratado pela Fenaseg foi conduzido ao longo dos anos 1973 a 1974. A sua parte formal abrange os seguintes três passos de investigação:

a) Uma avaliação das tendências do mercado de seguros de vida, no mundo e no Brasil, baseada primordialmente em dados secundários levantados entre nós, na Europa e nos EUA.

b) Uma pesquisa de opinião junto aos produtores e intermediários de seguros com o fito de avaliar a atual oferta de seguros de vida no Brasil.

c) Uma pesquisa de campo, subcontratada ao Instituto de Pesquisas de Opinião e Mercado (IPOM), para avaliar as principais dimensões de natureza qualitativa e quantitativa do nosso mercado de seguros, junto a uma amostra de 803 respondentes (443 em São Paulo e 360 no Rio de Janeiro), dividida em dois segmentos: "chefes de família" (como as pessoas supostamente mais motivadas a contratar seguros) e "outros respondentes" (pessoas de ambos os sexos, acima de 18 anos, que também constituiriam um mercado em potencial e que serviram de grupo de comparação e controle para os chefes de família).

Da interpretação conjunta dessas três pesquisas, resultou a formulação de um plano de metas e de dinamização do mercado que resumimos a seguir. A publicação do projeto, em sua íntegra, está sendo preparada pela Fenaseg.

2. METAS, POTENCIAL E AS PESQUISAS DE ESTRATÉGIAS

Tendo em vista a importante função econômica e social do ramo, o Governo federal se propôs, em 1970, incentivar os seguros no Brasil, com o intuito precípuo de elevar a participação global de seus prêmios a 3% do PIB até 1974. Várias medidas foram adotadas, tais como estímulos a fusões e incorporações para atingir economias de escala, bem como a criação de normas legais, técnicas e fiscais que visavam aumentar a flexibilidade operacional do ramo.

Todavia, a meta básica não foi atingida até 1974, o que nos levou a formular um novo plano de metas, que resumimos no quadro 1 e que destaca os seguintes pontos:


O alvo principal para os seguros em geral é atingir um volume correspondente a 3% do PIB até 1985.

Para efeito de projeção, imaginemos um crescimento retilíneo que parte da posição atual (de cerca de 1%) mas proporcionalmente maior do que o crescimento do PIB para que a meta dos 3% possa ser atingida na data prevista.

Em termos percentuais, a participação dos seguros gerais sobre o PIB seria então de 1,5% no ano de 1975, 2,2% em 1980 e finalmente de 3% em 1985 (ver item C. 1 no quadro 1).

Traduzido em cruzeiros (constantes de 1972), essa participação implicaria um volume de 5,3 bilhões em 1975, 9,8 bilhões em 1980 e 16,2 bilhões em 1985 (item B.4).

Admitimos também que o ramo vida mantivesse a mesma proporção em relação aos seguros em geral, ou seja, que cresça paralelamente com esse ao longo dos próximos 10 a 12 anos. Nesse caso, os seguros de vida individuais teriam que aumentar a sua participação sobre o PIB de cerca de 0,04% para 0,09% até 1985, enquanto que o aumento correspondente dos seguros de vida em grupo teria que ser de 0,22% a 0,45% e o conjunto dos dois tipos de seguro de vida teria que registrar um acréscimo proporcional de 0,27% a 0,54% entre 1972 e 1985.

Em resumo, o volume aproximado de prêmios nos anos selecionados (e a valores constantes de 1972) teria que crescer (em Cr$ bilhões) como segue:

Cabe salientar ainda que essas metas são bastante ambiciosas, em parte por se basearem em estimativas módicas do crescimento do PIB do país, em parte por contarem com aumentos consideráveis nas participações dos diversos tipos de seguros sobre o PIB.

Esse aspecto "otimista" transparece claramente nas últimas linhas do quadro 1, em que confrontamos as diversas metas analisadas. Em suma, esses dados demonstram que, para atingir as metas, o volume de prêmios de seguros teria que quintuplicar entre 1972 e 1985 (aos valores de 1972), contanto que o PIB, no mesmo período aumente em apenas 79% o seu volume real, o que hoje é uma visão bastante conservadora do crescimento geral da nação.

Difícil que seja atingir essas metas, elas não são de todo impossíveis graças ao potencial em descoberto claramente existente no Brasil.

O quadro 2 (cujos dados foram extraídos da pesquisa de campo) reflete esse potencial com maior precisão. Demonstra que para os níveis de renda familiar entre Cr$ 500,00 e Cr$ 3 000,00 mensais (em 1974), o mercado não atingido gira em torno da metade da população para "chefes de família", sendo bem superior ainda para os "outros respondentes". Ademais, mesmo entre as pessoas classificadas entre as "atingidas", há oportunidades de venda em aberto.


Outro aspecto importante desse quadro são as variações relativamente baixas entre as percentagens das pessoas não seguradas dos mercados atingidos nas diversas classes de renda. Isto sugere que a população tende a fechar um compromisso de seguro desde que devidamente motivada, não importa muito quão alto seja a sua renda, entre Cr$ 500,00 e Cr$ 15 000,00 mensais. Em outras palavras: a noção de que o brasileiro "resista" à idéia do seguro de vida não é confirmada pela pesquisa. O que falta então para divulgar e ampliar o uso do seguro são sobretudo produtos adequados para o público brasileiro, devidamente distribuídos entre as faixas de maior potencial. Finalmente, cabe salientar que a pesquisa de campo foi conduzida nas cidades certamente mais bem "trabalhadas" (Rio de Janeiro e São Paulo) em termos de ofertas de seguros. Sobretudo nas outras capitais - e certamente em um grande número de cidades médias e pequenas - o potencial relativo para seguros deverá ainda ser maior.

Em suma, por mais ambiciosas que sejam as metas delineadas, o potencial deve haver no Brasil para atingi-las. O problema é como conquistar esses mercados.

3. CARACTERÍSTICAS GERAIS DO MERCADO

Um dos objetivos da pesquisa de campo consistia em identificar os nichos mercadológicos com potencial descoberto e relacioná-los a outras modalidades de aplicações de recursos pessoais. Essa análise revelou, entre outros:

O mercado de seguros possui uma boa percentagem inexplorada, particularmente para "outros respondentes" (54% da amostra destes últimos pertencem ao mercado não atingido).

Em termos de potencial pode-se dizer que o mercado de seguros sugere boa expectativa pois a percentagem de não-segurados (pessoas que receberam propostas nos últimos 12 meses e não se seguraram) é muito pequena: 4% para "chefes de famílias" e 3% para "outros respondentes".

Em relação aos tipos de seguros, verifica-se que os seguros pessoais dominam o mercado em geral (aproximadamente 85% do mercado de segurados compõe-se de segurados pessoais).

