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AMBIDESTRIA E COEVOLUÇÃO EM OPERAÇÕES: INTEGRANDO TEORIA E PRÁTICA

INTRODUÇÃO

Quais fatores influenciam as mudanças relacionadas às operações nas empresas? Usualmente, a área de Gestão de Operações prioriza uma visão técnica de suas questões, muitas vezes com limitada sustentação teórica, distanciando-se consequentemente de outras áreas da Administração. Como a teoria de coevolução poderia ajudar nessa compreensão, tendo contribuições na pesquisa e na prática em Gestão de Operações? Nesse contexto, o desenvolvimento de um novo produto ou de um novo processo de negócio leva a mudanças muitas vezes expressivas na forma com a empresa configura suas operações. O crescimento do comércio eletrônico nas últimas décadas ilustra como a mudança não é apenas na estratégia da empresa, mas envolve as operações ao longo de toda a cadeia de suprimentos. Entretanto, o que impulsionaria a mudança? Diversas respostas aparecem. Inicialmente, pode-se pensar nos recursos internos como os principais propulsores de tais mudanças. Mesmo com críticas à resource-based view (RBV), essa abordagem assumiu um papel preponderante na pesquisa em operações (Bromiley & Rau, 2016Bromiley, P., & Rau, D. (2016). Operations management and the resource based view: Another view. Journal of Operations Management, 41, 95-106. doi:10.1016/j.jom.2015.11.003
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). Segundo a RBV, recursos internos, incluindo o líder do negócio, têm sido apontados como centrais para a estratégia e as mudanças nas operações da empresa (Hitt, Xu, & Carnes, 2016Hitt, M. A., Xu, K., & Carnes, C. M. (2016). Resource based theory in operations management research. Journal of Operations Management, 41, 77-94. doi:10.1016/j.jom.2015.11.002
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). Entretanto, pode-se também buscar causalidades externas, como a influência do setor industrial. Nessa abordagem, é válido considerar a influência de Michael Porter na forma de se pensar a estratégia das empresas por décadas (Hayes & Pisano, 1996Hayes, R. H., & Pisano, G. P. (1996). Manufacturing strategy: At the intersection of two paradigm shifts. Production and Operations Management, 5(1), 25-41. doi:10.1111/j.1937-5956.1996.tb00383.x
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).

Há também causas externas relacionadas ao contexto local. Pode-se citar aspectos do macroambiente dos negócios, como as leis e regulamentações. Há aqui uma ampla gama de aspectos, desde as questões trabalhistas até as normas ambientais.

Assim, pode-se considerar que tanto aspectos internos como o ambiente externo influenciam as mudanças nas operações das empresas.

Portanto, ao se retomar a pergunta inicial de quais fatores seriam as causas das mudanças nas operações das empresas, a resposta não é única, e a combinação de vários aspectos poderia ser a resposta mais adequada. Neste ponto, os conceitos de ambidestria e coevolução ajudam no entendimento do processo de mudança.

AMBIDESTRIA E COEVOLUÇÃO

O conceito de ambidestria considera que as empresas exploram seus recursos de duas formas distintas. Explotation, quando lança mão de seus recursos internos para buscar os melhores resultados no presente (Kristal, Huang, & Roth, 2010Kristal, M. M., Huang, X., & Roth, A. V. (2010). The effect of an ambidextrous supply chain strategy on combinative competitive capabilities and business performance. Journal of Operations Management, 28(5), 415-429. doi:10.1016/j.jom.2009.12.002
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). Por outro lado, na situação caracterizada como Exploration, a empresa utiliza seus recursos não mais com foco nas operações presentes, mas com um olhar no futuro, modificando e criando novas competências (O'Reilly & Tushman, 2004O'Reilly, C. A., III , & Tushman, M. L. (2004). The ambidextrous organization. Harvard Business Review, 82(4), 74.). No entanto, Explotation e Exploration são processos que coexistem e permitem à empresa reforçar sua atuação presente e se antecipar às mudanças futuras (Birkinshaw & Gupta, 2013Birkinshaw, J., & Gupta, K. (2013). Clarifying the distinctive contribution of ambidexterity to the field of organization studies. Academy of Management Perspectives, 27(4), 287-298. doi:10.5465/amp.2012.0167
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).

