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A dimensão física das pequenas e médias empresas (P.M.E's): à procura de um critério homogeneizador

ARTIGO

A dimensão física das pequenas e médias empresas (P.M.E's): à procura de um critério homogeneizador

Nilda Maria de Clodoaldo Pinto Guerra Leone

Professora Adjunta III do Departamento de Administração do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da UFPB

RESUMO

A definição do que sejam uma pequena e uma média empresa (P.M.E.) tem se tornado um obstáculo para os estudos envolvidos com o desenvolvimento dessas unidades econômicas.

A adoção de critérios quantitativos, qualitativos ou mistos apontam como uma solução.

As vantagens e os inconvenientes da adoção de cada um desses critérios mostram a importância de se procurar um critério homogeneizador que defina a pequena e a média empresa. Os estratos resultantes dessa classificação poderão ser melhor avaliados do ponto de vista econômico, social e político.

Palavras-chave: Pequena e média empresa, critérios quantitativos, critérios qualitativos, critérios mistos.

ABSTRACT

The definition of what a small and a medium enterprise is, has become an obstacle to the research studies dealing with the development of these economic units.

The adoption of qualitative, quantitative and mixed criteria appears as a solution.

The advantages and inconvenients from the adoption of each of these criteria show the actual importance of looking for an homogeneous criterion that defines exactly what a small and a medium enterprise is. The groups that result from this particular criterion could be better evaluated from the economic, social and politic points of view.

Key words: Small and medium enterprise, qualitative criteria, quantitative criteria, mixed criteria.

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INTRODUÇÃO

Todos os estudos sobre pequenas e médias empresas se deparam com o problema de sua definição. Além disso, esse mesmo problema é enfrentado, também, pelos órgãos públicos, que estão envolvidos com o desenvolvimento dessas unidades econômicas. Tentativas de solução adotaram três caminhos diferentes: o critério quantitativo, o critério qualitativo e uma combinação de ambos.

Mas, por que é necessário definir as empresas segundo o seu porte? Qual a importância de tal classificação? Por que faz falta um critério adequado geralmente aceito?

As pequenas empresas sempre existiram. Muito antes que as grandes empresas. Entretanto, foi a partir dos estudos de Staley1 1 . STALEY, Eugene. "Small Industry Development", Research Program on Small Industry Development. Stanford Research Institut, paper nº 1, dezembro, 1958. e, em seguida à divulgação das reflexões de Schumacher2 2 . SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 1977. , que os economistas passaram a se interessar, com mais freqüência, por essas unidades empresariais de porte reduzido. As autoridades governamentais começaram a se envolver mais de perto com a proteção e o desenvolvimento das pequenas empresas. A partir de 1970, em todos os países, inclusive o Brasil, com a criação da FIPEME3 3 . Programa de Financiamento à Pequena e Média Empresa. BNDES, 1965. , essas preocupações se intensificaram. Hoje, as pequenas e médias empresas são analisadas sob todos os aspectos, principalmente, quanto aos aspectos econômicos e sociais.

Existem características próprias que conferem às pequenas empresas uma importância vital para a economia.

Assim, pode-se notar que não há outra ótica pela qual enxergar esse estrato, senão estudando-o segundo o seu tamanho. Pois, é o porte que o destaca dos outros estratos empresariais.

Alguns analistas e outras tantas instituições governamentais4 4 . DUTRA, Ivan & GUAGLIARDI, José Augusto. "As micro e pequenas empresas: uma revisão da literatura de marketing e os critérios para caracterizá-las", Revista de Administração de Empresas, 24(4):123-31, out./dez., 1984. tentam conceituar essas unidades empresariais particulares através de uma conjugação entre os critérios quantitativos e qualitativos. Mas, na verdade, são os critérios quantitativos que predominam.

CRITÉRIOS QUANTITATIVOS

Os critérios quantitativos são critérios econômicos. Existe uma estreita correspondência entre os fenômenos econômicos e os sociais. Os critérios econômicos, ao conceituarem as pequenas empresas, ajudam a explicar o seu comportamento social. Do mesmo modo, os critérios qualitativos, de natureza mais social, quase sempre explicam o comportamento econômico das empresas. Os critérios econômicos têm outras vantagens, no entanto. Eles é que determinam o porte das empresas e são fáceis de coletar. Além disso, oferecem a oportunidade de, através deles, permitirem medidas de tendência no tempo e análises comparativas, porque são de uso corrente em todos os setores (governo, universidades e estatísticas). Os critérios quantitativos, no entanto, são de muitos tipos e tocam em diferentes componentes da atividade empresarial. Esses componentes refletem problemas diversos. O valor do capital social, o valor do ativo imobilizado, o valor de vendas e o número de empregados, para citar apenas os de uso mais freqüente, representam óticas diferentes e revelam problemas particulares das empresas5 5 . CHARREAUX, Gerard et alii. De Nouvelles théories pour gérer l'entreprise. Paris, Economica, 1987. .

