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Difusão da política cicloviária no município de São Paulo: resistências, apoios e o papel da mídia

Difusión de la política cicloviaria en el municipio de São Paulo: resistencias, apoyos y el papel de los medios

Resumo

São Paulo é uma megalópole com um padrão de ocupação marcado pelo protagonismo do automóvel, mas, recentemente, a agenda de mobilidade urbana ganhou novos significados e mobilizou novos atores. A partir da perspectiva teórica pós-positivista e das teorias de difusão de políticas públicas, buscou-se discutir como a ideia da política cicloviária se originou, se adaptou e enfrentou resistências no contexto político e social do município de São Paulo no governo Fernando Haddad (Partido dos Trabalhadores). Como resultado de pesquisa destacam-se, de um lado, o papel da comunidade política e epistêmica dos cicloativistas e o papel empreendedor do prefeito Haddad como elementos de apoio político. Em contraste, a imprensa paulistana desempenhou papel opositor à implementação da política, agindo como ator político no subsistema da política cicloviária, por meio do ataque sistemático à imagem das infraestruturas implantadas para as bicicletas.

Palavras-chave:
políticas públicas; difusão de políticas; mobilidade urbana; imprensa

Resumen

São Paulo es una megalópolis con un patrón de ocupación marcado por el protagonismo del automóvil. Sin embargo, la agenda de movilidad urbana recientemente ganó nuevos significados y movilizó nuevos actores. Desde una perspectiva teórica post-positivista y de difusión de políticas públicas, se intentó reflexionar sobre como la idea de la política de ciclo movilidad surgió, se adaptó y enfrentó resistencias en el contexto político y social del municipio de São Paulo en el gobierno de Fernando Haddad (Partido de los Trabajadores). Como resultado de la investigación gana relevo el papel de la comunidad política y epistémica de los ciclo-activistas y el papel de emprendedor del alcalde Haddad como elementos de apoyo político. En contraste, la prensa paulistana ha jugado un papel de oposición a la implementación de la política, actuando como actor político en el subsistema de la política, por medio de ataques sistemáticos a la policy image de la infraestructura implantadas para bicicletas.

Palabras clave:
políticas públicas; difusión de políticas; mobilidad urbana; prensa

Abstract

São Paulo is a megalopolis with a pattern of occupation marked by the prominence of the automobile. However, recently, the urban mobility agenda gained new meaning and new actors were mobilized. From the post-positivist and diffusion theoretical perspectives of public policies, the present work discusses how the idea of the cycling policy arose, adapted and faced resistance in the political and social context of the municipality of São Paulo under Fernando Haddad’s government (Workers’ Party). As a result of the research, on one hand, the role of the political and epistemic community of the cycling-activists and the entrepreneurial role of Mayor Haddad as elements of political support stand out. On the other hand, the São Paulo press played an oppositional role in the implementation of the policy, acting as a political actor in the subsystem of the cycling policy, by systematically attacking the image of the infrastructures implemented for the bicycles.

Keywords:
public policies; policy diffusion; urban mobility; press.

1. Introdução

São Paulo é uma megalópole que teve seu processo de expansão durante o século XX pautado pelo modelo rodoviarista de ocupação territorial e pelos interesses da indústria automobilística, de modo que, apesar dos diversos investimentos em outras formas de deslocamentos a partir dos anos 1970, as intervenções estatais não foram capazes de provocar uma inflexão para um novo paradigma de mobilidade (Rolnik e Klintowitz, 2011ROLNIK, Raquel; KLINTOWITZ, Danielle. (I)Mobilidade na cidade de São Paulo. Estudos Avançados, v. 25, n. 71, p. 89-108, abr. 2011.). Além da dimensão objetiva relacionada com a mobilidade, o uso do automóvel carrega uma dimensão sociológica que pode ser interpretada como um elemento social de resistência a mudanças nessa área. Segundo Schor (1999SCHOR, Tatiana. O automóvel e o desgaste social. São Paulo Perspectiva, v. 13, n. 3, p. 107-116, set. 1999.), a exclusão do consumo do automóvel implica desgaste e mal-estar social em um contexto em que esse meio de transporte configurou-se em um símbolo inequívoco que marca o tipo de modernização e os padrões contemporâneos de relações sociais nas sociedades capitalistas democráticas, individualistas e mercadorizantes.

Recentemente, contudo, as ações públicas de mobilidade urbana ganharam novos contornos na capital paulistana. Durante a gestão do prefeito Fernando Haddad (Partido dos Trabalhadores [PT], 2013-16), a formulação e a implementação de políticas públicas voltadas para diferentes modos de transporte ganharam relevância na agenda de mobilidade da cidade. Na esteira da discussão e viabilização da revisão do Plano Diretor Estratégico (PDE) (Lei no 16.050/2014), o Executivo municipal se notabilizou pela significativa expansão da infraestrutura cicloviária, pela criação de faixas exclusivas e ampliação de corredores de ônibus, uso de grandes avenidas como espaços de lazer aos domingos e redução das velocidades máximas nas principais vias da cidade (já iniciada na gestão anterior).

A julgar pelo sentido das ações da prefeitura a partir de 2013, pode-se dizer que houve uma significativa mudança na imagem da política (policy image) de mobilidade (Baumgartner e Jones, 1993BAUMGARTNER, Frank R.; JONES, Bryan D. Agendas and instability in American politics. Chicago: University of Chicago Press, 1993.). Se, por um lado, alguns instrumentos1 1 Instrumentos estes que em perspectiva sociológica “revelam singularidades históricas na estruturação de relações entre governantes e governados” (Lascoumes e Le Galès, 2012:19). de ação pública direcionados para os transportes coletivos não eram novidade na agenda de governos municipais paulistanos, por outro, a aposta no transporte cicloviário configurou elemento inédito por sua extensão no cenário histórico da mobilidade na cidade. Em um contexto político altamente conflituoso, diante de uma coalizão de resistência historicamente articulada (que envolvia a mídia) e de uma dinâmica social que, inequivocamente, sacraliza o uso do automóvel como “propriedade privada, individual e móvel” (Schor, 1999SCHOR, Tatiana. O automóvel e o desgaste social. São Paulo Perspectiva, v. 13, n. 3, p. 107-116, set. 1999.:110), o processo político de formulação e implementação da política cicloviária, que envolveu uma mudança de paradigma (Hall, 1993HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993.) de mobilidade, não foi trivial.

Tal mudança na orientação das ações da prefeitura suscita algumas questões analiticamente pertinentes. Historicamente, como a ideia da política cicloviária se originou e se adaptou no contexto político e social do município de São Paulo no governo Fernando Haddad? Como se caracterizou a transferência da política (policy transfer) (Dolowitz e Marsh, 2000DOLOWITZ, David; MARSH, David. Learning from abroad: the role of policy transfer in contemporary policy-making. Governance: An International Journal of Policy and Administration, v. 13, n. 1, p. 5-23, jan. 2000.) e suas articulações de atores, ideias, instituições, espaços estratégicos e contextos nos processos de mudança nas políticas? Especificamente, quais foram as coalizões de resistência e qual foi o papel de corporações privadas e consultorias, sobretudo setores da grande mídia paulistana?

O presente trabalho objetiva discutir essas questões a partir de um estudo de caso (Yin, 2001YIN, Robert. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. São Paulo: Artmed. 2001.) sobre o processo de formulação da recente política cicloviária da cidade de São Paulo e as resistências verificadas a partir de sua implementação. Especificamente, pretende-se analisar o papel das ideias e dos atores que as formulam e as defendem, bem como levantar hipóteses que ajudem a compreender o processo de difusão de políticas públicas de mobilidade. Destaca-se a postura de resistência à transferência das políticas apresentada pela imprensa escrita paulistana, investigando o modo com que as ações da Política de Mobilidade por Bicicletas da Prefeitura de São Paulo foram abordadas nas reportagens publicadas. Argumenta-se que configuraram estruturas normativas (Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) que legitimaram posições junto ao público e contribuíram, como hipótese, para a formação de um sentimento público negativo (idem) em torno do uso da bicicleta como meio de transporte.

2. Metodologia

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, um estudo de caso (Yin, 2001YIN, Robert. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. São Paulo: Artmed. 2001.) baseado na análise de dados primários, como documentos oficiais e estudos técnicos, bem como dados obtidos por meio de observações participantes em espaços estratégicos e, sobretudo, entrevistas semiestruturadas em profundidade com diversos atores relevantes no processo de construção das políticas.

