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ATRIBUTOS E CHANCES DE SUCESSO ELEITORAL DE PREFEITOS NO BRASIL

ATRIBUTOS Y POSIBILIDADES DE ÉXITO ELECTORAL DE ALCALDES EN BRASIL

Resumo

Estudo sobre as chances de sucesso eleitoral do Poder Executivo local com base na evolução do perfil de candidatos e eleitos. Foram analisados os resultados das eleições municipais ocorridas em 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016 segundo sexo, idade, escolaridade e ocupação, que revelassem fatores de influência para o perfil dos prefeitos vitoriosos. A metodologia envolveu pesquisa documental e bibliográfica. Tendo como base teoria de campo e capital político de Bourdieu (2011), foram analisados dados disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral mediante teste do qui-quadrado e de regressão logística. Os resultados indicaram o sexo e a ocupação declarada como fatores de influência determinantes no perfil dos eleitos. Observou-se diminuição das chances de sucesso eleitoral de candidatos do sexo masculino ou oriundos de carreira política nas eleições ocorridas em 2012 e em 2016.

Palavras-chaves:
chances de sucesso eleitoral; eleições municipais; perfil de prefeitos

Resumen

El artículo estudia las posibilidades de éxito electoral del Poder Ejecutivo local basado en la evolución del perfil de candidatos y elegidos. Se analizaron los resultados de las elecciones municipales ocurridas en 2000, 2004, 2008, 2012 y 2016 según sexo, edad, escolaridad y ocupación que revelasen factores de influencia para el perfil de los alcaldes victoriosos. La metodología incluyó investigación documental y bibliográfica. Con base en la teoría de campo y capital político de Bourdieu (2011), se analizaron datos proporcionados por el Tribunal Superior Electoral mediante la prueba de chi-cuadrado y de regresión logística. Los resultados indicaron el sexo y la ocupación declarada como factores de influencia determinantes en el perfil de los elegidos. Se observó una disminución de las posibilidades de éxito electoral de candidatos del sexo masculino u oriundos de carreras políticas en las elecciones ocurridas en 2012 y 2016.

Palabras clave:
posibilidades de éxito electoral; elecciones municipales; perfil de los alcaldes

Abstract

This article shows the chances of electoral success for local Executive Branch based on the profile of candidates and elected candidates. The results of the municipal elections of 2000, 2004, 2008, 2012 and 2016 were analyzed concentrating on the characteristics sex, age, schooling, and occupation in order to observe the influence of these characteristics in the profile of the elected mayors in the last five elections. The methodology involved documentary and bibliographic research. Data available from the Supreme Electoral Court were analyzed using the chi-square test and logistic regression. The analysis considered Bourdieu’s theory of field and political capital (2011). The results show evidence that the candidate’s sex and occupation are decisive influencing factors, with a decrease in chances of electoral success for male candidates or candidates of a political career in the elections of 2012 and 2016.

Keywords:
chances of electoral success; municipal elections; mayors profile

1. Introdução

Quais seriam os condicionantes para o sucesso eleitoral nas eleições para prefeitos no Brasil? Na literatura sobre o tema, constata-se que não é possível apontar um único fator determinante do êxito de candidatos. Várias são as condições, citadas por diversos autores, que podem influenciar tal sucesso, como o sexo do postulante, sua origem social, sua escolaridade, a socialização política a que é submetido, oportunidades do sistema político, competitividade do partido pelo qual concorre, volume dos recursos (Best & Cotta, 2000Best, H; & Cotta, M. (Ed.). (2000). Parliamentary representatives in Europe 1848-2000. Legislative Recruitment and Careers in Eleven European Countries. Oxford: Oxford University Press.; Freire, 2002Freire, A. (2002). A profissionalização política dos deputados portugueses. Revista de Sociologia da Universidade do Porto, 1(12), 27-56.; Gaxie, 1980Gaxie, D. (1980). Les logiques du recrutement politique. Revue Française de Science Politique, 30(1), 5-45.; Marvick, 1968Marvick, D. (1968). Political recruitment and careers. In D. L. Sills, International encyclopedia of the social sciences (pp. 273-282). Nova York: Macmillan. ; Matthews, 1984Matthews, D. R. (1984, November). Legislative recruitment and legislative careers. Legislative Studies Quarterly, 9(4), 547-585.; Norris, 1997Norris, P. (1997). Passages to power: legislative recruitment in advanced democracies. Nova York: Cambridge University Press.; Sanbonmatsu, 2006Sanbonmatsu, K. (2006). The legislative party and candidate recruitment in the American states. Party Politics, 12(2), 233-256.).

Além dessas, Codato, Cervi e Perissinotto (2013Codato, A; Cervi, E; & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, 14(2), 61-84., p. 79) destacam que a

[...] institucionalização das regras e dos aparelhos políticos da democracia representativa - partidos, parlamentos, eleições - tende a impor um conjunto de exigências que só podem ser atendidas por aqueles que se ocupam profissionalmente da política, e não por candidatos eventuais - por maior que seja seu status social ou por mais vistosas que sejam suas qualificações escolares.

Na busca por fundamentos teóricos que permitam melhor compreender os fatores de influência para o sucesso eleitoral, percebe-se a presença do conceito de capital político e seus desdobramentos por meio da teoria dos campos de Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Lisboa: Difel.). Dessa perspectiva emergem as peculiaridades e o processo de construção do campo político, que se apresentam em diferentes formas de capital convertidas para a construção de um capital simbólico suficiente ao sucesso no campo político.

Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Lisboa: Difel.), ao inserir o conceito de campo político, conduz sua abordagem teórica à ideia de capital político, a qual resulta tanto de fatores extrínsecos à pessoa do agente político - que diz respeito, por exemplo, ao partido do candidato -, quanto de fatores intrínsecos ao agente, ou seja, suas características pessoais, tais como sexo, idade, escolaridade, ou sua história pessoal, profissional ou familiar. Dessa ótica, o presente estudo tem como objetivo identificar, com base na linha teórica de fundamentação sobre capital político e em análises estatísticas, no decorrer da série histórica das últimas cinco eleições municipais brasileiras, elementos que possam evidenciar correlações com a evolução do perfil predominante afeto às principais características pessoais dos candidatos e eleitos. Destaca-se, pois, para esta pesquisa, a ideia de se melhor compreender a influência de algumas características que poderiam representar maior peso no capital político atribuído aos prefeitos nas eleições ocorridas entre 2000 e 2016. No presente estudo visa-se, pois, observar, por exemplo, como a carreira de um candidato se relaciona com suas chances de sucesso eleitoral, ou como suas características pessoais, tais como sexo, idade ou escolaridade, influenciam em suas chances de sucesso eleitoral. Portanto, o presente artigo traz reflexões sobre o perfil evolutivo de prefeitos eleitos segundo sexo, idade, escolaridade e ocupação, no intuito de buscar relação entre variáveis que tragam indícios sobre os fatores de influência para o perfil vitorioso nos últimos cinco pleitos.

