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Sabedoria desde os sentidos: um diálogo com Paul Stoller

Paul Stoller é professor de antropologia na West Chester University e Permanent Fellow no Cento de Estudos Avançados em Humanidades e Ciências Sociais na Friedrich Alexander University Erlangen/Nuremberg. Há mais de 30 anos conduz pesquisas de campo entre os povos de língua Songai, na República do Níger (África Ocidental), e entre os migrantes da África Ocidental na cidade de Nova York. Seu trabalho sobre religião, migração e antropologia dos sentidos resultou na publicação de 15 livros (entre romances, etnografias, memórias e uma biografia) e dezenas de artigos. Nesta entrevista tivemos a oportunidade de percorrer sua trajetória e seus “desvios”, expressão que elabora em seus textos, tecendo fios desde seu primeiro livro In sorcery’s shadowSTOLLER, Paul; OLKES, Cheryl. 1987. In Sorcery’s Shadow: A Memoir of Apprenticeship among the Songhay of Niger. Chicago, University of Chicago Press. de 1987, até seu mais recente, Wisdom from the edge, de 2023.

Como bons entusiastas do autor, nós, entrevistadores, unimos forças nos últimos anos para, em 2022, lançar O gosto das coisas etnográficas: os sentidos na antropologiaSTOLLER, Paul. 2022. O gosto das coisas etnográficas. Os sentidos na antropologia. (Traduzido por Marcelo Moura Mello). Rio de Janeiro, Papéis Selvagens Edições., seu primeiro livro traduzido ao português, o que nos permitiu mergulhar mais profundamente em sua obra. Inspirados no vasto universo etnográfico e sensorial que Stoller oferece, organizamos um conjunto de questões que desejávamos fazer-lhe. Este diálogo é o resultado de uma troca afetiva de perguntas e respostas que tivemos a longa distância, entre a Pensilvânia, Salvador e Rio de Janeiro, e que, esperamos, convide mais pessoas da comunidade antropológica a se debruçar no pensamento de Paul Stoller.

Paul, você pode nos contar como foi o caminho que o levou à antropologia? Quais percursos você percorreu? Quais desvios tomou? Como você estabeleceu contato com o povo Songai no Níger?

PS: Meu caminho para a antropologia foi sinuoso. Estudei filosofia (existencialismo e fenomenologia) na graduação e queria ser jornalista e, em algum momento, escrever ficção. Durante meu último ano de graduação, fui aceito como aluno de pós-graduação em jornalismo na Northwestern University, mas a guerra no Vietnã mudou esses planos. Como editor do The Pitt News, o jornal estudantil da Universidade de Pittsburgh, eu era um oponente ardente e público da guerra. Como não queria lutar em uma guerra “imoral”, candidatei-me e fui aceito como voluntário no US Peace Corps,1 1 | [Nota dos entrevistadores] Agência federal estadunidense, fundada em 1961 por John F. Kennedy, voltada para a execução de políticas de cooperação entre os Estados Unidos e os países em desenvolvimento. o que me dispensou do serviço militar no Vietnã. Devido aos meus estudos de francês, fui enviado para a África francófona – especificamente para o Níger –, onde seria capacitado para ensinar inglês como segunda língua. O Peace Corps do Níger me designou para ensinar em Tera, uma pequena cidade no noroeste do Níger, onde viviam os Songai. Em Tera, morei no campus da escola secundária, com “cooperantes” franceses e também com professores nigerenses. Depois de um ano em Tera, fui transferido para uma escola secundária 100 quilômetros a leste, Tillaberi, que viria a se tornar o local onde se deu grande parte de minha pesquisa etnográfica. Durante aquele ano conheci Adamu Jenitongo, que viria a se tornar meu mentor. Depois de dois anos agitados no Níger, eu queria regressar à África Ocidental. Por fim, regressei aos Estados Unidos para cursar pós-graduação, primeiro em linguística, na Universidade de Georgetown, e depois em antropologia social, na Universidade do Texas (Austin).

Seus estudos de pós-graduação foram em linguística e antropologia. A influência da linguística em seu trabalho é evidente, metodológica e teoricamente. Em relação às habilidades linguísticas e o trabalho de campo, o que você sugeriria aos antropólogos, especialmente aos jovens?