Atualmente, os estudos são realizados, tomando-se em consideração um conjunto conceituado como PME, isto é, juntam-se dois estratos desiguais para formar um único estrato com a pretensão de uniformizá-los. Acontece que uma pequena empresa, qualquer que seja o critério adotado para definí-la, não tem o mesmo comportamento econômico e social que uma média empresa. Os problemas são bastante diferentes. Alguns preferem ir até mais longe6 6 . MODENISI, Rui L. "A questão do porte é mais complexa do que parece". Rumos do Desenvolvimento, nov./dez., 1980, p.25. , juntando um outro estrato completamente diferente: o estrato das microempresas (qualquer que seja a base para conceituá-las).

O estrato das microempresas associado às PME's dá como resultado um conjunto estranho denominado de MPME que, a nosso ver, só tem a vantagem de permitir estudos menos dispendiosos, e não pode revelar coisa alguma de prático e de útil. Alguns problemas são comuns a essa mistura de empresas, mas, por outro lado, as diferenças são extremamente marcantes.

Para responder, então, objetivamente, às indagações que propusemos, podemos invocar as reflexões apontadas mais acima. E necessário classificar as empresas pelo seu porte porque, dependendo desse porte, elas revelam comportamento econômico e social significativo, cujas análises particulares poderão apontar soluções mais adequadas aos problemas apresentados por essas empresas de pequeno porte. A classificação das empresas segundo o seu tamanho tem significação também para os programas e ações governamentais que procuram o desenvolvimento econômico e social7 7 . PACHECO, Paulo José. "Uma opção para melhorar a eficiência no crédito". Rumos do Desenvolvimento, nov/dez., 1980, p.18. . As empresas, segundo o seu porte, apresentam finalidades e problemas diferentes, além de recursos distintos para a sua solução. Assim, as atividades governamentais de apoio devem ser articuladas com essas características de problemas, recursos e finalidades. Um critério único é imprescindível para as análises comparativas e análises estatísticas de tendência temporal. Não é possível realizar estudos sérios com estatísticas que são levantadas por meio de bases diferentes.

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Em alguns casos, no entanto, não é necessário lograr uniformidade a esse respeito. O critério escolhido e suas medidas vão depender efetivamente dos fins que se têm em vista. E o caso particular, por exemplo, das agências de crédito e de financiamento, que estabelecem seus próprios critérios, segundo o tipo, o montante e as finalidades dos auxílios financeiros. Tais agentes estão preocupados, principalmente, com as garantias reais que as empresas podem oferecer. Assim, os critérios se baseiam muito mais em valores, que indicam a situação patrimonial das unidades empresariais, do que em suas potencialidades, refletidas por indicadores operacionais.

1. Na classificação do porte das empresas, o Banco do Brasil optou pela adoção de critérios próprios, levando-se em conta, para melhor definí-los, entre outros indicadores, o valor do ativo imobilizado. Esse parâmetro tem por objetivo visualizar melhor o dimensionamento físico da empresa8 8 . COLIN, Oswaldo. "Mudanças de normas a fim de facilitar o crédito às pequenas e médias empresas". O Banco do Brasil em Ação, 29.02.1980, p.32. .

O ativo imobilizado, para as mesmas facilidades, é, também, o critério adotado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste para financiamento às pequenas empresas9 9 . BNDES E SUDENE, pela Portaria nº 001 de 22.10.1975. .

Na verdade, a heterogeneidade dos critérios é devida, em parte, ao fato de o conceito de PME se definir em consonância com as condições gerais de cada país, de cada região e de cada instituição. Assim, as empresas consideradas como pequenas, por exemplo, em países altamente desenvolvidos e de mercados amplos, podem aparecer como médias e, ainda, como grandes em países não industrializados e de baixo nível de desenvolvimento. Por extensão, a mesma situação parece ocorrer dentro de um mesmo país de grandes dimensões territoriais, como o Brasil, e com marcantes distinções econômico-sociais. Não existe uma definição universalmente aceita de PME, porquanto a noção é ainda puramente relativa. Entretanto, concordamos que pode haver uma compreensão mais específica de pequena, média e grande.

É possível que esse denominador comum venha a ser o tamanho do mercado. A dimensão física de uma empresa depende do tamanho de seu mercado próprio. Se a preocupação primordial dos economistas é oferecer condições para que as empresas pequenas se tornem mais rentáveis, mais produtivas, que seus produtos e serviços sejam de melhor qualidade e atendam melhor às exigências de seu mercado particular, devem ser examinadas as particularidades desse mercado.