O conceito de coevolução, por sua vez, tem interfaces claras com os processos de Explotation e Exploration. Para Lewin e Volberda (1999)Lewin, A., & Volberda, H. (1999). Prolegomena on coevolution: A framework for research on strategy and new organizational forms. Organization Science, 10(5), 519-534., coevolução refere-se à combinação entre intencionalidade gerencial, forças competitivas e influências do ambiente institucional. Assim, pode-se considerar que as decisões de líderes e das áreas funcionais da empresa, a influência do ambiente concorrencial e as instituições que cercam a empresa são aspectos-chave nas mudanças de operações. Entretanto, o nível de influência de cada um desses aspectos é variável e dependente do contexto (March, 1994March, J. (1994). The evolution of evolution. In J. Baum, & J. Singh (Eds.), Evolutionary dynamics of organizations (pp. 39-52). New York, NY: Oxford University Press.).

As empresas e suas operações, assim, mudam a partir de influências oriundas de diferentes níveis: do nível micro, ou de seus processos internos; do nível meso, ou do ambiente competitivo, o que inclui influência de competidores, clientes e fornecedores; e do nível macro ou do ambiente institucional, o que inclui a influência do governo, de associações e de sindicatos, entre outros atores (Rodrigues & Child, 2003Rodrigues, S., & Child, J. (2003). Co-evolution in an institutionalized environment. Journal of Management Studies, 40(8), 2137-2162. doi:10.1046/j.1467-6486.2003.00415.x
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). Desse modo, se pode considerar que múltiplos aspectos em diferentes níveis influenciam as mudanças nas operações das empresas. Em resumo, essa influência adviria de uma combinação de aspectos de escolha/intenção com reforço/adaptação nos diferentes níveis ambientais (micro, meso e macro). Um novo produto ou um novo processo, quando criados (intencional) pela empresa, podem mesmo afetar o ambiente competitivo externo. Um exemplo seria o smartphone, que criou novo setores (como a indústria de aplicativos) e alterou a forma como as empresas desse setor se relacionam com os consumidores. O produto criado pela Apple influenciou os demais concorrentes e viabilizou uma rede de fornecedores a criar novos produtos vinculados à gama de possibilidades que se abriu com o smartphone. Ao mesmo tempo, o ambiente institucional ou o ambiente competitivo também podem influenciar as mudanças na empresa. As pressões sobre questões ambientais ou condições de trabalho, muitas vezes, obrigam as empresas a alterar suas operações, seja para atendimento da legislação (influência do governo) ou pressão da sociedade, muitas vezes em questões éticas. O consumidor pode não mais aceitar alguma marca de produtos com suspeita de utilização de trabalho infantil em uma etapa da cadeia de suprimentos, mesmo que seja em componentes oriundos de outros países.

INTEGRANDO OPERAÇÕES COM A VISÃO COEVOLUTIVA

O processo dinâmico próximo ao conceito de Exloration e que caracteriza a visão coevolutiva combina situações de escolha e adaptação derivadas de iniciativas internas (nível micro) e de influências externas (meso e macro) (Van Den Bosch, Volberda, &De Boer, 1999Bosch, F. A. J.Van den, Volberda, H. W., & Boer, M. De. (1999). Coevolution of firm absorptive capacity and knowledge environment: Organizational forms and combinative capabilities. Organization Science, 10(5), 551-568.). Há quatro tipos distintos no processo de coevolução, segundo Lewin e Volberda (1999)Lewin, A., & Volberda, H. (1999). Prolegomena on coevolution: A framework for research on strategy and new organizational forms. Organization Science, 10(5), 519-534.: Seleção Limitada, Seleção Gerenciada, Renovação Hierárquica e Renovação Holística.