Um confronto entre as faixas de mercado "mais exploradas" e as de "melhor potencial" revelaram a existência de segmentos substanciais ainda muito pouco explorados pelos seguros de pessoas em geral (ver quadro 3).


A maior parte da amostra é constituída de investidores, entretanto, a percentagem de não-investidores ainda é bastante grande, particularmente para "outros respondentes" (36% dos chefes de família e 45% de outros respondentes não fizeram investimentos nos últimos dois anos).

Os tipos mais comuns de investimentos são a aquisição de bens de consumo e os títulos de renda fixa, verificando-se também que a aquisição de bens de consumo é maior entre "outros respondentes" que entre "chefes de família".

Com relação aos seguros, verifica-se que a maioria dos respondentes que aplicam em seguros também o fazem em outras formas de investimentos, sendo baixa a percentagem dos que aplicam exclusivamente em seguros.

Um confronto entre maior ou menor proporção de investidores, por classes de características sociais e suas preferências por vários tipos de investimentos, permitiu qualificar alguns dos fatores determinantes que conduzem ao investimento ou não (ver quadro 4).


Quatro tipos de investimentos (títulos de renda fixa, de renda variável, seguros e imóveis) foram avaliados com relação a oito motivos de preocupação. Esses oito motivos referem-se a garantias futuras, tranquilidade, formação de patrimônio e proteção contra inflação. Os imóveis obtiveram o primeiro lugar nessa avaliação e os títulos de renda variável, o último, os títulos de renda fixa e os seguros obtiveram posições intermediárias, sendo que, em relação aos seguros, foram aplicadas as maiores variações de avaliação. Os imóveis e os títulos de renda fixa são, portanto, os maiores concorrentes dos seguros na opinião dos entrevistados. Surpreendentemente, o motivo menos relacionado aos quatro tipos de investimentos foi a proteção contra a inflação.

Há uma grande falta de informação sobre o seguro de vida; o conceito que obteve maior percentagem de concordância foi: "Deixa-se de contratar seguros por falta de informação." O grande número de respostas "não sei" sobre itens específicos de seguros confirma esse aspecto de falta de informações.

Outros conceitos que obtiveram adesão da maioria dos respondentes foram: "Corretores visam comissão e não clientes" e "É melhor contratar seguro em banco do que com corretores", o que demonstra uma imagem um pouco negativa dos corretores de seguros.

Por outro lado, o INPS e os montepios não são considerados fortes concorrentes dos seguros pelos entrevistados.

As fontes mais usuais de informações sobre seguro são pela ordem: os parentes, amigos e colegas; a propaganda e publicidade; e os corretores de seguros.

A fonte considerada de maior confiança é, de longe, os parentes, amigos e colegas, seguidos dos bancos e gerentes de bancos.

Quanto ao conhecimento dos diversos tipos de seguros, vemos que os seguros podem ser divididos em três tipos: os bastante conhecidos (seguros de vida, seguros de automóvel e seguros contra incêndio), os medianamente conhecidos (acidentes pessoais, contra roubos e obrigatório de automóvel) e os praticamente desconhecidos (todos os restantes).

Com relação à experiência dos entrevistados, os seguros também podem ser divididos em três tipos principais: os seguros bastante experimentados (seguros de vida, obrigatório de automóvel e de automóvel), os medianamente experimentados (acidentes pessoais, contra incêndio, assistência médico-hospitalar e misto - vida e contra acidentes pessoais) e os muito pouco experimentados (restantes).

Verifica-se também que a percentagem de entrevistados que nunca tiveram experiência com nenhum tipo de seguro é muito alta: 31% de "chefes de família" é 54% de "outros respondentes".

Os seguros possuídos atualmente pelos entrevistados podem ser divididos da mesma forma que os seguros experimentados; os mesmos seguros são enquadrados nos três tipos principais: A (bastante possuídos), B (medianamente possuídos) e C (muito pouco possuídos atualmente).

Os canais mais utilizados na contratação do último seguro foram os corretores e as companhias onde trabalham os segurados, com grande margem de diferença para os demais canais.

Quanto aos motivos mais alegados para a contratação dos seguros, foram, pela ordem: a iniciativa própria, a influência do vendedor e a influência do empregador.

Nota-se, com relação às diferentes classes sociais, que a classe média baixa é a que se utilizou menos dos bancos e mais das companhias onde trabalham, como canais de contratação. Nessa mesma classe (média baixa) é onde se verifica também maior influência do empregador.

As percentagens de entrevistados que receberam propostas nos últimos 12 meses anteriores à pesquisa são baixas: 20% de "chefes de família" e 10% de "outros respondentes".

Os tipos mais oferecidos foram o seguro de vida, o de automóvel, o de acidentes pessoais e o seguro contra incêndio. Os demais registram percentagens insignificantes de propostas.

Os locais onde as propostas de seguros ocorreram foram, na sua maioria, a residência ou o local de trabalho do entrevistado, e os agentes, na sua maioria, os corretores de seguros. Os bancos desempenham papel secundário, como local e agente de proposta de seguros.

Os fatores considerados de maior importância na escolha de uma companhia de seguros são, primeiro, a boa organização da companhia (ausência de burocracia, precisão de informações e solidez financeira) e, a segunda, a reputação de honestidade (pagamentos rápidos e não "enrolar" clientes).

Os fatores considerados menos importantes foram o preço e a propaganda.

78% dos "chefes de família" e 59% de "outros respondentes" lembraram-se espontaneamente de alguma companhia de seguro, mas a grande maioria das companhias (aproximadamente 60% das consideradas) é praticamente desconhecida dos entrevistados.

Há uma grande concentração da preferência dos entrevistados em torno, mais ou menos, de umas seis companhias, as quais obtiveram percentagens de preferência acima de 10% da amostra de entrevistados.

4. OS NICHOS DO MERCADO DE SEGUROS

Partindo das conclusões anteriormente resumidas e de outros dados das pesquisas, traçamos vários perfis, três dos quais (referentes aos "chefes de família") são aqui reproduzidos.

Para cada um dos perfis, classificamos os "consumidores" (de investimentos e/ou seguros) em seis categorias. O tamanho dessas classes é uma função da amplitude na variação das percentagens encontradas para cada uma das características pesquisadas. Essas características são, por exemplo: o fato de residir no Rio de Janeiro, o fato de pertencer à classe média alta, etc. No caso, por exemplo, do gráfico 2, entraram 35 características na análise, com uma amplitude de variação das percentagens de 90% a 25%. Ao dividirmos a diferença entre essas percentagens (de 65%) pelo número de classes (6), obtivemos o tamanho das classes (no caso, aproximadamente 11).


Convém ressaltar que em todos os gráficos, as características são consideradas isoladamente, sem relação umas com as outras. Como exemplo, no mesmo gráfico citado, na classe de percentagens que vai de 36% a 47%, encontram-se duas características, indicando que, nesse intervalo, encontra-se a percentagem de segurados do sexo feminino e a percentagem de segurados que possuem renda familiar de Cr$ 501,00 a Cr$ 1 000,00, de ambos os sexos (e não somente do sexo feminino).