2. Perspectivas teóricas acerca dos aspectos condicionantes para o sucesso eleitoral segundo o perfil dos candidatos

A compreensão do processo político-eleitoral, tendo por base o modelo de Norris (1993Norris, P. (1993). Conclusions: comparing legislative recruitment. In Norris, P; & Lovenduski, J. (Ed.), Gender and party politics (pp. 309-330). Londres: Sage. ), depende de aspectos inter-relacionados de cunho socioeconômico, cultural e do próprio sistema político-eleitoral, e estabelece duas dimensões distintas que influenciam o recrutamento eleitoral pelos partidos: a demanda do partido por um amplo leque de filiações de cidadãos de variados perfis socioeconômicos, visando à composição de seus quadros e ao potencial aproveitamento para a formação de suas candidaturas; e a oferta por meio da qual os partidos avaliam, dentro de seus quadros, os competidores potencialmente elegíveis e, consequentemente, o que eles próprios têm para oferecer à sociedade nos pleitos eleitorais.

Segundo Araújo e Borges (2013Araújo, C; & Borges, D. (2013, junho). Trajetórias políticas e chances eleitorais: analisando o “gênero” das candidaturas em 2010. Revista de Sociologia Política, Curitiba, 21(46), 69-91., p. 70),

[...] demanda e oferta ocorrem e realizam-se em cenários mais amplos do sistema político, e envolvem a cultura política, o sistema partidário e a competição legislativa em si, ou seja, o contexto específico de cada disputa eleitoral. Além desses níveis, incluem-se, também, as configurações do ‘sistema partidário’, no interior do qual os autores destacam como relevantes, a ‘ideologia’ e a ‘cultura organizacional’ de cada partido.

Os autores advertem, ainda, que os recursos de campanha disponíveis, o contexto político no qual se dão a disputa e as trajetórias, os perfis e a carreira dos aspirantes à disputa são variáveis também importantes na formação das listas partidárias.

É consenso entre diversos autores da literatura (Miguel, 2004Miguel, L. F. (2004). Participação eleitoral e gênero no Brasil: as cotas para mulheres e seu impacto. In Anais do 2o Congresso da Associação Latino-Americana de Ciência Política (pp. 1-19), Cidade do México: Alacip. ; Bordignon, 2013Bordignon, R. R. (2013). Candidatos e eleitos: recrutamento e chances de sucesso nas eleições de 1998 e 2010. Revista Paraná Eleitoral, 2, 35-62.; Campos, 2015Campos, L. A. (2015). Socialismo moreno, conservadorismo pálido? Cor e recrutamento partidário em São Paulo e Rio de Janeiro nas eleições de 2012. DADOS - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, 58(3), 689-719.) que as dinâmicas intrapartidárias parecem ter grande peso na sub-representação política de grupos, a depender dos filtros utilizados. Em outros estudos, Codato, Cervi e Perissinotto (2013Codato, A; Cervi, E; & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, 14(2), 61-84.) investigam e mensuram o potencial explicativo do capital econômico, dos atributos dos postulantes e das estratégias e recursos políticos dos candidatos às prefeituras brasileiras nas eleições municipais de 2012. Esses autores inferem que

[...] as variáveis que se mostraram mais importantes para explicar o sucesso eleitoral foram, como se demonstrou, as de natureza política. Logo, parece que cada vez mais o acúmulo de capital propriamente político qualifica o indivíduo para enfrentar, com razoável chance de vitória, a competição por posições políticas (Codato, Cervi, & Perissinotto, 2013Codato, A; Cervi, E; & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, 14(2), 61-84., p. 79).

Mais ainda,

[...] ser candidato à reeleição, fazer parte de uma coligação partidária e estar na disputa em um partido com alto desempenho são as principais explicações para a aquisição do mandato municipal. A estas se segue a variável que mede a disponibilidade de recursos nas campanhas. Quanto maior a receita do candidato, mais chance ele tem de ser eleito (Codato, Cervi, & Perissinotto, 2013Codato, A; Cervi, E; & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, 14(2), 61-84., p. 790).

O capital político se evidencia, nesse contexto, como uma alternativa para se compreender o cenário analisado. Uma vez que os conceitos de capital e campo político estão relacionados, para melhor se compreender a ideia do capital político é oportuno inicialmente contemplar os limites desse campo e os agentes que o compõem na perspectiva da teoria de campo e capital político de Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Lisboa: Difel.).

2.1 O CAPITAL POLÍTICO E CARREIRA PROFISSIONAL DE CANDIDATOS E ELEITOS

Caracterizado, dentro do constructo de Bourdieu (2011Bourdieu, P. (2011). O campo político. Revista Brasileira de Ciência Política, 5, 193-216.), como espaço de relações sociais que pressupõem atividades específicas, o conceito de campo está atrelado a aspectos profissionais, religiosos, ideológicos, afetivos, entre outros. Por exemplo, o campo religioso ou campos profissionais, como medicina e direito, são dotados de ritos que habilitam seus pretendentes a neles ingressarem. Os ritos de iniciação na vida eclesiástica, de graduação em alguma profissão ou de aprovação em exames que conferem habilitações profissionais específicas, como no exame da Ordem dos Advogados do Brasil, são formas claras e objetivas de ingresso nos respectivos campos. Já o campo político não é dotado de limites tão claros.

O limite de um campo é o que define quem é reconhecido como parte dele, quem a ele pertence. Segundo Bourdieu (2011Bourdieu, P. (2011). O campo político. Revista Brasileira de Ciência Política, 5, 193-216., p. 202), “[...] reconhece-se a presença ou existência de um agente em um campo pelo fato de que ele transforma o estado do campo (ou que, se o retiramos, as coisas se modificam significativamente)”. Para o autor, os limites do campo se estabelecem até que cessem os efeitos do campo, ou seja, o limite de um campo é o limite de seus efeitos. No caso do campo político, esse limite é de difícil definição e pode não ser percebido facilmente. É possível pertencer a ele de inúmeras formas, como por meio de movimentos sociais, organizações civis, partidos políticos. Seus agentes também assumem funções variadas, podendo ser jornalistas, especialistas em pesquisa de opinião, além dos membros de partidos políticos, sejam eles ocupantes de cargos públicos ou não. Dessa forma, os agentes de um campo assim serão caracterizados na medida em que são capazes de sofrer e produzir efeitos no campo (Bourdieu, 2011).

A partir daí, deve-se compreender como o capital político se forma dentro do campo. Segundo Bourdieu (2011Bourdieu, P. (2011). O campo político. Revista Brasileira de Ciência Política, 5, 193-216., p. 204), “[...] há, no campo político, lutas simbólicas nas quais os adversários dispõem de armas desiguais, de capitais desiguais, de poderes simbólicos desiguais”. O capital político, para Bourdieu (2011, p. 204), caracteriza-se nesse contexto por “[...] uma espécie de capital de reputação, um capital simbólico ligado à maneira de ser conhecido”.

Dentro do campo político, as lutas travadas buscam fortalecer as ideias defendidas pelos diversos grupos de interesse que ali se consolidam. As armas utilizadas pelos agentes do campo são o capital político, que reflete a notoriedade, o reconhecimento de uma pessoa, de um grupo ou de uma instituição como agente político potencialmente capaz de mobilizar a sociedade, e de produzir mudanças nesta e no próprio campo ao qual pertence.