Para construir analiticamente a trajetória da política cicloviária, utilizou-se o process tracing como método de estudo de caso (Bennett e Elman, 2006BENNETT, Andrew; ELMAN, Colin. Qualitative research: recent developments in case study methods. Annual Rev. Political Science, v. 9, n. 1, p. 455-476, 2006.; Bennett e Checkel, 2012BENNETT, Andrew; CHECKEL, Jeffrey T. Process tracing: from philosophical roots to best practices. Simons Papers in Security and Development, v. 21, p. 3-48, 2012.; Silva e Cunha, 2015SILVA, Fábio M. E.; CUNHA, Eleonora S. M. Process-tracing e a produção de inferência causal. Revista Teoria & Sociedade, n. 22.2, p. 105-125, 2015.), que objetiva analisar evidências nos processos, sequências e conjunturas de eventos, visando desenvolver ou testar hipóteses de mecanismos causais que possam explicar o caso estudado. É, ainda, uma técnica de pesquisa indicada para “identificar as cadeias de caminhos que levam a um determinado resultado, por meio de sua reconstrução histórica” (George e Bennett, 2005:215 apud Porto de Oliveira, 2013aPORTO DE OLIVEIRA, Osmany. Do ponto de virada à difusão massiva: mecanismos da internacionalização do Orçamento Participativo. In: CONGRESO DE CEISAL: MEMORIA, PRESENTE Y PORVENIR, 7., 2013. Anais... Porto: Cesal, 2013a. p. 1-13.:3).

A primeira etapa da coleta de dados envolveu pesquisa documental (leis, normativas, acervos de jornais impressos e digitais) e foi realizada em bancos de dados públicos e privados,2 2 Procurou-se buscar, além das legislações federais, estaduais e municipais, dados referentes ao caso paulistano em páginas virtuais dos seguintes think tanks e associações civis: ITDP, UCLG, Cities for Mobility (Stuttgart) e Dutch Ciclyng Embassy; os brasileiros Ciclocidade, Bike é Legal e Vá de Bike , e de OIs — Habitat/ONU, URB-AL/Comissão Europeia, European Ciclist Federation e International Bycicle Consulting. configurando o primeiro mapeamento dos atores-chave do processo de construção da atual política cicloviária, o que permitiu que fossem planejadas as primeiras entrevistas.

A análise da resistência à adoção e implementação das políticas cicloviárias se concentrou no papel da mídia como ator político que influencia o debate público. Para traçar um panorama de como a imprensa paulistana trata do tema da mobilidade urbana, foram analisadas as reportagens publicadas nos jornais Folha de S.Paulo (FSP) e O Estado de S. Paulo (Oesp), os dois maiores jornais em circulação paga no município de São Paulo, entre janeiro de 2013 e dezembro de 2016, período do governo Fernando Haddad (PT). Foram assim levantadas 1.681 reportagens (921 de FSP e 753 de Oesp), cuja análise envolveu leitura em ordem cronológica, enquadramento por assunto (gerais e específicos) e tabulação de informações cadastrais.

No que diz respeito à pesquisa de campo, foram utilizadas duas técnicas: entrevistas semiestruturadas em profundidade com atores relevantes e observações participantes. As 10 entrevistas realizadas buscaram coletar informações subjetivas relacionadas com o sistema de valores e crenças dos sujeitos entrevistados. O interesse no papel de “atores estratégicos” nos processos de difusão de políticas exigiu ferramentas de pesquisa com alcance profundo. Nesse sentido, os “roteiros” levaram em consideração a proposta de entrevista “história de vida” (Boni e Quaresma, 2015BONI, Valdete; QUARESMA, Silvia J. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevista em ciências sociais. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em sociologia política da UFSC, v. 2, n. 1 (3), p. 68-80, jan./jul. 2015. Disponível em: <Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/emtese/article/view/18027/16976 >. Acesso em: 28 ago. 2016.
https://periodicos.ufsc.br/index.php/emt...
).

Finalmente, foram realizadas três observações participantes, todas na capital: 1a Reunião Geral de Planejamento da Ciclocidade para 2016 em 23/1/2016, no Espaço Contraponto; palestra do então prefeito Fernando Haddad (PT) na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (USP Leste) em 8/4/2016; e evento de abertura do Bicicultura 2016, em 26/5/2016 na Galeria Olido. Essas experiências também serviram para observar as estruturas normativas (Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) dos discursos públicos dos atores relevantes, como gramáticas mobilizadas a partir das estratégias políticas. A proposta metodológica de Porto de Oliveira (2015)PORTO DE OLIVEIRA, Osmany. A difusão do Orçamento Participativo na América Andina: embaixadores da participação e a transferência em escala nacional. Pensamiento Propio, v. 40, p. 157-190, 2015. foi a inspiração para a combinação das várias técnicas de pesquisa: revisão documental, entrevistas semiestruturadas em profundidade e observações sistematizadas em espaços abertos de discussão.

3. Arcabouço teórico

A chave teórica que está na base deste trabalho atribui importância ao papel das ideias, valores e crenças no processo de mudança de políticas públicas. Entende-se que autores que se alinham à orientação pós-positivista, mobilizando categorias analíticas sociológicas, sejam interessantes para a análise da construção da política cicloviária no município de São Paulo, processo este que envolveu a circulação de ideias e atores em redes e ambientes institucionais múltiplos e contextos políticos diversos.

A corrente pós-positivista é compreendida neste trabalho como uma orientação comum entre proponentes teóricos que valorizam dimensões como a subjetividade, a normatividade interpretativa, a argumentação, fatores sociopolíticos contextuais e idiossincráticos dos casos na análise das políticas públicas (Tomazini e Leite, 2016TOMAZINI, Carla Guerra; LEITE, Cristiane Kerches da Silva. Programa Fome Zero e o paradigma da segurança alimentar: ascensão e queda de uma coalizão? Revista Sociologia Política, v. 24, n. 58, p. 13-30, 2016.). Ainda que em diferentes graus e divergentes interpretações, os autores pós-positivistas consideram, em geral, a centralidade e o poder da argumentação e persuasão no processo político, uma vez que a ação política é, essencialmente, um exercício “retórico e interpretativo”. A agenda, em essência, seria construída a partir de histórias causais, da tradição, de atitudes e crenças “encapsuladas”, codificadas no discurso dos atores sociais e políticos (Howlett, Ramesh e Perl, 2013HOWLETT, Michael; RAMESH, Mishra; PERL, Anthony. Política pública: seus ciclos e subsistemas (uma abordagem integradora). Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.).

Neste trabalho são mobilizadas categorias analíticas de autores que se enquadram de alguma forma na perspectiva analítica pós-positivista (Kingdon, 2011KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011.; Baumgartner e Jones, 1993BAUMGARTNER, Frank R.; JONES, Bryan D. Agendas and instability in American politics. Chicago: University of Chicago Press, 1993.; Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998., 2002CAMPBELL, John L. Ideas, politics, and public policy. Annual Review of Sociology, v. 28, n. 1, p. 21-38, 2002.; Hall, 1993HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993.; Sabatier e Weible, 2016SABATIER, Paul A.; WEIBLE, Christopher M. The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In: SABATIER, Paul A. (Ed.). Theories of the policy process. 2. ed. Londres: Routledge, 2016. p. 189-217.; Latour, 2000LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Unesp, 2000.). Kingdon (2011)KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011. se aproxima dessa orientação ao valorizar o caráter interpretativo do fluxo de problemas e de ideias no seu esquema analítico de formação de agenda, assim como elementos sociológicos no fluxo político (como a noção de clima ou sentimento público). Os elementos propulsores de mudança de agenda dependem de processos normativos, de formação de significados políticos referentes a crises, símbolos e eventos, por exemplo, por parte de atores políticos e sociais. Dessa forma, o conceito de agenda governamental e decisional de Kingdon é constituído de elementos pós-positivistas, mas não necessariamente se esgota nesses (Tomazini e Leite, 2016TOMAZINI, Carla Guerra; LEITE, Cristiane Kerches da Silva. Programa Fome Zero e o paradigma da segurança alimentar: ascensão e queda de uma coalizão? Revista Sociologia Política, v. 24, n. 58, p. 13-30, 2016.).

