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Democracia vs. eficiência: como alcançar equilíbrio em tempo de crise financeira

Democracia vs. eficiencia: como buscar un equilibrio en tiempos de crisis financiera

Resumo

A administração pública é forçada a encontrar um equilíbrio entre eficiência e democracia na definição da sua agenda e curso de ação. Uma das características da administração pública é que todas as decisões devem refletir valores democráticos, para além de serem eficientes. No entanto, a reforma administrativa, motivada por dificuldades financeiras, tende a destacar a importância do desempenho financeiro, em detrimento dos aspetos democráticos nas políticas de gestão pública. Esta pesquisa visa analisar a relação e tensão entre a eficiência e a democracia à luz da mais recente crise financeira global. O trabalho utiliza uma abordagem quantitativa e recolhe dados de governos locais portugueses para testar o argumento de uma relação linear inversa de desempenho financeiro e procedimentos democráticos. Os resultados confirmam o argumento de uma relação inversa, definida por Waldo (1948). Adicionalmente, os resultados também permitem concluir que a crise financeira evidenciou o efeito negativo dos procedimentos democráticos no desempenho financeiro.

Palavras-chave:
democracia; crise financeira; governos locais

Resumen

La administración pública se ve obligada, en el decurso de su acción, a encontrar un equilibrio entre la eficiencia y la democrácia en la definición de su agenda y curso de la acción. Una de las características de la administración pública es que, además de ser eficiente, todas las decisiones deben reflejar los valores democráticos. Sin embargo, la reforma administrativa, motivada por el estrés financiero, tiende a poner de relieve la importancia de los resultados financieros, pasando por alto los aspectos democráticos y políticos de la gestión pública. Esta investigación busca analizar la relación y la tensión entre la eficiencia y la democracia en el decurso de la reciente crisis financiera global. El trabajo utiliza un enfoque cuantitativo y recoge datos de los gobiernos locales portugueses para poner a prueba el argumento de una relación lineal inversa entre el rendimiento financiero y los procedimientos democráticos. Los hallazgos confirman el argumento de Waldo (1948) de una relación inversa, mientras que la evidencia reunida muestra que la crisis financiera incrementó el efecto negativo de los procedimientos democráticos en el desempeño financiero.

Palabras clave:
democracia; crisis financiera; gobiernos locales

Abstract

Public Administration is forced to strike a balance between efficiency and democracy in defining its agenda and course of action. One of the characteristics of Public Administration is that all decisions must reflect democratic values, in addition to being efficient. Nevertheless, administrative reform, motivated by financial stress, tends to highlight the importance of financial performance while overlooking the democratic and political aspects of public management. This research seeks to analyze the link and tension between efficiency and democracy in light of the latest global financial crisis. The paper uses a quantitative approach and collects data from Portuguese local governments to test the argument of an inverse linear relationship between financial performance and democratic procedures. Findings confirm Waldo’s argument (1948) of an inverse relationship while the evidence gathered shows that the financial crisis increased the negative effect of democratic procedures on financial performance.

Keywords:
democracy; financial crises; local governments

1. Introdução

Na sequência de uma profunda crise financeira, a reforma da nova gestão pública centrou-se na utilização de mecanismos de mercado para a prestação do mercado; na fragmentação de unidades públicas; na pressão sobre a eficiência e bem como sobre a adoção de estilos de gestão do setor privado (Hood, 1991HOOD, Christopher. A public management for all seasons? Public Administration, v. 69, n. 1, p. 3-19, 1991.). Não se prestou muita atenção às questões políticas relacionadas com o reforço da qualidade da democracia ou com a garantia do envolvimento do cidadão na administração pública. Uma das razões apontadas para esse foco financeiro é o fato de a reforma ter de se concentrar nos aspectos que requerem imediata ação por parte dos atores políticos. Nos anos 1980, como na recente crise da dívida soberana, os aspetos políticos da qualidade da democracia não foram avaliados como estando em risco. Assim, as mudanças concentraram-se no desempenho financeiro e na forma como isso poderia ser melhorado pelos governos. Além disso, as iniciativas de reforma pareciam separar os valores políticos do processo decisório. O argumento de Waldo (1948WALDO, Dwight; MILLER, Hugh. The administrative state. Londres: Transaction Publishers, 1948.) de um trade-off entre democracia e eficiência apoiou essa opção. O entendimento é que a agenda política e os procedimentos democráticos podem impor limitações à capacidade de a gestão implementar medidas de forma eficiente (Svara, 2008SVARA, James. Beyond dichotomy: Dwight Waldo and the intertwined politics-administration relationship. Public Administration Review, v. 68, n. 1, p. 46-52, 2008.). Waldo acredita numa relação negativa e linear entre eficiência e democracia, explicada pela impossibilidade de conciliar duas visões diferentes da administração pública: a primeira, tirada de uma perspetiva gestionária, baseia-se na primazia de um governo eficiente por meio do poder discricionário dos burocratas, da sua experiência e o uso de soluções de mercado; a segunda, mais próxima da ciência política, baseia-se na primazia da democracia, da legitimidade e da participação cívica. Dollery (2010DOLLERY, Brian. Are there tensions between democracy and efficiency in local government? A conceptual note on the structural reform debate. Urban Policy and Research, v. 28, n. 1, p. 117-123, 2010.) e Overeem (2008OVEREEM, Patrick. Beyond heterodoxy: Dwight Waldo and the politics-administration dichotomy. Public Administration Review, v. 68, n. 1, p. 36-45, 2008.) afirmam que esse é um confronto recorrente na literatura, embora retratado sob diferentes formas. Já foi designado de tensão entre conhecimento técnico e vontade popular, apelidado de poder discricionário versus legitimidade, de uma altercação entre burocracia e cultura cívica e até mesmo de um trade-off entre vozes locais, diversidade e responsabilidade política contra uma preocupação primordial com a eficiência estrutural. O argumento clássico de Waldo, de uma relação negativa, tem sido testado em contextos diferentes, embora com resultados inconsistentes (Gasiorowski, 2000GASIOROWSKI, Mark. Democracy and macroeconomic performance in underdeveloped countries: an empirical analysis. Comparative Political Studies, v. 33, n. 3, p. 319-349, 2000.; Skelcher, 2007SKELCHER, Chris. Does democracy matter? A transatlantic research design on democratic performance and special purpose governments. Journal of Public Administration Research and Theory, v. 17, n. 1, p. 61-76, 2007.; Vigoda, 2002VIGODA, Eran. Administrative agents of democracy? A structural equation modeling of the relationship between public-sector performance and citizenship involvement. Journal of Public Administration Research and Theory, v. 12, n. 2, p. 241-272, 2002.).