O desenvolvimento dos partidos políticos institucionaliza papéis e influencia o capital de seus agentes. Segundo Bourdieu (2011Bourdieu, P. (2011). O campo político. Revista Brasileira de Ciência Política, 5, 193-216., p. 204), “O capital político de um agente político dependerá primeiramente do peso político de seu partido e do peso que a pessoa considerada tem dentro de seu partido”. O autor destaca ainda que:

Atualmente, o partido é uma espécie de banco de capital político específico, e o secretário-geral de um partido é uma espécie de banqueiro (talvez não seja por acaso que todos os nossos presidentes, passados e futuros, são antigos secretários gerais...) que controla o acesso ao capital político, burocratizado, burocrático, garantido e autenticado burocraticamente pela burocracia de um partido. À medida que o campo político se burocratiza, o ingresso à instituição supõe direitos de acesso, e hoje esses direitos são com cada vez maior frequência outorgados pelos partidos (e pelas grandes escolas, notadamente a Escola Nacional de Administração, a ENA). Os mais tenazes conservadores de um partido são os que mais dependem dele (Bourdieu, 2011Bourdieu, P. (2011). O campo político. Revista Brasileira de Ciência Política, 5, 193-216., p. 204).1 1 Bourdieu (2011) refere-se aos presidentes franceses, muitas vezes tendo ocupado o cargo de secretário-geral em seus respectivos partidos. No caso brasileiro, os partidos são chefiados por um presidente, que equivaleria ao secretário-geral.

O capital político é, pois, adquirido pelos agentes do campo de forma desigual. Isso porque depende de condições sociais e pessoais do agente para o acesso ao campo político. Trata-se, por exemplo, da disponibilidade financeira, do tempo livre para se dedicar a questões políticas do seu entorno, do nível educacional, da trajetória profissional e de demais características pessoais, tais como idade, sexo e história familiar.

Aqueles que têm melhores condições financeiras e tempo livre tendem a possuir uma maior facilidade em adquirir capital político ante competidores sem a mesma condição. Igualmente, aqueles que detêm melhores níveis educacionais terão mais facilidade em ingressar e pertencer ao campo político. Isso se dá pela melhor aceitação por parte dos que já pertencem ao campo, pois concede à pessoa melhor reconhecimento, amplia suas redes de relacionamento e o torna mais bem habilitado para se apresentar à sociedade em que o campo se insere, da qual depende e para a qual deve prestar contas.

Dessa perspectiva, encontram-se as categorias de capital político propostas por Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Lisboa: Difel.). A primeira, tendo como base a premissa da influência atrelada aos partidos políticos, identifica o capital delegado, que se qualifica e advém do capital político acumulado historicamente por instituições, como partidos e sindicatos, que possuem capital simbólico de reconhecimento e fidelidade. O capital delegado é, pois, investido àqueles que se destacam nas instituições, tendo um caráter temporário, mas que frequentemente é renovado vitaliciamente, e será mais significativo à medida que as instituições forem mais fortemente estabelecidas e burocratizadas, detentoras, portanto, de capital político mais expressivo. Nessa categoria, o capital atribuído ao agente pertence, na verdade, à organização e aos cargos públicos, em geral.

Na segunda categoria, tem-se o capital pessoal, alicerçado no fato de se “[...] possuir certo número de qualificações específicas que são a condição da aquisição e da conservação de uma boa reputação” (Bourdieu, 1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Lisboa: Difel., p. 191).

De outra forma, Miguel (2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134.) detalha as categorias de Bourdieu em três subgrupos de capital político: o capital delegado, com definição similar à de Bourdieu; o capital convertido; e o capital heroico. O capital convertido retrata a transferência de capital acumulado ao longo de toda uma vida em outros domínios - profissional, familiar, religioso, cultural, econômico - permitindo a um agente ser reconhecido como notável no campo político. É o caso, por exemplo, de intelectuais, artistas ou esportistas que ingressam na vida política. Nesse caso, segundo Miguel (2003), é importante a identificação da “taxa de conversão”, que varia conforme a espécie de capital advindo das lutas do campo político. Emergem nessa categoria outras subcategorias que promovem, por conversão, o capital político. São elas: o capital cultural, o capital esportivo, o capital artístico, o capital econômico, e outros, além do capital heroico ou profético, considerado uma subespécie do capital convertido, adquirido por ações singulares realizadas em momentos de crise.

Miguel (2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134.), ao estabelecer essas novas subcategorias, busca criar, por meio da perspectiva de Bourdieu, um arcabouço teórico mais alinhado à situação brasileira, constituída, segundo ele, por instituições partidárias frágeis, dotadas de minguado capital político.

Miguel (2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134., p. 121) entende o capital delegado “[...] como o capital originário do próprio campo político e/ou estatal. Isto é, a notoriedade advinda de mandatos eletivos anteriores, da ocupação de cargos públicos (de confiança) no Poder Executivo e da militância partidária”. Já o capital convertido é oriundo de fatores como “[...] popularidade conseguida em outros campos e deslocada para a política e também a transferência do capital econômico, por meio de campanhas eleitorais dispendiosas” (p. 121).

Esse quadro conceitual é bastante prático para a análise da carreira de inúmeros políticos brasileiros. Os que se sustentam primordialmente no capital delegado seriam aqueles que buscam ocupar cargos de menor expressão nacional, passando a cargos que demandam maior quantidade de capital, a ser acumulada lenta e gradualmente. É o caso do político que primeiramente conquista uma cadeira de vereador, passa a prefeito de uma pequena cidade, a deputado estadual, federal, senador etc. De outra forma, aos políticos que têm maior proveito de capital convertido são permitidos “saltos” de carreira, com isso podem iniciar já em cargos que demandam maior notoriedade, como secretário de Estado, ministro de Estado, senador ou prefeito de uma grande cidade (Miguel, 2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134.). Nessa configuração, a “carreira política” decorre de uma acumulação de capital político que implica a garantia de sua permanência no campo político

2.2 CHANCES DE SE ELEGER PREFEITO NO BRASIL: PRINCIPAIS ASPECTOS CONDICIONANTES DA CARREIRA E DA CONSTRUÇÃO DO CAPITAL POLÍTICO

O município é o âmbito da vida cotidiana, constitui espaço da propriedade e da atividade democrática. A Constituição de 1988 assegura uma vertente municipalista em um contexto de reforma do Estado que tem na descentralização política, fiscal e administrativa um de seus principais pressupostos. O reconhecimento do município como ente federado muda seu status institucional, ampliando sua autonomia política (Arretche, 2000Arretche, M. T. S. (2000). Estado federativo e políticas sociais: determinantes da descentralização. Rio de Janeiro: Revan; São Paulo: Fapesp.).