Ao privilegiar o papel das ideias no processo político, categorias analíticas como comunidades políticas, epistêmicas, redes3 3 Para mais informações, ver Massardier (2006), Marques (2006) e Haas (1992). e subsistemas são fundamentais nos esquemas explicativos dos supracitados autores de formação de agenda, sejam como espaços privilegiados de experimentação, debate e multiplicação de ideias (Kingdon, 2011KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011.), sejam como elementos centrais para compreender os períodos de estabilidade de determinadas ideias sobre políticas (Baumgartner e Jones, 1993BAUMGARTNER, Frank R.; JONES, Bryan D. Agendas and instability in American politics. Chicago: University of Chicago Press, 1993.). Especificamente o conceito de subsistema é considerado espaço de disputa entre coalizões de defesa (Sabatier, 1988SABATIER, Paul A. An advocacy coalition framework of policy change and the role of policy-oriented learning therein. Policy Sciences, v. 21, n. 2, p. 129-168, 1988.; Weible e Sabatier, 2007WEIBLE, Christopher M.; SABATIER, Paul A. A guide to the advocacy coalition framework. In: FISCHER, Frank; MILLER, Gerald J.; SIDNEY, Mara S. (Ed.). Handbook of public policy analysis: theory, politics, and methods. Londres: Routledge, 2007. p. 123-136.; Sabatier e Weible, 2016SABATIER, Paul A.; WEIBLE, Christopher M. The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In: SABATIER, Paul A. (Ed.). Theories of the policy process. 2. ed. Londres: Routledge, 2016. p. 189-217.). O papel das ideias é central, uma vez que cada coalizão possui um sistema de crenças hierarquizadas em três níveis de “profundidade”: o núcleo duro (deep core), o nível das crenças e valores fundamentais; o núcleo político (policy core), que diz respeito às estruturas normativas e cognitivas; e o nível instrumental (secondary aspects), que diz respeito às ideias técnicas e operacionais (Tomazini e Leite, 2016TOMAZINI, Carla Guerra; LEITE, Cristiane Kerches da Silva. Programa Fome Zero e o paradigma da segurança alimentar: ascensão e queda de uma coalizão? Revista Sociologia Política, v. 24, n. 58, p. 13-30, 2016.). O espaço para a figura da ação estratégica do ator político é configurado no conceito de mediador da política (policy broker) que, para além de somente defender uma posição, busca construir consensos e compromissos (Weible e Sabatier, 2007SABATIER, Paul A.; WEIBLE, Christopher M. The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In: SABATIER, Paul A. (Ed.). Theories of the policy process. 2. ed. Londres: Routledge, 2016. p. 189-217.).

Ao considerar a centralidade das ideias na análise das políticas públicas, Hall (1993HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993.) e Campbell (1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) se juntam aos autores teóricos cognitivos e mobilizam categorias conceituais pertinentes analiticamente, como paradigmas de políticas (policy paradigms) e aprendizagem social (social learning). Segundo Hall (1993)HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993., a aprendizagem social se caracteriza por tentativas deliberadas de ajustar metas, objetivos e técnicas em resposta a experiências passadas e novas informações. Tal processo é gradual e envolve três ordens de mudanças: a primeira ordem corresponde às definições dos instrumentos; a segunda diz respeito a técnicas e instrumentos utilizados para atingir os objetivos; a terceira consiste nos objetivos globais que norteiam a política, o “paradigma basilar” (Leite e Peres, 2015LEITE, Cristiane K. S.; PERES, Ursula D. Paradigmas de desenvolvimento e disseminação de políticas: raízes locais da criação do Programa Bolsa Família. Organizações & Sociedade, v. 22, n. 75, p. 621-638, 2015.). Em sintonia com Hall (1993)HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993., Campbell (1998)CAMPBELL, John L. Ideas, politics, and public policy. Annual Review of Sociology, v. 28, n. 1, p. 21-38, 2002. explora tipos de ideias, classificando-as a partir da perspectiva sociológica e organizacional. O autor propõe um quadro conceitual (quadro 1) dos tipos de ideias (cognitivas e normativas) presentes na tomada de decisão (policy making), que combinam o nível de exposição no debate público (primeiro plano e pano de fundo):

Quadro 1
Tipos de ideias e seus efeitos no policy making

A literatura mais recente sobre difusão de políticas públicas procura articular vários conceitos pós-positivistas e cognitivos aqui apresentados. O campo de estudos abarca as dinâmicas e os caminhos que as políticas percorrem em diversos níveis político-administrativos, institucionais e territoriais.4 4 Alguns estudos exploram a análise dos determinantes internos e externos dos processos de difusão de políticas. Ver: Leite e Peres (2015). Há grande polissemia no tratamento de fenômenos semelhantes: difusão, disseminação, tradução, emulação, transferência, inovação e muitos outros (Graham, Schipan e Volden, 2013GRAHAM, Erin; SCHIPAN, Charles; VOLDEN, Craig. The diffusion of policy diffusion research in political science. British Journal of Political Science, v. 43, n. 3, p. 673-701, 2013.; Farah, 2008FARAH, Marta F. S. Disseminação de inovações e políticas públicas e espaço local. Organizações & Sociedade, v. 15, n. 45, p. 107-126, 2008.; Pimenta de Faria, 2012PIMENTA DE FARIA, Carlos A.A difusão de políticas sociais como estratégia de inserção internacional: Brasil e Venezuela comparados. Interseções, v. 14, n. 2, p. 335-371, 2012; Porto de Oliveira, 2013aPORTO DE OLIVEIRA, Osmany. Do ponto de virada à difusão massiva: mecanismos da internacionalização do Orçamento Participativo. In: CONGRESO DE CEISAL: MEMORIA, PRESENTE Y PORVENIR, 7., 2013. Anais... Porto: Cesal, 2013a. p. 1-13., 2013bROLNIK, Raquel; KLINTOWITZ, Danielle. (I)Mobilidade na cidade de São Paulo. Estudos Avançados, v. 25, n. 71, p. 89-108, abr. 2011.; Leite e Peres, 2015LEITE, Cristiane K. S.; PERES, Ursula D. Paradigmas de desenvolvimento e disseminação de políticas: raízes locais da criação do Programa Bolsa Família. Organizações & Sociedade, v. 22, n. 75, p. 621-638, 2015.). Dolowitz e Marsh (2000DOLOWITZ, David; MARSH, David. Learning from abroad: the role of policy transfer in contemporary policy-making. Governance: An International Journal of Policy and Administration, v. 13, n. 1, p. 5-23, jan. 2000.) exploram o conceito de transferência de políticas, segundo os quais o conhecimento passado é usado para desenvolver políticas públicas, instituições ou ideias em outros sistemas políticos. Porto de Oliveira (2013b)PORTO DE OLIVEIRA, Osmany. Embaixadores da participação: a difusão internacional do Orçamento Participativo a partir do Brasil. Tese (doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013b. propõe uma definição escalar para o fenômeno: a circulação - movimento amplo e de longo prazo, que envolve fluxo e refluxo; a difusão - um movimento de adoção sincronizada e coletiva; e a transferência - movimentos pontuais, do ponto A para o ponto B. Esse autor destaca a importância de conexões fortuitas entre espaços e atores estratégicos: “embaixadores de políticas” que circulam por espaços nacionais e internacionais e carregam ideias entre diferentes espaços.

Elementos do modelo de disseminação de inovações por translações de Bruno Latour (2000LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Unesp, 2000.) também foram inspirações teóricas neste trabalho. Nesse modelo de análise, um “construtor de fatos” - que pode ser um ator individual ou uma rede de pessoas - lança uma afirmação forte sobre determinado assunto e procura estabelecer um diálogo com pessoas que considerem tal afirmação pertinente. Nesse processo, a disseminação é facilitada quando o “construtor” dá margem de atuação a quem “comprar” a ideia, passando, assim, por um processo de “translação” de interesses. Assim, a disseminação é um processo coletivo, onde a ideia é “adotada” e passada de “mão em mão”; trata-se de um processo de “convencimento negociado” que, quanto mais aberto à inclusão de adaptações, mais chance tem de lograr êxito.

