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Captura ou não captura? Perspectivas analíticas no estudo de políticas regulatórias

¿Captura o no captura? Perspectivas analíticas en el estudio de políticas regulatorias

Resumo

A discussão de captura regulatória não é uma agenda recente em estudos do Estado, mas o estabelecimento de critérios para identificação de captura, bem como a definição de protocolos para demonstração e mensuração do fenômeno estão longe de um consenso. O presente artigo tem por objetivo, por meio de uma revisão sistematizada não exaustiva da literatura, identificar as principais estratégias de captura e suas respectivas formas de mensuração. Propõe-se a organização dos estudos de regulação em quatro eixos de estratégias de captura: por incentivos materiais, por incentivos imateriais, por ameaça e por assimetria de informação. Ademais, busca-se examinar a produção sobre o caso brasileiro e discutir os resultados contraditórios de pesquisas recentes sobre o caso da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Identificou-se que, em geral, a literatura brasileira parte de uma abordagem ampla de compreensão de captura e que os trabalhos que se orientam por uma abordagem restritiva exploram, principalmente, o mecanismo de “porta giratória”, seguindo uma tendência da literatura internacional, porém ignorando outros mecanismos com potencial explicativo. Esses achados têm implicações para desenhos de pesquisa em estudos sobre regulação, de forma a avançar as análises além das impressões iniciais e em direção a demonstrações empíricas robustas.

Palavras-chave:
captura; agência reguladora; política regulatória; porta giratória

Resumen

La discusión sobre la captura regulatoria no es una agenda reciente en los estudios del Estado, pero el establecimiento de criterios para la identificación de la captura, así como la definición de protocolos para demostrar y medir el fenómeno están lejos de un consenso. Este artículo tiene como objetivo, a través de una revisión bibliográfica no exhaustiva, identificar las principales estrategias de captura y sus respectivas formas de medición. Se propone organizar los estudios de regulación en cuatro ejes de estrategias de captura: por incentivos materiales, por incentivos inmateriales, por amenaza y por asimetría de información. Además, se busca examinar la producción sobre el caso brasileño y discutir los resultados contradictorios de investigaciones recientes sobre el caso de la Agencia Nacional de Salud Suplementaria (ANS). Se identificó que, en general, la literatura brasileña parte de un enfoque amplio para comprender la captura y que las obras guiadas por un enfoque restrictivo exploran principalmente el mecanismo de “puerta giratoria”, siguiendo una tendencia en la literatura internacional, sin tener en cuenta otros mecanismos con potencial explicativo. Estos resultados tienen implicaciones para diseños de investigación en estudios de regulación, con el fin de avanzar en los análisis más allá de las impresiones iniciales y hacia demostraciones empíricas sólidas.

Palabras clave:
captura; agencia reguladora; política regulatoria; puerta giratoria

Abstract

The discussion of regulatory capture is not recent in state studies. However, the criteria to identify capture and the definition of the research protocols to demonstrate and measure the phenomenon have still not reached a consensus. This article carries out a non-exhaustive literature review to identify the main regulatory capture strategies and their respective measurement methods. We organize the regulation studies in four axes of regulatory capture strategies: capture by material incentives, capture by immaterial incentives, capture by threat, and capture by information asymmetry. Furthermore, the study examines the Brazilian case and discusses the contradictory results of recent research on the case of the National Supplementary Health Agency (ANS). We identified that, in general, Brazilian literature starts from a broad approach to understanding regulatory capture. Also, the studies adopt a restrictive approach mainly to explore the “revolving door” mechanism, following a trend in international literature but ignoring other mechanisms with explanatory potential. These findings have implications for research designs in studies of regulation in order to advance analyses beyond initial impressions and toward robust empirical research.

Keywords:
regulatory capture; regulatory agency; regulatory policy; revolving doors

1. INTRODUÇÃO

Como demonstrar que determinado resultado de políticas públicas é decorrência direta da captura de agências independentes? Como se pode atestar que o potencial de influência de um grupo de interesse desdobrou-se efetivamente em captura regulatória? O que se pode caracterizar como captura? Esses questionamentos têm incitado pesquisadores de regulação há algumas décadas e o debate não se limita à dimensão teórica da problemática, mas se estende à metodológica.

Stigler (1971Stigler, G. J. (1971). The Theory of Economic Regulation. Bell Journal of Economics and Management Science, 2(1), 3-21.), em estudo seminal sobre captura de agências reguladoras inicia a discussão sobre o direcionamento da atuação do Estado a grupos de interesse. Marcando uma mudança de paradigma nos estudos de regulação, Stigler contrapõe-se à figura do agente público benevolente - premissa da corrente do interesse público - e sugere a teoria da demanda por regulação, indicando que a regulação é “adquirida” pela indústria e conduzida por ela em seu benefício.

O pioneirismo de Stigler (1971Stigler, G. J. (1971). The Theory of Economic Regulation. Bell Journal of Economics and Management Science, 2(1), 3-21.), seguido pela importante elaboração de Peltzman (1976Peltzman, S. (1976). Toward a More General Theory of Regulation. The Journal of Law and Economics, 19(2), 211-240.), é reconhecido na fundação da agenda de captura regulatória, mas pesquisas posteriores levantaram lacunas explicativas em sua abordagem metodológica. De forma geral, as críticas endereçadas ao trabalho de Stigler- e de outros pesquisadores que enfrentaram a questão com modelos econométricos - é que pouco se discutia sobre como os mecanismos de captura eram observados na prática.

Sobre esse problema, Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.) revisam não só a publicação de Stigler, mas a produção derivada a partir de seu trabalho e apontam que, em geral, a captura não estava sendo corretamente diagnosticada. Em uma empreitada minuciosa de refinamento conceitual, os autores sustentam que, para alegar a existência de captura, deveria haver um esforço em três frentes principais: 1. apresentar um modelo “falsificável” de interesse público; 2. demonstrar uma mudança política em detrimento do interesse público e em favor de algum setor específico; e 3. demonstrar intenção e ação suficiente do setor para justificar a relação causal.

Além desses três aspectos, os autores apontam para a pouca precisão conceitual de diversos trabalhos, que tratam como captura mecanismos diversos de influência, corrupção ou falha regulatória. Nesse sentido, também seria importante o cuidado com a definição de captura adotada.

Apesar de o debate sobre captura de agências reguladoras não ser novo, a forma como o conceito é operacionalizado em trabalhos empíricos ainda permanece um campo aberto a debate. Essa questão é identificada pela literatura como o “paradoxo da captura”: um fenômeno amplamente reconhecido, mas cujas evidências empíricas são limitadas (Agrell & Gautier, 2012Agrell, P. J; & Gautier, A. (2012). Rethinking regulatory capture. In J. E. Harrington & Y. Katsoulacos (Orgs.), Recent advances in the analysis of competition policy and regulation. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing., 2017Agrell, P. J; & Gautier, A. (2017). A theory of soft capture. The Scandinavian Journal of Economics, 119(3), 571-596.). O paradoxo reside no fato de que há amplo reconhecimento teórico do fenômeno da captura, mas inobservância empírica dos canais pelos quais a captura ocorre - publicidade de acordos de subornos ou oferta de cargos entre regulados e reguladores, por exemplo.1 1 Para um debate aprofundado sobre esse ponto, ver a Introdução de Carpenter e Moss (2013).

Especificamente sobre a pesquisa em regulação no Brasil, o cenário não é diferente. Além de os trabalhos serem escassos, não há consenso sobre a definição ou a operacionalização do conceito de captura. Publicações recentes sobre a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por exemplo, chegam a resultados contraditórios sobre a captura da agência (Baird, 2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.; Ocké-Reis, Fiuza & Coimbra, 2019Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.).

O presente trabalho tem como objetivo avançar nessa agenda de pesquisa a partir da revisão da produção recente sobre captura de agências reguladoras. Inicialmente, a partir da revisão da literatura internacional, buscou-se identificar os principais mecanismos de captura mobilizados, bem como as práticas de operacionalização do conceito.