Denota-se logo que o formato dos três gráficos se assemelha a uma curva normal de distribuição com grande concentração de características nas classes intermediárias, diminuindo o número de características, à medida que nos aproximamos das classes situadas nos extremos da curva.

No extremo superior da curva (em que se encontram as percentagens mais elevadas), figura o mercado típico de seguros, isto é, as características dos consumidores que apresentaram as mais altas percentagens de segurados; no extremo inferior encontra-se o mercado menos atingido pelos seguros, isto é, aquelas características dos consumidores que revelaram as menores percentagens de segurados.

Ao confrontarmos os perfis, destacamos dois aspectos de particular importância para a formulação da estratégia posterior a essa análise: um é a comparação entre os perfis dos investidores e segurados, o outro é a determinação dos nichos de mercado em aberto.

4.1 Confronto entre investidores e segurados

Para efeito dessa análise, convém lembrar que a pesquisa de campo mostrou claramente que:

a) a maioria das pessoas que compram seguros aplicam também em outras modalidades de investimento;

b) os compradores de seguros tendem a aplicar em três ou mais outras modalidades de investimento, antes de fechar um contrato de seguro.

A contraposição dos perfis dos investidores e dos segurados não só confirma essas duas observações mas também as qualifica melhor. De uma maneira geral, as percentagens dos segurados (principalmente dos segurados pessoais) são sempre um pouco menos elevadas do que as percentagens dos investidores.

Como exemplo, os profissionais liberais/técnicos estão situados na classe mais alta de percentagem, tanto para segurados, como para investidores; entretanto, como a classe mais elevada de segurados vai de 30% a 91% (seguros gerais) e de 76% a 87% (seguros pessoais), enquanto que a classe mais elevada de investidores vai de 90% a 100%.

Por outro lado, as características situadas nas classes mais elevadas de percentagens são as mesmas, tanto para investidores quanto para segurados. Por exemplo, os indivíduos com nível universitário, ocupação de profissionais liberais/técnicos, pertencentes à classe alta e com renda de Cr$ 5 000,00 para cima, estão situados nas duas classes mais elevadas de investidores (de 80% a 100%). Como essas mesmas características encontram-se também nas duas classes mais elevadas de segurados, fica patente que os indivíduos com as mesmas características são os investidores em geral e os consumidores de seguros.

Do exposto conclui-se que, além das características mais "óbvias" de potencialidade (como grau de instrução e nível de renda), a intensidade do desejo de poupar e o hábito de investir constituem pré-requisitos fundamentais para uma venda mais fácil de uma apólice de seguros. Em outras palavras: os segmentos de mercado mais facilmente atingíveis para os seguros no Brasil são aqueles que se compõem de pessoas que já têm o hábito de investir.

Ademais, duas características adicionais devem ser ressaltadas quanto a esses mercados. A primeira é que esses segmentos são os mais visados pelos vendedores de seguros e os mais bem cobertos em termos do seu potencial. Por conseguinte, para a oferta existente, essas faixas não oferecem um potencial a descoberto muito elevado, mas essa conclusão não se aplica, necessariamente, às novas modalidades de oferta, sobretudo àquelas que conjuguem o seguro com aquilo que os compradores em potencial preferem: o investimento em outras modalidades.

A outra característica refere-se à defasagem entre a compra de uma apólice e de uma outra modalidade de investimento. Aparentemente, mesmo nas classes que costumam contratar seguros, estes ocupam uma posição bem inferior, na sua escala de prioridades, à de imóveis e títulos de renda fixa.

É lícito, portanto, concluir-se que, para que os seguros sejam adquiridos com maior grau de confiança e rapidez, e em volumes maiores, a sua imagem deve ser fortalecida.

4.2 Os nichos de mercado inexplorados

O simples fato de existirem mais investidores que segurados no Brasil sugere a existência de nichos mercadológicos ou de faixas de mercado, apenas precariamente cobertos pelas empresas apesar de oferecerem um bom potencial.

O confronto entre os perfis permite a determinação de pelo menos alguns desses nichos inexplorados. O quadro 5 revela isso com clareza.


Esse quadro demonstra, primeiro, que há uma grande conformidade entre as percentagens de investidores e de segurados (seguros em geral) para a maioria das características consideradas. As diferenças entre as percentagens são muito pequenas, geralmente variando de 0% a 2% apenas. De uma maneira geral, isso vem demonstrar claramente a coincidência entre os dois perfis.

Com relação aos seguros pessoais, as diferenças já são bem mais acentuadas. Segundo foram assinaladas na tabela, as diferenças que pareceram mais significativas entre investidores e segurados, a fim de destacar as características que parecem revelar os nichos mercadológicos mais significativos para os investigadores.

Sobretudo para os seguros pessoais, essas características principais são: pessoas que não têm filhos, os proprietários, donos ou gerentes de pequenas ou médias empresas, os profissionais liberais/técnicos, os solteiros, pessoas do sexo feminino, as viúvas e as donas-de-casa.

Embora as características não tenham sido consideradas conjuntamente na pesquisa, podemos inferir que algumas delas estão inter-relacionadas, no sentido de que devem ser as mesmas pessoas que as possuem. Por exemplo, deve haver uma coincidência de respondentes entre as respondentes do sexo feminino, as viúvas e as donas-de-casa.

Ao confrontarmos esses dados em sua totalidade, podemos destacar os seguintes nichos mais expressivos para os seguros de pessoas:

a) Os proprietários de pequenas e médias empresas, seus operários mais especializados e funcionários aposentados com mais de 45 anos.

b) Os solteiros e não possuidores de filhos, bem como as viúvas, as donas-de-casa e as mulheres em geral.

c) Os profissionais liberais e os técnicos de renda disponível média.

d) As pessoas que têm um nível de instrução acima do curso primário, entre 35 e 44 anos de idade, e as também acima de 45 anos.

e) As pessoas (casadas ou não) com um nível de renda mensal (em meados de 1974) entre Cr$ 2 000,00 a Cr$ 5000,00 e, em proporção menor, acima de Cr$ 5 000,00.

Ademais, vale destacar que, praticamente, todas as pessoas que têm renda suficiente para investir e que criaram o hábito de poupar e/ou de comprar bens duráveis a prazo, oferecem oportunidades para a colocação de seguros. Por exemplo, da classe média baixa e alta, somente 44%, respectivamente, 51% dispõem de um seguro pessoal, em confronto com 68% das pessoas da classe alta.

A partir destas considerações, formulamos a estratégia a seguir.