No primeiro tipo, denominado de Seleção Limitada (tradução livre para Naïve Selection), há inércia ou escolhas aleatórias, levando a mudanças e escolhas muitas vezes pouco conectadas ao ambiente. A mudança ocorre a partir de recursos escassos e há uma tentativa de manter no longo prazo o status quo, ou seja, os mesmos produtos e processos. Seria o que em Gestão de Operações se caracteriza por internamente neutra: a empresa apenas minimiza aspectos negativos de suas operações (Wheelwright & Hayes, 1985Wheelwright, S. C., & Hayes, R. H. (1985). Competing through manufacturing. Harvard Business Review, 63(1), 99-109.), ou seja, prioritariamente há ênfase em processos de Explotation. Este tipo de coevolução representa empresas ou setores que perdem sua competitividade e que podem até mesmo desaparecer no médio ou longo prazo. Uma empresa que não se adapta às mudanças em curso no ambiente pode estar fora do mercado em um futuro próximo. Em uma segunda situação, a empresa por competir em setores oligopolizados, apresenta uma elevada complacência em relação à ineficiência de suas operações. No limite, pode-se citar o caso da empresa Vale e sua forma de atuação nos últimos anos no Brasil. Apesar da existência de tecnologias mais seguras em relação aos dejetos de minério já utilizados em outros países, houve historicamente uma priorização por custo e de manter as operações sem alteração, ainda que com grandes riscos relativos às barragens com tecnologia denominada "a montante". O ambiente institucional com níveis elevados de complacência dos órgão ambientais e governos locais, permitiu que a empresa operasse por anos com tecnologias defasadas com alto risco apara a sociedade. Assim, os desastres de Brumadinho e Mariana impuseram sérios questionamentos à política ambiental do Brasil e a questões éticas da empresa Vale, envolvendo as tecnologias de suas barragens. O ambiente institucional representado pelos seus diferentes stakeholders levou assim a empresa à necessidade urgente de reconfigurar suas operações, com pressões para que passe a priorizar de imediato a segurança e não apenas uma visão de custo com graves consequências para a sociedade como um todo.

A Seleção Gerenciada (Managed Selection) pressupõe uma escolha direcionada em relação às práticas existentes, ainda que numa lógica de tentativa e erro. Há um ambiente mais complexo no nível micro que analisa a criticidade em relação aos tempos envolvidos e os recursos existentes (Galunic & Eisenhardt, 1996Galunic, D. C., & Eisenhardt, K. M. (1996). The evolution of intracorporate domains: Divisional charter losses in high-technology, multidivisional corporations. Organization Science, 7(3), 255-282. doi:10.1287/orsc.7.3.255
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). A empresa busca atingir apenas a paridade com seus competidores, denominada de externamente neutra (Wheelwright & Hayes, 1985Wheelwright, S. C., & Hayes, R. H. (1985). Competing through manufacturing. Harvard Business Review, 63(1), 99-109.), ainda com ênfase em processos de Explotation, mas com movimentos incipientes de construção de competências futuras. Assim, há preocupação inicial que leva a processos de Exploration.

Setores fragmentados são exemplos presentes neste caso. O mercado de móveis planejados no Brasil é um exemplo deste tipo de coevolução. A Todeschini é a empresa líder do mercado brasileiro. Entretanto, aquelas que competem proximamente à líder possuem operações muito similares, com fabricação própria, lojas exclusivas, desenvolvimento de projetos customizados e serviços de instalação e de manutenção dos móveis comercializados. As tecnologias de processo, desde a fabricação até a comercialização, são disseminadas entre as principais empresas do setor. Tecnologias mais específicas, como os softwares de projeto utilizados não são exclusivas. Deste modo, o que varia entre as empresas e suas diferentes marcas seria a proposta de valor e o consequente posicionamento da empresa no mercado. Também a automação na manufatura é um exemplo de mudança buscada por estas empresas nos últimos anos e que hoje são disseminadas entre os líderes de mercado. As influências primordialmente estão no nível meso, decorrentes do ambiente concorrencial. Assim a concorrência acirrada leva as empresas a adotarem novos processos operacionais que seus concorrentes muitas vezes já utilizam ou que podem adotar no curto prazo.