A partir daí, analisando a produção sobre o caso brasileiro, pretende-se identificar quais as lentes analíticas que guiam os pesquisadores no país, quais as escolhas para operacionalizar a mensuração de captura e de que forma essas escolhas podem conduzir a resultados distintos no estudo do fenômeno.

Pretende-se, assim, contribuir para o refinamento conceitual de captura regulatória, organizando o repertório teórico e metodológico a disposição dos pesquisadores e contribuir, dessa forma, para a consolidação dessa agenda no estudo de políticas regulatórias no Brasil.

O artigo está organizado da seguinte forma: como ponto de partida, serão apresentadas, na próxima seção, algumas notas a respeito dos procedimentos para a seleção dos artigos acadêmicos revisados. Em seguida, será discutida a literatura internacional sobre captura para melhor situar o panorama no qual se insere a produção nacional. O artigo segue discutindo o caso brasileiro e sob quais perspectivas analíticas as agências reguladoras do país têm sido analisadas. Por fim, serão apresentadas, nas conclusões, as principais contribuições do artigo e apontamentos para pesquisas futuras que explorem o fenômeno da captura em países em desenvolvimento.

2. NOTAS SOBRE OS PROCEDIMENTOS DE REVISÃO

Embora o artigo proponha-se a uma revisão não exaustiva da literatura, cabem alguns apontamentos acerca da seleção dos artigos acadêmicos para a discussão. Para a pesquisa, foram utilizadas três bases principais: Web of Science, Scielo e Google Scholar.

Na base Web of Science, as buscas foram filtradas pelas palavras-chave “captura regulatória” e “regulatory capture”, limitadas aos últimos cinco anos. Os resultados foram restritos ao formato “Article” nas seguintes áreas do conhecimento: Economics, Political Science, Management, Business, Public Administration, International Relations, Health Policy Services e Social Sciences Interdisciplinary. Nessa base, foram selecionados artigos com cinco citações ou mais, o que nos retornou um total de 72 artigos.

A partir desta seleção inicial, foi realizada uma análise qualitativa dos resumos dos artigos, de forma a selecionar apenas aqueles com objetivo específico de discutir captura regulatória em termos teóricos ou que apresentavam análises empíricas sobre captura, totalizando, ao final, 19 artigos.

De forma complementar a esse levantamento, recorreu-se às bases Scielo e Google Scholar, nas quais foram realizadas buscas pelas palavras-chave “captura regulatória”, “captura”, “regulatory capture”, “política regulatória” e “agências reguladoras”, todas para o limite dos cinco anos mais recentes. Na busca no Google Scholar, esse critério foi relaxado para a inclusão de pesquisas sobre o caso brasileiro, já que o volume de produção é pequeno. Por isso, foram incluídas algumas publicações mais antigas.

Dessa forma, no levantamento da base Google Scholar, optou-se por utilizar apenas o filtro de “relevância” para que a busca não fosse muito restritiva. No Scielo, a pesquisa foi restrita às seguintes áreas: Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Humanas, Ciências da Saúde e Multidisciplinar. Também se procedeu uma análise qualitativa dos resumos para filtrar os trabalhos com foco em captura regulatória.

De forma complementar, foram selecionadas publicações por referências cruzadas dos artigos inicialmente selecionados. Foram incluídos artigos que mobilizavam e embasavam a discussão de múltiplos autores previamente selecionados. Aqui entra a seleção de textos clássicos e demais produções que são referências basilares para a discussão e que, porventura, não estivessem contempladas na triagem inicial - a exemplo de Stigler (1971Stigler, G. J. (1971). The Theory of Economic Regulation. Bell Journal of Economics and Management Science, 2(1), 3-21.), Peltzman (1976Peltzman, S. (1976). Toward a More General Theory of Regulation. The Journal of Law and Economics, 19(2), 211-240.) e Dal Bó (2003Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53., 2006Dal Bó, E. (2006). Regulatory capture: A review. Oxford Review of Economic Policy, 22(2), 203-225. Recuperado de https://doi.org/10.1093/oxrep/grj013
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). Incluímos também, sugestões dos pareceristas anônimos. Ao final, foram revisadas 54 publicações.

3. CAPTURA OU NÃO CAPTURA?

A agenda de regulação é dominada, em termos gerais, por duas principais correntes explicativas: a Teoria do Interesse Público e a Teoria Econômica ou de Captura (Levine & Forrence, 1990Levine, M. E; & Forrence, J. L. (1990). Regulatory capture, public interest, and the public agenda: Toward a synthesis. Journal of Law, Economics, and Organization, 6, 167-198.; Melo, 2000Melo, M. A. (2000). Política regulatória: Uma revisão de literatura. BIB - Revista brasileira de informação bibliografica em ciências sociais, 50(2), 7-43.). Apesar das limitações da teoria da captura debatidas pela literatura (Croley, 2011Croley, S. P. (2011). Beyond capture: Towards a new theory of regulation. In D. Levi-Faur (Org.), Handbook on the politics of regulation (pp. 50-69). Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing .), o fenômeno é frequentemente identificado em estudos de caso nos mais diversos mercados e ainda permanece atual. A Teoria do Interesse Público da Regulação sugere que o objetivo da regulação é defender o interesse do público contra ações de interesses privados, particularmente das empresas (Balla, 2011Balla, S. (2011). Institutional design and the management of regulatory governance. In D. Levi-Faur (Org.), Handbook on the Politics of Regulation. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing .; Mueller, 2001Mueller, B. (2001). Regulação, informação e política: Uma resenha da teoria política positiva da regulação. Revista Brasileira de Economia de Empresas, 1, 9-29.). Essa abordagem assume uma premissa de que os reguladores são maximizadores do bem-estar social. Por exemplo, regular o setor de energia elétrica justifica-se por ser uma atividade com característica de monopólio natural.

Por outro lado, a Teoria Econômica da Regulação, com as influentes contribuições de Stigler-Peltzman, sugere que a semelhança de uma relação de mercado, políticos e elites regulatórias ofertam e os interesses organizados demandam regulação (Mueller, 2001Mueller, B. (2001). Regulação, informação e política: Uma resenha da teoria política positiva da regulação. Revista Brasileira de Economia de Empresas, 1, 9-29.). Um dos conceitos seminais dessa literatura é a captura regulatória, a regulação tende a favorecer os produtores economicamente mais homogêneos e organizados em grupos menores em relação a grupos mais difusos e maiores (por exemplo, consumidores).

Quando se fala em captura regulatória, em geral, a produção acadêmica divide-se em duas formas de interpretação: a ampla e a restritiva (Dal Bó, 2006Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.). A interpretação ampla não diz respeito apenas a agências reguladoras, mas trata a captura como um processo genérico em que interesses externos afetam a intervenção do Estado sobre a economia. Ou seja, diz respeito a interesses especiais que afetam a intervenção do Estado em todas as suas formas e pode incluir áreas como impostos, escolha da política externa ou monetária ou mesmo legislação que afeta pesquisa e desenvolvimento. A interpretação restritiva, por sua vez, entende a captura regulatória especificamente como os processos pelos quais os agentes regulados manipulam as agências que deveriam exercer controle sobre eles.

Partindo dessa primeira clivagem da literatura, fica claro que a definição adotada por Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.),2 2 Segundo os autores, a captura regulatória é um resultado ou processo pelo qual a regulação é consistente e recorrentemente afastada do interesse público em direção aos interesses dos regulados por ação deliberada desses mesmos regulados (p. 15). bem como as críticas derivadas de seu entendimento sobre captura, procede de uma visão restritiva de captura regulatória, elevando as exigências sobre a demonstração efetiva de captura e de seus mecanismos.

A definição de captura para esses autores envolve não apenas a evidência sobre o desvio do interesse público, mas também a demonstração de manipulação pelos regulados. Apesar de a produção sobre captura definir o conceito, em geral, como a troca de favores entre regulador e regulados (Agrell & Gautier, 2017Agrell, P. J; & Gautier, A. (2017). A theory of soft capture. The Scandinavian Journal of Economics, 119(3), 571-596.), o nível de exigência de Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.) para a confirmação do fenômeno é muito mais rigorosa do que normalmente se apresenta na literatura.