A pequena empresa atua sempre num mercado restrito. As vezes, esse pequeno mercado não tem limites geográficos apertados. O tamanho do mercado não nos induz a pensar em um mercado local, muito embora a maioria das pequenas empresas atuem em mercados desse tipo. É muito comum, no entanto, encontrarmos pequenas empresas que produzem produtos ou serviços especializados. Nesses casos, o seu mercado particular pode ser pequeno, em termos de número de clientes, mas pode ser bastante amplo, em termos espaciais10 10 . Muitos casos podem ser citados. Veja o caso de uma pequena empresa especializada em consultoria fiscal. Ela pode atender a uma pequena clientela dispersa geograficamente. . E difícil conceber uma pequena empresa que atenda a um grande mercado, de amplas dimensões econômicas.

2. O critério amplamente utilizado é o do número de empregados. É um critério quantitativo, portanto, fácil de manipular e de coletar. O FIBGE adota esse critério em suas estatísticas censitárias, que são consultadas amplamente. É um critério tanto econômico como social, pelas indicações que oferece dos problemas sociais pertinentes, principalmente, à absorção de mão-de-obra, ao nível de renda e à produtividade. Na definição do tamanho da PME pelo número de empregados, está implícita a premissa de que esse critério determina a produtividade ou o Valor da Transformação Industrial (VTI). Entretanto, segundo Rattner11 11 . RATTNER, Henrique. "Acumulação de Capital, Internacionalização da Economia e as Pequenas e Médias Empresas". Revista de Administração de Empresas, 24(4):97, out./dez., 1984. , este último parâmetro depende da composição técnica do capital, e sua adoção indiscriminada talvez possa levar à classificação de empresas altamente capitalizadas (automatizadas) na mesma categoria que empresas tradicionais de mão-de-obra intensiva (manufatureiras).

O critério, apesar disso, mostra-se perfeitamente homogeneizador pela sua aceitação corrente. O grande mérito na utilização dessa variável consiste em evitar as dificuldades referentes a preços, taxas, avaliações subjetivas e acesso às informações, muitas vezes guardadas como segredo profissional, comercial e pessoal.

A grande maioria dos estudos acadêmicos adota esse critério quantitativo12 12 . MONTE CARMELO, Milton & SCHOEPS, Wolfgang. Administração geral e financeira na pequena e média empresa brasileira. Rio de Janeiro, FGV, 1979; CHAR-REAUX, Gérard et alii. Op. cit.; GELINIER, Octave & GELINIER, André. L'avenir des entreprises personelles et familiales. Paris, Hommes et Techniques, 1974; LOISEAU, Bernard & DUPONT, Christopher. "Facteurs de succès et d échecs dans les P.M.E. Revue Française de Gestion, (32), set./out., 1981. .

3. O faturamento (ou vendas) é um critério quantitativo de uso corrente em vários países. E um critério econômico que indica o movimento operacional da empresa. Além disso, é um critério também contábil. De um lado, é satisfatório porque reflete o tamanho do mercado da empresa, mas, de outro, perde muito de sua confiabilidade para determinadas finalidades, em virtude de estar sujeito às flutuações da moeda e às mudanças dos critérios contábeis. E um critério muito utilizado nas operações de crédito e financiamento, mesmo de empresa para empresa. A Receita Federal utiliza esse critério, combinado com o de capital social, ao definir a pequena empresa para efeitos de execução da política fiscal do governo no apoio ao desenvolvimento econômico.

O Banco Central, através de várias resoluções13 13 . DUTRA, Ivan & GUAGLIARDI, José Augusto. Op. cit. , adotou o mesmo critério para regulamentar certos tipos de financiamento às pequenas e médias empresas.

Podemos, agora, sublinhar dois pontos:

a) O critério do faturamento (ou das vendas), quando se definem as pequenas e médias empresas, é usado principalmente pelo governo e pelas agências de crédito, como forma de classificação para as finalidades do financiamento e apoio à política fiscal.

b) Por estar sujeito às flutuações da moeda, o faturamento tem que ser medido, constantemente, por parâmetros que são usados na indexação da economia, como o Salário-Mínimo, o Maior Valor de Referência, a BTN.