PS: Meus estudos de pós-graduação em linguística me proporcionaram rigor metodológico e um foco analítico aguçado e sólido. Os estudos em linguística me deram um profundo respeito pelas maravilhas e complexidades da estrutura e uso da língua. Eles também me compeliram a trabalhar duro para falar com fluência uma “língua de campo” – no meu caso, Songai. Cada dia no campo era uma lição de linguagem. Esses esforços resultaram em uma fluência cada vez maior, o que me fez ganhar um pouco de respeito por meu esforço diário para aprender o Songai. Isso, por sua vez, teve um grande impacto na minha integração à vida social do povo Songai, na zona rural do Níger. No final das contas, as competências linguísticas são um dos aspectos mais importantes para se fazer um bom trabalho de campo.

O quão importante foi sua estada na França? Quais foram suas maiores influências lá?

PS: Após defender minha tese na Universidade do Texas em Austin, recebi uma Bolsa de Pós-Doutorado em Ciências da OTAN, para uma residência de um ano no Laboratoire d’Anthropologie Sociale, de Claude Lévi-Strauss, em Paris. Durante aquele ano, assisti palestras de Lévi-Strauss, Michel Foucault, Roland Barthes e Jacques Derrida. Passei bastante tempo no Musée de L’Homme, onde tive a oportunidade de me envolver em debates animados com Jean Rouch e sua equipe de documentaristas. Também fui a muitas exibições de filmes. Com o passar do tempo, o fascínio rarefeito do estruturalismo desapareceu e comecei a perceber como o pensamento de Roland Barthes e Jacques Derrida, combinado com os impulsos surrealistas de Jean Rouch, poderiam me ajudar a entender os imponderáveis impressionantes do mundo Songai da possessão espiritual e da feitiçaria.

Você pode nos contar sobre a influência da obra de Merleau-Ponty em seu trabalho? De que maneira suas perspectivas ajudaram a moldar suas reflexões sobre o corpo e os sentidos?

PS: Comecei a ler Merleau-Ponty quando era estudante de pós-graduação em antropologia social. Mergulhei na Fenomenologia da PercepçãoMERLEAU-PONTY, Maurice. 1999. Fenomenologia da percepção. São Paulo, Martins Fontes., The Primacy of PerceptionMERLEAU-PONTY, Maurice. 1964. The Primacy of Perception. And other essays on phenomenological Psychology, the philosophy of art history and politics. Evanston, Northwestern University Press., SignosMERLEAU-PONTY, Maurice. 1992. Signos. São Paulo, Martins Fontes., A Prosa do MundoMERLEAU-PONTY, Maurice. 2002. A prosa do mundo. São Paulo, Cosac Naify e, principalmente, O Olho e o EspíritoMERLEAU-PONTY, Maurice. 2004. O Olho e o Espírito. São Paulo, Cosac Naify.. O pensamento de Merleau-Ponty sempre se centrou na corporeidade e na centralidade dos sentidos na nossa apreensão do mundo. Suas ideias subjazem minha abordagem sobre escrever etnografia, um desejo de transformar uma etnografia, ou um filme etnográfico, em uma pintura, uma tentativa de representar o “há” [there is], expressão que Merleau-Ponty usou para descrever uma orientação pictórica para com o mundo. Minha tentativa de descrever sensorialmente outros mundos sociais emergiu diretamente de Merleau-Ponty, especialmente de seu fenomenal O Olho e o EspíritoMERLEAU-PONTY, Maurice. 2004. O Olho e o Espírito. São Paulo, Cosac Naify.. As ideias de Merleau-Ponty ainda são importantes para antropólogos em formação.

Jean Rouch influenciou sobremaneira seu trabalho. Você até escreveu um livro sobre ele, The cinematic griot. The ethnography of Jean RouchSTOLLER, Paul. 1992. The cinematic griot. The ethnography of Jean Rouch. Chicago, University of Chicago Press. [O griô cinemático. A etnografia de Jean Rouch, em tradução livre]. Você pode nos falar sobre a importância de Jean Rouch e do filme etnográfico em sua pesquisa?