É importante enfatizar que as agências independentes estão sujeitas a pressões tanto dos setores privados regulados quanto de grupos político-partidários interessados em implementar uma agenda de curto prazo contrária ao interesse público (Stiglitz, 1998Stiglitz, J. (1998). Distinguished Lecture on Economics in Government: The Private Uses of Public Interests: Incentives and Institutions. Journal of Economic Perspectives, 12(2), 3-22. Recuperado de https://doi.org/10.1257/jep.12.2.3
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). Nesse caso, a captura pelos regulados, que pode ocorrer por via legislativa ou administrativa. A captura legislativa pelo setor privado ocorre de forma indireta, uma vez que esses não são atores diretamente envolvidos no processo regulatório. Esse caminho de ação envolve a captura intermediária de legisladores por meio de favores ou benefícios privados, de forma que eles representem os interesses do setor no processo legislativo de estruturação da regulação ou definição dos mecanismos de controle sobre as agências (McCubbins, Noll & Weingast, 1989McCubbins, M. D; Noll, R. G; & Weingast, B. R. (1989). Structure and Process, Politics and Policy: Administrative Arrangements and the Political Control of Agencies. Virginia Law Review, 75(2), 431-482. Recuperado de https://doi.org/10.2307/1073179
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). A captura administrativa, por sua vez, ocorre diretamente entre regulados e reguladores, na qual esses últimos recorrem a múltiplas estratégias para garantir o domínio do processo regulatório dentro das agências. Essa forma de captura é o principal objeto de análise deste artigo e será aprofundada nas próximas seções do artigo.

Como o foco do presente artigo é essencialmente a forma de demonstração da captura, a produção foi organizada com base nos dois eixos identificados por Dal Bó (2006Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.) - interpretação ampla e interpretação restritiva. A partir dessa clivagem, foi elaborado um quadro comparativo de como cada uma dessas abordagens enfrenta o fenômeno a partir de três aspectos principais: exposição do risco de captura, demonstração de captura e mecanismos de captura. Os detalhes estão apresentados no Quadro 1.

Quadro 1
Diferenças entre as abordagens ampla e restritiva no estudo de captura

3.1 Estratégias de captura

A captura pode ser classificada tanto pela forma como ela ocorre - a estratégia de influência adotada pelo regulado - quanto pela dimensão do impacto negativo que gera para o interesse público.

Com relação à forma como ela ocorre, organizou-se a literatura em quatro nichos de mecanismos de captura: incentivos materiais (Tabakovic & Wollmann, 2018Tabakovic, H; & Wollmann, T. G. (2018). From revolving doors to regulatory capture? Evidence from patent examiners. Cambridge, MA: National Bureau of Economic Research.), assimetria informacional (Agrell & Gautier, 2012Agrell, P. J; & Gautier, A. (2012). Rethinking regulatory capture. In J. E. Harrington & Y. Katsoulacos (Orgs.), Recent advances in the analysis of competition policy and regulation. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing., 2017Agrell, P. J; & Gautier, A. (2017). A theory of soft capture. The Scandinavian Journal of Economics, 119(3), 571-596.; Wagner, 2009Wagner, W. E. (2009). Administrative law, filter failure, and information capture. Duke Law Journal, 59(7), 1321-1432.), ameaças (Dal Bó, Dal Bó & Di Tella, 2006Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.; Dal Bó & Di Tella, 2003 Dal Bó , E ; &Di Tella, R . (2003). Capture by Threat. Journal of Political Economy, 111(5), 1123-1154.) e incentivos imateriais (Kwak, 2013Kwak, J. (2013). Cultural Capture and the Financial Crisis. In D. P. Carpenter & D. Moss (Orgs.), Preventing regulatory capture: Special interest influence and how to limit it (pp. 71-98). Cambridge, UK: Cambridge University Press .).

Os incentivos materiais referem-se especificamente às estratégias de captura que envolvem suborno, troca de favores, oferta de cargos e benefícios, entre outros. Talvez pela dificuldade inerente de levantar evidências de pagamentos irregulares ou troca de favores, a literatura concentra-se essencialmente em analisar estratégias de financiamento de campanha - quando trata-se de captura legislativa - ou a ocupação de cargos pelo fenômeno de “porta giratória” (revolving doors) - quando de captura administrativa.

Já a literatura que aponta os riscos advindos da assimetria informacional desdobra-se em quatro caminhos: o fornecimento de informação viesada; o excesso deliberado de informação; a complexificação das informações fornecidas; e a captura por tecnologia. Com relação ao primeiro caso, o principal incentivo à captura seria a pressão do principal diante dos agentes. Para esses autores, os reguladores aceitariam receber informação viesada dos regulados por incentivos distintos de suborno ou ameaças, conforme exemplos no Quadro 2.

Com receio de falhar nas suas atividades - não entregando regulação nova - e lidando com um cenário de limitação de recursos - especialmente tempo para checar todas as informações do setor regulado -, o agente regulador aceitaria informações distorcidas do setor para agilizar o processo regulatório (Agrell & Gautier, 2012Agrell, P. J; & Gautier, A. (2012). Rethinking regulatory capture. In J. E. Harrington & Y. Katsoulacos (Orgs.), Recent advances in the analysis of competition policy and regulation. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing., 2017Agrell, P. J; & Gautier, A. (2017). A theory of soft capture. The Scandinavian Journal of Economics, 119(3), 571-596.).

Essas situações são identificadas como captura leve (soft capture). O incentivo aqui seria, essencialmente, o medo de alguma punição por parte do principal - que estaria constantemente cobrando por políticas regulatórias. Nesse sentido, apesar de a ambição pela manutenção do cargo e o avanço na carreira ser de alguma forma material, ela é essencialmente distinta das retribuições materiais diretas discutidas anteriormente.

Outra forma de captura relacionada à disparidade no acesso a informações seria a captura por excesso de informação, em que o setor regulado oferece informações em volume excessivo ao regulador de forma a desequilibrar e desorientar a atividade regulatória. Isso aconteceria, principalmente, por conta de uma falha administrativa na filtragem das informações, o que tornaria o processo regulatório ineficiente (Wagner, 2009Wagner, W. E. (2009). Administrative law, filter failure, and information capture. Duke Law Journal, 59(7), 1321-1432.).

Um elemento central dessa forma de captura é que o custo de fornecimento de um grande volume de informações é menor para uma das partes afetadas pela atividade regulatória - em geral, as empresas e prestadoras de serviços. As outras partes envolvidas - talvez, os beneficiários ou consumidores - teriam dificuldade em competir com o mesmo nível de informações e abririam espaço para que a outra parte fosse dominante na orientação da atividade regulatória.

O desequilíbrio em prover informações ao regulador pode ocorrer também por meio da forma como a informação é apresentada. Hakenes e Shnabel (2014Hakenes, H; & Schnabel, I. (2014). Regulatory Capture by Sophistication. CEPR Discussion Paper No . DP10100.), por exemplo, ao examinarem a captura do setor financeiro nos Estados Unidos, apontam para a existência da captura por sofisticação, que seria o fornecimento de informações extremamente complexas e que o regulador teria dificuldade de compreender. O desequilíbrio é causado também em face de outros players do setor, principalmente os menores, que teriam menor potencial de recorrer a essa estratégia.

Outro tipo de captura proveniente da assimetria informacional é a captura por tecnologia, que ocorre em setores com indústria complexa, como a química. O conceito de captura por tecnologia, inicialmente cunhado para definir a supremacia de um mercado a partir do domínio de determinada tecnologia (Gagnon, 2016Gagnon, M. A. (2016). Shaping the social determinants of value through economic ghostmanagement. In T. H. Jo & F. S. Lee (Eds.), Marx, Veblen, and the foundations of heterodox economics: Essays in honor of John F. Henry. London, UK: Routledge.) foi expandido também para interações regulatórias. Em mercados dessa natureza, o setor regulado possui domínio da tecnologia que lhe permite fazer inovações ou mudanças incrementais em seus produtos que resolvam parcialmente demandas do regulador, mas ao mesmo tempo trazendo informação nova sobre as características do produto, que lhe permite barganhar com as agências.