Recentemente, vários estudos adotaram uma abordagem alternativa e argumentaram exatamente o oposto da hipótese de Waldo. Norris (2012NORRIS, Pippa. Making democratic governance work. Nova York: Cambridge University Press, 2012.), baseando-se na teoria unificada, afirmou que a governação democrática pode impulsionar a prosperidade, bem-estar e paz nos países em desenvolvimento. Em nível local, alguns estudos encontraram evidências de uma relação positiva entre a democracia local e a eficiência (Aulich, 2005AULICH, Chris. Australia: still a tale of Cinderela. In: DENTERS, Bas; ROSE, Lawrence (Ed.). Comparing local governance: trends and developments. Nova York: Palgrave, 2005. p. 288-310.; Boyne, 1992BOYNE, George A. Local-government structure and performance - lessons from America. Public Administration, v. 70, n. 3, p. 333-357, 1992.; Dollery, 2010DOLLERY, Brian. Are there tensions between democracy and efficiency in local government? A conceptual note on the structural reform debate. Urban Policy and Research, v. 28, n. 1, p. 117-123, 2010.).

O objetivo principal deste trabalho é esclarecer a relação entre o desempenho financeiro e a qualidade da democracia testando ambas as hipóteses de relação linear positiva e negativa. O artigo procura também medir os efeitos de iniciativas gestionárias recentes sobre a relação entre democracia e eficiência. Este último objetivo foi motivado pela situação financeira portuguesa, que levou o governo a implementar uma agenda de reformas de acordo com o memorando de entendimento assinado com o Fundo Monetário Internacional (FMI), União Europeia (UE) e Banco Central Europeu (BCE): troika.

A contribuição do artigo para a literatura situa-se no confronto da abordagem alternativa ao argumento clássico de Waldo da ligação proporcionalmente inversa da democracia-eficiência. O artigo procura aproximar a literatura em dois campos de especialização: gestão e ciência política.

Esta pesquisa emprega dados de governos municipais portugueses em 2005-12 e constrói um índice de desempenho financeiro, utilizado como proxy para a eficiência, e outro índice que mede a qualidade da democracia local. Usando esses índices, o artigo sugere que há uma relação linear negativa entre democracia e eficiência, confirmando o argumento de Waldo. Além disso, os resultados apontam para evidências de que as recentes iniciativas de reforma impostas pelo programa de assistência apenas servem para intensificar a relação negativa entre o desempenho financeiro e a qualidade da democracia.

Este artigo está organizado da seguinte forma. Em primeiro lugar, o artigo introduz a literatura sobre a ligação clássica entre democracia e eficiência. Em seguida, o artigo apresenta os argumentos para a eficiência democrática. A seção três discute a operacionalização da democracia e os índices de desempenho financeiro. A seção quatro descreve o contexto da pesquisa, seguido pela seção sobre os dados e métodos empregados na análise empírica. Os resultados são discutidos na seção seis. O artigo termina com as conclusões e implicações políticas desta pesquisa.

2. O trade-off clássico de Waldo

O argumento de Waldo pode ser resumido como identificando os principais inconvenientes dos procedimentos democráticos nos esforços de eficiência nas organizações públicas. Uma democracia de melhor qualidade pode ser alcançada aumentando a precisão da representação, envolvendo os cidadãos e encorajando um melhor ajuste entre a vontade dos cidadãos e as decisões políticas. Seguindo o argumento de Waldo, essa estratégia pode procurar uma maior integração, mais descentralização e propor um novo equilíbrio de poder de partilha com os cidadãos. No entanto, há, definitivamente, um risco de comprometer a capacidade de tomar decisões eficazes. Na verdade, a democracia é considerada como tendo pelo menos três inconvenientes para um processo eficiente de tomada de decisão: estratégias de pork barrel; rent-seeking; e ciclos políticos. Em primeiro lugar, o aumento da representação pode conduzir a uma situação em que os cidadãos possam cumprir plenamente suas preferências, o que pode ter consequências insuportáveis para a sustentabilidade financeira. Cada cidadão tende a priorizar suas preferências reivindicando sua importância sobre os outros. Cada um, usando uma estratégia de pork barrel, será levado a solicitar mais serviços públicos, aumentando os gastos globais, uma vez que eles irão internalizar parte do custo (Weingast, Shepsle e Johnsen, 1981WEINGAST, Barry; SHEPSLE, Kenneth; JOHNSEN, Christopher. The political economy of benefits and costs: A neoclassical approach to distributive politics. The Journal of Political Economy, v. 89, n. 4, p. 642-664, 1981.). Em segundo lugar, os funcionários eleitos são tradicionalmente definidos como agentes racionais que procuram implementar estratégias que garantam sua reeleição. Da mesma forma, as estratégias de procura de votos promovem a implementação da agenda política baseada em outros valores além dos econômicos. Como tal, os funcionários eleitos podem ter dificuldade em aprovar e cumprir as leis que impõem restrições a si mesmos e à sua base eleitoral, o que pode representar uma ameaça ao desempenho financeiro (Gasiorowski, 2000GASIOROWSKI, Mark. Democracy and macroeconomic performance in underdeveloped countries: an empirical analysis. Comparative Political Studies, v. 33, n. 3, p. 319-349, 2000.). Da mesma forma, a literatura aponta os argumentos clássicos dos ciclos políticos (Nordhaus, 1975NORDHAUS, William. The political business cycle. The Review of Economic Studies, v. 42, n. 2, p. 169-190, 1975.) e do mediano-eleitor (Downs, 1957DOWNS, Anthony. An economic theory of democracy. Nova York: Harper & Row. 1957.), nos quais os eleitos têm uma definição política de eficiência impulsionada pelo interesse próprio e gerem as variáveis econômicas e a situação financeira de modo a maximizar sua utilidade.