5. UMA ESTRATÉGIA PARA SEGUROS DE PESSOAS NO BRASIL

Ao encararmos o mercado brasileiro de seguros pessoais de uma distância suficientemente grande, para enfeixar o seu conjunto, mas sem perder de vista os seus diversos nichos mercadológicos inadequadamente cobertos, destacam-se dois segmentos nitidamente distintos, ambos suficientemente amplos e com excelente potencial para justificar a criação e implementação de duas estratégias, cada uma dirigida a uma das duas faixas através de um instrumentário próprio, subordinado a uma política geral voltada aos objetivos e as metas de dinamização desse mercado.

Um desses dois segmentos se situa no topo das curvas dos perfis antes delineados com uma concentração entre as pessoas de nível de instrução colegial ou superior, pertencentes às classes mais altas, com uma renda familiar de Cr$ 5 000,00 para cima (em meados de 1974), que exercem profissões diversas e que já criaram o hábito de poupar a médio e longo prazo, mas que não necessariamente são portadores de apólices de seguros pessoais, não porque lhes faltassem recursos para a sua aquisição nem porque tivessem uma atitude negativa ou cética com respeito à contratação de seguros, mas primordialmente porque ainda não lhes foi ofertado o produto adequado aos seus padrões e desejos pessoais.

A essência dessa primeira modalidade da estratégia deveria, portanto, concentrar-se na inovação da linha de produtos, diretamente competitivos quanto às outras modalidades de aplicação de poupança favorecidas pelo investidor brasileiro, mas sem perder de vista a necessidade de comunicação da existência e das propriedades reais dessa oferta, após ter sido criada, através da venda pessoal e/ou institucional e com o apoio de propaganda e promoção.

Face as suas características de inovação e de diferenciação de linha de produtos, chamamos essa estratégia de "diversificação de produtos".

A outra modalidade estratégica denominamos "penetração" pois ela deve se concentrar na divulgação ordenada daqueles instrumentos de seguros pessoais que se adequaram, em termos de necessidades de cobertura e poder aquisitivo, e o vasto campo de não-segurados no Brasil, cujo hábito de poupar é apenas precariamente desenvolvido, nos que não se negariam a aplicar uma parcela de seus recursos pessoais em apólices "atraentes" aos seus gostos e ao seu "bolso".

A existência de um amplo mercado inexplorado, que permitiria e justificaria um esforço intenso de divulgação do seguro pessoal no Brasil, ficou consubstanciada através da pesquisa de campo.

Dada a sua natureza de ativação de poupança popular, a estratégia de "penetração" viria também ao encontro "das novas necessidades econômicas e sociais do Brasil... (como) o caminho natural da expansão e grandeza dos negócios do Brasil".1 1 Seguro-marketing ou nada. Estudo especial da revista Conjuntura Econômica, out. 1973.

Em suma, ficou demonstrado que a grande maioria do mercado inexplorado para os seguros pessoais concentra-se na faixa dos não-investidores e dos investidores unimodais, cujo conjunto forma cerca de 60% do mercado total coberto pela pesquisa.

Todavia, é preciso evitar que se criem expectativas exageradas quanto às possibilidades de exploração a curto prazo desse mercado em massa. Além das limitações naturais do baixo poder aquisitivo da maioria das classes sociais, bem como da "concorrência" do INPS e dos montepios, o maior obstáculo é a falta de criação de hábitos de poupança desse segmento. Portanto, recomendamos sejam adotadas as seguintes diretrizes gerais para a estratégia de "penetração":

Ela deve ser dirigida primordialmente às faixas de mercado que figuram nos extremos mais baixos da curva de perfil e que apresentam as seguintes características: pessoas com renda familiar (base: meados de 1974) abaixo de Cr$ 5 000,00, com instrução ginasial ou até primária ou menos, abrangendo não só os chefes de família, como também as donas-de-casa, viúvas, aposentados, pessoas com idade acima de 45 anos e pessoas que exercem profissões menos especializadas.

As suas linhas de produtos devem ser adequadas às expectativas e ao poder de compra dessas faixas, mas não precisam necessariamente ser integralmente novas em relação ao mercado em geral. De certa maneira - e dentro dos limites impostos pelo próprio segmento - os produtos deveriam ser "derivados" do mercado mais sofisticado de "diversificação" para que se atinjam os benefícios de transferência de imagem de um para o outro segmento.

Convém que a estratégia siga um planejamento por etapas, cada uma com metas específicas de penetração em faixas predeterminadas do segmento total, face à complexidade e amplitude desse mercado. Inicialmente, talvez conviria concentrar-se nos seguros em grupo dirigidos a quaisquer "conglomerações" humanas de potencial atraente, sejam elas "fechadas" (como empresas, associações ou clubes) ou "abertas" (clientes de bancos ou grupos informais de pessoas que não têm contato direto entre si mas que o seguro "une" em termos de interesse).

A ênfase do composto mercadológico deve ser colocada na venda pessoal ou o contato direto entre o "portador da mensagem" e o cliente em potencial (o indivíduo ou o representante do grupo), face à importância da comunicação pessoal como meio quase que obrigatório para o fechamento de contratos junto a pessoas pouco familiarizadas com os seguros.

A comunicação em massa (propaganda e promoção) deve ser, prioritariamente, de ordem institucional (comandada por órgãos que inspirem confiança ao comprador em potencial) em sustentação à venda pessoal (ou seja, não como meio exclusivo de comunicação).

Dada a sua amplitude de propósitos e face as suas finalidades eminentemente sociais, os órgãos promotores da estratégia de penetração deverão procurar o apoio técnico, legal e institucional de órgãos do Governo.

A partir dessas considerações gerais esboçaremos, a seguir, as duas modalidades estratégicas, adotando o seguinte esquema básico de análise e ação mercadológica:

Para ambas as estratégias apontadas, será desenvolvido um composto diferente dos elementos de apresentação do produto, de distribuição e de comunicação com o mercado.

Essa estrutura obedece a padrões de análise mercadológica descritos em trabalhos anteriores.2 2 Richers, R. Um conceito funcional de integração mercadológica. In: Richers, R. coord. Ensaios de administração mercadológica. 2. tir. Rio de Janeiro. Fundação Getúlio Vargas, 1974. p. 29-50. Em essência ela opera com os seguintes elementos:

O subcomposto de apresentação envolve os tipos de produto que melhor se adaptam ao mercado em questão, seu preço, sua apresentação física, e preocupa-se também com o aspecto de satisfação pós-compra do consumidor em relação aos referidos produtos.

O subcomposto de distribuição analisa as vias de distribuição mais adequadas a cada uma das estratégias (utilização dos bancos, dos corretores, do local de trabalho, etc), enquanto que o subcomposto de comunicação preocupa-se com as formas mais convenientes de abordagem do consumidor e de promoção dos seguros junto ao mercado (envolve os aspectos da venda pessoal, da propaganda e da promoção de vendas).