Na Renovação Hierárquica (Hierarchical Renewal), há uma clara intenção estratégica na escolha de práticas e competências que mudam as operações da empresa. Há um equilíbrio entre a utilização eficiente de recursos internos (Explotation), mas notadamente há a presença de ações que construirão o futuro (Exploration). Nesta situação, as mudanças refletem as orientações estratégicas do negócio e não apenas a busca de paridade competitiva com os concorrentes. Há uma orientação top-down no qual o processo coevolutivo é caracterizado como majoritariamente racional, proativo e com metas monitoradas. As diferentes unidades do negócio acessam práticas e competências muitas vezes intra e inter-unidades, com o objetivo de atingir as metas organizacionais. A Natura pode ser considerada como um exemplo de empresa que caracteriza este tipo de coevolução. Sua estratégia de negócios é claramente definida a partir da proposta de sustentabilidade. As mudanças que direcionam a área operacional se iniciam internamente com atuação direta da alta direção e das gerências (Hashiba & Paiva, 2016Hashiba, L., & Paiva, E. L. (2016). Incorporating sustainability in the new product development process: An analysis based on the resource-based view. BASE-Revista de Administração e Contabilidade da Unisinos, 13(3), 188-199. doi:10.4013/base.2016.133.01
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). No nível concorrencial, a empresa influencia fortemente sua rede de fornecedores com sua orientação estratégia de sustentabilidade. Ao mesmo tempo, alguns fornecedores de produtos naturais, como comunidades que vivem em regiões amazônicas, também influenciam a empresa com conhecimentos específicos sobre produtos e componentes locais. No nível macro, a empresa além de atender à legislação ambiental também se antecipa a tendências futuras, como a eliminação de testes de produtos com animais. Portanto, a empresa desenvolve ações na área de operações que continuamente dão suporte à sua estratégia de negócio, sendo assim caracterizada como internamente competitiva.

A Renovação Holística (Holistic Renewal) pressupõe a aprendizagem coletiva entre os diferentes níveis da empresa, ao invés da orientação notadamente top-down da Renovação Hierárquica. Há neste caso uma renovação cíclica que abrange os vários níveis do negócio desenvolvida entre períodos de estabilidade e renovação. Aproxima-se assim do conceito de dynamic capabilities (Teece & Pisano, 1994Teece, D., & Pisano, G. (1994). The dynamic capabilities of firms: An introduction. Industrial and Corporate Change, 3(3), 537-556. doi:10.1093/icc/3.3.537-a
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). Nesta situação, é característica a proatividade das empresas em relação à mudança de suas operações, com desenvolvimento e aprimoramento constante de suas competências. Simultaneamente se combinam os processos de Explotation e Exploration (Kortman et al., 2014Kortmann, S., Gelhard, C., Zimmermann, C., & Piller, F. T. (2014). Linking strategic flexibility and operational efficiency: The mediating role of ambidextrous operational capabilities. Journal of Operations Management, 32(7-8), 475-490. doi:10.1016/j.jom.2014.09.007
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). A empresa é capaz de criar novos padrões competitivos e estes levam muitas vezes a mudanças no ambiente competitivo, ou seja, fornecedores, consumidores e competidores são influenciados por novas formas de competir criadas pela empresa.

De acordo com Huygens et al. (2001)Huygens, M., Bosch, F. A. Van Den, Volberda, H. W., & Baden-Fuller, C. (2001). Co-evolution of firm capabilities and industry competition: Investigating the music industry, 1877-1997. Organization Studies, 22(6), 971-1011., as empresas mais competitivas continuamente se antecipam no desenvolvimento de novas competências e formas de competir, ao passo que suas competidoras tentarão replicar estas competências a partir de tecnologias disponíveis, se estas forem identificadas como capazes de criar vantagem competitiva. Nesta situação, a possibilidade de busca constante de paridade competitiva constante pode levar à rápida erosão de vantagens competitivas criadas (Lewin & Volberda, 1999Lewin, A., & Volberda, H. (1999). Prolegomena on coevolution: A framework for research on strategy and new organizational forms. Organization Science, 10(5), 519-534.).

Um exemplo presente para este caso é a empresa Amazon, que vem revolucionando o varejo há décadas. A empresa foi pioneira no comércio eletrônico e ocasionou profundas mudanças em vários setores, inicialmente no segmento de livros. Redes tradicionais de livrarias têm enfrentado dificuldades crescentes até mesmo no Brasil pelas mudanças profundas no mercado editorial. A Amazon conseguiu por meio do comércio eletrônico aliar variedade com preços competitivos. Com o tempo, assumiu as operações de distribuição e de logística e ampliou seus negócios para uma grande gama de produtos, como eletrodomésticos, roupas e utensílios domésticos. Com centros de distribuição altamente automatizados, se antecipou às tendências do seu setor e alcançou além de variedade e de preço competitivo, entregas mais rápidas e mais confiáveis. A constante interação com seu ambiente competitivo e a alavancagem a partir de seus recursos internos tem levado a empresa a buscar atender seu consumidor, expandir sua rede de fornecedores e parceiros. A empresa, há anos sustenta uma posição de destaque no comércio eletrônico. A automação no varejo é seu mais recente movimento competitivo. Assim, a empresa ao revolucionar o comércio eletrônico, se tornou referência às demais empresas de seu segmento e de outros também. No início de suas operações no Brasil, a legislação tributária local foi reinterpretada quanto à geração do imposto para se adequar ao novo modelo de negócios em expansão à época. Deste modo, vemos que a empresa cria novas formas de competir que influenciam tanto o nível concorrencial (meso) como o nível institucional (macro), criando um processo contínuo de criação e ajuste de suas competências e operações.