A partir de um estudo de caso da indústria química, Finch, Geiger e Reid (2017Finch, J; Geiger, S; & Reid, E. (2017). Captured by technology? How material agency sustains interaction between regulators and industry actors. Research Policy, 46(1), 160-170. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.respol.2016.08.002
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) definem essa relação como um processo interativo e incremental. Nesse processo, a ciência aplicada dessas indústrias elabora alternativas tecnológicas para enfrentar as demandas regulatórias ao mesmo tempo em que traz novas informações exclusivas sobre os novos produtos, o que permite a negociação de regulação nos termos do regulado.

Pode-se notar que nos casos de captura por assimetria de informação não há um incentivo particularista para o regulador beneficiar os regulados, mas incentivos de outra natureza, seja pressão do principal, falha administrativa ou pouca especialização.

Existiria ainda o cenário de captura em que o regulador não estaria disposto a cooperar, mas acaba cedendo ao setor regulado por conta de ameaças. Nesse caso, as ameaças podem ter naturezas diversas, mas objetivam, em geral, ferir a reputação do regulador. Dal Bó (2003Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.) apresenta esse mecanismo em uma situação de captura legislativa, mas o conceito transita sem maiores problemas para tratar de captura administrativa igualmente.

Os incentivos imateriais, por sua vez, estão relacionados a mecanismos cognitivos, como uma identidade compartilhada entre regulador e regulado. Esse tipo de captura não relacionado a recompensas materiais é identificado pela literatura como “captura cultural” (Kwak, 2013Kwak, J. (2013). Cultural Capture and the Financial Crisis. In D. P. Carpenter & D. Moss (Orgs.), Preventing regulatory capture: Special interest influence and how to limit it (pp. 71-98). Cambridge, UK: Cambridge University Press .). Derivado das discussões de captura cognitiva, a captura cultural aconteceria pela identificação pessoal do regulador com o grupo de regulados.

James Kwak identifica três principais mecanismos pelos quais essa forma de captura ocorre: identidade de grupo; status e redes de relacionamento (Kwak, 2013Kwak, J. (2013). Cultural Capture and the Financial Crisis. In D. P. Carpenter & D. Moss (Orgs.), Preventing regulatory capture: Special interest influence and how to limit it (pp. 71-98). Cambridge, UK: Cambridge University Press ., p. 80). Segundo o autor, essa estratégia de captura pode acontecer por ação deliberada das empresas reguladas ou não. Nesse sentido, essa forma de captura não necessariamente atende ao terceiro critério estabelecido por Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.) sobre a ação intencional do regulado, apesar de trazer o mesmo resultado. No Quadro 2, estão organizados os tipos de captura discutidos até aqui, bem como os principais mecanismos envolvidos no processo e os incentivos dos reguladores.

Quadro 2
Categorização de tipos e mecanismos de captura

O Quadro 2 resumitivo busca organizar os principais caminhos apontados pela literatura internacional para compreender o fenômeno da captura. No entanto, cabe destacar que os trabalhos discutidos anteriormente - e as demais produções sobre captura, em geral - restringem-se a políticas de nível nacional e estadual. Além disso, normalmente examina-se a relação entre duas partes apenas - regulador e regulado. Não obstante, pesquisas recentes apontam que a atividade regulatória, muitas vezes, conta com a ação de uma terceira parte, um intermediário (Abbott, Levi-Faur & Snidal, 2017Abbott, K. W; Levi-Faur, D; & Snidal, D. (2017). Theorizing Regulatory Intermediaries: The RIT Model. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, 670(1), 14-35. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0002716216688272
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; Marques, 2019Marques, J. C. (2019). Private regulatory capture via harmonization: An analysis of global retailer regulatory intermediaries. Regulation & Governance, 13, 157-176. Recuperado de https://doi.org/10.1111/rego.12252
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).

A existência de um intermediário é identificada, principalmente, em contextos transnacionais, nos quais consultorias, auditorias, ONGs, entre outros,3 3 A definição de intermediário regulatório não é restrita, podendo ser qualquer ator público ou privado que interfere na relação regulador-regulado (Abbott et al; 2017, p. 15). frequentemente colaboram com as empresas para adequação de sua atuação aos diversos contextos locais. Nesse sentido, haveria uma terceira parte que também deve ser considerada nas investigações de captura.

Essa perspectiva de análise é apresentada pela literatura como o modelo regulator-intermediary-target (RIT) e explora tanto a captura dos intermediários pelas empresas quanto a captura dos governos pelos intermediários e vice-versa (Abbott et al; 2017Abbott, K. W; Levi-Faur, D; & Snidal, D. (2017). Theorizing Regulatory Intermediaries: The RIT Model. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, 670(1), 14-35. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0002716216688272
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). Para essa corrente da literatura, existiria um nível de meta-governança nas relações comerciais e, nesse contexto, as estratégias de captura são ainda mais diversas, como a captura por harmonização - uma forma de convergência regulatória transnacional por ação de grandes empresas (Fransen, 2015Fransen, L. (2015). The politics of meta-governance in transnational private sustainability governance. Policy Sciences, 48(3), 293-317. Recuperado de https://doi.org/10.1007/s11077-015-9219-8
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; Marques, 2019Marques, J. C. (2019). Private regulatory capture via harmonization: An analysis of global retailer regulatory intermediaries. Regulation & Governance, 13, 157-176. Recuperado de https://doi.org/10.1111/rego.12252
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).

Até aqui discutiram-se as diversas estratégias de captura identificadas pela literatura, mas como salientou-se anteriormente, a captura também pode ser classificada a partir da dimensão dos seus efeitos. Sobre o segundo modo de classificação - o impacto da captura - destaca-se a contribuição de Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.) que, na tentativa de matizar o conceito de captura quanto ao nível de comprometimento da atividade regulatória, identificam dois graus de captura: captura forte e captura fraca. A captura forte seria aquela que compromete os resultados da política de tal maneira que um desdobramento melhor seria que não houvesse nenhuma regulação ou que a política - ou mesmo a agência - fosse completamente substituída. Esse seria o tipo stigleriano de captura, que identifica um decréscimo substantivo no interesse público.4 4 O interesse público é um conceito em disputa e o parâmetro para resultados regulatórios satisfatórios deve levar em consideração as diferenças socioeconômicas dos países em análise. Esse ponto será retomado nas conclusões ao se discutirem as relações contemporâneas entre Estado e setor privado, especialmente em países em desenvolvimento.

No entanto, para Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), esse não seria o desenrolar de toda ação de captura. Há situações em que se observa uma captura fraca, ou seja, há um comprometimento da capacidade regulatória, mas ainda assim, os resultados são superiores aos do cenário de ausência de regulação.

Nesse sentido, a classificação do tipo de captura é uma definição relativa que depende da avaliação do impacto que ela tem sobre o resultado regulatório. Ou seja, para identificar se uma situação de captura é forte ou fraca deve-se olhar para o caso específico e suas consequências e não para a forma genérica pela qual se deu a captura.

3.2. Mensuração de captura

Como discutido anteriormente, o paradoxo da captura revela o frágil arcabouço empírico das pesquisas acadêmicas para sustentar o argumento de captura (Agrell & Gautier, 2012Agrell, P. J; & Gautier, A. (2012). Rethinking regulatory capture. In J. E. Harrington & Y. Katsoulacos (Orgs.), Recent advances in the analysis of competition policy and regulation. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing.; Carpenter & Moss, 2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.). Enquanto os modelos teóricos variam imensamente, as possibilidades de mensuração de influência e captura são mais restritas.

A agenda de pesquisa envolvendo captura é vasta e investiga desde a relação entre captura e resultados regulatórios, o impacto da “porta giratória” em práticas regulatórias até o efeito da pressão dos consumidores na regulação (Dal Bó, 2006Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.). A identificação de riscos de captura também acaba perpassando várias pesquisas, bem como a avaliação de autonomia e transparência dos processos regulatórios.

Independentemente da problemática que se busca enfrentar, a mensuração de captura é uma etapa essencial em qualquer investigação. Não obstante, a maior parte dos trabalhos não se dedica a demonstrar propriamente a captura, mas a mapear interesses dos regulados, bem como as decisões que tenham ocorrido a seu favor.