Tendo em vista que nos processos de difusão e transferência existem atores que se opõem à adoção de novas políticas públicas, o presente trabalho procurou analisar o papel da mídia operando como ator político-ideológico na resistência a essas inovações (Capelato e Prado, 1980CAPELATO, Maria Helena; PRADO, Maria Ligia. O bravo matutino. Imprensa e ideologia: o jornal O Estado de S. Paulo. São Paulo: Alfa-Omega, 1980.; Fonseca, 2005FONSECA, Francisco Cesar Pinto da. O consenso forjado: a grande imprensa e a formação da agenda ultraliberal no Brasil. São Paulo: Hucitec, 2005.). Neste trabalho assume-se a hipótese de que a mídia, a partir de sua periodicidade diária, com todo um aparato editorial e jornalístico, sedimenta ideias, visões ou enquadramentos dos temas cotidianos, exercendo uma influência sutil na opinião pública, seja a de determinados segmentos sociais ou dos detentores do poder estatal (Fonseca, 2005FONSECA, Francisco Cesar Pinto da. O consenso forjado: a grande imprensa e a formação da agenda ultraliberal no Brasil. São Paulo: Hucitec, 2005.). A mídia exerce o poder de influenciar o sentimento público em torno de políticas públicas por meio da mobilização de estruturas normativas (Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) presentes em narrativas e histórias causais (Stone, 1989STONE, Deborah. Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, v. 104, n. 2, p. 281-300, verão1989.), que impactam os desenhos e instrumentos das políticas - ou ideias programáticas, nos termos de Campbell (1998)CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998..

Na literatura de formação de agenda com orientação pós-positivista destacam-se os trabalhos de Baumgartner e Jones (1993BAUMGARTNER, Frank R.; JONES, Bryan D. Agendas and instability in American politics. Chicago: University of Chicago Press, 1993.) como autores que discutem, no bojo de uma teoria mais ampla sobre mudanças em políticas públicas a partir da articulação entre ideias e instituições, o relevante papel da mídia na formação da agenda governamental nos EUA. Os autores identificaram “tanto a frequência de determinados temas na agenda midiática, quanto o ‘tom’ da cobertura (positiva, negativa ou neutra), observação importante para desenvolver o conceito de policy image, relacionado à representação das políticas públicas, no contexto do modelo teórico proposto” (Capella, Brasil e Alves, 2016CAPELLA, Ana Claudia; BRASIL, Felipe; ALVES, Renan. Agenda-setting: mídia e opinião pública na dinâmica de políticas públicas. In: ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIÊNCIA POLÍTICA (ABCP), 10., 2016. Anais... Belo Horizonte: ABCP, 2016. p. 1-20.:11). No caso deste trabalho, foi desenvolvida uma estratégia de pesquisa muito semelhante e também foram encontrados resultados relevantes com relação à frequência da abordagem do tema da ciclomobilidade e a natureza da cobertura, hegemonicamente negativa com relação à política de implementação das ciclofaixas no governo Haddad (PT). Argumenta-se que a grande mídia analisada teve um papel crucial na configuração da representação social da política de ciclomobilidade, agindo como ator político que produz narrativas e histórias causais no subsistema da ciclomobilidade no município de São Paulo, configurado por duas forças políticas: a promotora da política de ciclomobilidade e as vozes de resistência a essa política.

4. Análise dos dados

4.1 A primeira onda de difusão de ideias

Identificam-se neste trabalho duas ondas de difusão de ideias sobre ciclomobilidade: a primeira inicia-se em meados dos anos 1970 e a segunda nos primeiros anos da segunda década dos anos 2000. A primeira onda se dá quando a crise do petróleo provocou a redução da oferta de combustíveis fósseis abrindo uma janela de oportunidade para a implementação de medidas cicloviárias pioneiras na gestão do prefeito Olavo Setúbal (Arena, 1975-79). Entretanto, poucas iniciativas para fomento aos deslocamentos por bicicletas foram implantadas nas duas décadas seguintes. Durante a gestão Erundina (PT, 1989-92), quando foi criada a primeira ciclofaixa de lazer da cidade, destacou-se a figura do vereador Walter Feldman (Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB), ator que agiu como empreendedor político kingdoniano5 5 Conforme Kingdon, os empreendedores “[...] invist their resources - time, energy, reputation, and sometimes money - in the hope of a future return. That return might come to them in the form of policies of which they aprove, satisfaction from participation, or even personal aggrandizement People in and around government become advocates for solutions and look for current problems to which to attach their pet solution” (Kingdon 2011:122-123). das políticas cicloviárias na cidade. Reconhecido por seu vínculo com o ambientalismo, teve apoio de Gunther Bantel, engenheiro ligado ao tema cicloviário desde os anos 1970 por conta de sua experiência no exterior e com quem mantinha uma boa relação de amizade (E3 (E3) BANTEL, Gunther. Engenheiro metalúrgico de formação, começou a trabalhar com questões de ciclomobilidade depois de viajar à Holanda na década de 1970. Entrevistado em 7/12/2015, em São Paulo (SP).; E6 (E6) CENEVIVA, Laura L. V. e HOFFMAN, Ana M. Laura é arquiteta, coordenadora do Grupo Executivo Pró-Ciclista desde sua criação até 2009. Ana é funcionária de carreira da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente desde 1994, e acompanhou todas as atividades voltadas à ciclomobilidade. Entrevistadas simultaneamente em 27/11/2015, em São Paulo (SP).),6 6 Optamos para usar a nomenclatura de E1 a E11 para citar os entrevistados que estão identificados no final da seção das referências bibliográficas para melhorar a fluidez do texto. para formular dois projetos de lei referentes ao tema.7 7 Feldman foi responsável pelos projetos de lei que originaram as Leis no 10.907/1990 (destinação de espaços para ciclovias no Município de São Paulo), e no 10.908/1990 (demarcação de espaços para ciclofaixas em praças públicas). Em 2009, foi o proponente do projeto de lei que regulamentou a implementação das ciclofaixas de lazer como secretário de Esportes, Lazer e Recreação da capital. Feldman havia se aproximado da questão cicloviária no início dos anos 1980, sobretudo durante as discussões do plano do governo de Franco Montoro (Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB) (E1 (E1) ALCORTA, Arturo. Cicloativista de longa data, foi criador do “Bike Repórter Rádio Eldorado FM” (SP). Entrevistado em 29/6/2016 em São Paulo (SP).).

No início da gestão de Paulo Maluf (Partido Progressista Brasileiro - PPB, 1993-96) foi criada a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), espaço de circulação de ideias voltadas à ciclomobilidade. O que havia de conhecimento produzido sobre o tema foi canalizado em um espaço que, apesar da incipiente força política e institucional, foi responsável por apurar o “caldo de ideias”8 8 Conforme Kingdon, “[...] There is a long process of “softening up”: ideas are floated, bills introduced, speeches made; proposals are drafted, then amended in response to reaction and floated again. Ideas confront one other (much as molecules bumped [...]) and combine with one another in various ways. The “soup” changes not only through the appearance of wholly new elements, but even more by the recombination of previously existing elements (Kingdon, 2011:116-117). (Kingdon, 2011KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011.) sobre o tema e representou importante arena política de aprendizagem social (Hall, 1993HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993.). Nos anos 1990, o sentimento público (Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) era favorável ao debate de questões ambientais, graças à realização da “Rio 92”9 9 Ou “Eco 92”, outra denominação conhecida. - Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que ocorreu no Rio de Janeiro. A SVMA teria como seu primeiro-secretário Werner Zulauf, ambientalista de longa data. Zulauf havia conhecido Bantel na época em que foi consultor da Cosipa, empresa em que Bantel foi diretor de Meio Ambiente. No comando da SVMA, designou-o coordenador do “Projeto Ciclista”, abrindo espaço para que Bantel pudesse agregar ao poder público todo conhecimento que adquiriu em suas viagens pela Europa. Essa trajetória foi o veículo para a incorporação de atores e ideias oriundas de experiências europeias no contexto paulistano (E3). O projeto não adquiriu grandes dimensões, mas oficializou a bicicleta, ainda que timidamente, na agenda governamental e possibilitou a formação de redes temáticas (Massardier, 2006MASSARDIER, Giles. Redes de política pública. In: SARAVIA, Enrique; FERRAREZI, Elisabete. Políticas Públicas - coletânea. Brasília: Enap, 2006. v. 2, p. 167-185.) entre os simpatizantes da ciclomobilidade, que teriam importância central para a atual política cicloviária. Durante o governo de Celso Pitta (Partido Progressista - PP, 1997-2000), o trabalho de produção de informação seguiu se expandindo no âmbito da SVMA, embora boa parte das ações se concentrasse dentro dos parques e em algumas campanhas de conscientização.