Ambas as estratégias deveriam adotar todos os elementos dos três subcompostos, mas tanto a dosagem de cada um de seus meios, como a aplicação seqüencial no tempo devem diferir para cada um deles, conforme as recomendações esboçadas a seguir.

5.1 O subcomposto de apresentação

Vimos que as modalidades e oportunidades de inovação de produtos são quase ilimitadas para o Brasil. Todavia, nem todos os produtos existentes no mercado mundial se adaptariam igualmente bem ao nosso mercado. Por exemplo, a conjugação da apólice de seguros com títulos de renda variável é altamente desaconselhável no Brasil, face à depressão que atualmente caracteriza o mercado de ações.

No entanto, determinadas formas do package deal - ou da associação do seguro com outras formas de poupança popular - são altamente recomendáveis, sobretudo para lançamentos de produtos destinados ao segmento de "diversificação".

A) Tipo de produtos

1. Estratégia de diversificação

Já focalizamos a importância da inovação das ofertas para a estratégia de diversificação. Entre essas inovações, todas aquelas parecem ser prometedoras que se associam às formas prioritárias da aplicação pessoal de poupança no Brasil de hoje, entre as quais destacaremos:

1.1 A associação com títulos de renda fixa

Foi constatado que os títulos de renda fixa concorrem diretamente com os seguros, obtendo médias mais altas, em campos quase que específicos de seguros (por exemplo, na garantia de uma renda quando alguém deixa de trabalhar e - na garantia dos estudos dos filhos). Ao que parece, muitos investidores em letras de rendimento fixo estão, acima de tudo, à procura de tranqüilidade e segurança quanto à sua aplicação, motivos esses que se associam perfeitamente aos objetivos do seguro de vida.

Todavia, além dos problemas de ordem legal, burocrática e institucional, que inevitavelmente surgirão em quaisquer tentativas de "casamentos" a posteriori com instrumentos financeiros, já existentes no mercado (tais como as letras de câmbio, ORTNs, letras imobiliárias, etc), há razoes que justificam a criação de novas modalidades de captação de recursos populares associados a um ou vários instrumentos de seguros pessoais. Entre essas razoes figuram:

a escassez de títulos voltados à captação de recursos a médio e longo prazo, destinados ao financiamento do capital de giro e, particularmente, da capitalização através da emissão de obrigação e/ou debêntures, de valor reajustável e/ou corrigidas pela correção monetária, possivelmente vinculados a garantias hipotecárias ou outras, além de protegidos e promovidos pelos poderes públicos através de nomes de controle, algumas garantias e benefícios fiscais como a deduzibilidade de rendimentos e/ou parcelas do principal do imposto de renda;

a importância da criação desses tipos de títulos, dentro da economia brasileira, para ampliar as frentes de acumulação de capital a longo prazo e para reduzir as pressões da balança (externa) de capitais;

a concordância entre os objetivos econômicos de médio e longo prazo desses tipos de títulos e os fins sociais, igualmente de maior duração, dos seguros pessoais; e

o interesse em potencial do Governo federal em promover e sustentar esses tipos de iniciativa.

O que recomendamos, em suma, é a criação de uma comissão de peritos, inspirada pela própria Fenaseg, que se incumbiria de elaborar um estudo de viabilidade e conveniência de lançamentos de títulos de renda fixa, vinculados a uma ou várias modalidades de seguros pessoais.

1.2 Seguro de saúde como suplemento do seguro de vida

Através da inclusão de cláusulas referentes à assistência médica ou hospitalar em contratos de seguros de vida, esse tipo de produto visaria as faixas de maior renda, insatisfeitas com o INPS e com os programas de assistência médica fornecidos pelas empresas.

Esta recomendação se baseia no êxito da experiência com esse produto nos países desenvolvidos. Além disso, parece haver uma opinião favorável a esse tipo de produto entre os consumidores brasileiros, se nos basearmos nas conclusões da pesquisa formal, na qual verificamos que um dos motivos mais associados ao seguro de vida foi o motivo n.º 3 ("Garantir a mim e a minha família contra doenças, acidentes, etc").

Esse produto viria portanto corresponder a uma expectativa dos consumidores brasileiros.

1.3 Aposentadoria

Os planos privados de aposentadoria complementariam o sistema de seguro administrado pelo INPS, oferecendo opções adicionais aos consumidores de nível socioeconômico mais elevado que são justamente os visados pela estratégia de diversificação. Esses consumidores são os que necessitariam de uma complementação aos planos do INPS, a fim de manterem o mesmo padrão de vida e de consumo após sua aposentadoria.

1.4 Modalidade de seguros com proteção inflacionária

Apesar do consumidor brasileiro não ter uma noção clara entre as várias formas de investimento pessoal e as suas vantagens e limitações relativas quanto à proteção contra os efeitos da inflação, verificamos que há, entre os mutuários, uma real preocupação de serem vítimas do processo de desvalorização ao contratarem um seguro de vida: 42% dos chefes de família acreditam na frase "recebe-se indenização de seguro em dinheiro desvalorizado".

Face a essa problemática, recomenda-se a análise minuciosa de pelo menos duas modalidades de ajuste e compensação dos instrumentos de seguro. A primeira é a apólice vinculada ao mecanismo de correção monetária, que foi lançada por poucas empresas até o momento, mas ainda não parece ter gerado resultados satisfatórios. É preciso investigar os porquês destas falhas e tentar corrigi-las a curto prazo, porque, individualmente, a corrosão inflacionária torna-se um inimigo tão mais sério à dinamização do seguro, quanto mais a população se conscientiza de seus efeitos.

A segunda modalidade é a participação direta dos mutuários nos rendimentos das aplicações de capitalização das empresas de seguros, seja em termos de dividendos, bonificações, participações nos lucros ou outras formas: também a análise dessa modalidade mereceria um estudo técnico detalhado por parte da Fenaseg.

Finalmente, cabe destacar: - há outras oportunidades de inovações da "linha de produtos" dos seguros de vida no Brasil que podem contar com uma boa receptividade por parte do consumidor (tais como os associados com a educação), a partir, talvez, das considerações sobre a oferta de seguros que hoje predomina no exterior. No entanto, a esta altura, não é tanto a variedade de oferta que contribuirá à ampliação do mercado, mas o esforço conjugado das empresas e dos órgãos de classe para investigar as vantagens de limitações dos produtos que parecem ser os mais prometedores em termos do nosso mercado, e depois agir em conjunto para mercadizar as inovações escolhidas em primeira linha.

2. Estratégia de penetração

Embora, para essa estratégia não seja essencial a introdução de produtos novos através de uma diversificação substancial da oferta, podemos considerar alguns tipos de produtos como sendo adequados a esse mercado.

2.1 Seguros em grupo

A médio prazo, os seguros em grupo constituem o tipo mais apropriado à expansão maciça dos seguros, já que permitem atingir um número muito maior de pessoas, a um preço mais acessível, frente a um amplo mercado ainda descoberto e em contínua expansão.