Muito embora o critério tenha muita relação com a atividade comercial das empresas, dando contornos um pouco mais exatos ao tamanho de seu mercado, ele não é usado para classificar o tamanho das empresas para outros trabalhos como as pesquisas acadêmicas que analisam outros aspectos da problemática das pequenas unidades empresariais. Ele pode ser usado, com alguma utilidade prática, em combinação, por exemplo, com o número de empregados ou com o valor do ativo imobilizado, apenas como medida de produtividade. Um exemplo significativo da utilização de um critério que combina o faturamento com o valor do ativo imobilizado é dado por Pacheco14 14 . PACHECO, Paulo José. "Óbices à definição e execução de politicas de apoio". Comércio e Mercados, nov., 1982, p. 28-9. , quando levanta informações de apoio ao seu estudo sobre a importância das MPME's (conjunto de empresas de menor porte: micro, pequenas e médias), conforme se vê no quadro 1.


Cada Cr$ 1,00 de ativo imobilizado responde com Cr$ 9,37, em faturamento quando aplicado em sua MPME, e com apenas Cr$ 2,59 se aplicado em uma grande empresa.

Conclui Pacheco que a "busca de crescimento do Produto Interno Bruto pode ser muito mais eficiente aplicando recursos nas MPME's do que nas grandes empresas"15 15 . Idem, ibidem, p. 28. .

A conclusão é apressada, porque, além de ser um indicador isolado, cujos componentes sofrem influência da aplicação de diferentes critérios contábeis nas pequenas e nas grandes empresas, indica também o comportamento global de uma mistura de empresas que possuem características próprias e diversas uma das outras. Mas é um indicador que serve de alerta ao problema da pequena empresa e que sugere um caminho fecundo para pesquisas adicionais.

4. Alguns estudiosos propõem o uso do valor adicionado que procura apontar o valor das vendas pela exclusão do valor dos materiais comprados de terceiros. Esse ajustamento procura um indicador que, ao mesmo tempo, reflita as operações comerciais das empresas, bem como a sua estrutura organizacional, medida pelas despesas necessárias à produção de bens.

E um critério que só pode ser utilizado para comparar empresas industriais, pela sua própria natureza. Na verdade, é um parâmetro mais feliz do que o puro valor do faturamento, muito embora contenha as mesmas falhas, em termos de influência das flutuações da moeda e dos critérios de cálculo, uma vez que vai depender destes últimos para o conhecimento do valor dos materiais, que vai ser excluído.

5. O Capital Social e/ou a Estrutura de Financiamento são um outro critério quantitativo, econômico e contábil, usado para definir o tamanho das empresas com objetivos de apoio a critérios de ajuda financeira. No Brasil, além de outros critérios, já citados anteriormente, o Banco Central (Resolução nº 184, de 20.05.1971) utilizou esse critério ao regulamentar a aplicação do depósito compulsório às pequenas e médias empresas.

Em termos internacionais, vale a pena citar Francarolli16 16 . FRANCAROLLI, Luiz Machado. Pequena e Média Empresa. Aspectos legais. São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1975. que, em sua obra, nos diz que o Equador, o Peru e o México usam o capital social para definir a pequena empresa. Quanto à Estrutura de Financiamento, que inclui os dados do capital alheio, não vemos com agrado a sua utilização para efeitos de definição de pequenas e médias empresas, pois, na maioria das vezes, essas pequenas unidades econômicas são de grupos familiares e, pelo seu reduzido porte, pouco usam recursos de terceiros, principalmente porque existem os óbices naturais que lhes são impostos, nesse sentido, pelas forças de uma economia de mercado, com diferentes percepções de lucro e de risco. As empresas só usam capitais alheios na medida em que se tornam grandes, dotadas, então, de garantias reais e oferecendo risco menor às instituições de financiamento e a emprestadores. Outros critérios quantitativos, econômicos e contábeis, são o valor do Patrimônio Líquido17 17 . Banco do Brasil, ao regulamentar a aplicação dos Fundos 157 para as sociedades por ações de pequeno e médio porte. e o valor do Passivo18 18 . É o critério usado no Brasil para a definição legal de pequenas falências (Lei Federal nº 4.983/66). . Como se vê, a variedade de critérios reflete a diversidade de objetivos com os quais se deseja definir a pequena e a média empresa. O uso de um determinado critério sempre depende das finalidades que tentam alcançar o pesquisador, o analista, a agência de crédito e financiamento ou a instituição governamental.

Segundo uma opinião extrema, a empresa deixa de ser pequena quando não pode continuar a ser dirigida por uma só pessoa. Esse critério, também quantitativo, embora não econômico e tampouco contábil, é excessivamente generalizante, muito embora saibamos que, até certo ponto, a direção de uma empresa por uma só pessoa constitui uma característica de muitas pequenas empresas19 19 . HIRAN, S. Danis. "What is Small Business: A Suggested Criterion Illustrated with data from the wool textile industries, Explannations. Entrepreneurial History, 7, Cambridge, Massachussets, Harvard Research Center, 1955, pp.174-9. .