Justamente devido à importância conferida por Arretche (2000Arretche, M. T. S. (2000). Estado federativo e políticas sociais: determinantes da descentralização. Rio de Janeiro: Revan; São Paulo: Fapesp.) e outros autores ao papel do governo local, não faltam desafios ao trabalho de prefeitos e vereadores. Nesse cenário, a vida pública, envolve a atuação dos agentes políticos no âmbito dos municípios, de forma que Bordignon (2013Bordignon, R. R. (2013). Candidatos e eleitos: recrutamento e chances de sucesso nas eleições de 1998 e 2010. Revista Paraná Eleitoral, 2, 35-62.) destaca que poucos políticos alcançam cargos eletivos em instâncias estaduais ou federais (no Executivo ou no Legislativo) sem antes terem despontado para a vida pública em cargos no nível municipal: considerado a principal via de acesso aos cargos políticos eletivos, o nível municipal se configura como espaço de difusão da identidade, composição das bases eleitorais e afirmação intrapartidária.

2.2.1 INFLUÊNCIA DAS CARREIRAS PROFISSIONAIS NO SUCESSO ELEITORAL E O RETRATO EVOLUTIVO DA DESIGUALDADE ENTRE SEXOS NA POLÍTICA

A influência dos fatores associados ao capital político se manifesta, além da efetivação das trajetórias políticas dos indivíduos, também nas escolhas partidárias relacionadas com carreira e sexo dos candidatos. Com efeito, os estudos de Bourdieu (1996Bourdieu, P. (1996). Razões práticas: sobre a teoria da ação (5a ed.). Campinas: Papirus.) acentuam essa dimensão da origem social sobre a produção e reprodução das desigualdades nas diversas esferas da vida, inclusive a profissional.

O capital político “[...] indica o reconhecimento social que permite que alguns indivíduos, mais do que outros, sejam aceitos como atores políticos e, portanto, capazes de agir politicamente” (Miguel, 2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134., p. 115). Ao longo dessa força motriz, tem-se assumido um caráter de freio para atores políticos com baixo acúmulo desse capital, entre os quais as mulheres, às quais uma socialização de gênero atribui papéis mais associados ao cuidado do trato da coisa pública (Miguel, 2003; Pinheiro, 2007Pinheiro, L. S. (2007). Vozes femininas na política: uma análise sobre mulheres parlamentares no pós-Constituinte. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para Mulheres.). A força dessa constatação não tem sido suficiente para a transformação dessa realidade, de tal forma que, ao crescimento da participação da mulher no mercado de trabalho na segunda metade do século XX e início do século XXI, não correspondeu uma ampliação proporcional dos ganhos e, de modo geral, a mulher precisa demonstrar melhor capacitação para assumir postos de chefia e comando. Com efeito, apesar de avanços recentes, o cenário da participação da mulher no mercado de trabalho é caracterizado por grandes dificuldades e desafios, especialmente no que diz respeito à igualdade de remuneração, condições de conciliação do trabalho com a família (dupla jornada de trabalho) e à concentração das mulheres em posições de menor nível de remuneração (Pinheiro, 2007).

No setor público, entretanto, a participação feminina na força de trabalho encontra um de seus maiores paradoxos, expresso na relação inversamente proporcional entre a quantidade de mulheres ocupantes de cargos efetivos, onde são maioria (investidura por concurso público), e nos cargos eletivos (investidura por meio da disputa eleitoral), onde estão em número pouco expressivo, a despeito de políticas de cotas para mulheres na política (Pinheiro, 2007Pinheiro, L. S. (2007). Vozes femininas na política: uma análise sobre mulheres parlamentares no pós-Constituinte. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para Mulheres.).

Novamente, a noção de capital político de Bourdieu (2011Bourdieu, P. (2011). O campo político. Revista Brasileira de Ciência Política, 5, 193-216.) oferece uma interessante chave explicativa para o fenômeno. Uma vez que a atuação política se insere em um contexto de disputa pelo poder, o capital político implica a ocupação de posições dominantes para o acúmulo desse capital, cuja obtenção não pode ser racionalmente relacionada apenas com as diferenças de capital cultural e escolar, ou seja, com base na meritocracia (Pinheiro, 2007Pinheiro, L. S. (2007). Vozes femininas na política: uma análise sobre mulheres parlamentares no pós-Constituinte. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para Mulheres.). Dessa forma, Bourdieu compreende a existência de outro princípio de diferenciação, outro tipo de capital, cuja distribuição desigual está na base das diferenças verificadas: o capital político. A respeito dele, Bourdieu (1996, p. 31) assevera:

[o capital político] assegura a seus detentores uma forma de apropriação privada de bens e serviços públicos […] vemos então que o capital social de tipo político que se adquire nos aparelhos de sindicatos e dos partidos transmite-se através de redes de relações familiares que levam à constituição de verdadeiras dinastias políticas.

Na esteira do entendimento de Bourdieu, conclui Miguel (2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134., p. 121):

O capital político é, em grande medida, uma espécie de capital simbólico; o reconhecimento da legitimidade daquele indivíduo para agir na política. Ele baseia-se em porções de capital cultural (treinamento cognitivo para a ação política), capital social (redes de relações estabelecidas) e capital econômico (que dispõe do ócio necessário à política). Como toda forma de capital, o capital político está desigualmente distribuído na sociedade. Na base da pirâmide, temos os simples eleitores […] no topo, os líderes que […] são reconhecidos como representantes dos diversos segmentos sociais.

Conclui-se esta seção aludindo aos conceitos de teto de vidro, parede de vidro, labirinto de cristal, cunhados por diferentes autores. Utilizando imagens metafóricas, e cada qual com suas peculiaridades, referem-se a barreiras invisíveis que limitam as escolhas e oportunidades para a mulher ascender profissionalmente.

3. Metodologia

De forma a analisar comparativamente as condições determinantes de sucesso nas eleições para prefeito no Brasil de 2000 a 2016, analisa-se no estudo o universo de candidatos e prefeitos com base na metodologia aqui detalhada. O estudo se caracteriza como exploratório, realizado por meio de pesquisa bibliográfica, documental e de campo. Foram consultados autores da ciência política com especial destaque para Bourdieu (1989Bourdieu, P. (1989). O poder simbólico. Lisboa: Difel., 1996, 2011), Miguel (2003Miguel, L. F. (2003, junho). Capital político e carreira eleitoral: algumas variáveis na eleição para o Congresso Brasileiro. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, 20, 115-134.), Urbinati (2006Urbinati, N. (2006). O que torna a representação democrática? Lua Nova, São Paulo, 67, 191-228.) e Codato, Cervi e Perissinotto (2013Codato, A; Cervi, E; & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, 14(2), 61-84.). Foi realizada pesquisa documental nas bases de dados disponibilizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), buscando desenvolver uma metodologia de análise estatística que pudesse estabelecer associação entre variáveis. O repositório de dados eleitorais, disponibilizado em formato de arquivo de dados, permitiu selecionar e analisar as variáveis de interesse do estudo. Com base nesses dados, são apresentados, inicialmente, os perfis dos prefeitos eleitos nas eleições de 2000 a 2016 no que se refere a idade, escolaridade, sexo e ocupação.