Despesas excessivas, níveis de impostos penosos e desconfiança dos funcionários eleitos acentuam a necessidade de se concentrar na eficiência dos serviços públicos (Pierre, 2009PIERRE, Jon. Reinventing governance, reinventing democracy? Policy & Politics, v. 37, n. 4, p. 591-609, 2009.). A eficiência é provavelmente um dos conceitos mais bem explorados e bem definidos da literatura de gestão. Ele descreve até que ponto o esforço e o custo são aproveitados para uma tarefa ou propósito pretendido. A eficiência também é definida pela relação mais adequada entre os resultados e os recursos necessários para obtê-los. A busca pela eficiência tem sido o cerne da maioria dos trabalhos tradicionais sobre ciências administrativas desde a sua criação. As crises econômicas e a crescente dificuldade de controle das despesas públicas aumentaram o interesse pela questão da eficiência do setor público. No entanto, mais ênfase é colocada no desempenho financeiro, redução de custos e fazer o melhor uso do dinheiro dos contribuintes (Cope, 1997COPE, Glen. Bureaucratic reform and issues of political responsiveness. Journal of Public Administration Research and Theory, v. 7, n. 3, p. 461-471, 1997.; Hood e Dixion, 2013HOOD, Christopher; DIXION, Ruth. A model of cost-cutting in government? The great management revolution in UK central government reconsidered. Public Administration, v. 91, n. 1, p. 114-134, 2013.; Scorsone e Plerhoples, 2010SCORSONE, Eric; PLERHOPLES, Christiana. Fiscal stress and cutback management amongst state and local governments. State and Local Government Review, v. 42, n. 2, p. 176-187, 2010.). A agenda de reformas elaborada na sequência da crise das dívidas soberanas foi dominada pelo desempenho financeiro, pela centralização e por camadas suplementares de controlo das despesas públicas. O objetivo foi resgatar os governos do estresse fiscal e impedir que as entidades públicas fossem à falência. A abordagem gestionária dominou a agenda, reduzindo a importância de uma atitude mais democrática, já que acreditava que não seria possível fazer reduções significativas sem que algumas restrições fossem colocadas sobre a capacidade dos moradores de participar dessas decisões.

3. Eficiência democrática

Parte da literatura usa uma perspetiva de ciência política para construir um argumento alternativo ao de Waldo. A ideia central é que a descentralização, o envolvimento cívico, a cidadania ativa e uma melhor representação dos cidadãos não só são capazes de preservar a legitimidade da ação política, mas também de melhorar o desempenho e a eficiência do serviço público. A ênfase no desempenho financeiro aproxima a gestão pública do estilo de gestão privado, que obviamente tem as suas vantagens, mas afasta-a perigosamente da singularidade e do respeito pelos valores democráticos que supostamente deve assegurar. É fato que nenhuma democracia pode sobreviver se o governo não tiver a capacidade de fornecer aos cidadãos os serviços de que precisam. No entanto, nenhuma expectativa de prosperidade é sustentável se despojada de legitimidade (Thomas e Memon, 2007THOMAS, Steven; MEMON, Ali. New Zealand local government at the crossroads? Reflections on the recent local government reforms. Urban Policy and Research, v. 25, n. 2, p. 171-185, 2007.). Espera-se, portanto, que os governos locais equilibrem o trade-off entre o desempenho financeiro e os valores democráticos. Norris (2012NORRIS, Pippa. Making democratic governance work. Nova York: Cambridge University Press, 2012.) centra-se no argumento da eficiência democrática, uma combinação de competição política e mecanismos de participação cívica com pleno acesso à informação que leva à transparência e à responsabilização, o que por sua vez promove a prestação de serviços precisos e a sustentabilidade financeira.

Esta abordagem desacredita argumentos anteriores que suportam os benefícios das decisões gestionárias sem levar em conta a agenda política. Os interesses particulares podem dominar as iniciativas de reforma, uma vez que o escrutínio popular é incapaz de participar no processo de tomada de decisão. Os procedimentos democráticos aumentam a responsabilização, a transparência e conferem legitimidade às decisões públicas, o que é particularmente importante quando as decisões públicas dizem respeito a medidas restritivas. Dar poderes discricionários excessivos aos burocratas permite-lhes tomar decisões, com um nível reduzido de responsabilidade. Podemos acabar com uma solução perfeita, tecnicamente falando, mas que é completamente desprovida de qualquer valor democrático. Além disso, sem qualquer controlo democrático, existe o risco adicional de que as decisões burocráticas sejam desviadas do interesse público e abordem interesses particulares. Os teóricos da escolha pública lidaram com o problema do controlo burocrático por meio do uso de mecanismos de mercado (Pierre, 2009PIERRE, Jon. Reinventing governance, reinventing democracy? Policy & Politics, v. 37, n. 4, p. 591-609, 2009.).

A democracia é um aspeto essencial do governo. Fornece legitimidade aos escolhidos para agir em nome da comunidade na procura do bem comum e garante um sistema pelo qual os principais atores são responsabilizados por suas decisões. Não há consenso sobre a definição de democracia, ou sobre a forma como ela pode ser medida entre acadêmicos. De acordo com a definição de Schumpeter (1976SCHUMPETER, Joseph. Capitalism, socialism and democracy. Londres: Allen and Unwin, 1976.), a democracia é um arranjo institucional de processos de tomada de decisão coletiva, pelo qual os indivíduos adquirem a capacidade de decidir mediante um mecanismo competitivo de eleição. Essa compreensão da democracia é relativamente simples e fácil de medir, uma vez que se baseia apenas num mecanismo eleitoral. No entanto, a compreensão da democracia mudou ao longo dos anos. O mero fato de se ter um processo eleitoral não é suficiente para garantir padrões mais elevados de democracia (Beetham, 1999BEETHAM, David. Democracy and human rights. Cambridge: Polity Press, 1999.). A definição da democracia como um sistema no qual o poder do povo age em favor do povo foi substituída por uma situação com o poder formal do povo, onde as iniciativas de envolvimento cívico com a comunidade foram usadas para alvejar problemas e resolvê-los (Haus e Klausen, 2011HAUS, Michael; ERLING KLAUSEN, Jan. Urban leadership and community involvement: ingredients for good governance? Urban Affairs Review, v. 47, n. 2, p. 256-279, 2011.). A legitimidade para manter um cargo político separa-se da legitimidade de usar seu poder. O primeiro é adquirido por meio do processo eleitoral, enquanto o segundo é um processo constante de envolvimento cívico.