A rede do cicloativismo,10 10 No Brasil, o cicloativismo começa a se configurar na década de 1970, mas é a partir dos anos 2000 que ganha importância no policy making, sobretudo com as bicicletadas (Xavier, 2007). compreendida como um movimento de luta por respeito aos ciclistas no espaço urbano, teve solo fértil para se desenvolver institucionalmente na SVMA. Os laços construídos foram se multiplicando ao longo dos anos, em um processo de translação de ideias (Latour, 2000LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Unesp, 2000.). Os conflitos eram mediados democraticamente e com a presença de construtores de fatos que buscavam estabelecer consensos para lograr suas ideias (Latour, 2000LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Unesp, 2000.). No Poder Executivo municipal, funcionários responsáveis pelo planejamento e coordenação de implementação das ações cicloviárias estavam ligados à rede de políticas públicas da ciclomobilidade (E9).

A agenda da mobilidade estava em evidência desde o início dos anos 2000 no contexto nacional. Havia sentimento público favorável, mudança institucional e movimento nos fluxos de problemas, políticos e de soluções (Kingdon, 2011KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011.), formando assim uma nova imagem (Baumgartner e Jones, 1993BAUMGARTNER, Frank R.; JONES, Bryan D. Agendas and instability in American politics. Chicago: University of Chicago Press, 1993.): a mobilidade urbana para cidades sustentáveis. Anos depois, essa nova imagem se consolidaria como um novo paradigma de política (Hall, 1993HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993.), na criação da Política Nacional de Mobilidade Urbana, gestada no Ministério das Cidades (criado no governo Lula em 2003), que serviria de arrimo para o grupo dos transportes ativos legitimar suas demandas.

Entre a gestão Pitta (PP, 1997-2000) e a gestão Suplicy (PT, 2001-04) foram construídas as bases do grupo de trabalho que viria a ser o Projeto Pró-Ciclista. Laura Ceneviva, representante da SVMA e coordenadora do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Cades) (SP) foi eleita presidente da Iniciativa do Ar Limpo para América Latina, ação financiada pelo Banco Mundial. Dessa gestão, surge um projeto que receberia recursos financeiros do Global Environment Facility (GEF). Essa situação evidenciou que a bicicleta já era compreendida como meio de transporte urbano dentro do ideário dos organismos internacionais, tal como o Banco Mundial, “ator político, intelectual e financeiro” (Pereira, 2010PEREIRA, João M. M. O Banco Mundial como ator político intelectual e financeiro: 1944-2008. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.), que operava como uma “caixa de ressonância” de ideias entre os países nos anos 2000 (Leite e Peres, 2013LEITE, Cristiane K. S.; PERES, Ursula D. Origem e disseminação do Programa Bolsa Família: aproximações com o caso mexicano. Revista do Serviço Público, v. 64, n. 3, p. 351-376, 2013.:366). Naquele período, atores sociais com relevante presença nas instituições públicas e espaços de participação, como Arturo Alcorta e Renata Falzoni, seriam responsáveis por tentar sensibilizar o público por meio de ações na mídia como “bike repórteres”, ou ainda, como Suzana Nogueira, uma das maiores conhecedoras das ruas de São Paulo (E6), ou Reginaldo Paiva, um engenheiro de carreira que representa a abordagem cicloviária dentro da CPTM desde os tempos de Fepasa, em 1983, e que também trabalhou no governo Haddad (PT) apoiando a CET por meio da articulação com a coordenadoria de subprefeituras (E11 (E11) PAIVA, Reginaldo Assis de. Engenheiro de carreira da CPTM desde os anos 1980, atuou “emprestado” como assessor de gabinete de Chico Macena na coordenadoria de Subprefeituras. Tem vínculos com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), onde presidiu por muito tempo a Comissão de Bicicletas, entre outras funções. Entrevistado em 28/7/2016, em São Paulo (SP).).

Em síntese, na primeira onda de transferências se formou uma rede de atores que circularam centralmente na SVMA e seriam responsáveis por introduzir a bicicleta como ideia programa (Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) conectada com as demandas relacionadas com o paradigma (Hall, 1993HALL, Peter A. Policy paradigms, social learning and the state: the case of economic policymaking in Britain. Comparative Politics, v. 25, n. 3, p. 275-296, 1993.) de mobilidade sustentável, transporte limpo e redução do consumo de combustíveis fósseis, configurando pontos de conexão entre a primeira e a segunda onda de difusão de ideias cicloviárias.

4.2 A segunda onda de difusão

A partir dos primeiros anos da segunda década dos anos 2000 formou-se a segunda onda de difusão das ideias cicloviárias e o subsistema ganharia uma nova configuração. A discussão dos planos regionais decorrentes do Plano Diretor Estratégico da capital foi uma janela de oportunidade institucional (Kingdon, 2011KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011.) que seria responsável por inserir um grande número de defensores da bicicleta na estrutura estatal e favoreceria a expansão e renovação da rede de cicloativistas. O grupo dos transportes ativos ganharia espaço na disputa com grupos dos transportes rodoviários individuais e coletivos (E10 (E10) TONOBOHN, Ronaldo. Arquiteto e urbanista, foi superintendente de planejamento da CET durante a gestão Haddad. Trabalha com a questão cicloviária desde a década de 1990. Entrevistado em 11/8/2016, em São Paulo (SP).). De fato, a bicicleta entrou na agenda governamental (Kingdon, 2011KINGDON, John. Agendas, alternatives, and public policies. Nova York: Longman, 2011.) a partir de 2005, em um cenário complexo. Esse processo seria eivado por disputas cada vez mais acirradas entre as coalizões de defesa (Sabatier, 1988SABATIER, Paul A. An advocacy coalition framework of policy change and the role of policy-oriented learning therein. Policy Sciences, v. 21, n. 2, p. 129-168, 1988.), mobilizando experiências internacionais exitosas e a ação de movimentos sociais combativos.

Por iniciativa e pressão do movimento cicloativista, a gestão do tema passou para a Secretaria dos Transportes (SMT), com maiores prerrogativas e poder orçamentário, mas que isolou um processo que antes era participativo e que envolvia diversos atores com grande bagagem de conhecimento sobre o assunto (E5 (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).). Entretanto, ainda que a questão tivesse ganhado importância institucional, as ações realizadas ficaram muito aquém do desejado (E2 (E2) ARANHA, Carlos. Cicloativista e especialista em mobilidade urbana, integrante do Conselho Municipal de Política Urbana, coordena o GT Mobilidade da “Rede Nossa São Paulo”. Entrevistado em 7/12/2015 em São Paulo (SP).).

Concomitantemente, a agenda climática vinha ganhando relevância no governo municipal. Na gestão Kassab (Partido Social Democrático - PSD, 2009-12), a Secretaria Municipal de Relações Internacionais organizou eventos como a C40 em 2011, fórum de prefeitos das maiores cidades do mundo, emissários de ideias exitosas de políticas públicas. A mesma secretaria, em 2009, firmou um termo de cooperação para aquisição de know how de implementação com o ITDP, reconhecido think tank de políticas de mobilidade, presidido por Enrique Peñalosa, o “garoto propaganda” das políticas de mobilidade urbana sustentável (Montero, 2017MONTERO, Sergio. Worlding Bogotá’s ciclovía: from urban experiment to international “best practice”. Latin American Perspectives, v. 44, n. 2, p. 111-131, 2017.; E5 (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).) ou, em outras palavras, um agente de transferência. Naquele período, houve êxito com a implementação das ciclofaixas de lazer - uma ação importante para a educação cidadã e conscientização no trânsito - que contou com a participação de alguns atores vinculados aos movimentos de cicloativismo e parceria com a iniciativa privada (Banco Bradesco). Algumas ações foram realizadas em parceria com o governo do estado, porém as resistências dentro das estruturas estaduais ainda estavam muito consolidadas (E7 (E7) JORGE, Eduardo. Médico sanitarista de longa trajetória política, foi secretário do Verde e do Meio Ambiente entre 2005 e 2012. Entrevistado em 16/2/2016, em São Paulo (SP).).