Outros autores citados no trabalho de Hiran20 20 . Idem, Ibidem. preferem considerar o consumo de energia combinado com o volume de vendas. O uso de consumo de energia não é racional, porque tal consumo varia muito com o tipo e as características da atividade fabril de cada empresa, não refletindo seu tamanho e nem sua escala.

Uma grande empresa, de mão-de-obra intensiva, por esse critério, poderá ser considerada pequena ou média, desde que o seu consumo de energia não alcance os limites fixados pelo critério. Outras pequenas empresas, de capital-intensivas, podem ser, por outro lado, consideradas como médias, ou mesmo grandes, se consomem bastante energia.

8. Um outro critério interessante, citado por McGuire21 21 . McGUIRE, Joseph W. "The small entreprise in Economics ans Organization Theory". Journal of Contemporany Business, 5(2):117,été, 1976. , diz respeito ao número de centros de lucro. Assim, uma empresa industrial, dispondo de apenas um centro de lucro, deve ser considerada como pequena. Essa definição, segundo o pesquisador, permite a imediata e inequívoca distinção entre a pequena e a grande empresa, já que esta última se caracteriza pelo exercício de uma grande variedade de atividades através de muitas funções empresariais. Além disso, esse conceito não julga o tamanho da empresa pelos critérios puramente quantitativos. Ele tem uma idéia de estrutura, em primeiro lugar. No momento em que uma empresa passa a dispor de vários centros de lucro, ela deixa, por hipótese, de ser uma pequena empresa. O conceito é original. O problema principal reside na dificuldade de conceituarmos um centro de lucro. Não é um conceito de uso generalizado, principalmente pelo pequeno empresário.

CRITÉRIOS QUALITATIVOS

Critérios qualitativos são também largamente usados para definir o porte de uma empresa. Eles apresentam uma imagem mais fiel das empresas, uma vez que tocam, essencialmente, na sua estrutura interna, na sua organização e nos estilos de gestão. Os critérios qualitativos são mais sincronizados com os estilos de direção, o perfil e as atitudes dos pequenos dirigentes e suas percepções do ambiente externo e assim podem oferecer mais subsídios para o estudo do comportamento de uma empresa, quando se parte do princípio de que esta é um espelho do comportamento de seu dirigente. Enquanto os critérios quantitativos dão uma imagem estática à empresa, os critérios qualitativos parecem oferecer uma visão mais de movimento, mais de ação gerencial, por isso mesmo, mostram a empresa em funcionamento, fazendo movimentar seus bens materiais e humanos, operando com fornecedores e clientes, realizando ações de empréstimos e financiamentos e mostrando a natureza íntima de sua atividade.

Assim, são pequenas as empresas que22 22 . DUTRA, Ivan & GUAGLIARD, José Auguste Op. cit., p.125. :

• usam trabalho próprio ou de familiares;

• não possuem administração especializada fora da empresa;

• não pertencem a grupos financeiros e econômicos;

• não têm produção em escala;

• apresentam condições particulares de atividades reveladoras da exiguidade do negócio;

• têm organizações rudimentares;

• apresentam menos complexidade do equipamento produtivo, causando baixa relação investimento/mão-de-obra;

• são receptoras de mão-de-obra liberada do setor rural;

• são um campo de treinamento de mão-de-obra especializada e da formação de empresários.

Nenhum desses critérios, porém, pode ser tomado isoladamente. Os dados são obtidos, estudando-se internamente o processo empresarial de cada empresa. Por isso, são critérios pouco usados em pesquisas onde se tem, a priori, a necessidade de se definir o tamanho das empresas, antes de se chegar propriamente a entrar na empresa.

Outros critérios qualitativos podem ser, ainda, apontados. Por exemplo, uma empresa de pequeno porte deve:

• ter estreita relação pessoal do proprietário com os empregados, os clientes e os fornecedores;

• ter dificuldade em obter créditos, mesmo a curto prazo;

• ter falta de poder de barganha nas negociações de compra e venda;

• ter uma integração bastante estreita na comunidade local a que pertecem seus proprietários.

No mesmo caminho, Staley e Morse23 23 . STALEY, E. & MORSE, R. Modem Small Industries for Developing Countries. California Stanford Research Institut, 1965, p.9. descrevem as pequenas empresas.

Eles propuseram uma diversidade de características próprias das pequenas empresas. Os pontos significativos de sua conceituação são os seguintes:

1) Direção relativamente pouco especializada.

2) Relações pessoais estreitas entre os dirigentes, os empregados encarregados do setor de produção, os clientes e os fornecedores.

3) Falta de acesso ao capital através de um mercado de capital organizado.

4) Falta de força particular nas negociações entre compradores e vendedores.