Em relação ao estudo estatístico, buscou-se, nesta pesquisa, num primeiro momento, determinar se atributos sociais e profissionais favorecem o sucesso nas eleições, com base em cruzamentos das variáveis independentes (sexo, idade, escolaridade e ocupação) em relação à variável dependente (resultado na eleição: eleito/não eleito). Foi realizado o teste do qui-quadrado (χ2), que indica o nível de dependência entre os pares de variáveis, ou seja, é um teste de hipóteses que tem como objetivo avaliar a associação existente entre variáveis qualitativas, buscando um valor da dispersão para duas variáveis nominais, utilizado para verificar a dependência ou independência entre as variáveis consideradas.

Num segundo momento, empregou-se o método de regressão logística de forma a avaliar os efeitos e a força de todas as variáveis explicativas em conjunto, a fim de se entender quais das variáveis independentes seriam mais relevantes para a vitória de um candidato a prefeito. A metodologia consistiu na utilização da análise estatística, empregando variáveis codificadas nos moldes dummy (variáveis binárias que assumem valor 0 = não ocorrência e 1 = sim ocorrência). A função de uma regressão logística é indicar uma probabilidade de ocorrência de determinado fato, dada a mudança de uma característica independente. Aqui, o fato é ser ou não eleito prefeito municipal, e as características são as variáveis explicativas: sexo, idade, grau de instrução e ocupação. Assim, os resultados de uma regressão logística expressam a probabilidade de ocorrência de valores preditos de uma variável dicotômica (sim/não). No caso, os valores são 0 = não eleito ou 1 = eleito. Por exemplo, tomando-se a variável “sexo do candidato” em relação à variável dependente, o resultado será interpretado em termos de intensidade: o quanto aumentam ou diminuem as chances de eleição do candidato (ou seja, passar de 0 para 1 nessa variável) quando este for do sexo feminino ou do masculino.

As variáveis explicativas consideradas foram: a) idade: verificar se a idade do candidato tem algum impacto nas chances de eleição. A variável binária representará o contraponto entre o grupo “adultos”, definido para o presente estudo como a faixa de 40 a 54 anos, e a soma dos demais candidatos, quais sejam: os “jovens” de 20 a 39 anos e os “mais velhos” com 55 anos ou mais. Essa variável assumirá o valor 1 (um) para o conjunto de “adultos”; b) escolaridade: mensurar o impacto do maior ou menor nível de instrução nos resultados das eleições. A variável binária foi construída levando-se em conta se o candidato possuía ou não nível superior completo, sendo 1 (um) para os casos afirmativos e 0 (zero) para os demais níveis de escolaridade; c) ocupação: medir as chances do candidato pertencente à carreira política (reeleição, ou trajetória política pregressa). Incluem-se os candidatos que declararam ocupações classificadas no subgrupo “membros superiores e dirigentes do poder público” (Horta, Silva, Rocha & Dufloth, 2017Horta, C; Silva, M; Rocha, M; & Dufloth, S. (2017). Perfil dos prefeitos eleitos nos municípios brasileiros: estudo evolutivo das eleições realizadas no período entre 2000 e 2012 2012 (Textos para Discussão, n. 4). Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro. Recuperado de http://www.fjp.mg.gov.br/index.php/docman/texto-para-discussao/703-td-no4-claudia-horta/file.
http://www.fjp.mg.gov.br/index.php/docma...
). Destaca-se que, majoritariamente, tais candidatos se declararam prefeitos (outros poucos, vereadores, deputados etc.). A variável binária assumiu valor 1 (um) para aqueles candidatos pertencentes ao referido subgrupo, e 0 (zero) para as demais ocupações; d) sexo: mensurar se os homens têm chances maiores ou menores de se elegerem prefeitos. Determinar se e mensurar o quanto ser homem influenciou em eleição ou não eleição para prefeito. Ser homem teria qual peso nos resultados da disputa às prefeituras brasileiras? A variável binária utilizada foi 1 (um) para homens e 0 (zero) para mulheres.

4. O perfil dos prefeitos eleitos de 2000 a 2016

A análise do perfil dos prefeitos eleitos no período compreendido entre 2000 e 2016 apresenta-se, a seguir, organizada por características segundo: a) idade e escolaridade; e b) ocupação e sexo.

4.1 IDADE E ESCOLARIDADE

Os resultados das eleições municipais de 2000 a 2016, apresentados na Tabela 1, evidenciaram padrão etário característico aos prefeitos eleitos e mostram concentração nos grupos etários de 40 a 44 anos, 45 a 49 anos e 50 a 54 anos, perfazendo juntos mais da metade dos prefeitos eleitos nos anos de 2000 a 2012, e aproximadamente a metade deles na eleição de 2016. Entretanto, nas três últimas eleições o peso desses três grupos etários vem diminuindo. O percentual de prefeitos eleitos nos grupos etários mais velhos, ou seja, com 55 anos ou mais, é ligeiramente superior ao do grupo dos mais jovens, quais sejam, de 20 a 39 anos. Na eleição de 2016, 49,8% dos prefeitos eleitos tinham idade entre 40 e 54 anos. Para os demais, 21% encontravam-se entre 20 e 39 anos, enquanto 29,2% tinham 55 anos ou mais. As alterações observadas ao longo das eleições na estrutura etária apontam para o aumento sistemático da idade média dos prefeitos no país. Essa idade se encontrava em torno dos 48 anos na eleição de 2000, chegando a 48,8 anos em 2016.

Tabela 1
Distribuição relativa dos prefeitos eleitos segundo grupos etários (2000, 2004, 2008, 2012 e 2016)

No quesito escolaridade, a pesquisa demonstra que, indiscutivelmente, aumentou o nível de escolaridade dos prefeitos eleitos; entretanto, verificou-se que candidatos com baixa escolaridade ainda permanecem representados, mesmo que com percentuais decrescentes ao longo do período. Dois pontos chamam atenção na distribuição dos prefeitos eleitos segundo escolaridade: predominância daqueles que declaram ter ensino superior completo e aumento gradativo dos níveis de escolaridade entre as eleições de 2000 e 2016. A Tabela 2 aponta que, dos prefeitos eleitos em 2000, 38,7% declaram possuir nível superior completo, passando para 52,5% no ano de 2016. Dessa forma, poder-se-ia apontar a elevada proporção de prefeitos eleitos com curso superior, o que sugere que pessoas com baixa escolaridade possuem menores chances de serem eleitas. Enquanto na eleição de 2000, do total de prefeitos, 15,5% não tinham o primeiro grau completo,2 2 Incluem-se aqueles que declararam “lê e escreve” e “primeiro grau incompleto”. em 2016 esse percentual representou 7% dos prefeitos eleitos, fruto de quedas sucessivas e significativas ao longo das quatro eleições. Vale ressaltar ainda que, nas eleições de 2000, 23,6% dos prefeitos eleitos possuíam o 2o grau completo. Na eleição de 2016, os prefeitos com essa escolaridade representavam 25,7% do total.