Em geral, é possível dizer que grande volume da produção sobre captura, orienta-se, na verdade, para identificar situações com potencial de influência dos regulados, mais do que a manipulação das políticas em si.

Dentre os que se aventuram a identificar empiricamente captura, as estratégias para mensuração mais frequentes na literatura são: 1. medidas de corrupção; 2. rastreamento de financiamento de campanha; e 3. mapeamento de trajetórias de dirigentes para avaliação do fenômeno de “porta giratória” - sendo essa última uma das abordagens mais comuns em estudos recentes (Dal Bó, 2006Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.). Os métodos de coletas de dados, em geral, envolvem entrevistas, prosopografia de dirigentes de agências reguladoras e análise documental de decisões regulatórias.

4. CAPTURA EM AGÊNCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS

4.1. O que se estuda?

Apesar da contribuição substancial para o campo, a demonstração de captura sob os termos propostos por Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.) não é uma tarefa fácil. Apesar da produção flagrantemente reduzida sobre o tema no caso brasileiro, alguns pesquisadores aventuraram-se em explorar empiricamente as vulnerabilidades das agências sob perspectivas diversas.5 5 Como o objetivo do trabalho é explorar a produção sobre captura regulatória, foram revisados na seção apenas publicações que trataram das relações entre agências e mercado regulado. Para análises de autonomia frente ao poder público e influência política, ver Correa, Melo, Mueller e Pereira (2019) e Vieira, Gomes e Guarido (2019).

Vilarinho (2010Vilarinho, P. F. (2010). A percepção da captura política da saúde suplementar no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 8(4), 694-709.), por exemplo, faz um notável trabalho mapeando os interesses dos diversos atores envolvidos no campo da saúde suplementar do Brasil. Embora não elabore um modelo de interesse público, esforça-se em identificar os interesses dos consumidores dos serviços de saúde suplementar.

Partindo de um modelo conceitual de táticas ativas e defensivas de captura, Vilarinho (2010Vilarinho, P. F. (2010). A percepção da captura política da saúde suplementar no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 8(4), 694-709.) apresenta um quadro que resume as percepções sobre captura no campo da saúde suplementar. Apesar de discutir uma possível mudança na política em favor de grupos privados - como o avanço do modelo de planos coletivos em detrimento dos individuais -, as táticas apresentadas são, em geral, apenas indícios da atuação das operadoras de planos de saúde. Poder-se-ia dizer que o que foi levantado pelo autor sugere a intenção e o potencial político das operadoras, mas não há evidências fortes da atuação direcionada das mesmas para atestar a relação causal.

Tangenciando também apenas o potencial de captura, Ianoni (2017Ianoni, M. (2017). Interesses financeiros e captura do Estado no Brasil. Revista de Economia Política, 37(2), 324-342. Recuperado de https://doi.org/10.1590/0101-31572017v37n02a04
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) apresenta um estudo dos casos do Banco Central, da Secretaria do Tesouro Nacional e da agência de investimentos Best Brazil para discutir a possível captura da política macroeconômica. O autor sustenta que a institucionalização de iniciativas de relações com investidores (RI) tem intensificado a comunicação entre o mercado financeiro e o estado. Apesar de chamar atenção para esse novo canal de influência, não tem como objetivo a demonstração efetiva de captura.

A institucionalização de instrumentos que favorecem o setor regulado também é objeto da análise de Milanez e Santos (2020Milanez, B. & Santos, R. S. P. (2020). Mineração e captura regulatória: A estratégia da Anglo American em Conceição do Mato Dentro (MG), Brasil. Revista Pós Ciências Sociais, 16(32), 69-91. Recuperado de https://doi.org/10.18764/2236-9473.v16n32p69-91
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) sobre o setor de mineração. A partir de um estudo de caso da atuação da empresa Anglo American em Minas Gerais, os autores destacam como principais evidências de captura: isenções fiscais; facilitação e redução dos custos de desapropriação de áreas; porta-giratória; e fracionamento do processo de licenciamento ambiental. O trabalho não se dedica a explorar as motivações dos agentes ou a demonstrar a ação dos regulados em si, mas sugere que há um alinhamento entre Estado e mercado em torno dos interesses corporativos, o que poderia ser classificado como captura cultural.

Sob outra ótica, com foco nos mecanismos de participação social no processo decisório das agências, Mariana Batista (2012Batista, M. (2012). Mecanismos de participação e atuação de grupos de interesse no processo regulatório brasileiro: O caso da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Revista de Administração Pública, 46(4), 969-992.) identifica uma sobrerrepresentação dos regulados em audiências públicas da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Apesar disso, a diferença entre a proporção de contribuições aceitas por meio de demandas em audiências públicas não é muito grande entre produtores e consumidores6 6 A quantidade absoluta de proposições apresentadas pelos produtores é muito superior à dos consumidores, o que a autora discute como um problema de ação coletiva. - 26,7% para os primeiros e 19,9% para os últimos.

Dessa forma, apesar de questionar a hipótese inicial de que os regulados seriam muito mais beneficiados que os consumidores, Batista (2012Batista, M. (2012). Mecanismos de participação e atuação de grupos de interesse no processo regulatório brasileiro: O caso da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Revista de Administração Pública, 46(4), 969-992.) concentra-se em discutir a vulnerabilidade da agência por mecanismos de participação social, que poderiam ser classificados dentro do tipo de captura por informação.

Outros estudos optam por explorar a perspectiva dos agentes inseridos nas agências e suas conexões com grupos de interesse. Sob esse ótica, Vieira (2015Vieira, A. S. A. (2015). Agências reguladoras independentes? Especialização e captura nas trajetórias de carreira dos reguladores federais brasileiros (Dissertação de Mestrado). Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro, RJ.) propõe-se a analisar a carreira de diretores e conselheiros de dez agências reguladoras brasileiras buscando explorar aspectos de especialização e captura por partidos políticos. Na mesma linha, De Bonis (2016De Bonis, D. F. (2016). Os limites do desenho institucional: Uma investigação empírica dos mecanismos da influência presidencial sobre as agências reguladoras independentes no Governo Federal brasileiro (Tese de Doutorado). Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getulio Vargas, São Paulo, SP.) e Peci et al. (2020Peci, A; Santos, A. M; & Araújo, B. C. P. O. (2020). Quo Vadis? Career paths of Brazilian regulators. Regulation & Governance, 1-17. Recuperado de https://doi.org/10.1111/rego.12348
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) trazem preciosas contribuições no estudo de carreiras dos reguladores. No entanto, por concentrarem-se em processos de recrutamento e trajetória, os trabalhos não pretendem avançar em demonstrações de captura per se.

Igualmente centrados nos indivíduos que ocuparam postos diretivos na ANS, em esforço mais recente, Marcello Baird (2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) lança mão de análise documental, mas também da abordagem de redes para mapear os canais de influência externa sobre a ANS. Baird esforçou-se para reconstituir as principais disputas na agência desde sua criação e explorou dados de faturamento, financiamento de campanhas e estrutura das redes de relações. As conclusões do trabalho também questionam o argumento crescente sobre favorecimento irrestrito dos grupos regulados, apontando para o papel de resistência da burocracia especializada na contenção de influências externas.

Em direção contrária, pesquisas conduzidas por Carlos Ocké-Reis sobre a ANS (Ocké-Reis et al; 2019Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.; Ocké-Reis & Cardoso, 2011Ocké-Reis, C. O; & Cardoso, S. S. (2011). A regulamentação dos preços dos planos individuais de saúde. Revista de Economia Política, 31(3), 455-470. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0101-31572011000300008
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) apontam que a captura da agência pelos regulados é evidente, especialmente quando se observa a incapacidade da organização em conter a inflação dos planos de saúde.7 7 Recuperado de https://www.valor.com.br/empresas/6244647/em-18-anos-preco-de-plano-de-saude-sobe-quase-o-dobro-da-inflacao No entanto, esses estudos também não miraram a demonstração da ação de captura, mas os claros benefícios experimentados pelos grupos regulados. O caso específico da ANS será discutido mais adiante, no qual serão comparadas de forma mais aprofundada as estratégias de cada um dos estudos.