PS: Jean Rouch foi meu mentor antropológico. Depois de ter lido seus livros e visto muitos de seus filmes, eu o conheci em Niamey, no início de meu trabalho de campo etnográfico entre os Songai, com o mesmo grupo cujas práticas religiosas foram tema da maioria dos filmes de Rouch. Como todos os bons mentores, Rouch nunca insistiu que eu fizesse antropologia à sua maneira. Ele me convidou para seu mundo e deixou que esse conjunto de experiências moldasse minhas pesquisas e representações etnográficas. De certa forma, muitos dos meus trabalhos etnográficos surgem do esforço de conferir à minha prosa propriedades fílmicas. Dito de outra forma, o exemplo de Rouch me compeliu a me envolver no que gosto de chamar de “arte da etnografia”, na qual o escritor evoca sensorialmente o espaço/lugar, sintoniza o diálogo e molda o personagem de tal forma que o poder do mundo salta da página impressa para a mente do leitor. Essa abordagem pode deixar uma marca indelével de um determinado povo, que vive em um lugar particular. Seguindo o exemplo de Rouch, tenho procurado produzir obras que inspirem o leitor a ter novos pensamentos e sentir novos sentimentos. Como mentor, eu mesmo tentei seguir seu modelo, ajudando jovens antropólogos a desenvolver sua própria maneira de “fazer” antropologia.

Diretamente, como em Embodying colonial memoriesSTOLLER, Paul. 1995. Embodying Colonial Memories: Spirit Possession, Power, and the Hauka in West Africa. Londres, Routledge. [Incorporando/Corporificando memórias coloniais], ou indiretamente, você abordou temas relacionados ao colonialismo em Songai. De que forma o processo de independência do Níger afetou seu trabalho de campo?

PS: O legado colonial é profundo [runs deep] na África Ocidental. Certamente esteve presente durante meu trabalho de campo no Níger. Quando fui pela primeira vez ao Níger, funcionários franceses dirigiam ou ensinavam em muitas das escolas secundárias, cujos currículos eram baseados no sistema francês de educação. O diretor da minha primeira escola era um racista descarado, assim como muitos dos funcionários expatriados que encontrei. Minha fluência em Songai me sintonizou com muitos incidentes racistas que ocorreram durante meu período no Níger. O francês continua sendo uma das línguas oficiais no Níger, e é a língua ensinada e de ensino nas escolas. É inegável que a longa sombra do colonialismo estruturou as relações sociais entre meus interlocutores da África Ocidental e eu. Em alguns casos, senti que meu conhecimento da cultura Songai e fluência na língua poderiam preencher o abismo que separa o eu europeu do outro colonial, mas frequentemente um incidente, ou um lapso linguístico, me lembravam o quão ampla a partição (neo)colonial continuava a ser. Minha esperança, é claro, é que se a sabedoria de outros, como a dos Songai, for articulada por toda a parte, a participação colonial possa ser um pouco mais fácil de negociar. Mesmo assim, o legado do colonialismo está profundamente enraizado e devemos permanecer vigilantes sobre ele.

Você pode falar mais sobre seus estudos sobre possessão espiritual e os Hauka, mais especificamente?

PS: Na primeira vez que experienciei uma cerimônia de possessão [espiritual] Songai, eu estava ensinando inglês como língua estrangeira na remota vila de Tera, no Níger. Ensinei com quatro expatriados franceses e dois nigerinos. No final de um dia quente de ensino, eu acompanhava meus colegas franceses no único bar da cidade, o Chez Jacob, uma pequena sala de tijolos de barro com uma geladeira a querosene que mantinha a cerveja refrescante bem gelada. Nós sentamos na varanda do Jacob – dois bancos um de frente para o outro –, e bebíamos grandes garrafas de cerveja. Um dia, presenciamos um evento na porta ao lado. Ouvíamos o lamento agudo do violino monocórdio e as batidas e os dobrares dos tambores de cabaça. Vestido com uma bata branca de laboratório, vi um homem balançando uma seringa. Seus olhos estavam inflamados. Sálvia espumava de sua boca. Um idoso, Soumana, que sabia que eu falava um pouco de Songai, disse que aquele “homem” queria me conhecer. Eu não queria conhecê-lo, mas Soumana disse que se eu recusasse, as pessoas da aldeia sofreriam. Eu aproximei da figura esquisita, então.

“Encantado,” o homem-espírito disse.

“Encantado”, respondi.

“Sua mãe não tem peitos!” ele berrou.

“Sim, ela tem”, retorqui, o que provocou risos generalizados.

“Seu pai não tem colhões.”

“Na realidade, ele tem”

Mais risadas.

O homem-espírito estendeu a mão, que eu apertei. Recebi o que parecia ser um choque elétrico, um choque que me lançou para o mundo Songai da possessão espiritual.