DISCUSSÃO

Há situações intermediárias entre os tipos descritos? Os exemplos utilizados para cada tipo de coevolução foram descritos sob um enfoque weberiano de modelos ideais. Entretanto, mesmo nestes casos há características que podem estar mais ou menos próximas de cada tipo. Deste modo, uma empresa ou mesmo um setor podem apresentar características intermediárias entre um tipo de coevolução e outro.

Empresas como a espanhola Zara parecem representar tal situação. A empresa apresenta várias características que a aproximam dos dois últimos tipos de coevolução. Desenvolveu operações integradas entre seu departamento de design, sua rede de lojas próprias e seus centros de distribuição com alto nível de automação, aliando assim rápidas respostas ao mercado com níveis baixos de estoques. Portanto, várias mudanças nas suas operações foram influenciadas pelos níveis nível micro e meso, que construíram e alteraram suas competências ao longo de décadas. Ao mesmo tempo, a empresa tem sido acusada de utilização ainda que indiretamente de mão-de-obra escrava em fornecedores de segunda ordem. As pressões da legislação trabalhista e dos consumidores em seus principais mercados traz elementos dos tipos mais primários de coevolução, caracterizados especialmente pela desconexão da empresa com os níveis macro do ambiente. Ainda que altamente competitiva, a empresa pode fragilizar sua imagem e consequentemente o negócio, se ações futuras não eliminarem tais problemas. Houve movimentos de boicote à marca em redes sociais quando tais problemas vieram à tona. Empresas menos suscetíveis a alterar suas operações em situações como esta ou que ignoram avanços tecnológicos presentes, representa a perda de competitividade no médio e longo prazos.

CONCLUSÕES

A melhor compreensão do fenômeno acerca das mudanças em operações permite que a pesquisa em Gestão de Operações avance para uma perspectiva mais próxima do "mundo real". O olhar de sistema fechado ou apenas de produtividade tem limitado historicamente a pesquisa na área e principalmente a interface com outras áreas de conhecimento. Deste modo, aliando-se um olhar mais amplo em operações com métodos de pesquisa avançados, como a abordagem de coevolução e ambidestria permitem, criam-se condições para o desenvolvimento de pesquisas capazes de combinar rigor científico com relevância acadêmica e prática, o que é crescentemente importante.

Os tipos de coevolução apresentados ilustram como as empresas modificam suas operações, especialmente a partir de movimentos de Exploration, ou seja, na busca de construção de competências futuras, e de Explotation, neste caso, para reforço das competências já existentes.

Resumidamente, empresas ou setores próximos ao primeiro tipo de coevolução possuem pouca conexão com o ambiente externo, com ênfase notada em Explotation de seus recursos. Esta orientação pode acarretar sérios problemas de competividade, se considerarmos a desconexão com novas tecnologias, ou seja, no nível meso (concorrencial), ou até mesmo desconexão com questões legais e éticas (nível macro ou institucional). Nos níveis mais avançados, há um processo dinâmico entre os três níveis, com crescente importância de processos de Exploration, ou seja, de busca de antecipação às tendências futuras. A empresa cria novas formas de competir e influencia seu setor industrial ou mesmo outras indústrias. Ao mesmo tempo, a presença simultânea nos tipos mais avançados de ações de Explotation, permite à empresa responder rapidamente aos avanços do mercado e às demandas e pressões do ambiente institucional.

Por fim, a abordagem de coevolução insere uma visão dinâmica no processo de mudança em operações. Assim, enriquece o entendimento do fenômeno e permite pesquisas que dialoguem mais diretamente com outras áreas de pesquisa e com questões mais aplicadas.

  • Artigo convidado
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REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2019
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