5) Integração relativamente forte na comunidade à qual pertence o dirigente e dependência de mercados e de fontes de suprimentos próximos.

Segundo Barreyre24 24 . BARREYRE, Pierre-Yves. Strategie d'Innovations dans les Moyennes et Petites Industries. Paris, Editions Hommes et Techniques, 1975. , cujos estudos deram origem a uma série de pesquisas por parte do universo acadêmico francês, as empresas são pequenas e médias quando têm:

• um capital social repartido entre alguns sócios (que pertencem, normalmente, à mesma família), quando não é detido, na sua totalidade, por uma única pessoa física: o patrão;

• uma autonomia real de financiamento e de administração; em conseqüência, não serão consideradas como PME's autênticas as filiais de grupos industriais ou financeiros, desde que a participação destes últimos lhes assegure uma posição preponderante na determinação dos objetivos da empresa e de sua estratégia; a mesma coisa acontece com a administração pública e as sociedades de economia mista;

• um estado de desenvolvimento dimensional que condicione o estilo de direção da empresa, a posição que ela ocupa no seu meio ambiente e sua margem de manobra.

O 2º Simpósio Latino Americano y del Caribe de La Pequena y Mediana Empresa, realizado em Quito, Equador, em 1978, definiu a pequena e a média empresa, de um modo geral, como aquelas que, "não ocupando uma posição de domínio ou monopólio no mercado, são dirigidas por seus próprios donos, que assumem o risco do negócio e não estão vinculados a outras grandes empresas ou grupos financeiros."

CRITÉRIOS MISTOS

Muitos estudiosos, e outras tantas instituições de pesquisa e de apoio à pequena empresa, preferem utilizar critérios mistos ou combinados para definir o tamanho das empresas.

O grupo de trabalho25 25 . DUTRA, Ivan & GUAGUARDI, José Augusto. Op. cit. criado no Brasil pelo decreto-lei nº 77941 de 30.06.1976, com o objetivo de propor um programa especial de apoio à PMI, estabeleceu um critério quantitativo para a pequena empresa de produção anual inferior a 3 mil salários-mínimos, além de critérios qualitativos que assim se configuram:

• baixa relação de investimento/mão-de-obra empregada, decorrente de menor complexidade do equipamento produtivo, o que as capacita a gerar emprego a menor custo social e privado;

• menor dependência das fontes externas de tecnologia;

• papel complementar às atividades industriais mais complexas;

• extensa rede de produção e distribuição de bens e serviços, o que contribui, decisivamente, para a desconcentração industrial;

• suporte à política de apoio às cidades de porte médio, viabilizando a utilização de recursos locais disponíveis e retendo mão-de-obra liberada do setor rural, antes de seu deslocamento para os centros urbanos congestionados;

• campo de treinamento de mão-de-obra especializada e de formação de empresários.

O Decreto-lei nº 486 de 03.03.1969 define o pequeno comerciante, por exemplo, pelas seguintes bases, que são uma combinação de critérios qualitativos e quantitativos:

• natureza artesanal da atividade;

• predominância do trabalho próprio e de familiares;

• capital empregado;

• renda bruta anual.

Robalinho de Barros26 26 . ROBALINHO DE BARROS, Frederico. Pequena e Média Empresa e Política Econômica: um desafio à mudança. Rio de Janeiro, APEC Editora, 1978, p.38. cita o estudo de Sandesara27 27 . SANDESARA, J. C. Scale and Technology in Indian Industry. India, University of Boroda, 1977. , no qual esse pesquisador apresenta critérios mistos, até mesmo na forma original de indicadores ou quocientes, que podem ser aplicados a qualquer economia, sobretudo às economias em via de desenvolvimento, como o Brasil, sem os grandes riscos de uma adaptação. Esses indicadores se referem, basicamente, a algumas características econômicas, portanto quantitativas, consideradas como válidas para uma política de apoio, conseqüentemente válidas também, para a definição do tamanho das empresas. Convém lembrar que tais critérios são uma combinação de dois critérios quantitativos. Os critérios mistos, apresentados até aqui, constituem uma conjugação de critérios quantitativos e qualitativos, porém sem interligá-los; eles continuam independentes. Os critérios estabelecidos por Sandesara, no entanto, são de natureza diferente: eles são o resultado de um quociente em que os dois termos que o formam, no final, perdem, cada um deles, a sua identidade, para fornecer um indicador próprio.

CONCLUSÃO

A variedade de critérios existentes que tentam solucionar o problema da definição do que sejam uma pequena e uma média empresa reflete a diversidade de objetivos que se deseja alcançar, assim como, o ângulo do qual se quer estudar a pequena e a média empresa.