Três resultados positivos podem ser obtidos a partir dos efeitos da democracia sobre a eficiência. Primeiro, um sistema democrático promove um mecanismo de representação das necessidades dos cidadãos. Numa democracia indireta, a representação precisa das preferências dos constituintes é determinada pela veracidade do mecanismo e da estrutura da governação (Copus, 2003COPUS, Colin. Re-engaging citizens and councils: The importance of the councillor to enhanced citizen involvement. Local Government Studies, v. 29, n. 2, p. 32-51, 2003.). Em segundo lugar, a competição política obriga os políticos a obter um bom desempenho, uma vez que correm o risco de serem punidos com uma derrota eleitoral. Também melhora a disseminação de informações mediante vários agentes, evitando situações de informação assimétrica. Por fim, a democracia traz transparência e responsabilidade para a tomada de decisões políticas e sua implementação. A responsabilização tornará os funcionários eleitos mais responsivos à procura dos cidadãos, mesmo usando uma perspetiva de procura de voto (Norris, 2012NORRIS, Pippa. Making democratic governance work. Nova York: Cambridge University Press, 2012.), enquanto a transparência dá aos cidadãos um melhor julgamento sobre as ações políticas. Adam e colaboradores (2011ADAM, Adam; DELIS, Manthos; KAMMAS, Pantelis. Are democratic governments more efficient? European Journal of Political Economy, v. 27, n. 1, p. 75-86, 2011.) argumentam que o envolvimento cívico e a transparência governamental também proporcionam um melhor controlo do oportunismo político aumentando a folga orçamental na prestação de serviços.

4. Hipóteses do trabalho

A revisão da literatura sugere dois argumentos opostos. Aqueles que procuram e defendem valores democráticos afirmam que as iniciativas de reforma que impõem austeridade e restrições ao bem-estar das pessoas devem ter uma base sólida de legitimidade. Assim, asseguramos transparência e facilitamos a aceitação pública. Por outro lado, o argumento oposto afirma que algumas medidas devem ser decididas dentro de um círculo menor. A lógica da política tende a afastar-se de cursos de ação impopulares, mas necessários. Consequentemente, os esforços para melhorar o melhor desempenho financeiro podem ter avaliação negativa em termos políticos, o que faz que sejam menos apetecíveis por agentes políticos que pretendam maximizar suas possibilidades de eleição.

O artigo procura testar essas duas hipóteses opostas. Uma está de acordo com o argumento do trade-off de Waldo:

H1: Existe uma relação linear negativa entre democracia e desempenho financeiro; o aumento do nível de democracia reduzirá os níveis de desempenho financeiro.

A hipótese baseia-se no pressuposto de que aproximar o processo de tomada de decisão à esfera política aumentará os riscos de influência ou troca de favores pelo voto. Além disso, a divulgação pública de uma decisão antes da sua implementação pode provocar oposição política que levará a custos de negociação e estratégias de pork barrel.

A hipótese alternativa defende um argumento em linha com a ideia de coexistência entre democracia e eficiência:

H2: Há uma relação positiva linear entre democracia e desempenho financeiro; o aumento do nível de democracia aumentará os níveis de desempenho financeiro.

Nesse caso, os procedimentos democráticos aumentam a responsabilidade, a responsabilidade e a transparência. A decisão dos burocratas será mais próxima dos desejos dos cidadãos, o que minimizará o risco de estratégias de lobby.

4.1 Índice de desempenho financeiro

Várias publicações acadêmicas concentram-se na avaliação de uma medida correta da eficiência do setor público e enfrentam vários problemas relacionados com a sua aplicação. As origens do conceito baseiam-se no setor privado, com base na necessidade de encontrar um rácio entre outputs e inputs (Afonso e Fernandes, 2008AFONSO, António; FERNANDES, Sónia. Assessing and explaining the relative efficiency of local government. The Journal of Socio-Economics, v. 37, n. 5, p. 1946-1979, 2008.). Os outputs do serviço público são raramente medidos em preços que refletem os custos de seus consumos, uma vez que o mercado não consegue fixar preços para serviços sem fins lucrativos. Apesar dessa desvantagem, algumas técnicas são usadas para medir a eficiência do serviço sem exigir a definição de pesos. As estimativas não paramétricas podem gerar índices de eficiência, baseados em uma fronteira da função de produção, com base nas distâncias relativas de observação ineficiente da fronteira (Afonso e Fernandes, 2008; Moore, Nolan e Segal, 2005MOORE, Adrian; NOLAN, James; SEGAL, Geoffrey. Putting out the trash: measuring municipal service efficiency in U.S. cities. Urban Affairs Review, v. 41, n. 2, p. 237-259, 2005.).

Neste artigo, usamos o desempenho financeiro como uma proxy para a eficiência do governo local. Reconhecemos a diferença entre os dois conceitos, mas justificamos sua utilização por duas razões principais. Primeiro, encontramos muito pouco consenso na literatura sobre a medida da eficiência. Em segundo lugar, e provavelmente mais importante, pensamos que as iniciativas de reforma implementadas em países como Portugal, Grécia e Irlanda centraram-se em questões financeiras, políticas de redução da despesa e medidas de austeridade. O lema é “fazer menos com menos’, sendo o desempenho financeiro um conceito-chave que capta o objetivo específico e os esforços das iniciativas gestionárias.

O desempenho financeiro dos governos locais será avaliado com base em dois elementos: capacidade do governo e produtividade. Capacidade do governo significa sua capacidade de assegurar raízes institucionais e serviços públicos (Kaufmann, Kraay e Mastruzzi, 2010KAUFMANN, Daniel; KRAAY, Aart; MASTRUZZI, Massimo. The worldwide governance indicators: methodology and analytical issues. World Bank Policy Research Working Paper, n. 5430, 2010.; Stiglitz, 1989STIGLITZ, Joseph. The economic role of the State. Londres: Wiley-Blackwell, 1989.). As crises financeiras desencadeiam a entropia no sistema administrativo, o que compromete sua capacidade. Os governos tornam-se incapazes de cumprir todas as exigências do serviço público e começam a repensar o âmbito e o alcance do governo e optar por uma política de gestão de redução e a racionalização bem como a adoção de processos empresariais (Scorsone e Plerhoples, 2010SCORSONE, Eric; PLERHOPLES, Christiana. Fiscal stress and cutback management amongst state and local governments. State and Local Government Review, v. 42, n. 2, p. 176-187, 2010.). O outro elemento do desempenho financeiro é a produtividade do setor público. Isso capta o valor agregado dos burocratas para o serviço público e procura avaliar até que ponto a estrutura governamental se encaixa no contexto em que opera.