Soumana e eu voltamos ao Chez Jacob.

“Quem era aquele homem? perguntei a Soumana.

“Ele não é um homem. Ele é um Hauka”.

Esse primeiro encontro estabeleceu as bases para minha experiência com a possessão espiritual Songai. De fato, os Hauka, divindades que representam as figuras da época colonial, figuram com destaque nas descrições sensoriais de possessão espiritual que são apresentadas em meu novo livro, Wisdom from the EdgeSTOLLER, Paul. 2023. Wisdom from the edge. Writing Ethnography in Turbulent Times. Ithaca. Cornell University Press. [Sabedoria do limiar]2 2 | [Nota dos entrevistadores] O título do livro permite distintas traduções, desde Sabedoria do limiar até Sabedoria desde (ou a partir do) o limiar. A palavra “edge” também se presta a distintas traduções: borda, margem, periferia, limite, fronteira. .

Um corpo significativo de sua obra foi produzido no período de emergência (e consolidação) do chamado “pós-modernismo” na antropologia. Seus livros promovem experimentos com a linguagem, mas, em nossa opinião, você não tem a mesma agenda de autores como George Marcus e James Clifford – o trabalho de campo é muito importante para você, por exemplo. De que forma sua obra dialoga com o “pós-modernismo” na antropologia e nas humanidades em geral?

PS: A virada pós-moderna na antropologia ardeu intensamente nas décadas de 1980 e 1990. A teoria social pós-estruturalista (Foucault, Derrida, Barthes, Kristeva, Irigaray, Cixous) inspirou muito do discurso pós-moderno na antropologia, o qual demandava uma etnografia experimental que pudesse substituir as monótonas convenções representacionais do humanismo clássico. A maioria dos proponentes da etnografia pós-moderna não escreveu, de fato, etnografias experimentais. Para mim, escritores como George Marcus, James Clifford, Michael Fischer e Mary Louise Pratt criaram o discurso disciplinar necessário para convencer editoras acadêmicas a publicar trabalhos não convencionais como meu primeiro livro, In Sorcery’s ShadowSTOLLER, Paul; OLKES, Cheryl. 1987. In Sorcery’s Shadow: A Memoir of Apprenticeship among the Songhay of Niger. Chicago, University of Chicago Press. [Na sombra da feitiçaria], um livro de memórias sobre feitiçaria, magia, aprendizado e, indiretamente, sobre o ofício da etnografia. Nesse livro, usei a narrativa para evocar as principais questões teóricas da época. Dito de outra forma, minha agenda era uma tentativa de colocar em prática o que Marcus, Clifford, Fischer e Pratt haviam defendido em seus livros e artigos. Se Marcus, Fischer e Clifford não tivessem publicado seus trabalhos perspicazes, livros como o meu não teriam sido publicados.

Seu trabalho é repleto de descrições de experiências pessoais no campo. Em In Sorcery’s ShadowSTOLLER, Paul; OLKES, Cheryl. 1987. In Sorcery’s Shadow: A Memoir of Apprenticeship among the Songhay of Niger. Chicago, University of Chicago Press., você narra como se tornou um feiticeiro por meio da orientação de Adamu Jenitongo. A recepção deste livro variou. Enquanto alguns autores o elogiaram, outros foram mais críticos, levantando muitas questões, inclusive éticas. Quais são as potencialidades e os limites de inserir a subjetividade no centro da escrita antropológica? Quais são as implicações epistemológicas e existenciais dos experimentos narrativos que você promove em seus livros? Qual sua opinião sobre a autoetnografia?

PS: Em minha visão sobre a vida do antropólogo, é impossível que etnógrafos ignorem sua implicação pessoal no campo. O trabalho de campo etnográfico é, antes de tudo, uma experiência profundamente subjetiva. Como Jean Rouch gostava de me dizer: a qualidade da etnografia ou dos filmes etnográficos emerge diretamente da qualidade das relações subjetivas que o etnógrafo desenvolveu durante a pesquisa de campo. Quando escrevi pela primeira vez sobre Adamu Jenitongo e seu mundo da feitiçaria Songai, construí um texto etnográfico padrão: introdução, revisão da literatura, apresentação dos resultados, discussão e conclusão – tudo composto em prosa pálida e estilo singelo. Por conta do relacionamento próximo que desenvolvi com meu mentor, queria eliciar seus comentários em um manuscrito de livro. Durante dois meses nos encontramos no meio da noite e eu traduzia as páginas. Meu mentor nunca fez um comentário. Quando chegamos ao final de nossas sessões, perguntei-lhe ansiosamente sobre meu livro.