2.2 O seguro de vida "industrial"

Por suas características é um tipo de produto bem sucedido em outros países e que se adequaria muito bem ao mercado de poder aquisitivo mais baixo (particularmente os operários). Também a introdução dessa modalidade mereceria um estudo institucional próprio.

2.3 Seguro de saúde

Poderia ser enfatizado, através de novas cláusulas associadas aos seguros de vida em grupo referentes à assistência médico-hospitalar, despesas de laboratório, etc. Esse seguro poderá ter muito êxito também nessa estratégia, tendo em vista a insatisfação generalizada de todas as classes sociais com relação ao INPS.

Todavia, por mais atraentes que sejam essas e outras modalidades de inovação de produtos para o "grande mercado", reenfatizamos que o sucesso da estratégia de penetração dependerá menos dessas inovações do que da maneira como a gama disponível de produtos é oferecida ao mercado - primordialmente em termos de venda pessoal.

B) Os preços

A pesquisa formal revelou que o preço não constitui, de maneira geral, um impecilho sério para a contratação dos seguros, nem constitui um fator preponderante na escolha de uma companhia de seguros.

Como na aquisição de bens de consumo, as "parcelas mensais" exercem uma maior influência sobre a decisão de comprar do que o preço global. Esse, portanto, pode ser determinado de maneira a permitir margens bastante satisfatórias para as empresas, sobretudo para os produtos que se destinam às classes de maior poder aquisitivo.

À medida, contudo, que o mutuário se conscientiza da relação entre os pagamentos que efetua e o valor presente do sinistro futuro não reajustado em termos inflacionários, ele tenderá a perder o interesse pelo seguro, o que, claramente, não vem ao encontro dos objetivos da dinamização.

C) A satisfação de pós-compra

Intimamente ligado ao ponto anterior está a satisfação de pós-compra do segurado, particularmente, tendo-se em vista a importância da comunicação "de boca em boca" para a divulgação dos seguros no Brasil. Fundamental, portanto, é que as empresas individuais concentrem muito de sua atenção aos departamentos de sinistros.

Paulo Gavião Gonzaga ressalta esse aspecto: "O pagamento da indenização é a fase mais importante da operação de seguros, é a razão mesmo da existência do produto."3 3 Estudo sobre seguros no Brasil. 1973. p. 41, mimeogr. O autor também chama a atenção para a situação psicológica do segurado após a ocorrência do sinistro. Sendo freqüentemente uma pessoa traumatizada, qualquer decepção adicional poderá ser fundamental para a formação e difusão de uma imagem negativa da companhia de seguro (e do próprio produto seguro), cuja imagem de reputação e honestidade é, como vimos, crucial para a confiança do segurado.

Provavelmente, tendo em vista essas considerações, algumas companhias de seguros colocam ênfase na carteira de automóvel, apesar de ser pouco rentável em si mesma. O bom tratamento dado ao sinistro atrai os clientes e os convence a comprar outros tipos de produto, mais lucrativos para a empresa.

D) Apresentação do produto

Um dos pontos importantes da comunicação entre os produtores e seus clientes é a simplificação da apresentação das apólices, pois a pesquisa formal revelou que o conceito "apólices enroladas oferecem pretexto para companhias não pagarem" obteve alta percentagem de adesão (45%).

Portanto, a necessidade de simplificação das apólices impõe-se não só como condição de compreensão e divulgação dos seguros, mas também da eliminação de uma imagem negativa das companhias.

Este ponto, por sinal, já foi levantado por Gavião Gonzaga que sugere o desenvolvimento das apólices em livretes ilustrados, atraentes e em linguagem simples e direta, em lugar das formas tradicionais de apólices, com letras minúsculas no verso.4 4 Op. cit. p. 40.

5.2 O subcomposto de distribuição

O distanciamento da seguradora, em relação ao seu mercado devido ao bloqueio dos canais de comercialização, ressalta a presença obrigatória do corretor registrado como um dos fatores mais importantes desse distanciamento.

A pesquisa de campo confirmou esse distanciamento constatados que 80% dos chefes de família e 90% de "outros respondentes" não haviam recebido nenhuma proposta de seguro nos últimos 12 meses.

Juntamente com o problema da falta de comunicação - que será comentado mais adiante - o problema da distribuição inadequada é legalmente responsável pelo baixo índice de divulgação dos seguros no Brasil.

Um dos aspectos mais sérios nesse sentido é a imagem negativa do corretor, que foi revelada tanto pelos consumidores quanto pelos ofertantes de seguros.

Quanto aos consumidores, a queixa refere-se principalmente ao fato de os corretores visarem mais a comissão do que o interesse dos clientes, verificando-se que 3/4 dos respondentes, aproximadamente, concordaram com essa afirmativa. Esse aspecto de não-preocupação com o interesse dos clientes deve ser particularmente negativo na distribuição de um produto como o seguro, o qual, estando vinculado ao próprio instinto de conservação do homem tem como preocupação fundamental a defesa e a segurança de vidas e bens contra os infortúnios.

No entanto, "culpar" os corretores por exclusão pela falta ou inadequação das comunicações com o cliente, seria não só injusto, mas sobretudo temerário. O que será preciso, mais do que a crítica, é a revisão e reformulação de todo o sistema de distribuição por parte das próprias empresas.

É com esse intuito em vista que devem ser entendidos os seguintes comentários:

A) Estratégia de diversificação

1. Os bancos

Para esta estratégia, a melhor via indireta de acesso ao mercado é a instituição bancária com todas as suas vantagens intrínsecas de transmitirem confiança por serem instituições "respeitadas" e controladas, de poderem contar com uma clientela cativa e de permitirem a distribuição e comunicação a custos fixos, praticamente nulos.

A pesquisa de campo demonstrou que, embora os bancos possuam uma imagem bastante positiva na opinião dos entrevistados, são muito pouco utilizados como canal de contratação demonstrando que essa via ainda pode ser muito explorada. Aliás, a experiência das companhias que têm se utilizado dessa via, tem se revelado bastante positiva.

As duas principais limitações do banco, como distribuidor "ideal", são o fato de nem todas as empresas de seguros terem acesso a esta via e o baixo índice de visitas aos bancos por parte dos consumidores em potencial mais humildes, pois são quase que somente os membros das classes mais abastadas que se utilizam dos bancos para a contratação de seguros.

2. Os corretores

Embora a ênfase da estratégia de diversificação esteja na distribuição bancária, a atuação dos corretores não deve ser menosprezada. Os pontos principais de atuação dos corretores devem ser o local de trabalho dos clientes, pois, conforme vimos, o potencial para os segmentos mais altos do mercado se concentra, em grande parte nos profissionais liberais ou técnicos, facilmente localizáveis em suas respectivas empresas.