Naquele período, a despeito das orientações do Executivo, destaca-se o papel de empreendedor político de Eduardo Jorge, secretário do Verde e do Meio Ambiente de 2005 a 2012 nas gestões Serra (PSDB) e Kassab (PSD), que se engajou consistentemente no advocacy da questão da ciclomobilidade participando de eventos de mobilidade, visitando cidades que já haviam avançado na questão, como Londres, e divulgando uma imagem pública da viabilidade do uso rotineiro da bicicleta como meio de transporte em São Paulo quando começou a se deslocar de sua residência à SVMA de bicicleta (E7). O ITDP (E4 (E4) BENICCHIO, Thiago. Gerente de Transportes Ativos do ITDP Brasil. Cicloativista desde meados da década de 2000, é um dos fundadores da Associação de Ciclistas Urbanos da Cidade de São Paulo (Ciclocidade). Entrevistado em 3/12/2015, em São Paulo (SP).) e o híbrido de movimentos de cicloativismo que originou a Rede Nossa São Paulo (E2 (E2) ARANHA, Carlos. Cicloativista e especialista em mobilidade urbana, integrante do Conselho Municipal de Política Urbana, coordena o GT Mobilidade da “Rede Nossa São Paulo”. Entrevistado em 7/12/2015 em São Paulo (SP).) também se destacam naquele momento na difusão de modelos de implementação de políticas cicloviárias de cidades consideradas modelos, como Bogotá, Buenos Aires, Nova York e São Francisco. O ITDP se sobressai ainda por difundir modelos de políticas de compartilhamento de bicicletas (advin­dos da França e da Holanda) e de Ciclofaixas de lazer (a partir dos casos de Bogotá e São Francisco).

Vale reforçar como essa segunda onda de difusão foi impulsionada, em larga medida, pelo caso de Bogotá. Como destaca Montero (2017MONTERO, Sergio. Worlding Bogotá’s ciclovía: from urban experiment to international “best practice”. Latin American Perspectives, v. 44, n. 2, p. 111-131, 2017.), a despeito da crítica contextual - também presente em Farah (2008FARAH, Marta F. S. Disseminação de inovações e políticas públicas e espaço local. Organizações & Sociedade, v. 15, n. 45, p. 107-126, 2008.) -, o conceito de best practice internacional adquirido pelo caso favoreceu a entrada do tema na agenda regional. Nesse caso, destaca-se a figura carismática de Enrique Peñalosa, que passou a agir como um embaixador de políticas, nos termos de Porto de Oliveira (2013b)PORTO DE OLIVEIRA, Osmany. Embaixadores da participação: a difusão internacional do Orçamento Participativo a partir do Brasil. Tese (doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013b., para iniciativas de mobilidade ativa na América Latina e no mundo a partir de sua experiência como ex-prefeito de Bogotá (E5 (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).; Marques et al., 2015MARQUES, Eduardo et al. Entrevista: Novos Estudos Cebrap entrevista Fernando Haddad. Novos Estudos Cebrap, n. 103, p. 11-31, 2015.).

Todavia, foi somente no Governo Haddad (PT, 2013-16) que a bicicleta, como meio de transporte, ganhou espaço de destaque na agenda governamental. Junho de 201311 11 Para mais detalhes sobre a natureza desse processo político, ver Singer (2013) e Alonso (2017). representa, na perspectiva deste trabalho, uma mudança no contexto político que gerou um processo de pressão no governo Haddad (PT) para que realizasse mudanças na questão da mobilidade em São Paulo. Segundo entrevistados, as manifestações de junho de 2013 representaram o “ponto de virada” para a construção das ciclovias e ciclofaixas permanentes, fazendo com que a questão da infraestrutura cicloviária fosse incluída nas metas do plano de governo (E10 (E10) TONOBOHN, Ronaldo. Arquiteto e urbanista, foi superintendente de planejamento da CET durante a gestão Haddad. Trabalha com a questão cicloviária desde a década de 1990. Entrevistado em 11/8/2016, em São Paulo (SP).; E11 (E11) PAIVA, Reginaldo Assis de. Engenheiro de carreira da CPTM desde os anos 1980, atuou “emprestado” como assessor de gabinete de Chico Macena na coordenadoria de Subprefeituras. Tem vínculos com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), onde presidiu por muito tempo a Comissão de Bicicletas, entre outras funções. Entrevistado em 28/7/2016, em São Paulo (SP).; E12). As mobilizações, ocorridas com a bandeira da mobilidade expressa na ideia de “tarifa zero”, além da valorização da ideia da “mobilidade urbana sustentável”, forneceram a alavancagem para que ações concretas fossem implementadas: aceleração da implantação das faixas exclusivas de ônibus, suspensão do aumento da tarifa de ônibus, instituição do Conselho Municipal de Trânsito e Transporte (CMTT)12 12 O Conselho Municipal de Transporte e Trânsito foi então reativado (E8) e teve seu estatuto alterado, incluindo atores outrora alijados do processo institucional. e a divulgação da metodologia de cálculo de reajuste tarifário.

Porém, ainda que Haddad já houvesse assumido a ciclomobilidade publicamente em seu plano de governo, a questão somente deslanchou na metade do mandato. Pode-se dizer que, apesar de toda massa crítica formada ao longo dos anos por atores dedicados à questão cicloviária, a expansão do cenário cicloviário contou com uma sequência fortuita de fatos. O momento-chave teria sido uma viagem oficial realizada por Haddad, e depois pelo secretário de Transportes Jilmar Tatto, para Buenos Aires (E10 (E10) TONOBOHN, Ronaldo. Arquiteto e urbanista, foi superintendente de planejamento da CET durante a gestão Haddad. Trabalha com a questão cicloviária desde a década de 1990. Entrevistado em 11/8/2016, em São Paulo (SP).; E5 (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).; E9 (E9) NOGUEIRA, Suzana L. Arquiteta e urbanista, foi coordenadora do Departamento de Planejamento Cicloviário da CET durante a segunda metade da gestão Haddad. Entrevistada em 17/2/2016, em São Paulo (SP).), onde o modelo de ciclofaixa que ocupa vagas de carro teria inspirado uma solução cicloviária sem obras caras para a cidade de São Paulo (E5 (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).).

A questão da mobilidade passou a ser foco de atenção total do Executivo municipal e Haddad orientou Tatto a levar a cabo uma série de projetos de mobilidade, inclusive as ciclovias. A rede cicloviária da cidade então saltou de 63 km de ciclovias e ciclofaixas para 468 km em pouco mais de dois anos, cumprindo o objetivo do Plano de Metas de implantar 400 km de vias cicláveis. A elaboração do PlanMob 2015, gestada no bojo da disputa entre as coalizões (E5 (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).) do subsistema da mobilidade urbana (rodoviaristas, o grupo dos transportes coletivos e o da ciclomobilidade), institucionalizou a política cicloviária implementada no governo Haddad.

4.3 O papel da imprensa na resistência à difusão

Entre as 1.681 reportagens analisadas no levantamento feito para verificar o espaço dedicado à mobilidade urbana nos dois maiores veículos de imprensa escrita na cidade entre 2013 e 2016, o bloco de notícias sobre o sistema de transporte coletivo teve a maior participação no total de matérias (43,9%), distribuídas entre textos sobre sistemas de ônibus, rede sobre trilhos e a política geral de transportes. Reportagens sobre trânsito e estacionamento formaram o segundo maior bloco temático (19,63%), tratando de segurança viária, políticas gerais de trânsito, gestão do sistema e obras viárias. Os transportes ativos (cicloviário e a pé) configuraram o terceiro maior grupo de notícias (14,46%), tratando especialmente da implantação e das condições das novas faixas exclusivas para bicicletas, com polêmicas na sociedade civil e críticas ao modelo de implantação, às características físicas e funcionais das faixas e eventuais perigos pelo conflito com pedestres.