“Baba” – eu disse –, “estive traduzindo e você não disse nada. Eu parto amanhã e gostaria de saber o que você pensa sobre o livro”.

Ele olhou para mim e disse: “Não é tão bom”.

Chocado, perguntei: “O que posso fazer para melhorar?”

“Não há o suficiente de mim nisso, e não há o suficiente de você. Escreva algo que meus netos e seus netos irão ler e discutir”.

Seus comentários me convenceram a retrabalhar meu texto original. Escrevi In Sorcery’s Shadow, ao invés disso, um livro de memórias etnográficas. Foi publicado em 1987 e ainda hoje é lido e debatido. O desafio representacional de Adamu Jenitongo tem sido a base do meu trabalho acadêmico e não acadêmico. Escrever um livro de memórias, é claro, é complicado. Se você for muito intimista, o texto pode se tornar tedioso e egocêntrico. O truque para escrever memórias é encontrar o equilíbrio textual certo. Se você puder usar uma história pessoal para lançar luz sobre processos sociais, políticos e econômicos relevantes, vale a pena recontá-la. Foi isso que tentei fazer em livros como Money has No SmellSTOLLER, Paul. 2002. Money Has No Smell. The Africanization of New York City. Chicago, University of Chicago Press. [O dinheiro não tem cheiro], Stranger in the Village of the Sick [O estranho/desconhecido no vilarejo dos enfermos], Yaya’s Story [A estória de Yaya]STOLLER, Paul. 2014. Yaya’s Story: The Quest for Well-Being in the World. Chicago, University of Chicago Press. e Wisdom from the EdgeSTOLLER, Paul. 2023. Wisdom from the edge. Writing Ethnography in Turbulent Times. Ithaca. Cornell University Press.. Continuo lutando para alcançar o equilíbrio em minha escrita – às vezes com sucesso, às vezes não.

Como seus livros deixam claro, você teve um envolvimento visceral com “o campo” e com as pessoas. Adamu Jenitongo, em particular, não foi apenas um anfitrião e interlocutor, mas também um mentor e professor. Você pode nos contar mais sobre seu relacionamento com ele e com o mundo Songai?

PS: Nossas vidas sociais são definidas através do amor e da perda. Assim é com o trabalho de campo etnográfico. A vida de Adamu Jenitongo, que conto com algum detalhe em Wisdom from the EdgeSTOLLER, Paul. 2023. Wisdom from the edge. Writing Ethnography in Turbulent Times. Ithaca. Cornell University Press., foi moldada pelos prazeres do amor e pela dor da perda. Cada um desses episódios em sua vida fortaleceu seu caráter e refinou seu pensamento. Com o tempo, esse desenvolvimento emocional e intelectual fez dele um curador poderoso. Quando o conhecei, há mais de 50 anos, ele era um ancião sábio e poderoso. Seu olhar atravessou várias camadas de defesa psicológica e imediatamente se conectou ao “há” do meu ser. A partir desse começo poderoso, desenvolvemos um amor profundo, o que fez com que minha eventual representação dele e de seu pensamento se tornasse um fardo existencial. Como eu poderia escrever algo sobre ele que ressaltasse nosso profundo respeito mútuo? Como filho de uma família judia da classe trabalhadora de Washington DC, nunca imaginei conhecer alguém como Adamu Jenitongo, muito menos me tornar um pupilo a quem foi dada a desafiadora responsabilidade de contar sua história. Ele era o mestre e eu o aprendiz, o que significava que ele exigia meu respeito. Ele também exigia minha fidelidade – a ele e a suas tradições. E é por isso que ele disse em um determinado momento de nosso tempo juntos. “Todos os dias nosso povo faz coisas para irritar a floresta. Todos os dias farei oferendas à floresta para consertar as coisas, para trazer ao mundo um equilíbrio de uma só boca e um só coração. Isso é o que os mais velhos me ensinaram. Esse é o meu trabalho. É isso que eu quero te ensinar. Espero que meu trabalho possa se tornar o seu trabalho.” Em todos os sentidos, meu projeto de antropologia tem sido uma tentativa de fazer do trabalho de Adamu Jenitongo meu trabalho.