4.2 Índice da qualidade da democracia local

Existem várias maneiras de calcular índices de democracia: o Freedom House Index (FHI); O Índice de Democracia Eficaz (EDI); O Índice de Democracia e Política IV da Economist Intelligence Unit.

FHI (House, 2011HOUSE, Freedom. Freedom in the World 2011. Rowman & Littlefield Pub Incorporated, 2011.) é amplamente utilizado entre os acadêmicos para medir a democracia. A FHI está intimamente ligada a uma concepção de democracia baseada no processo eleitoral e na presença de instituições democráticas (Knutsen, 2010KNUTSEN, Carl. Measuring effective democracy. International Political Science Review, v. 31, n. 2, p. 109-128, 2010.). Classifica os países por liberdades civis e direitos políticos. Por outro lado, EDI salienta a importância de medir a democracia substantiva, ou seja, o funcionamento das instituições democráticas (Inglehart e Welzel, 2005INGLEHART, Ronald; WELZEL, Christian. Modernization, cultural change, and democracy. Nova York: Cambridge University Press, 2005.). O Índice de Democracia da Economist Intelligence Unit (Economist, 2010THE ECONOMIST. The Economist intelligence unit’s index of democracy 2010. Disponível em: <Disponível em: http://graphics.eiu.com/PDF/Democracy_Index_2010_web.pdf >. Acesso em: 26 dez. 2012.
http://graphics.eiu.com/PDF/Democracy_In...
) classifica a democracia pelo processo eleitoral e pelo pluralismo; participação política; cultura política democrática; e liberdades civis. O Índice de Democracia e Política IV estabelece elementos de restrição executiva e de recrutamento para determinar o nível de democracia.

No entanto, esses índices foram concebidos para serem utilizados em nível nacional. Adaptá-los ao nível local deve considerar as responsabilidades atribuídas a esse nível de governo, bem como suas limitações e diferenças. Para os propósitos do artigo, construímos um índice que reflete a realidade do governo local. O índice de qualidade da democracia local será calculado com base em dois elementos: competição eleitoral e precisão de representação.

A competição eleitoral e o pluralismo são os check and balances que responsabilizam os funcionários por suas ações. A concorrência aumenta a responsabilidade, a transparência e a preocupação com as necessidades dos cidadãos. Uma eleição extremamente competitiva encorajará os funcionários a implementar estratégias de busca de votos para evitar a perda das próximas eleições. Como resultado, os eleitos, impulsionados por seus instintos básicos de sobrevivência, fornecerão propostas mais adequadas aos interesses dos cidadãos para obter seu voto (Downs, 1957DOWNS, Anthony. An economic theory of democracy. Nova York: Harper & Row. 1957.).

Para além da ênfase nas necessidades dos cidadãos, a concorrência também pode aumentar a transparência. Uma vitória estreita, onde a diferença de votos entre vencedor e perdedor é mínima, pode motivar ambos os lados. Na procura do apoio popular, o vencedor procurará apresentar-se como confiável para garantir sua reeleição e uma vitória maior. O partido derrotado, encorajado por um grande número de votos, aumentará sua supervisão dos eleitos para torná-los responsáveis por suas ações. Em última análise, podemos comparar o processo eleitoral a um mercado político: as escolhas dos cidadãos determinarão quem ganha ou perde. Assim, quanto mais acérrima é a disputa eleitoral, melhor para os cidadãos. Quando a intensidade da competição diminui, a responsabilidade dos eleitos em relação aos cidadãos diminui, o que significa que eles se tornam mais dependentes de sua força eleitoral e legitimidade.

Juntamente com a competitividade, o pluralismo desempenha um papel significativo na intensidade da democracia. O pluralismo nos órgãos dirigentes assegura a representação precisa das preferências dos constituintes (Copus, 2003COPUS, Colin. Re-engaging citizens and councils: The importance of the councillor to enhanced citizen involvement. Local Government Studies, v. 29, n. 2, p. 32-51, 2003.). O foco excessivo nas preferências do eleitor mediano pode resultar numa tirania das maiorias (Weimer e Vining, 2010WEIMER, David; VINING, Aidan. Policy analysis. Nova Jersey: Longman Pub Group, 2010.). Nessa situação, os mecanismos democráticos indiretos deixarão de cumprir sua missão de representar a confiança e a soberania do povo.

5. Contexto de análise

A recente crise das dívidas soberanas colocou os governos locais sob pressão, comprometendo sua capacidade de cumprir suas responsabilidades e promover o bem-estar dos eleitores. Portanto, os municípios sofreram uma forte pressão para aumentar as receitas e obter sustentabilidade financeira a qualquer custo. Além disso, o ambiente externo caracterizou-se por condições adversas, motivadas pela decisão do governo central em recorrer ao mecanismo de assistência financeira internacional. O Memorando de Entendimento com a Troika prevê um conjunto de reformas para melhorar a capacidade financeira e maximizar as receitas. Todas as reformas começaram no final de 2010 e atingiram o pico na eleição de 2012, que estabeleceu um novo quadro de governação, que entrou em vigor no início de 2013.

As agendas de reforma impostas pelos governos locais podem ser classificadas em três categorias principais: mais centralização; maximização da receita; redução da representação popular.