Entretanto, as novas infraestruturas para trânsito de bicicletas foram objeto do maior número de reportagens em todo o período da pesquisa quando analisadas como assunto específico das matérias (180 notícias, 10,71% do total), conforme classificação apresentada no quadro 2. A ênfase na atenção dada a essa política fica ainda mais evidenciada ao compará-la à ocorrência de somente 79 reportagens específicas tratando dos atrasos das obras de expansão do sistema de transporte coletivo metropolitano sobre trilhos,13 13 Atrasos em projetos de oito linhas de Metrô, CPTM e Monotrilho, totalizando 97,2 km de novas linhas e 87 estações. mesmo com seus seguidos adiamentos e paralisações de obras que empregam vultosos recursos públicos para qualificar a reduzida rede metroviária da capital.

Quadro 2
Assuntos gerais, temas consolidados e assuntos específicos das reportagens analisadas, com número de ocorrências e participação no total, entre 2013 e 2016, nos jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo

As novidades na condução da política municipal de mobilidade urbana e na destinação do espaço viário da cidade movimentaram a imprensa especialmente entre o segundo semestre de 2014 e o início de 2015, provocando grande alteração no padrão do noticiário sobre mobilidade na mídia paulistana, conforme a figura 1. Nesse sentido, as 119 reportagens sobre o transporte cicloviário representaram mais de 30% do total de 386 textos sobre mobilidade urbana desse período de intensa implantação de grande parte da nova rede de transportes ativos.

Figura 1
Sazonalidade dos temas consolidados abordados no total das reportagens por semestre (2013-16)

A síntese do conteúdo do material midiático permite apontar alguns temas que foram veiculados pelos órgãos da imprensa como estruturas normativas (Campbell, 1998CAMPBELL, John L. Institutional analysis and the role of ideas in political economy. Theory and Society, v. 27, n. 3, p. 377-409, 1998.) que enquadram ideias forjando a proteção de determinados valores disseminados e que podem manipular sentimentos públicos (idem). Dessa forma, as narrativas e histórias causais (Stone, 1989STONE, Deborah. Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, v. 104, n. 2, p. 281-300, verão1989.) produzidas pela grande imprensa agiram como verdadeiros instrumentos de resistência à mudança de paradigma da política cicloviária na cidade de São Paulo, influenciando de forma significativa o sentimento público contra as iniciativas governamentais apoiadas pela coalizão do cicloativismo.

O quadro analítico a seguir organiza o conteúdo dos editoriais e reportagens coletados relacionando-os com as narrativas e histórias causais apresentadas pela imprensa à luz das estruturas normativas utilizadas, configurando a resistência midiática à política cicloviária municipal.

Quadro 3
Análise das estratégias normativas da imprensa à política cicloviária no município de São Paulo na Gestão Haddad

Conforme o quadro 3, o processo de transferência discutido neste trabalho foi marcado de forma contundente por ações de resistência da grande mídia, que se expressaram em editoriais e matérias jornalísticas estruturados em quatro tipos de narrativas e estruturas normativas: o apelo a características pessoais negativas atribuídas ao prefeito; a alegação de ineficiência e incompetência administrativa da gestão; a pretensa irrelevância e insegurança das estruturas cicloviárias; e, por fim, a mácula na liberdade de escolha dos indivíduos no direito de ir e vir. A estratégia de resistência se concretizou na mobilização contínua dessas estruturas normativas, formando uma cadeia de argumentos e histórias causais que foram assacados de forma escalonada no tempo, dando substância ao sentimento público desfavorável.

Verifica-se, assim, que o veto dos veículos de comunicação à política cicloviária adotou uma ampla estratégia de desqualificação de sua imagem, que incluiu, de um lado, o ataque à figura do prefeito Fernando Haddad e aos problemas técnicos encontrados nas ciclovias implantadas. Por outro lado, construiu-se uma narrativa de irrelevância das bicicletas na mobilidade urbana, ignorando a imagem internacional positiva da bicicleta associada a meio de transporte. Finalmente, retrata e reforça a rejeição da população à política dando ênfase ao impacto das ações na redução do espaço de circulação destinado aos automóveis particulares, argumento que encontra solo fértil em uma cidade em que se locomover de carro é um elemento de distinção social importante.

5. Considerações finais

Pode-se dizer que houve uma mudança de paradigma no que diz respeito à mobilidade urbana na gestão Haddad, priorizando-se o transporte coletivo e a bicicleta. A julgar pelo discurso político, pelas instituições e instrumentos que foram criados e ressignificados, além de uma série de ações conflitantes com a mobilidade motorizada individual, sobretudo as medidas de redução de tráfego, redução de velocidades, aumento de faixas exclusivas para transportes coletivos e a implementação das ciclofaixas. Em um contexto social historicamente marcado pelo “modo de vida automobilístico”, o processo de transferência que culminou na política cicloviária pode ser dividido em dois momentos: primeiramente a circulação de ideias sobre experiências exógenas (ciclovias europeias) e sua inserção no aparato do estado, marcando as políticas iniciais sobre mobilidade por bicicletas na cidade de São Paulo, com a marca da rede de “cicloespecialistas”.

A segunda onda, a partir de meados da década de 2000, foi marcada pelos trabalhos do GT Pro-ciclista, que foram responsáveis por transmitir conhecimento aos novos atores que eram inseridos na rede desde a década de 1980. Alguns atores tiveram papel destacado como “correias de transmissão intergeracional”, conservando e compartilhando o conhecimento produzido na década de 1990. A mudança de arena (da SVMA para a Secretaria de Transportes) acabou estimulando o fortalecimento de associações da sociedade civil, fóruns que reuniam muitos funcionários públicos que militavam em prol de questões ambientais e de ciclomobilidade.

As redes (Massardier, 2006MASSARDIER, Giles. Redes de política pública. In: SARAVIA, Enrique; FERRAREZI, Elisabete. Políticas Públicas - coletânea. Brasília: Enap, 2006. v. 2, p. 167-185.) foram canais de circulação e transmissão de ideias diversas, absorvendo o impacto dos determinantes internos e externos e codificando-os nas suas estratégias de ação. Esse processo de absorção e ressignificação de ideias, por sua vez, dependeu de atores políticos dispostos a estabelecer consensos e criar parcerias negociando alterações em um longo processo de acomodação de interesses. No caso paulistano, fica claro como diversas figuras tiveram um papel de destaque nesse sentido como os “construtores de fatos” de Latour (2000LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Unesp, 2000.). Portanto, o modelo de translação de Latour aplica-se ao processo de formação da questão dentro da rede e, portanto, dentro das instituições, uma vez que a rede de ciclomobilidade inseriu-se no governo, dada a permeabilidade dentro da SVMA.

Por fim, destacam-se alguns empreendedores políticos kingdonianos, como Walter Feldman no começo dos anos 1990, Eduardo Jorge e, finalmente, Fernando Haddad como chefe do Executivo Municipal que assumiu a questão como prioridade de governo, em um momento de enormes dificuldades financeiras e de necessidade de promover inovações no plano municipal.

As reportagens analisadas mostraram seu potencial de influenciar a sociedade com a disseminação de ideias e a formação da opinião pública acerca dos temas tratados, especialmente na repetição sistemática de histórias causais (Stone, 1989STONE, Deborah. Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, v. 104, n. 2, p. 281-300, verão1989.) para caracterizar um tema e sedimentar uma imagem (no caso, negativa), na política cicloviária paulistana (“ciclovias de Haddad”, “falta de planejamento”, “improvisadas”). A dinâmica de resistência da mídia que se configurou foi clara: adotou-se a postura conservadora na abordagem das novas iniciativas municipais, com ostensivo destaque negativo às novidades que limitaram o protagonismo do automóvel na destinação do sistema viário paulistano - provavelmente pelo impacto no cotidiano do público-alvo de alta renda dessas publicações.

Ao invés de exercer papel fiscalizador das ações governamentais, a imprensa focalizou sua narrativa em aspectos de menor relevância - ou de importância específica para os grupos de interesse e público-alvo do jornal - e ocultou diversos avanços obtidos nas políticas públicas para os deslocamentos urbanos em São Paulo, em consonância com o estado da arte da mobilidade sustentável no mundo. Ao contrário, as reportagens regularmente extrapolavam o viés negativo verificado em uma ciclovia mal sinalizada para a desqualificação completa da iniciativa, retroalimentando a rejeição da população às novas intervenções e dando vigor a valores ultrapassados na discussão contemporânea do tema por meio da mobilização de estruturas normativas relacionadas com a liberdade de ir e vir, atributos administrativos da gestão e pessoais do prefeito.