Os critérios quantitativos, por serem de uso corrente em vários setores (governo, universidades, estatísticas) oferecem a oportunidade de análises comparativas e análises estatísticas de tendência temporal e tocam em diferentes componentes da atividade empresarial.

Os critérios qualitativos são mais sincronizados com os estilos de direção, o perfil e as atitudes dos pequenos e médios dirigentes e suas percepções do ambiente externo e assim podem oferecer mais subsídios para o estudo do comportamento de uma empresa, quando se parte do princípio de que esta é um espelho do comportamento de seu dirigente. Eles oferecem uma imagem mais fiel das empresas pois tocam, essencialmente, na sua estrutura interna, na sua organização e nos estilos de gestão.

A adoção de critérios mistos combina indicadores econômicos com características sociais e políticas. Eles constituem, quase sempre, uma conjugação de critérios qualitativos e quantitativos independentes entre si.

A classificação de pequena e média empresa é uma necessidade não apenas formal, mas de caráter prático, relacionada não só à política de financiamento mas também à possibilidade de se fazerem estudos estatísticos, de caráter social e do comportamento gerencial.

Finalmente, quaisquer que sejam os critérios para definir o tamanho das empresas, o que se deseja é tirar conclusões quanto ao comportamento dessas unidades empresariais. É claro que a definição dos estratos empresariais tem que estar ajustada a essa finalidade primordial.

Os critérios que forem adotados têm que ajudar a classificar as empresas, segundo o seu porte, do melhor modo, para que os estratos resultantes possam ser melhor analisados tanto do ponto de vista econômico, como social e político.