Tabela 2
Distribuição relativa dos prefeitos eleitos segundo grau de instrução (2000, 2004, 2008, 2012 e 2016)

Os resultados obtidos na análise da variável idade apresentam mudanças pouco significativas ao longo dos cinco últimos pleitos, e são uma demonstração de como o montante de capital político necessário à conquista do Executivo municipal gera a necessidade de candidatos com notoriedade adquirida por períodos de longa maturação. Assim, prefeitos eleitos antes de completar 40 anos são menos frequentes, o que significa que o capital político, seja delegado ou pessoal, necessário para vencer uma eleição majoritária municipal produz frutos a prazos longos.

No que se refere à escolaridade, os dados mostram o quanto o diploma de ensino superior é valorizado no Brasil. Ao longo das cinco últimas eleições municipais, mais prefeitos eleitos detêm esse grau de instrução, o que pode estar associado tanto à expansão do ensino superior ao longo do período quanto ao reconhecimento que a educação superior confere às pessoas, representando um símbolo de colocação social elevada. Ademais, a educação superior pode ter relação também com o capital econômico dos candidatos - cidadãos que puderam se dedicar aos estudos - e à expansão de seus círculos de relacionamentos profissionais, enquanto muitos outros precisam se dedicar ao trabalho a partir da idade adulta.

4.2 SEXO E OCUPAÇÃO DECLARADA

Os resultados das urnas nas cinco últimas eleições apontam a sub-representação das mulheres nas prefeituras brasileiras, a despeito de o percentual de prefeitas eleitas ter aumentado continuamente entre 2000 e 2012 e ter permanecido praticamente estável na eleição de 2016. Informações dos censos demográficos de 2000 e 2010 mostram que pouco mais da metade da população brasileira é composta por mulheres, enquanto nas prefeituras esse percentual é bem menos significativo. No ano 2000, 5,7% dos prefeitos eleitos eram do sexo feminino. Como mostra a Tabela 3, nas três eleições seguintes esse percentual cresceu gradativamente, chegando em 2012 a 11,8%. Ou seja, pouco mais do que o dobro num período de quatro eleições; entretanto, como pontuado anteriormente, em patamar ainda reduzido. Na eleição seguinte, o percentual tem leve recuo para 11,6%

Tabela 3
Distribuição relativa dos prefeitos eleitos segundo sexo (2000, 2004, 2008, 2012 e 2016)

A lenta inclusão feminina no campo político demonstra o baixo reconhecimento da mulher como agente político, bem como as barreiras invisíveis já mencionadas anteriormente.

A análise das ocupações declaradas pelos prefeitos eleitos nos pleitos de 2000 a 2016 evidencia importantes mudanças quando se observam categorias ou grupos ocupacionais.3 3 Os procedimentos metodológicos de construção dos grupos e subgrupos de ocupação encontram-se em Horta et al. (2017). [Horta, C., Silva, M., Rocha, M., & Dufloth, S. nas referências] No que se refere à ocupação declarada, os “profissionais das ciências e das artes” apresentaram participação expressiva, entretanto, com redução ao longo desse período. Conforme mostra a Tabela 4, que traz os principais achados do estudo,4 4 A distribuição relativa dos prefeitos segundo grupos e subgrupos de ocupação completa encontra-se em Horta et al. (2017). [Horta, C., Silva, M., Rocha, M., & Dufloth, S. nas referências] no ano de 2000, esse grupo representava o maior percentual dos eleitos (28,4%), passando para 25,6% da totalidade em 2016. Nessa última eleição, representa ainda percentual importante, entretanto, deixando de se caracterizar como principal grupo quanto a ocupação. O subgrupo “profissionais das ciências biológicas, da saúde e afins” destaca-se na composição do referido grupo em todas as eleições analisadas, apresentando também redução do seu percentual.

O estudo aponta que, a partir da eleição de 2008, os “profissionais das ciências e das artes” deixam a posição de principal ocupação dando lugar aos “membros superiores do poder público, dirigentes de organizações de interesse político e de empresas e gerentes”. Chama atenção para a relevância de tal fato, tanto pelo significativo crescimento da participação desse último grupo ocupacional ao longo das cinco eleições, quanto pela importância relativa. Esse percentual praticamente dobra, passando de 22% em 2000 para 42% em 2016. Mais ainda, especificamente sobre esse grupo, os resultados apontam elevada participação do subgrupo “membros superiores e dirigentes do poder público” na composição dos prefeitos eleitos em patamares crescentes. Se em 2000 representavam apenas 5,9% do total de eleitos, chegam em 2012 a 21%. Na sua quase totalidade, como ocupação declararam-se: prefeito ou vereador - podem ser classificados como pertencentes a uma “carreira política” ou “reeleitos politicamente”. Além desse subgrupo, também os “dirigentes de empresas e organizações” vêm apresentando participação crescente, apesar de estabelecerem patamares inferiores. Em 2000, representavam 2,3%, passando para 15% em 2016. Ressalta-se que os dois grupos destacados representavam mais da metade das ocupações declaradas pelos prefeitos eleitos - 50,4% em 2000 e 67,7% em 2016.

Vale salientar que a análise dos dados não permite diferenciar entre “dirigentes de empresas e organizações” aqueles que são oriundos de empresas privadas e de organizações e empresas públicas. Esse grupo teve um crescimento significativo observado ao longo dos anos pesquisados, passando de 2,25% para 14,96% entre 2000 e 2016.

Tabela 4
Distribuição relativa dos prefeitos eleitos segundo ocupação declarada nos anos 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016

Esses resultados demonstram como a carreira profissional é uma das mais significativas fontes de acumulação do capital político para os atores políticos no âmbito local. Com efeito, ter ocupado postos estratégicos em instituições ou órgãos públicos, especialmente, é uma forma de se adquirir capital delegado, tendo despontado, a partir da eleição de 2008, como a mais frequente atividade dos prefeitos eleitos. Isso pode ser compreendido como uma maior burocratização do campo político no Brasil nos anos mais recentes, em que instituições públicas têm maior capacidade de estocar montantes significativos de capital político a ser transferido aos agentes do campo, diferentemente de um passado em que o capital pessoal e o capital convertido teriam maior relevância na definição das candidaturas mais fortes.

5. Chances de se eleger prefeito no Brasil: sucesso eleitoral segundo atributos sociais e profissionais e probabilidades

A Tabela 5 apresenta a distribuição relativa dos candidatos eleitos e não eleitos nas eleições de 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016 segundo as variáveis binárias construídas: sexo, idade entre 40 e 54 anos, grau de instrução superior completo e ocupação “carreira política”, como especificado anteriormente. Os resultados do teste do qui-quadrado (χ2) encontram-se logo abaixo dos cruzamentos; entre parênteses é apresentado o nível de significância.