Nesse breve resumo da produção sobre captura de agências brasileiras percebeu-se que os resultados são diversos e o escopo das pesquisas varia substancialmente. É possível notar, no entanto, que a maioria deles concentra-se em identificar potenciais cenários de risco de captura e os possíveis efeitos dela (como aumento da inflação dos planos de saúde, assimetria de participação na atividade regulatória, entre outros).

Em geral, a produção sobre o caso brasileiro não se empenhou em examinar os mecanismos pelos quais ela pode ter sido empreendida nas agências. Dessa forma, vê-se que há um vasto campo inexplorado nas relações entre Estado e mercado nas agências reguladoras. Enquanto a porta-giratória emerge como mecanismo mais recorrente de captura, as dimensões de captura cultural, ameaça e as múltiplas formas de assimetria informacional seguem pouco exploradas no contexto brasileiro.

Pode-se dizer, então, que essa literatura parte, em grande medida, de uma abordagem ampla de captura, na qual a demonstração detalhada de mecanismos não é cerne da questão. O estabelecimento de critérios mais restritivos para a constatação de captura pode, no entanto, trazer variações quanto às interpretações do fenômeno. Um exemplo disso é o caso da ANS que será discutido na subseção seguinte.

4.2 O caso da ANS: de onde surgem as diferenças nos resultados?

O Brasil possui um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, ainda assim, aproximadamente 25% da população brasileira é coberta por planos de saúde, particularmente por meio de acordos coletivos (ou seja, por pacote de benefícios concedidos pelos empregadores). As principais regulamentações para o setor de saúde suplementar são a Lei no 9.656/98 que estabelece regras para o funcionamento do setor e a Lei no 9.961/2000 que instituiu a Agencia Nacional de Saúde Suplementar (ANS) com competências para regular e fiscalizar as operadoras de saúde, inclusive no que diz respeito a reajustes de preço e ao direito assistencial mínimo dos beneficiários dos planos de saúde ou rol de procedimentos e evento em saúde (Costa, 2008Costa, N. R. (2008). O regime regulatório e o mercado de planos de saúde no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 13(5), 1453-1462. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S1413-81232008000500011
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).

O crescimento do setor de saúde suplementar é usualmente explicado por uma demanda crescente da população insatisfeita com os serviços do SUS, conceito conhecido como universalização excludente ou “filho indesejado” da Reforma Sanitária que instituiu o Sistema Público de Saúde (Favaret & Oliveira, 1990Favaret, P Filho; & Oliveira, P. J. (1990). A universalização excludente: Reflexões sobre as tendências do sistema de saúde. Planejamento e Políticas Públicas, 3, 139-162.). A demanda de consumidores - tanto na mídia quanto no judiciário - insatisfeitos com decisões das empresas de seguro e planos de saúde de aumento de preços e restrições à cobertura, incitou o Executivo federal a ampliar e propor novas bases regulatórias para o setor. A escolha pelo modelo de agência reguladora independente se deu, segundo Pereira (2003Pereira, C. (2003). O marco regulatório no setor de saúde suplementar: Contextualização e perspectivas. In J. Montone & A. J. W. Castro (Orgs.), Regulação e Saúde (pp. 93-120). Rio de Janeiro, RJ: Agência Nacional de Saúde Suplementar.), como uma forma de inovação organizacional para regular um setor que até então gerava desgastes políticos crescentes ao Executivo federal, bem como seria uma forma de transferir responsabilidades de potenciais novos problemas a esse corpo autônomo da burocracia.

Desde então, o caso da saúde suplementar no Brasil é emblemático e concentra grande parte das pesquisas sobre regulação no país (Costa, 2008Costa, N. R. (2008). O regime regulatório e o mercado de planos de saúde no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 13(5), 1453-1462. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S1413-81232008000500011
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; Pereira, 2003Pereira, C. (2003). O marco regulatório no setor de saúde suplementar: Contextualização e perspectivas. In J. Montone & A. J. W. Castro (Orgs.), Regulação e Saúde (pp. 93-120). Rio de Janeiro, RJ: Agência Nacional de Saúde Suplementar.; Pietrobon, Prado, & Caetano, 2008Pietrobon, L; Prado, M. L; & Caetano, J. C. (2008). Saúde suplementar no Brasil: O papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar na regulação do setor. Physis: Revista de Saúde Coletiva, 18(4), 767-783. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0103-73312008000400009
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; Salvatori & Ventura, 2012Salvatori, R. T; & Ventura, C. A. A. (2012). A Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS: Onze anos de regulação dos planos de saúde. Organizações & Sociedade, 19(62), 471-488. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S1984-92302012000300006
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; Sestelo, Souza & Bahia, 2014Sestelo, J. A. de F; Souza, L. E. P. F. de & Bahia, L. (2014). Saúde suplementar no Brasil: Revisão crítica da literatura de 2000 a 2010. Saúde em Debate, 38(102). Recuperado de https://doi.org/10.5935/0103-1104.20140056
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). Entre os estudos interessados na economia política da regulação da saúde suplementar, os achados, em geral, apontam para o risco de captura e o atendimento às demandas dos setores regulados em detrimento do usuário.

Uma nota técnica recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, IPEA (Ocké-Reis et al; 2019Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.), inflamou os debates sobre captura da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ao questionar a metodologia do cálculo de reajuste dos planos. Os pesquisadores apontaram que a inflação acumulada dos planos foi muito superior à taxa de inflação geral e à taxa do setor de saúde, especificamente. A conclusão de que a ANS não foi capaz de regular a inflação dos planos de saúde é o que sustenta a percepção de captura. Essa análise resgata a suspeição de captura advinda de trabalhos anteriores, que abordam desde o preço dos planos (Ocké-Reis & Cardoso, 2011Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.), os interesses latentes em disputa na agência (Vilarinho, 2010Vilarinho, P. F. (2010). A percepção da captura política da saúde suplementar no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 8(4), 694-709.) e até o financiamento de campanhas eleitorais por operadoras de planos de saúde - o que sugeriria captura legislativa (Scheffer & Bahia, 2011Scheffer, M; & Bahia, L. (2011). Representação política e interesses particulares na saúde: O caso do financiamento de campanhas eleitorais pelas empresas de planos de saúde privados no Brasil. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, 15(38), 947-956. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S1414-32832011000300030
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, 2013Scheffer, M; & Bahia, L. (2013). O financiamento de campanhas pelos planos e seguros de saúde nas eleições de 2010. Saúde em Debate, 37(96), 96-103. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0103-11042013000100011
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).

Não obstante, ao pesquisar as redes de influência política na ANS desde sua criação, Marcello Baird (2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) chega a conclusões divergentes sobre a captura da agência. Em uma análise minuciosa da atuação da ANS entre 2000 e 2014 por meio, principalmente, de análise de redes, entrevistas e análise documental, o autor não identificou evidências de ação direcionada dos regulados para manipular as políticas do setor ou forçar a desregulação da saúde suplementar.

Em sentido oposto, ele observou que o período em que a diretoria da agência possuía maior conexão com o empresariado foi a época em que se observou maior regulação assistencial (Baird, 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295., p. 23) - com aumento de transparência para o consumidor, expansão da portabilidade de carências, implementação do pool de risco para estabilizar os reajustes para os beneficiários de planos coletivos, estabelecimento de prazos máximos de atendimento, entre outros.

Sobre a concentração do setor e, especificamente, a venda da Amil em 2012 - a maior transação do setor - Baird destaca que, apesar da celeridade da ANS em autorizar a venda, a medida não foi inédita e não se observou a alteração de nenhuma regra no período que favorecesse exclusivamente as empresas envolvidas (Baird, 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295., p. 21).

Compreendendo a fragilidade desse argumento, Baird (2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) propôs uma análise do fenômeno de “porta giratória” para examinar se os membros da diretoria colegiada da ANS ligados ao setor regulado possuíam um padrão de votação distinto. Mais uma vez, não foram encontradas evidências para sustentar o argumento de captura.