A centralização foi expressa mediante perspetivas organizacionais e financeiras. O governo central restringiu a liberdade de auto-organização do município. Desde 1978, os presidentes municipais foram autorizados a organizar seus próprios municípios. Os serviços municipais e os respetivos departamentos foram criados, fundidos e eliminados sempre que o município considerasse adequado. Como resultado da reforma, o governo central estabeleceu uma grande restrição à capacidade dos governos locais de se autogovernarem. Os departamentos são agora uma expressão direta da relação com o tamanho da população da jurisdição. O objetivo geral é o dotar os municípios de uma estrutura ótima de serviços municipais para os diferentes tipos de configuração demográfica. Em termos financeiros, ocorreram alterações na lei das finanças locais. A maior parte do orçamento municipal é apoiada por uma subvenção obtida a partir das receitas fiscais recolhidas pelo governo central. A lei das finanças locais regula todas as receitas municipais, concentrando-se principalmente na regulamentação das subvenções do governo central ao governo local. É criado um conselho central composto por vários ministros, incluindo o ministro das Finanças e representantes do governo local, e é autorizado, se necessário, a anular a lei, reduzir as subvenções do governo local se necessário para equilibrar o orçamento nacional. Para além deste conselho de supervisão, a mesma lei estabelece duas formas adicionais de apoio financeiro, apenas para ser utilizado em caso de estresse fiscal: reestruturação financeira municipal e reequilíbrio financeiro municipal. Em ambos os casos, os indicadores financeiros desencadeiam um mecanismo pelo qual deve ser elaborado um plano de contenção que especifique todas as medidas a adotar para assegurar a sustentabilidade financeira a longo prazo. Durante esse período, os eleitos perdem parte de sua liberdade e autonomia em relação ao governo central. A ideia é garantir um aval financeiro em troca da perda de autonomia e submissão a um plano de reestruturação financeira.

A maximização da receita é sentida principalmente na gestão de empresas municipais. Criados como entidades locais com personalidade jurídica com autonomia administrativa, financeira e patrimonial, são regulados pela lei das empresas públicas e pelo código das sociedades comerciais. Apoiado pela tendência internacional de externalização dos serviços e agenciamento, o número de empresas municipais nunca parou de crescer. No entanto, as iniciativas de reforma mudaram esse status. Os municípios deixaram de ter o poder de decidir o que queriam para manter ou eliminar essas entidades. Como resultado dos altos níveis de endividamento, as empresas municipais rapidamente se tornaram um bode expiatório para a má situação financeira dos governos locais. Hoje em dia, foi estabelecido um conjunto de indicadores financeiros (endividamento, lucro líquido, dependência financeira municipal) que são aplicados a todas as empresas municipais. O incumprimento dessas medidas conduziu a um encerramento obrigatório daquele governo local, num processo diretamente desencadeado pelo ministro das Finanças.

Por fim, as iniciativas de reforma também reduziram a representação popular. Cada jurisdição municipal é dividida em jurisdições menores conhecidas como freguesias. Essas entidades têm dois papéis políticos específicos. A primeira é dar voz aos cidadãos, identificar suas necessidades e fornecer uma solução para seus problemas. Além disso, as freguesias desempenham um papel significativo no esquema de governação na estrutura dos municípios. Cada freguesia tem direito a ter um representante na assembleia municipal. Em média, os representantes da freguesia compreendem quase metade dessa assembleia. A reforma adotada pela troika reduziu o número de freguesias. Utilizou o argumento da fragmentação excessiva e suas consequências sobre a capacidade de promover a eficiência, argumentando que causou excesso de gastos. Os custos políticos de excluir representantes foram completamente ignorados na busca de melhorar a eficiência financeira.

6. Dados e métodos

Esta pesquisa aborda as seguintes questões de investigação: qual é a ligação entre desempenho financeiro e democracia no contexto do governo local em Portugal? Quais são os efeitos neste link motivados pela agenda de reformas implementada para lidar com a crise da dívida soberana? Para abordar as questões de pesquisa do artigo, utilizamos análise de dados de painel e regressão simples de OLS, e nossa base de dados abrange o período desde 2005. O conjunto de dados foi dividido em três períodos: um correspondente ao ciclo político de 2005-08; outra correspondente ao ciclo político de 2009-12; e, finalmente, de 2013. Antes de 2005, os municípios não utilizavam a contabilidade patrimonial para produzir informações financeiras, o que significava que era impossível calcular o Índice de Desempenho Financeiro utilizado no documento para o período 2001-04. Para cada ciclo, o artigo usa análise de dados de painel com efeitos aleatórios e calcula dois modelos. O primeiro é utilizado para testar a relação linear entre desempenho financeiro e democracia, enquanto o segundo testa a consistência do primeiro modelo, por meio da adição de variáveis de controlo que medem o contexto econômico de cada governo local. Uma vez que o último ciclo político inclui apenas um ano (2013), utilizamos a regressão OLS.

Os nossos modelos podem ser representados por:

Índice de desempenho financeiro= α + β1 (Índice da qualidade da democracia local) + μ{1}

Índice de desempenho financeiro = α+β1 (Índice da qualidade da democracia local) + β2 ln (População)+ β3 ln (Rendimento) + β4 (Densidade) + Tamanho + μ {2}

A análise empírica foi realizada em duas etapas sequenciais. Primeiro, calculamos o índice de desempenho financeiro e o índice de qualidade da democracia local. Em seguida, utilizamos técnicas econométricas para calcular modelos para três ciclos políticos. Em cada um deles, estimamos dois modelos: {1} {2}. Os modelos foram calculados para as 278 jurisdições do continente.

Ambos os índices foram construídos usando a mesma metodologia (Morris e McAlpin, 1982MORRIS, Morris; MCALPIN, Michelle. Measuring the condition of India’s poor. 1. ed. Nova Delhi: Humanities, 1982.). Para cada indicador, o papel estabelece o melhor e o pior valor de tal forma que todos os índices se tornem unidirecionais e possam ser combinados (Dholakia, 2005DHOLAKIA, Archana. Measuring fiscal performance of states: an alternative approach. Economic and Political Weekly, v. 30 p. 3421-3428, 2005.). Cada indicador é colocado em uma escala de 0 a 1, com 0 representando o pior resultado observado e 1 o melhor. Em seguida, os índices são devidamente ponderados. Para o propósito deste trabalho, todos os indicadores foram igualmente ponderados (0,5).

Para calcular ambos os índices, o papel utiliza os indicadores, estruturados da seguinte forma:

Quadro 1
Desempenho financeiro e o índice de qualidade da democracia local

6.1 Financial performance index

Os níveis de desempenho financeiro de cada governo local são medidos pela combinação de duas variáveis: capacidade do governo e produtividade. A capacidade do governo é uma medida do nível de endividamento municipal e da proporção das receitas próprias dos municípios. O argumento para usar o endividamento municipal como uma proxy para a capacidade do governo é o de que a agenda da reforma da troika concentrou-se na implementação de medidas para aumentar o rendimento e reduzir a dívida em todos os níveis de governo. O nível de endividamento fornece uma indicação clara do grau de (des)equilíbrio do município. O endividamento financeiro é estimado pela diferença entre passivos e ativos financeiros. A capacidade governativa também é estimada usando a proporção de receitas próprias geradas por cada município. Esse indicador fornece informações sobre a capacidade de cada município para maximizar as receitas usando sua estrutura, sem a necessidade de fundos do governo central. Ambos os indicadores são obtidos a partir de dados financeiros oficiais da Direção-Geral das Autarquias Locais.