3. Mala direta

Um meio aparentemente pouco utilizado no Brasil no setor de seguros é a mala direta. No caso, ela se presta mais para a comunicação com os clientes em potencial e efetivos das classes de maior poder aquisitivo, visando os seguintes quatro objetivos: primeiro, a captação da curiosidade e talvez do próprio cliente; segundo, para o envio de informações de propostas concretas e/ou para preparar a visita de um representante (corretor ou vendedor da empresa); terceiro, para promover a imagem da empresa e de seus produtos; e, quarto, para comunicar dados e informações sobre "outras" atividades ou ofertas da companhia ou do grupo.

B) Estratégia de penetração

Claramente, a maneira mais adequada para atingir os mercados em massa é o uso intenso da venda pessoal, seja ela constituída de corretores autônomos ou de representantes de própria seguradora. A via, portanto, é eminentemente direta e será tratada a seguir.

5.3 O subcomposto de comunicação

O principal problema demonstrado pela pesquisa formal é a ausência de informações e conhecimentos sobre seguros por parte do público, o que justifica uma grande ênfase na comunicação da empresa com o seu mercado, não importa a estratégia adotada (75% dos respondentes concordaram com a afirmativa: "deixa-se de contratar seguros por falta de informações").

Além disso, ficou demonstrado também, que os seguros e as companhias que os oferecem possuem uma imagem em parte negativa diante de uma grande parcela de respondentes, o que também reflete um problema de comunicação.

Em sua essência, esse problema apresenta as seguintes três facetas:

não há conhecimento nem informações adequadas sobre seguros;

não há boa confiabilidade no produto e nas empresas de seguros;

não há exploração suficiente do mercado. (Problema que já foi comentado e que se refere à distribuição do produto.)

A partir dessa situação, são dois os pontos cruciais que devem ser "atacados" pela comunicação, pela ordem:

1. O que é seguro e como adquiri-lo? Criação de um conhecimento básico sobre seguros.

2. Como apoiar a expansão do mercado? Formação e manutenção de uma imagem de confiabilidade a respeito dos produtos.

Ao abordar esses problemas partimos do pressuposto de que o seguro é um bem tangível, que visa a uma imagem de garantia de proteção futura. Portanto, na sua compra devem predominar considerações do tipo racional e consciente,5 5 Seguro- marketing ou nada. op. cit. sem desprezar os aspectos instintivos e emotivos. Dessa forma, os apelos para a comunicação devem ser simples, diretos e objetivos, atentando para valores como a garantia, segurança, a racionalidade da decisão, mas também a tranqüilidade e a proteção da família.

De certa forma voltamos à idéia central desse trabalho: o seguro requer um sacrifício momentâneo em benefício de uma renda futura maior, o que implica que o indivíduo só fará seguro de vida se estiver convencido de que o adiamento do consumo, lhe trará benefícios. Esses benefícios deverão ser enfatizados pela comunicação. Da mesma forma, o problema da confiabilidade entra, aqui, de modo fundamental: como poderão se decidir por esse "sacrifício" momentâneo de sua renda se 42% dos entrevistados acham que a indenização do seguro é recebida em dinheiro desvalorizado e 45% acreditam que apólices "enroladas" oferecem pretexto para companhias não pagarem?

A insegurança que esses dados acusam, reflete-se também na ênfase que o consumidor médio dá a fatores como a "boa organização" e a "honestidade" da empresa com que lida, bem como de sua dependência da opinião de parentes e amigos e finalmente da sua desconfiança com respeito às mensagens divulgadas pelos meios de propaganda.

Uma das lições que podemos derivar destas considerações é a necessidade de um timing adequado da comunicação. Por exemplo, tentar estimular a demanda de seguros, através de campanhas publicitárias de ordem institucional, sem o devido preparo anterior da população através do contato direto para com os líderes de opinião, resultaria num desperdício de recursos. Em outras palavras: a abertura dos mercados é fundamentalmente uma tarefa da venda pessoal que deve ser sustentada pela comunicação impessoal (propaganda e promoção de vendas) na medida em que informa o consumidor, o "educa", em termos da oferta existente de seguros e de suas vantagens, e conquista a sua confiança.

Esta regra se aplica indistintamente a ambas as estratégias, mas ela é mais importante para as estratégias de penetração, ou seja para a abertura e ampliação daquelas faixas do mercado que menos "sabem" a respeito dos seguros à sua disposição. Portanto, comentá-la-emos em primeiro lugar.

A) Estratégia de penetração

1. A venda pessoal

Vimos que o núcleo da preocupação da política de penetração de seguros deve ser a venda pessoal, como instrumento de contato, divulgação, coleta de informações e certamente de fechamento de contratos particularmente junto aos segmentos abertos de poder aquisitivo médio da população brasileira.

Na realidade, pouco importa se esse trabalho de campo é conduzido primordialmente por corretores ou vendedores das próprias seguradoras. A ênfase entre as duas modalidades é uma questão de diretriz interna das empresas individuais. Contudo, o que elas não devem fazer é "delegar" funções de venda pessoal, integralmente, a terceiros. No mínimo, a formulação das diretrizes de vendas e a sua supervisão deviam ser da alçada das próprias empresas. Por exemplo, perguntas como: a quem se dirigir primordialmente? Com que tipos de ofertas (produtos)? Através de que argumentos básicos? Visando que metas de vendas cabem ser formuladas e respondidas pelas seguradoras? Sua implementação pode ser delegada a corretores, setores de vendas próprios, agências bancárias ou outros órgãos executivos de vendas.

Ao formular ou reformular seus planos de venda, certas áreas tendem a merecer um destaque especial. Entre eles mencionamos e comentamos sumariamente:

O treinamento em dois níveis: primeiro, o institucional, que deve ser promovido por órgãos de classe já existentes (como a Fenaseg, o IRB, a Susep, etc.) ou uma entidade nova (a ser criada) exclusivamente dedicada a esse intuito; segundo, o "interno", da alçada direta das empresas e/ou de suas corretoras. No primeiro devem ser destacados programas que visam a melhor compreensão técnica dos seguros em si e o segundo deve enfatizar aspectos de motivação, argumentação de vendas, abordagem de clientes, roteiros de visitas, etc.

A sistemática de remuneração deveria ser reavaliada e reestruturada com o intuito de reduzir a ênfase na compensação direta do sucesso (comissões e prêmios por fechamentos) e de valorizar mais as atitudes que geram e mantêm uma clientela leal a longo prazo.

O controle das forças de venda com meio de "sentir" o pulso do mercado a qualquer momento e de reavaliar, e possivelmente reformular a política de vendas.

2. Propaganda e promoção de vendas

Esses dois instrumentos devem ser usados pelas seguradoras com dois objetivos em mente: preencher lacunas de informação e sustentar a venda pessoal. Não deve se esperar deles que sirvam de substituto à venda pessoal num ramo onde a comunicação verbal é decisiva para a abertura de um mercado.