Uma relevante contribuição de Baird (2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) no exame do fenômeno de “porta giratória” é o esforço de matizar os possíveis efeitos dessa troca de cargos. Ao levantar o padrão de votação de resoluções normativas dos diretores, Baird identificou que houve pouca divergência entre “sanitaristas” e “liberais” dentro da agência. Isso revela a fragilidade do potencial explicativo das análises de porta giratória quando conduzidas desassociadas do exame das ações políticas dos atores.

É importante destacar que os achados empíricos de Baird (2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) são apresentados como potencial de influência e não captura, propriamente. Considerando que o trabalho partiria de uma visão mais restritiva de captura e que não se identificou nenhum processo que revelasse a manipulação dos regulados, o uso do conceito de influência é mais adequado.

Nesse sentido, nota-se que a pesquisa levantou situações de conflito e reconhece a existência de medidas que favoreceram o setor regulado, no entanto, não encontrou evidências de ações deliberadas das empresas. Ademais, tampouco observa-se a ausência de medidas que favoreceram os beneficiários a altos custos para as operadoras.

A essa altura, fica claro que um elemento que diferencia as pesquisas a respeito da captura da ANS é a própria operacionalização do conceito de captura. Como foi discutido anteriormente, a distinção entre as abordagens ampla e restritiva pode ser valiosa para compreender as dissonâncias nas conclusões a respeito do caso da saúde suplementar no Brasil.

Como observado, os achados que sustentam o argumento de captura enfatizam os benefícios experimentados pelo setor regulado em um cenário amplo, especialmente no que tange o reajuste dos planos (Ocké-Reis et al; 2019Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.; Ocké-Reis & Cardoso, 2011Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.). Esses trabalhos, no entanto, tendem a minimizar as decisões da agência em favor dos beneficiários e em detrimento das operadoras dos planos, como no caso do estabelecimento de prazo máximo de atendimento e outras decisões bastante custosas ao setor.

Ademais, os resultados encontrados por meio de uma abordagem ampla não se dedicam a realizar uma análise de processo, reconstituindo o histórico decisório e buscando identificar os mecanismos causais que justificariam o argumento de captura. Ocké-Reis (2019Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA., 2011Peci, A; Santos, A. M; & Araújo, B. C. P. O. (2020). Quo Vadis? Career paths of Brazilian regulators. Regulation & Governance, 1-17. Recuperado de https://doi.org/10.1111/rego.12348
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) e Vilarinho (2010Vilarinho, P. F. (2010). A percepção da captura política da saúde suplementar no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 8(4), 694-709.) não propõem ou testam um modelo de ação dos regulados, tampouco agregam evidências situadas sobre os processos decisórios da agência. Da mesma forma, os trabalhos de Scheffer e Bahia (2011Scheffer, M; & Bahia, L. (2011). Representação política e interesses particulares na saúde: O caso do financiamento de campanhas eleitorais pelas empresas de planos de saúde privados no Brasil. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, 15(38), 947-956. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S1414-32832011000300030
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, 2013Scheffer, M; & Bahia, L. (2013). O financiamento de campanhas pelos planos e seguros de saúde nas eleições de 2010. Saúde em Debate, 37(96), 96-103. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0103-11042013000100011
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) não conectam o financiamento de campanha dos políticos eleitos à sua atuação efetiva dentro dos parlamentos e gabinetes executivos. De modo geral, o objetivo desses trabalhos não é examinar em detalhe os mecanismos de captura. Essa é, essencialmente, a preocupação da abordagem restritiva sobre o tema, à qual o trabalho de Baird (2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) está vinculado.

Apesar de não propor um modelo de interesse público nos termos propostos por Carpenter e Moss (2013Carpenter, D; & Moss, D. (2013). Preventing Regulatory Capture: Special Interest Influence and How to Limit it. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), Baird (2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.) enfrenta a investigação de processo que poderia revelar a ação dos regulados orientada à alteração dos rumos da política regulatória. As conclusões dele não entram no mérito do julgamento se o reajuste dos planos é abusivo ou não, mas revela a ausência de evidências que sustentariam a identificação do fenômeno de captura propriamente dito.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há algumas décadas atrás, Sartori (1970Sartori, G. (1970). Concept Misformation in Comparative Politics. The American Political Science Review, 64(4), 1033-1053.) já alertava sobre a importância de se ter cuidado em conceituar fenômenos enfrentados pelas ciências sociais. A definição correta dos conceitos é o principal guia para a aplicação acertada do método e para sustentar as inferências.

O presente artigo empenhou-se nessa tarefa com foco no conceito de captura e seus diversos mecanismos. Ao longo do artigo, buscou-se organizar as principais formas de captura regulatória identificadas pela literatura, bem como os mecanismos que estão associados ao fenômeno. Embora haja grande diversidade das estratégias de captura apresentadas, identificou-se quatro grandes grupos de captura: captura por incentivos materiais, captura por incentivos imateriais, captura por ameaça e captura por assimetria de informação.

Sobre a definição e operacionalização do conceito de captura, resgatou-se a discussão de Dal Bó (2006Dal Bó, E; Dal Bó, P; & Di Tella, R. (2006). “Plata o Plomo?”: Bribe and Punishment in a Theory of Political Influence. American Political Science Review, 100(1), 41-53.) sobre a existência de uma abordagem ampla e uma restritiva sobre o fenômeno. Detalharam-se as principais diferenças entre as duas visões e, a partir da análise do caso da ANS no Brasil, concluiu-se que a abordagem de partida é um elemento importante para explicar os resultados contraditórios evidenciados pela literatura (Baird, 2017Baird, M. F. (2017). Redes de influência, burocracia, política e negócios na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Tese de Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., 2019Baird, M. F. (2019). Da Hegemonia Sanitarista ao Predomínio Liberal: investigando os fatores que impediram uma inflexão liberal na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (2004-2014). Dados, 62(4), e20180295.; Ocké-Reis et al; 2019Ocké-Reis, C. O; Fiuza, E. P. S; & Coimbra, P. H. H. (2019). Inflação dos Planos de Saúde - 2000/2018 (Nota técnica No 54). Brasília, DF: IPEA.; Ocké-Reis & Cardoso, 2011Peci, A; Santos, A. M; & Araújo, B. C. P. O. (2020). Quo Vadis? Career paths of Brazilian regulators. Regulation & Governance, 1-17. Recuperado de https://doi.org/10.1111/rego.12348
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).

Ademais, identificou-se que a maior parte dos estudos sobre agências reguladoras brasileiras parte de uma abordagem ampla de captura, sem preocupação em demonstrar os mecanismos causais que explicariam as ações de captura por parte dos regulados. Isso mostra como há uma miríade de caminhos inexplorados no estudo de regulação no Brasil.

Por fim, esse estudo finaliza deixando como sugestão adicional para pesquisadores interessados no tema da captura regulatória que priorizem abordagens alternativas no estudo desse fenômeno para além da teoria econômica da regulação. Em geral, a literatura de captura é vista, essencialmente, como um aspecto negativo da relação entre mercados e governos, materializando-se como um risco à legitimidade democrática e à accountability institucional (Thaw, 2014Thaw, D. (2014). Enlightened Regulatory Capture. Washington Law Review, 89, 329-377., p. 335). No entanto, apesar da recorrência e contemporaneidade da agenda, essa visão negativa e o próprio conceito de captura são questionados por uma corrente que propõe explicações alternativas sobre a relação entre Estado e mercado. Essa literatura sugere duas principais interpretações sobre essa relação: 1. o Estado como direcionador do lobby das empresas; e 2. o Estado atuando de forma cooperativa com os setores regulados.

A partir de estudos de caso dos setores de telecomunicações e aviação, Cornelia Woll (2008Woll, C. (2008). Firm interests: How governments shape business lobbying on global trade. Ithaca, NY: Cornell University Press.), discute a primeira interpretação - o caminho contrário da captura - em que o Estado motivaria mudanças no lobby dos regulados ao invés de o lobby alterar a política pública. Reconhecendo as limitações da teoria econômica, Woll (2008) sugere outras variáveis explicativas para a mudança no lobby regulatório. Segundo ela, novas institucionalidades criadas pelo Estado modificaram a preferência das empresas e essa redefinição alterou especialmente as ideias que elas tinham sobre sua identidade e crenças sobre suas operações internacionais.