O desempenho financeiro também é calculado usando a produtividade municipal. Este artigo utiliza dois tipos de produtividade: interna e externa. A produtividade interna é calculada pela relação entre o montante total do rendimento e o número de servidores públicos. Ela fornece uma estimativa do valor agregado contribuído por cada funcionário público e dá uma indicação da capacidade da organização de se ajustar à procura. A produtividade externa é obtida a partir da razão entre o lucro líquido e a população. Essa medida permite avaliar o valor acrescentado que o município proporciona à sua comunidade.

6.2 Índice da qualidade da democracia local

O índice da qualidade da democracia local é calculado com base em dois elementos: competição eleitoral e precisão da representação.

A competição eleitoral é medida com base em dois indicadores: diferença de votos entre os dois partidos com maior votação. Maior pressão competitiva sobre o eleito pode condicionar a ação deste para que se concentre mais nas preferências dos eleitores. Portanto, uma vitória mais curta poderá incentivar os agentes políticos a ser mais responsáveis perante seus eleitores. Outro indicador da competição eleitoral é a participação eleitoral. Um nível mais alto de participação é um bom indicador de uma disputa eleitoral. Geralmente, eleições competitivas tendem a atrair a atenção de mais constituintes, que respondem com maior participação.

A precisão da representação democrática também é avaliada mediante a utilização de dois indicadores: a fragmentação política e o número de freguesias. A fragmentação política é determinada pelo número de partidos políticos no concelho municipal. Argumenta-se que os órgãos governamentais com maior diversidade são capazes de representar melhor a variedade de preferência de uma comunidade. Os dados de todos os indicadores foram obtidos junto à Comissão Nacional de Eleições. Por fim, o artigo utiliza o número de freguesias por município como medida de representatividade. O objetivo deste nível de governo submunicipal é dar voz aos cidadãos e funcionar com escolas de democracia. Assim, mais freguesias asseguram uma representação mais precisa.

6.3 Variáveis de controlo

No segundo modelo estimado no trabalho, foram incluídas três variáveis de controlo: população, densidade populacional e rendimento. As variáveis de controlo são usadas como uma proxy para registrar o contexto econômico do governo local que de alguma forma interfere com seu nível de eficiência. Densidade populacional e tamanho da população são variáveis de controlo construídas para capturar o efeito de economias de escala que podem aumentar o desempenho financeiro dos municípios. O rendimento per capita é usado para controlar o efeito da capacidade dos cidadãos de pagar por serviços públicos.

7. Resultados

Os resultados mostram variações significativas no índice de desempenho financeiro durante o período em análise (tabela 1). Entre os ciclos políticos de 2005-08 e 2009-12, encontramos um aumento das desigualdades de desempenho financeiro e uma disparidade crescente entre os municípios. Embora a pontuação média melhorasse de 0,44 para 0,46, o fato é que houve menos municípios com pontuação de desempenho financeiro acima de 0,5, caindo em termos relativos de 34% em 2005-08 para 32% em 2009-12. Além disso, a distância entre municípios aumentou mesmo que seja de pequena margem. As pontuações podem refletir os efeitos do início da crise das dívidas soberanas. No entanto, o efeito foi silenciado pelo período das eleições legislativas em 2010-11. O governo incumbente lutou para evitar a intervenção externa, usando recursos públicos para corrigir e resolver problemas financeiros em vários níveis do governo.

Mudanças significativas são detectadas na comparação com o ciclo político iniciado em 2013. O número de municípios com desempenho financeiro acima de 0,5 subiu para 63%, equivalente a um aumento de 100% em comparação com os 32% de 2009-12. O registo médio também aumentou e agora é positivo com uma pontuação de 0,53, enquanto a disparidade entre a maior e a menor pontuação foi reduzida para 0,52.

Esse resultado nos permite argumentar que o desempenho financeiro melhorou significativamente em 2013, o que não pode ser alheio à agenda de reformas implementada no final de 2010.

Tabela 1
Índice de Desempenho Financeiro (2005-13)

Nossos resultados confirmam o argumento de Waldo de um trade-off entre desempenho financeiro e democracia. Elas fornecem evidências de que um grau mais elevado de democracia tem um efeito negativo sobre o desempenho financeiro e, além disso, que esse efeito tem piorado nos últimos anos, na sequência da implementação da agenda de reforma acordada com a troika. Todos os modelos apresentam um valor negativo para o índice da qualidade da democracia local, indicando uma relação inversa com o índice de desempenho financeiro.

No período de 2005-08, o modelo simples não pode ser considerado, uma vez que é estatisticamente insignificante. O modelo completo, com as variáveis de controlo, evidencia uma relação negativa. O índice de qualidade da democracia local tem uma pontuação de -0.0805, representando a queda do índice de desempenho financeiro decorrente do aumento de uma unidade do índice de qualidade da democracia local. A estatística rho, que mede a variação na variável dependente devido às diferenças entre painéis, tem um valor baixo: 3,7%. As variáveis de controlo comportam-se como esperado. A população e o rendimento têm um impacto positivo na pontuação do índice de desempenho financeiro. Podemos detetar o efeito das economias de escala e da capacidade financeira dos cidadãos sobre o desempenho financeiro.

Durante o período de 2009 a 2012, ambos os modelos têm significância estatística. Nos modelos simples e completos, temos evidências de um impacto negativo do índice de qualidade da democracia local sobre o índice de desempenho financeiro. Aumentos de uma unidade no índice de qualidade da democracia local resultam, respectivamente, numa queda de -0.1005 e -0.0637 no índice de desempenho financeiro. As variáveis de controlo têm comportamentos consistentes com o período anterior e ainda são consistentes com nossas expectativas. A estatística rho exibe um valor de 44% indicando a variação explicada pelas diferenças entre municípios no painel. No entanto, a pontuação diminui no modelo completo.