Os resultados mostram que quase todas as variáveis explicativas têm relação individual com a variável dependente, ao nível de significância de 5%. As exceções referem-se à variável idade entre 40 e 54 anos nas eleições de 2004 e 2016 e à variável escolaridade nas eleições de 2008 a 2016. Pode-se depreender que, no que diz respeito ao sexo dos candidatos, constatou-se importante relação com o fato de eleger-se ou não. Ser homem contribui para a eleição de forma bastante significativa na eleição de 2000 (χ2 de 45,331), ou seja, mesmo que se considere o elevado número de candidaturas masculinas comparativamente às femininas, os primeiros elegeram-se proporcionalmente mais. Nesse ano, foi a variável que apresentou maior relação. Os candidatos homens representam 92,4%, enquanto os eleitos sobem para 94,3%. Ao longo das três eleições seguintes faz-se também evidente tal relação, entretanto com redução do valor do qui-quadrado, mas ainda com significância estatística acentuada. Ou seja, o sexo do candidato responde pela maior ou menor chance de sucesso na eleição, mas essa variável tem perdido, paulatinamente, importância entre as eleições de 2000 e 2016.

Tabela 5
Brasil: distribuição relativa dos eleitos e não eleitos às prefeituras segundo sexo, idade, escolaridade e carreira política (2000, 2004, 2008, 2012 e 2016)

A variável idade também apresentou, individualmente, relação com o resultado eleitoral. Candidatos com idade entre 40 e 54 anos têm maior chance de sucesso comparativamente aos mais jovens (20 a 39 anos) e mais velhos (55 anos ou mais), nas eleições analisadas, com exceção de 2004 e 2016, como apontado anteriormente.

A escolaridade dos candidatos guarda relação com o desempenho eleitoral apenas nas eleições de 2000 e 2004; entretanto, favoráveis aos que não tinham curso superior completo, ou seja, estes obtiveram mais sucesso comparativamente àqueles com curso superior completo. Entre as variáveis dependentes em estudo, aquela que dimensiona o peso da “carreira política” no sucesso eleitoral das eleições para prefeito merece destaque. Da mesma forma que o sexo dos candidatos, ser da “carreira política” contribui expressivamente para a chance de eleição, estabelecendo elevados valores de χ2. Ou seja, pertencer à “carreira política” destacadamente aumenta a chance de vencer nas eleições para prefeito.5 5 Vale lembrar que, na sua maioria, os candidatos classificados neste subgrupo declararam, como ocupação, “prefeito”. Na eleição de 2016, 18,5% dos candidatos classificavam-se como pertencentes à “carreira política”, e entre os eleitos esse percentual subiu para 21%.

Com o objetivo de avaliar os efeitos e a força das variáveis explicativas conjuntamente, buscando verificar sua relevância para a vitória de um candidato a prefeito, são apresentados, a seguir, os resultados das regressões logísticas. Foram consideradas apenas aquelas variáveis que apresentaram significância estatística, observada pelo valor da estatística p (menor ou igual a 0,05). A análise se baseará nas razões de chance calculadas a partir da exp(β). O valor dessa estatística indica a intensidade da probabilidade de ser eleito prefeito e o sinal indica sua direção, ou seja, se existe maior ou menor chance de eleição segundo cada uma das características analisadas.

Na eleição de 2000, ser homem ou ter idade entre 40 e 54 anos ou ser da “carreira política” aumentava significativamente as chances de eleger-se a prefeito. Os resultados da Tabela 6 mostraram que um candidato do sexo masculino tinha 57,9% mais chances de ser eleito do que uma candidata do sexo feminino. Significativa também a vantagem daqueles candidatos pertencentes às “carreiras políticas”. Estes tinham 47,9% mais chances de vitória comparativamente aos demais. Ter idade entre 40 e 54 anos também determinava maior chance nas eleições, apesar de num patamar inferior (19,3% maior que os demais candidatos). No nível de escolaridade dos candidatos, ter curso superior completo diminuía as chances de eleger-se para prefeito.

Tabela 6
Coeficientes da regressão logística, 2000

Os resultados da eleição de 2004, apresentados na Tabela 7, mostram que o sexo, a escolaridade e a ocupação dos candidatos a prefeito contribuíram de forma importante para a eleição dos prefeitos. Destaca-se a importância da ocupação do candidato, pois pertencer à “carreira política” determinou uma chance de vitória 62,4% maior em relação aos demais. Na sequência, o sexo do candidato se apresentou como característica determinante: ser do sexo masculino aumentou em 49,9% a chance de ser eleito comparativamente às candidatas mulheres. Mais uma vez, nessa eleição, constatou-se que ter escolaridade superior não aumentava a chance de ser eleito prefeito; na verdade, a chance foi 7,2% menor.

Tabela 7
Coeficientes da regressão logística, 2004

Na eleição de 2008, chama atenção a importância de pertencer à “carreira política” em relação às chances de eleição a prefeito. Os candidatos classificados nessa categoria tiveram 139,8% mais chance de se elegerem prefeitos comparativamente aos demais candidatos. Na sequência, mais uma vez, ser do sexo masculino aumentou em 41% a chance de eleição comparativamente ao sexo feminino. Nesse ano, a variável idade mostrou-se estatisticamente significativa, e candidatos com idade entre 40 e 54 anos tiveram maior chance na eleição, 29,1% mais que os demais candidatos. A variável escolaridade, a partir dessa eleição, deixa de ter impacto na explicação para eleição de prefeitos.6 6 Nas eleições de 2012 e 2016, a variável escolaridade não mais apresentou significância estatística.

Tabela 8
Coeficientes da regressão logística, 2008

As mesmas três variáveis, sexo, idade e “carreira política”, continuaram respondendo pela maior chance de eleição em 2012. Destaque, novamente, para aqueles candidatos que pertenciam à “carreira política”. Pertencer a essa categoria aumentou em 58,5% a chance de eleição comparativamente aos demais candidatos. Também significativo e determinante na eleição foi o sexo do candidato. Mais uma vez, ser do sexo masculino aumentou em 25% a chance de eleição comparativamente às mulheres. Por fim, também a idade do candidato determinava vantagens. Aqueles com idade entre 40 e 54 anos tiveram 9% mais chances de serem eleitos.

Tabela 9
Coeficientes da regressão logística, 2012

Na última eleição para prefeito, observa-se consolidação dos atributos sexo e ocupação nas chances eleitorais dos candidatos. Nesse ano, apenas as duas variáveis foram estatisticamente significativas. Candidatos que pertenciam à “carreira política” tiveram 28,1% maior chance de eleição que os demais candidatos, e ser do sexo masculino aumentou em 24,5%.

Tabela 10
Coeficientes da regressão logística, 2016

6. Conclusões

A análise dos dados confirma as teorias já abordadas no que diz respeito à variável sexo, reforçando um traço negativo da sociedade brasileira: a crença de que existem limitações para que as mulheres ocupem cargos de liderança. Fica muito claro que há maior dificuldade para que elas tenham acesso ao campo político, uma vez que se deparam com imposições sociais que dificultam seu ingresso em partidos ou outras organizações públicas capazes de torná-las fortes concorrentes às prefeituras. Ainda que se tenha notado um avanço na participação feminina entre as candidaturas vitoriosas de 2000 a 2012, variando de 5,7% para 11,8%, a leve retração desse número em 2016 para 11,6% é um dado preocupante.