Ainda sobre a atuação do setor privado em convergência com o interesse público, a partir de um estudo de caso na área de segurança cibernética, Thaw (2014Thaw, D. (2014). Enlightened Regulatory Capture. Washington Law Review, 89, 329-377.) discorre sobre o processo que ele identifica como enlightened regulatory capture, em que os mecanismos de captura são utilizados pelas empresas para atingir objetivos públicos e não privados, mesmo com custos concentrados para elas.

Em outro trabalho influente, Woll e Artigas (2007Woll, C; & Artigas, A. (2007). When trade liberalization turns into regulatory reform: The impact on business-government relations in international trade politics. Regulation & Governance, 1(2), 121-138.) apontam que Estado e mercado atuam de forma interativa em políticas de regulação - discussão que aparece inicialmente na literatura com a proposta normativa de “regulação negociada” (Harter, 1983Harter, P. J. (1983). The Political Legitimacy and Judicial Review of Consensual Rules. American University Law Review, 32, 471.). Para explorar a questão, os autores sugerem que o lobby regulatório é essencialmente distinto do lobby de pressão, pois requer a construção constante de reputação e legitimidade das empresas em face dos governos - sendo incompatível, portanto, com a visão predatória de captura.

Nesse sentido, Levi-Faur (2013Levi-Faur, D. (2013). The Odyssey of the Regulatory State: From a “Thin” Monomorphic Concept to a “Thick” and Polymorphic Concept. Law & Policy, 35(1-2), 29-50. Recuperado de https://doi.org/10.1111/lapo.12000
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) sugere o conceito de Estado regulatório para o desenvolvimento, uma tentativa de conciliar estudos regulatórios com a literatura de estado desenvolvimentista, no qual os países em desenvolvimento poderiam beneficiar-se do modelo de autonomia inserida nas relações Estado−Sociedade (Evans, 1995Evans, P. (1995). Embedded autonomy: States and industrial transformation. Princeton, NJ: Princeton University Press.). Ou seja, particularmente no contexto de países em desenvolvimento, como o Brasil, o conceito de captura regulatória é insuficiente para explicar essas relações capitalistas contemporâneas. O estudo de Shadlen e Fonseca (2013Shadlen, K. C; & Fonseca, E. M. (2013). Health Policy as Industrial Policy: Brazil in Comparative Perspective. Politics & Society, 41(4), 561-587. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0032329213507552
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), por exemplo, demostra como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária atuou em um processo de “tutela” ao auxiliar atores privados a adquirir capacidades para sobreviver às novas regulações, que tinham por objetivo aumentar a competição no mercado farmacêutico e, por consequência, reduzir o de preços dos medicamentos. Ao adquirir essas novas competências, as empresas alteraram suas preferências em relação à regulação, a qual antes se opunham. Portanto, uma agenda importante na literatura de regulação é refletir sobre essa multidimensionalidade do interesse público, bem como fomentar maior diálogo entre estudiosos do estado regulatório e do desenvolvimentista (Amann, 2006Amann, E. (2006). Regulating development: Evidence from Africa and Latin America. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing .; Dubash & Morgan, 2012Dubash, N. K; & Morgan, B. (2012). Understanding the rise of the regulatory state of the South. Regulation & Governance, 6(3), 261-281. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1748-5991.2012.01146.x
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).

Um ponto relevante sobre essa literatura alternativa é que, apesar de oferecer explicações robustas sobre casos não esclarecidos pela teoria econômica, seus achados não são necessariamente incompatíveis com os achados de captura. Além disso, permite uma aplicação mais adequada ao contexto dos países do Sul Global, que diferem dos cenários dos Estados Unidos e dos países da União Europeia em diversos aspectos políticos e econômicos. Nesse sentido, é duvidoso que se possa simplesmente importar para países em desenvolvimento teorias elaboradas para explicar fenômenos que ocorrem em países desenvolvidos (como a Teoria da Captura) (Amann, 2006Amann, E. (2006). Regulating development: Evidence from Africa and Latin America. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing .; Dubash & Morgan, 2012Dubash, N. K; & Morgan, B. (2012). Understanding the rise of the regulatory state of the South. Regulation & Governance, 6(3), 261-281. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1748-5991.2012.01146.x
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).

Portanto, estudos como o de Woll e Levi-Faur abrem espaço para uma nova agenda sobre relações entre Estado e mercado e suas aplicações em países em desenvolvimento, também ainda pouco explorada, que se configura em torno da investigação de quais fatores podem levar à cooperação e quais fatores podem levar à captura regulatória. Nesse sentido, entende-se que a identificação dos mecanismos que materializam a captura, e não apenas a análise dos resultados do processo regulatório, é um empreendimento importante para conectar a discussão do contexto relacional das agências reguladoras à agenda de desenvolvimento econômico.

A identificação dessas características e os apontamentos sobre a mensuração de captura discutidas no artigo têm, portanto, implicações de natureza teórica, mas também prática. Há um crescente interesse pelo estudo de agências reguladoras no Brasil devido ao ambiente de disputa política que se configura no âmbito dessas organizações e as implicações das relações entre Estado e mercado para as políticas públicas. Considerando a relevância da agenda para a comunidade acadêmica e para a instrução de ações da administração pública, o rigor conceitual e a adequação de suas aplicações é o que permite, portanto, avançar de meras impressões sobre o tema para demonstrações mais robustas do fenômeno.

AGRADECIMENTOS

IAL é bolsista teaching assistant da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getulio Vargas (FGV). EMF recebe auxílio a pesquisa da Fapesp (2015/18604-5), CNPq (407382/2018-6) e da Rede de Pesquisa Aplicada da FGV.

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  • 1
    Para um debate aprofundado sobre esse ponto, ver a Introdução de Carpenter e Moss (2013).
  • 2
    Segundo os autores, a captura regulatória é um resultado ou processo pelo qual a regulação é consistente e recorrentemente afastada do interesse público em direção aos interesses dos regulados por ação deliberada desses mesmos regulados (p. 15).
  • 3
    A definição de intermediário regulatório não é restrita, podendo ser qualquer ator público ou privado que interfere na relação regulador-regulado (Abbott et al; 2017, p. 15).
  • 4
    O interesse público é um conceito em disputa e o parâmetro para resultados regulatórios satisfatórios deve levar em consideração as diferenças socioeconômicas dos países em análise. Esse ponto será retomado nas conclusões ao se discutirem as relações contemporâneas entre Estado e setor privado, especialmente em países em desenvolvimento.
  • 5
    Como o objetivo do trabalho é explorar a produção sobre captura regulatória, foram revisados na seção apenas publicações que trataram das relações entre agências e mercado regulado. Para análises de autonomia frente ao poder público e influência política, ver Correa, Melo, Mueller e Pereira (2019Correa, P; Melo, M; Mueller, B; & Pereira, C. (2019). Political interference and regulatory resilience in Brazil. Regulation & Governance, 13(4), 540-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/rego.12274
    https://doi.org/10.1111/rego.12274...
    ) e Vieira, Gomes e Guarido (2019)Vieira, J. N. S; Gomes, R. C; & Guarido, E. R Filho . (2019). Avaliação da independência das agências reguladoras dos setores de energia elétrica, telecomunicações e petróleo no Brasil. Revista do Serviço Público, 70(4), 576-607. Recuperado de https://doi.org/10.21874/rsp.v70i4.3512
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    .
  • 6
    A quantidade absoluta de proposições apresentadas pelos produtores é muito superior à dos consumidores, o que a autora discute como um problema de ação coletiva.
  • 7
    Recuperado de https://www.valor.com.br/empresas/6244647/em-18-anos-preco-de-plano-de-saude-sobe-quase-o-dobro-da-inflacao

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2021

Histórico

  • Recebido
    27 Maio 2020
  • Aceito
    17 Set 2020
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