Isso significa primordialmente:

A seleção da mídia e a sua veiculação deve "acompanhar" os roteiros de venda pessoal.

As mensagens devem realçar os argumentos que sustentam a confiabilidade do instrumento (a apólice) e de quem o emitiu (a seguradora).

Na medida do possível, as mensagens devem ser dirigidas aos líderes da opinião dos grupos visados (como o empregador no seguro em grupo ou a "autoridade" - médico, professor, prefeito, etc. - nas comunidades menores).

B) A estratégia de diversificação

As considerações básicas, anteriormente resumidas, aplicam-se também à estratégia de diversificação, mas a dosagem do composto de comunicação deve ser outra, primordialmente nos seguintes sentidos:

O vendedor e corretor deve ter um grau de preparo técnico mais avançado, sobretudo a partir do momento que as apólices "vinculadas" (a outros meios de poupança) são lançadas no mercado.

Possivelmente, o recrutamento dos representantes desses instrumentos novos pode partir dos corretores que já têm conhecimento e experiência com títulos do mercado financeiro.

Mais ainda do que no caso da estratégia de penetração, o controle de venda pessoal cabe primordialmente às próprias seguradoras.

A comunicação impessoal deve ser eminentemente informativa, enfatizando as reais vantagens dos novos tipos de contratos em termos de aspectos como: rentabilidade, negociabilidade (se for o caso), liquidez, segurança e proteção, vantagens fiscais, endosso governamental, etc.

Uma vez criados os instrumentos e definidas todas as suas dimensões (legais, fiscais, técnicas, etc), convém seja lançada uma campanha institucional de informação e divulgação dirigida às classes altas e médias altas naqueles locais (sobretudo núcleos urbanos), onde há retaguarda imediata de venda pessoal, devidamente treinada e preparada.

A rede bancária e os corretores de títulos parecem ser os órgãos predestinados para, em conjunto com os corretores de seguros tradicionais, encarregar-se da distribuição dos títulos novos.

Para as seguradoras que têm acesso a uma rede bancária, recomenda-se a elaboração de programas de vendas que envolvem o gerente das filiais, até uma equipe de corretores próprios que operam em cidades pré-selecionadas diretamente junto à população de maior poder aquisitivo.

6. CONCLUSÕES: IMPLICAÇÕES PARA AS EMPRESAS, INDIVIDUALMENTE

Em se tratando de um projeto de ordem institucional, o presente artigo focalizou aspectos antes gerais do que específicos do mercado brasileiro de seguros de vida. Convém, portanto, perguntar: Quais são as principais implicações do estudo, aplicáveis à estratégia de marketing de uma determinada seguradora?

Primeiro, vale resumir algumas das conclusões do estudo, de utilidade para qualquer seguradora:

Mesmo em se desconsiderando as faixas das pessoas de menor renda e/ou nível de ocupação, o potencial de mercado para seguros de pessoas é altamente inexplorado no Brasil.

Dentro da ampla faixa desse potencial, há alguns segmentos com características próprias e que compõem os nichos menos explorados até agora (ver quadro 5 e comentários no texto).

Normalmente, as pessoas só se dispõem a fechar um contrato de seguro desde que já tenham formado o hábito de poupar ou de investir uma parcela de sua receita, sobretudo em imóveis e títulos de renda variável.

São sobretudo essas pessoas que se mostram receptivas à aquisição de um seguro, particularmente, se oferecido por empresa e/ou intermediário em que depositam confiança. Todavia, a iniciativa deve partir do vendedor, pois reduzidíssima é a percentagem das pessoas que compram seguros por iniciativa própria.

Com exceção de algumas poucas seguradoras, a maioria das empresas do ramo demonstrou, no passado, pouca agressividade mercadológica, sobretudo ao que se refere à venda pessoal. Muitas delegam essa função a intermediários sem manter o devido controle ou contatos com a sua clientela.

Em suma, pode-se dizer que o potencial em descoberto para seguros de pessoas é vasto no Brasil, mas só será aproveitado por aquelas empresas que se dedicarem a sua exploração de maneira metódica e diretamente dirigida ao consumidor final.

Para atingir esse alvo, convém que a empresa trace um plano de ação, cuja estrutura básica poderá ser composta dos seguintes passos:

a) Reavaliação dos objetivos mercadológicos, face aos resultados do projeto Fenaseg e seus significados específicos, para a sua própria organização e planos de expansão e/ou diversificação.

b) Determinação preliminar dos segmentos a serem cobertos com maior ou menor ênfase no futuro, seja no sentido geográfico ou de características pessoais dos compradores a serem atingidos prioritariamente.

c) Determinação dos potenciais de mercado para cada um dos segmentos prioritários.

d) Avaliação (e/ou reavaliação) dos tipos de produtos (seguros) a serem oferecidos a cada segmento, levando em conta as comodidades da oferta atual e a introdução de eventuais inovações (como package deals).

e) Escolha de uma estratégia de cobertura dos segmentos escolhidos.

f) Determinação das políticas mercadológicas condizentes com a estratégia, sobretudo nas áreas de: adaptação dos produtos aos segmentos; preparação da venda pessoal (própria e/ou de intermediários); formulação de um plano de propaganda e promoção em sustentação à venda pessoal.

g) Elaboração de um plano de metas de vendas por segmento, em volumes previstos e por períodos, seguido por um orçamento financeiro.

h) Determinação das diretrizes de implementação do plano (referente, por exemplo, à estrutura do setor e das equipes de venda, descrição de funções, zoneamento, cotas, remuneração, prêmios, assistência aos intermediários, controles do desempenho, etc).

  • 3 Estudo sobre seguros no Brasil. 1973. p. 41, mimeogr.
  • *
    Resumo de um projeto de pesquisas contratado pela Federação Nacional de Seguros e Capitalizações (Fenaseg) à empresa de Consultoria Richers, Buarque de Almeida & Associados. O autor agradece à Fenaseg pela autorização de tornar público o presente trabalho, pelo qual se declara responsável. Outrossim, manifesta o reconhecimento aos seus colaboradores, em particular aos Profs. Eduardo Buarque de Almeida e Sérgio Roberto Dias, à Sra. Maria Magdalena E. Mischan Rodrigues e ao Sr. Maxim Castelnau, do IPOM.
  • 1
    Seguro-marketing ou nada. Estudo especial da revista
    Conjuntura Econômica, out. 1973.
  • 2
    Richers, R. Um conceito funcional de integração mercadológica. In: Richers, R. coord.
    Ensaios de administração mercadológica. 2. tir. Rio de Janeiro. Fundação Getúlio Vargas, 1974. p. 29-50.
  • 3
    Estudo sobre seguros no Brasil. 1973. p. 41, mimeogr.
  • 4
    Op. cit. p. 40.
  • 5
    Seguro-
    marketing ou nada. op. cit.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 1975
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