Tabela 2
Resultados dos modelos econométricos

A última estimativa diz respeito a 2013. Esse é o primeiro ano do ciclo político que incorpora todas as modificações nas instituições e estrutura de governo. Novamente, ambos os modelos têm significância estatística. Os modelos mostram um impacto muito maior do índice de qualidade da democracia local sobre o índice de desempenho financeiro. Em ambos os modelos, o impacto negativo de um aumento no índice de qualidade da democracia local é de aproximadamente -0,22. Comparado aos outros modelos, podemos ver um claro aumento na relação negativa. O modelo estimado após a implementação da agenda de reformas apresenta o maior valor: -0,22 para 2013, -0,0637 para 2009-12 e -0,0805 para 2005-08. Entre as variáveis de controlo, apenas a população tem significância estatística e, como esperado, tem um impacto positivo. A estatística R2 apresenta um valor de 0,428 no modelo completo, mostrando que quase 43% da variação na variável dependente podem ser explicados pelo modelo.

8. Conclusão e discussão

Nos últimos anos sentimos o efeito negativo da crise das dívidas soberanas. Vários países europeus foram forçados a solicitar ajuda financeira da troika. Cada país foi obrigado a assinar um memorando de entendimento especificando os termos da agenda de reformas para alcançar a estabilidade financeira. Várias das iniciativas de reforma foram decididas centralmente e impostas aos países. Apesar das diferenças significativas em relação às iniciativas dos Emergency Managers em Michigan (Scorsone e Plerhoples, 2010SCORSONE, Eric; PLERHOPLES, Christiana. Fiscal stress and cutback management amongst state and local governments. State and Local Government Review, v. 42, n. 2, p. 176-187, 2010.; Mears, 2012MEARS, Patrick. Michigan’s emergency financial manager law and its impact on creditors of municipalities and school districts. Business Law Journal, Spring, 2012.; Anderson, 2011ANDERSON, Janet. Rightsizing government. State and Local Government Review, v. 43, n. 3, p. 224-232, 2011.), essa atitude levou a UE a reconsiderar grande parte do modus operandi da troika para lidar com os valores democráticos.

No caso português, ao nível dos governos locais, a agenda de reformas negociada com a troika centrou-se na centralização, na maximização da receita e na redução da representação popular. Na literatura, encontramos um conjunto de argumentos teóricos que sustentam esta opção. O trabalho de Waldo (1948WALDO, Dwight; MILLER, Hugh. The administrative state. Londres: Transaction Publishers, 1948.) focalizou os impactos dos procedimentos democráticos sobre a eficiência dos governos. Argumentou a existência de uma relação negativa, na qual as decisões públicas precisam ser expugnadas de orientações políticas que possam limitar seu nível de eficiência. No entanto, a literatura oferece também um conjunto de argumentos contrários, onde se encontram evidências de relação positiva entre os procedimentos democráticos e do envolvimento do cidadão com a eficiência.

O documento testa ambos os argumentos usando o índice de desempenho financeiro, como um proxy adequado para a eficiência no contexto da crise das dívidas soberanas, e do índice de qualidade da democracia local. Os resultados permitiram argumentar a existência de uma relação linear inversa entre desempenho financeiro e democracia. O objetivo deste trabalho é lançar luz sobre a relação e os trade-offs entre o desempenho financeiro e a democracia. Além disso, seus resultados sustentam o argumento de que essa relação negativa tende a aumentar em resultado da implementação da agenda de reformas negociada com a troika.

Também é preciso destacar que o primeiro período em análise é de expansão econômica: o PIB cresce 1,19% de 2005 a 2008. Pelo contrário, os períodos seguintes são de clara depressão econômica. A partir de 2009-12 o PIB cai 3,99% enquanto a dívida pública cresce de 83,6% do PIB para 126,2%; e o ano de 2013 registou uma queda no PIB de 1,13% e a dívida pública atingiu o valor máximo de 129% do PIB. A tendência apresentada por nossos resultados é consistente com esses ciclos econômicos, uma vez que o trade-off entre eficiência e democracia é mais evidente no segundo e terceiro período se comparado com o primeiro.

Duas ideias adicionais deste artigo devem ser destacadas. Um dos argumentos tradicionais da ciência política é que uma democracia que é incapaz de prover riqueza e prosperidade para uma nação logo será superada por uma revolução ou mudança de regime. Como Norris (2012NORRIS, Pippa. Making democratic governance work. Nova York: Cambridge University Press, 2012.) salientou: “As pessoas não podem comer a democracia” e, mais cedo ou mais tarde, perceberão os enormes custos de oportunidade do sistema democrático se reduzir o bem-estar. Apesar dos resultados apresentados no trabalho, 12,5% dos municípios contornaram a tendência geral e conseguiram maximizar ambos os índices. Esse é um caso de otimização onde os procedimentos democráticos promovem o desempenho financeiro. Esses casos requerem uma análise aprofundada para determinar os fatores que levam a tal situação. Isso nos daria uma ideia de como equilibrar o trade-off e maximizar tanto o desempenho financeiro quanto a democracia.

Outro ponto que merece reflexão está relacionado com cenários futuros de gestão de governação. Essas iniciativas de reforma enfatizam o desempenho financeiro e optam para centralizar procedimentos e limitar a representação cívica. Isso levanta questões significativas relacionadas com a identidade dos governos locais. Desde 1974, a autonomia do governo local foi implicitamente assumida como uma expressão da revolução democrática e do envolvimento cívico nas comunidades locais. De certa forma, as crises financeiras e as iniciativas de reforma posteriores comprometeram o legado democrático. Se a agenda de reformas continuar a se concentrar unicamente no desempenho financeiro, os municípios e as freguesias tornar-se-ão meras extensões do governo central. Correm o risco de se tornar um aparato administrativo interessado apenas em alcançar melhores indicadores financeiros em vez de compromisso com suas comunidades. Esse cenário é bastante difícil de entender, uma vez que assume uma perspectiva ultraminimalista, e as missões do governo local envolvem mais do que prestação de serviços. Esses são o alicerce da nossa cidadania e as bases de um regime democrático. Dito isto, corremos o risco de estar à beira de uma era em que as organizações públicas se tornam autoconscientes e seguem um caminho de satisfazer suas necessidades para sobreviver, em vez de supervisionar os interesses de seus constituintes.

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  • 2
    {Versão traduzida}

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2017

Histórico

  • Recebido
    24 Jun 2016
  • Aceito
    20 Set 2016
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