Assim, as diferenças percebidas nas chances de eleição relacionadas ao sexo dos candidatos e à estagnação no avanço da participação feminina deixam claro que as políticas de cotas para candidatas nas eleições brasileiras devem ser aprofundadas, pois estão longe de promover a justa igualdade de oportunidades para homens e mulheres. Avalia-se que a consistente sub-representação feminina justifica políticas afirmativas de estímulo à participação feminina na vida política nacional, especialmente no que tange às cotas de gênero nas candidaturas. Nesse caso, as cotas definidas pela Lei no 12.034/20097 7 A minirreforma eleitoral de 2009 (Lei no 12.034) estabeleceu no §3o do artigo 10 da Lei das Eleições (Lei no 9.504/1997) que “cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”. são aplicáveis somente aos cargos proporcionais (Poder Legislativo), e ainda assim os efeitos desse tipo de incentivo são limitados em um sistema de lista aberta, como destaca Miguel (2004Miguel, L. F. (2004). Participação eleitoral e gênero no Brasil: as cotas para mulheres e seu impacto. In Anais do 2o Congresso da Associação Latino-Americana de Ciência Política (pp. 1-19), Cidade do México: Alacip.

Ainda tratando das chances femininas em eleições, é oportuno reparar que houve uma redução, ao longo dos cinco pleitos estudados, nas chances de eleição de candidatos do sexo masculino. Essa redução é percebida entre 2000 e 2008, seguindo-se uma significativa redução em 2012. Isso pode ter relação com o fato de Dilma Rousseff ter vencido as eleições de 2010, tornando-se a primeira mulher a ocupar a Presidência da República a partir do ano seguinte. Mais uma vez, entretanto, percebeu-se uma queda no ritmo de redução dessa desigualdade entre 2012 e 2016.

No quesito escolaridade, há um resultado surpreendente. Enquanto era de se esperar que essa variável tivesse forte relação com a variável dependente analisada, viu-se que em alguns anos ela foi descartada pelas técnicas estatísticas aplicadas ou apresentou chance negativa, ou seja, o diploma universitário não teria, em tese, influenciado no sucesso eleitoral de um candidato. Tal resultado surpreende e cria a possiblidade de aprofundamento da pesquisa, especialmente pelo fato de se ter observado que o nível de escolaridade dos candidatos vitoriosos nas eleições de 2000 a 2016 apresentou aumento constante, chegando-se à marca de 52,6% dos prefeitos eleitos em 2016 com nível superior completo. O que se poderia inferir de tal fato seria uma suposta relação entre o capital pessoal de um pretendente a ingressar na política, suas condições econômicas e seu nível de escolaridade. Partindo-se do pressuposto de que o ensino superior no Brasil ainda é acessível aos estratos de maior renda da população, a escolaridade poderia estar relacionada não diretamente com as chances de eleição de um candidato, mas com as condições para que ele seja capaz de acumular um capital político mais vultoso, seja por ter maior disponibilidade de tempo para se dedicar às questões políticas do seu entorno, seja por ter melhor acesso a informação, redes de relacionamento mais amplas, capital econômico abundante, pertencer a famílias mais influentes etc. Desse modo, a crescente escolaridade de candidatos poderia ser um indicador de que o campo político vem se tornando mais fechado para novos ingressantes, havendo maiores barreiras para se alcançar êxito nas eleições. Isso significaria que, para alcançar postos mais altos nas estruturas partidárias e de organizações públicas, haveria uma exigência de níveis cada vez mais altos de escolaridade, sendo tal exigência ainda maior para mulheres do que para homens, quando se veem os índices mais atuais de nível superior completo para prefeitos e prefeitas eleitos em 2016.

Por fim, a variável carreira política, conforme tratada, demonstra que houve maior oclusão do campo político no Brasil entre 2000 e 2008. Os resultados mostram que as chances de um candidato pertencente a esse grupo ser vitorioso aumentaram significativamente nessas três eleições, chegando ao ápice de 139,8%. Nesse período, o campo político no Brasil notadamente passava por um momento de forte estabilidade, impulsionado por um cenário econômico muito favorável e otimista - lembrando aqui que a crise de 2008 eclode com o evento do pedido de falência do banco Lehman Brothers em 15 de setembro daquele ano, nos EUA, mas não gera repercussões diretas no pleito ocorrido em 5 e 26 de outubro no Brasil. Nesse período, há uma crescente participação dos chamados “políticos profissionais” entre os candidatos vitoriosos, aqueles que conquistaram a reeleição ou que já ocupavam cargos públicos, como vereadores, secretários municipais, dirigentes sindicais ou de outras organizações de interesse público.

No entanto, após 2008, é notória a redução nas chances de candidatos da carreira política nos pleitos municipais, chegando a 28,1% em 2016. Aqui se pode perceber uma maior aceitação do eleitorado para novos entrantes, quando alguns candidatos de grandes capitais, como João Doria, em São Paulo, e Alexandre Kalil, em Belo Horizonte, beneficiaram-se do discurso de negação de pertencimento à classe política.

Apesar disso, os números demonstram que o campo político brasileiro detém ainda algum nível de sedimentação e estabilidade, o que se comprova pela elevada chance de vitória dos candidatos que já vêm de uma carreira política. Isso faz com que a entrada de novos atores capazes de produzir mudanças substanciais no campo político dependa da superação de inúmeras barreiras, tornando também mais evidentes as desigualdades na conquista do necessário capital político. A grande questão é esperar que essas barreiras sejam mais republicanas, ou seja, estejam relacionadas com a qualidade das propostas e das ações das pessoas que têm interesse em ingressar nessa área, e não com práticas vergonhosas associadas a ela, fundadas em patrimonialismo, em perpetuação do poder de grupos familiares, em apropriação privada do Estado.

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  • Urbinati, N. (2006). O que torna a representação democrática? Lua Nova, São Paulo, 67, 191-228.
  • 1
    Bourdieu (2011) refere-se aos presidentes franceses, muitas vezes tendo ocupado o cargo de secretário-geral em seus respectivos partidos. No caso brasileiro, os partidos são chefiados por um presidente, que equivaleria ao secretário-geral.
  • 2
    Incluem-se aqueles que declararam “lê e escreve” e “primeiro grau incompleto”.
  • 3
    Os procedimentos metodológicos de construção dos grupos e subgrupos de ocupação encontram-se em Horta et al. (2017). [Horta, C., Silva, M., Rocha, M., & Dufloth, S. nas referências]
  • 4
    A distribuição relativa dos prefeitos segundo grupos e subgrupos de ocupação completa encontra-se em Horta et al. (2017). [Horta, C., Silva, M., Rocha, M., & Dufloth, S. nas referências]
  • 5
    Vale lembrar que, na sua maioria, os candidatos classificados neste subgrupo declararam, como ocupação, “prefeito”.
  • 6
    Nas eleições de 2012 e 2016, a variável escolaridade não mais apresentou significância estatística.
  • 7
    A minirreforma eleitoral de 2009 (Lei no 12.034) estabeleceu no §3o do artigo 10 da Lei das Eleições (Lei no 9.504/1997) que “cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2019

Histórico

  • Recebido
    28 Jul 2017
  • Aceito
    22 Mar 2018
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