  • 1 STALEY, Eugene. "Small Industry Development", Research Program on Small Industry Development. Stanford Research Institut, paper nş 1, dezembro, 1958.
  • 2. SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 1977.
  • 3. Programa de Financiamento à Pequena e Média Empresa. BNDES, 1965.
  • 4. DUTRA, Ivan & GUAGLIARDI, José Augusto. "As micro e pequenas empresas: uma revisão da literatura de marketing e os critérios para caracterizá-las", Revista de Administração de Empresas, 24(4):123-31, out./dez., 1984.
  • 5. CHARREAUX, Gerard et alii. De Nouvelles théories pour gérer l'entreprise. Paris, Economica, 1987.
  • 6. MODENISI, Rui L. "A questão do porte é mais complexa do que parece". Rumos do Desenvolvimento, nov./dez., 1980, p.25.
  • 7. PACHECO, Paulo José. "Uma opção para melhorar a eficiência no crédito". Rumos do Desenvolvimento, nov/dez., 1980, p.18.
  • 8. COLIN, Oswaldo. "Mudanças de normas a fim de facilitar o crédito às pequenas e médias empresas". O Banco do Brasil em Ação, 29.02.1980, p.32.
  • 11. RATTNER, Henrique. "Acumulação de Capital, Internacionalização da Economia e as Pequenas e Médias Empresas". Revista de Administração de Empresas, 24(4):97, out./dez., 1984.
  • 12. MONTE CARMELO, Milton & SCHOEPS, Wolfgang. Administração geral e financeira na pequena e média empresa brasileira. Rio de Janeiro, FGV, 1979;
  • CHAR-REAUX, Gérard et alii. Op. cit.; GELINIER, Octave & GELINIER, André. L'avenir des entreprises personelles et familiales. Paris, Hommes et Techniques, 1974; LOISEAU, Bernard & DUPONT, Christopher. "Facteurs de succès et d échecs dans les P.M.E. Revue Française de Gestion, (32), set./out., 1981.
  • 14. PACHECO, Paulo José. "Óbices à definição e execução de politicas de apoio". Comércio e Mercados, nov., 1982, p. 28-9.
  • 16. FRANCAROLLI, Luiz Machado. Pequena e Média Empresa. Aspectos legais. São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1975.
  • 19. HIRAN, S. Danis. "What is Small Business: A Suggested Criterion Illustrated with data from the wool textile industries, Explannations. Entrepreneurial History, 7, Cambridge, Massachussets, Harvard Research Center, 1955, pp.174-9.
  • 21. McGUIRE, Joseph W. "The small entreprise in Economics ans Organization Theory". Journal of Contemporany Business, 5(2):117,été, 1976.
  • 23. STALEY, E. & MORSE, R. Modem Small Industries for Developing Countries. California Stanford Research Institut, 1965, p.9.
  • 24. BARREYRE, Pierre-Yves. Strategie d'Innovations dans les Moyennes et Petites Industries. Paris, Editions Hommes et Techniques, 1975.
  • 26. ROBALINHO DE BARROS, Frederico. Pequena e Média Empresa e Política Econômica: um desafio à mudança. Rio de Janeiro, APEC Editora, 1978, p.38.
  • 27. SANDESARA, J. C. Scale and Technology in Indian Industry. India, University of Boroda, 1977.
  • 1
    . STALEY, Eugene. "Small Industry Development",
    Research Program on Small Industry Development. Stanford Research Institut, paper nº 1, dezembro, 1958.
  • 2
    . SCHUMACHER, E. F.
    O negócio é ser pequeno. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 1977.
  • 3
    .
    Programa de Financiamento à Pequena e Média Empresa. BNDES, 1965.
  • 4
    . DUTRA, Ivan & GUAGLIARDI, José Augusto. "As micro e pequenas empresas: uma revisão da literatura de marketing e os critérios para caracterizá-las",
    Revista de Administração de Empresas, 24(4):123-31, out./dez., 1984.
  • 5
    . CHARREAUX, Gerard et alii.
    De Nouvelles théories pour gérer l'entreprise. Paris, Economica, 1987.
  • 6
    . MODENISI, Rui L. "A questão do porte é mais complexa do que parece".
    Rumos do Desenvolvimento, nov./dez., 1980, p.25.
  • 7
    . PACHECO, Paulo José. "Uma opção para melhorar a eficiência no crédito".
    Rumos do Desenvolvimento, nov/dez., 1980, p.18.
  • 8
    . COLIN, Oswaldo. "Mudanças de normas a fim de facilitar o crédito às pequenas e médias empresas".
    O Banco do Brasil em Ação, 29.02.1980, p.32.
  • 9
    . BNDES E SUDENE, pela Portaria nº 001 de 22.10.1975.
  • 10
    . Muitos casos podem ser citados. Veja o caso de uma pequena empresa especializada em consultoria fiscal. Ela pode atender a uma pequena clientela dispersa geograficamente.
  • 11
    . RATTNER, Henrique. "Acumulação de Capital, Internacionalização da Economia e as Pequenas e Médias Empresas".
    Revista de Administração de Empresas, 24(4):97, out./dez., 1984.
  • 12
    . MONTE CARMELO, Milton & SCHOEPS, Wolfgang.
    Administração geral e financeira na pequena e média empresa brasileira. Rio de Janeiro, FGV, 1979; CHAR-REAUX, Gérard et alii. Op. cit.; GELINIER, Octave & GELINIER, André.
    L'avenir des entreprises personelles et familiales. Paris, Hommes et Techniques, 1974; LOISEAU, Bernard & DUPONT, Christopher. "Facteurs de succès et d échecs dans les P.M.E.
    Revue Française de Gestion, (32), set./out., 1981.
  • 13
    . DUTRA, Ivan & GUAGLIARDI, José Augusto. Op. cit.
  • 14
    . PACHECO, Paulo José. "Óbices à definição e execução de politicas de apoio".
    Comércio e Mercados, nov., 1982, p. 28-9.
  • 15
    . Idem, ibidem, p. 28.
  • 16
    . FRANCAROLLI, Luiz Machado.
    Pequena e Média Empresa. Aspectos legais. São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1975.
  • 17
    . Banco do Brasil, ao regulamentar a aplicação dos Fundos 157 para as sociedades por ações de pequeno e médio porte.
  • 18
    . É o critério usado no Brasil para a definição legal de pequenas falências (Lei Federal nº 4.983/66).
  • 19
    . HIRAN, S. Danis. "What is Small Business: A Suggested Criterion Illustrated with data from the wool textile industries, Explannations.
    Entrepreneurial History, 7, Cambridge, Massachussets, Harvard Research Center, 1955, pp.174-9.
  • 20
    . Idem, Ibidem.
  • 21
    . McGUIRE, Joseph W. "The small entreprise in Economics ans Organization Theory".
    Journal of Contemporany Business, 5(2):117,été, 1976.
  • 22
    . DUTRA, Ivan & GUAGLIARD, José Auguste Op. cit., p.125.
  • 23
    . STALEY, E. & MORSE, R.
    Modem Small Industries for Developing Countries. California Stanford Research Institut, 1965, p.9.
  • 24
    . BARREYRE, Pierre-Yves.
    Strategie d'Innovations dans les Moyennes et Petites Industries. Paris, Editions Hommes et Techniques, 1975.
  • 25
    . DUTRA, Ivan & GUAGUARDI, José Augusto. Op. cit.
  • 26
    . ROBALINHO DE BARROS, Frederico.
    Pequena e Média Empresa e Política Econômica: um desafio à mudança. Rio de Janeiro, APEC Editora, 1978, p.38.
  • 27
    . SANDESARA, J. C.
    Scale and Technology in Indian Industry. India, University of Boroda, 1977.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 1991
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