Por fim, neste trabalho podem-se observar distintas formas em que a mídia, a partir da elaboração de narrativas e mobilização de estruturas normativas diversas, produziu uma dinâmica de resistência que marcou o processo de transferência da política cicloviária em São Paulo. Na perspectiva dos estudos sobre difusão, este trabalho contribui ao sugerir a relevância empírica e analítica de considerar a mídia como objeto de estudo de transferência e difusão de políticas ao agir como ator fundamental no espaço público dissolvendo ou fortalecendo resistências a políticas que são transferidas ou difundidas. A abordagem da mídia como ator político valoriza a dimensão do conflito e torna-se uma chave importante para a análise dos processos de adaptação de políticas em contextos domésticos. Da mesma forma, aponta para a importância da articulação entre os conceitos do campo da difusão e as categorias analíticas da análise cognitiva de políticas públicas, especialmente nos estudos referentes aos processos de adaptação, configuração e implementação de políticas públicas que se deslocam entre governos distintos.

Referências

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Entrevistas realizadas

  • (E1) ALCORTA, Arturo. Cicloativista de longa data, foi criador do “Bike Repórter Rádio Eldorado FM” (SP). Entrevistado em 29/6/2016 em São Paulo (SP).
  • (E2) ARANHA, Carlos. Cicloativista e especialista em mobilidade urbana, integrante do Conselho Municipal de Política Urbana, coordena o GT Mobilidade da “Rede Nossa São Paulo”. Entrevistado em 7/12/2015 em São Paulo (SP).
  • (E3) BANTEL, Gunther. Engenheiro metalúrgico de formação, começou a trabalhar com questões de ciclomobilidade depois de viajar à Holanda na década de 1970. Entrevistado em 7/12/2015, em São Paulo (SP).
  • (E4) BENICCHIO, Thiago. Gerente de Transportes Ativos do ITDP Brasil. Cicloativista desde meados da década de 2000, é um dos fundadores da Associação de Ciclistas Urbanos da Cidade de São Paulo (Ciclocidade). Entrevistado em 3/12/2015, em São Paulo (SP).
  • (E5) “BONEY”, Odair Henrique Neto. Assessor especial de Políticas Públicas da Secretária Municipal de Governo da Prefeitura de São Paulo. Participou do desenvolvimento do Programa de Governo da candidatura de Fernando Haddad. Entrevistado em 22/6/2016, em São Paulo (SP).
  • (E6) CENEVIVA, Laura L. V. e HOFFMAN, Ana M. Laura é arquiteta, coordenadora do Grupo Executivo Pró-Ciclista desde sua criação até 2009. Ana é funcionária de carreira da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente desde 1994, e acompanhou todas as atividades voltadas à ciclomobilidade. Entrevistadas simultaneamente em 27/11/2015, em São Paulo (SP).
  • (E7) JORGE, Eduardo. Médico sanitarista de longa trajetória política, foi secretário do Verde e do Meio Ambiente entre 2005 e 2012. Entrevistado em 16/2/2016, em São Paulo (SP).
  • (E8) LECH, Josias. Foi assessor especial da Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo e secretário executivo do Conselho Municipal de Transportes e Trânsito. Entrevistado em 25/11/2015, em São Paulo (SP).
  • (E9) NOGUEIRA, Suzana L. Arquiteta e urbanista, foi coordenadora do Departamento de Planejamento Cicloviário da CET durante a segunda metade da gestão Haddad. Entrevistada em 17/2/2016, em São Paulo (SP).
  • (E10) TONOBOHN, Ronaldo. Arquiteto e urbanista, foi superintendente de planejamento da CET durante a gestão Haddad. Trabalha com a questão cicloviária desde a década de 1990. Entrevistado em 11/8/2016, em São Paulo (SP).
  • (E11) PAIVA, Reginaldo Assis de. Engenheiro de carreira da CPTM desde os anos 1980, atuou “emprestado” como assessor de gabinete de Chico Macena na coordenadoria de Subprefeituras. Tem vínculos com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), onde presidiu por muito tempo a Comissão de Bicicletas, entre outras funções. Entrevistado em 28/7/2016, em São Paulo (SP).
  • 1
    Instrumentos estes que em perspectiva sociológica “revelam singularidades históricas na estruturação de relações entre governantes e governados” (Lascoumes e Le Galès, 2012LASCOUMES, Pierre; LE GALÈS, Patrick. A ação pública abordada pelos seus instrumentos. Revista Pós Ciências Sociais, v. 9, n. 18, p. 19-44, 2012.:19).
  • 2
    Procurou-se buscar, além das legislações federais, estaduais e municipais, dados referentes ao caso paulistano em páginas virtuais dos seguintes think tanks e associações civis: ITDP, UCLG, Cities for Mobility (Stuttgart) e Dutch Ciclyng Embassy; os brasileiros Ciclocidade, Bike é Legal e Vá de Bike , e de OIs — Habitat/ONU, URB-AL/Comissão Europeia, European Ciclist Federation e International Bycicle Consulting.
  • 3
    Para mais informações, ver Massardier (2006), Marques (2006)MARQUES, Eduardo Cesar. Redes sociais e poder no Estado brasileiro: aprendizados a partir de políticas urbanas. Revista Brasileira de Ciências Sociais [online], v. 21, n. 60, p. 15-41, 2006. e Haas (1992)HAAS, Peter A. Introduction: epistemic communities and international policy coordination. International Organization, v. 1, n. 46, p. 1-35, 1992..
  • 4
    Alguns estudos exploram a análise dos determinantes internos e externos dos processos de difusão de políticas. Ver: Leite e Peres (2015).
  • 5
    Conforme Kingdon, os empreendedores “[...] invist their resources - time, energy, reputation, and sometimes money - in the hope of a future return. That return might come to them in the form of policies of which they aprove, satisfaction from participation, or even personal aggrandizement People in and around government become advocates for solutions and look for current problems to which to attach their pet solution” (Kingdon 2011:122-123).
  • 6
    Optamos para usar a nomenclatura de E1 a E11 para citar os entrevistados que estão identificados no final da seção das referências bibliográficas para melhorar a fluidez do texto.
  • 7
    Feldman foi responsável pelos projetos de lei que originaram as Leis no 10.907/1990 (destinação de espaços para ciclovias no Município de São Paulo), e no 10.908/1990 (demarcação de espaços para ciclofaixas em praças públicas). Em 2009, foi o proponente do projeto de lei que regulamentou a implementação das ciclofaixas de lazer como secretário de Esportes, Lazer e Recreação da capital.
  • 8
    Conforme Kingdon, “[...] There is a long process of “softening up”: ideas are floated, bills introduced, speeches made; proposals are drafted, then amended in response to reaction and floated again. Ideas confront one other (much as molecules bumped [...]) and combine with one another in various ways. The “soup” changes not only through the appearance of wholly new elements, but even more by the recombination of previously existing elements (Kingdon, 2011:116-117).
  • 9
    Ou “Eco 92”, outra denominação conhecida.
  • 10
    No Brasil, o cicloativismo começa a se configurar na década de 1970, mas é a partir dos anos 2000 que ganha importância no policy making, sobretudo com as bicicletadas (Xavier, 2007XAVIER, Giselle N. A. O cicloativismo no Brasil e a produção da lei de política nacional de mobilidade urbana. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC, v. 3, n. 2, p. 122-145, 2007.).
  • 11
    Para mais detalhes sobre a natureza desse processo político, ver Singer (2013)SINGER, André. Brasil, junho de 2013, classes e ideologias cruzadas. Novos Estudos Cebrap, n. 97, p. 23-40, nov. 2013. e Alonso (2017)ALONSO, Angela. A política das ruas: protestos em São Paulo de Dilma a Temer. Revista Novos Estudos, n. esp. Dinâmicas da Crise, p. 49-58, 2017..
  • 12
    O Conselho Municipal de Transporte e Trânsito foi então reativado (E8 (E8) LECH, Josias. Foi assessor especial da Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo e secretário executivo do Conselho Municipal de Transportes e Trânsito. Entrevistado em 25/11/2015, em São Paulo (SP).) e teve seu estatuto alterado, incluindo atores outrora alijados do processo institucional.
  • 13
    Atrasos em projetos de oito linhas de Metrô, CPTM e Monotrilho, totalizando 97,2 km de novas linhas e 87 estações.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2017
  • Aceito
    09 Mar 2018
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