Como foi a transição do trabalho de campo no Níger para Nova York? Conte-nos mais sobre essa transição.

PS: Mudar a pesquisa de campo da zona rural do Níger para o Harlem, na cidade de Nova York, foi uma transição importante. Na zona rural do Níger, a pesquisa de campo não era menos complicada, mas definida de forma mais restrita. Na zona rural do Níger, tentei entender a possessão espiritual, a medicina herbal, a adivinhação e as práticas de feitiçaria, um projeto de longo prazo que desafiou minha sensibilidade e ampliou minha imaginação para a periferia da consciência. Na cidade de Nova York, eu queria descrever a vida social dos imigrantes da África Ocidental, alguns dos quais eram Songai do Níger e do Mali. Para entender os desafios que esses africanos ocidentais, em sua maioria de áreas rurais, enfrentaram enquanto tentavam se adaptar às condições socioeconômicas em um dos espaços mais urbanos do mundo, tive que aumentar minha compreensão sobre a política de imigração dos EUA, leis de direito autoral e de registro de patentes, processos dinâmicos de redes econômicas, a profundidade e a amplitude do racismo institucional e da intolerância religiosa dos Estados Unidos, a hiper-realidade do setor informal da economia do país e os custos sociais da alienação social e cultural. Em determinado ponto de minha pesquisa em Nova York, que começou no início dos anos 1990 e ainda está em andamento, a complexidade absoluta dos dados que compilei me deixou perplexo. Como eu poderia tecer tantos fios etnográficos em uma tapeçaria atraente? Uma tarde, sentei-me desesperado em um armazém de arte africana administrado por africanos na seção de Chelsea, em Manhattan. Perguntei a El Hajji Hamidou, um comerciante de arte Songai de Balléyara, Níger, o que ele achava do meu dilema. Ele disse que eu deveria abordar meu trabalho da mesma forma que os tecelões Songai abordam sua arte. “Nossos tecelões”, disse ele, “combinam vários fios em um padrão que cria um lindo cobertor. Dizemos que os tecelões tecem o mundo.” Devido a esse sábio conselho, escrevi Money has No SmellSTOLLER, Paul. 2002. Money Has No Smell. The Africanization of New York City. Chicago, University of Chicago Press., uma etnografia que conta a história de três dos principais comerciantes imigrantes nigerianos na cidade de Nova York. Suas histórias, é claro, evocaram todos os temas (imigração, racismo, intolerância religiosa, hiper-realidade, economia informal, leis de direito autoral e de registro de patentes, leis de direitos autorais e imigração e alienação social e cultural) que definiram a textura da vida social dos imigrantes na cidade de Nova York.

Em sua conferência na reunião bianual da Associação Brasileira de Antropologia, em 2022, você enfatizou a importância da arte em seu trabalho e para a antropologia. Você pode elaborar um pouco mais essa ideia?

PS: A importância da arte em meu trabalho decorre da filosofia de Merleau-Ponty e seu ensaio filosófico O Olho e o EspíritoMERLEAU-PONTY, Maurice. 2004. O Olho e o Espírito. São Paulo, Cosac Naify. (L’Oeil et L’Esprit). Eu estendi suas ideias para muito da minha própria escrita, bem como para as oficinas de escrita etnográfica que tenho mediado por mais de 15 anos. Nessas oficinas intensivas, exploramos como certos etnógrafos, escritores criativos de não-ficção, romancistas e poetas evocaram espaço e lugar de forma criativa, sintonizando-se com as idiossincrasias do diálogo e criando personagens. Em seguida, escrevemos sobre o espaço e lugar, desenvolvemos diálogos e criamos personagens – tudo a partir das experiências de campo dos participantes. Ao final da oficina, os participantes produzem um ensaio que apresenta evocações de espaço e lugar, a sonoridade do diálogo e as particularidades do personagem – um exercício na arte da etnografia. Utilizando-se dessas técnicas, os acadêmicos podem criar obras que dão vida às vicissitudes das pessoas e do lugar. Em tempos turbulentos, é importante que os antropólogos usem a arte da etnografia para que os insights etnográficos, que incorporam o conhecimento nativo, possam ser projetados para um público que precisa da sabedoria nativa.

O Gosto das Coisas EtnográficasSTOLLER, Paul. 2022. O gosto das coisas etnográficas. Os sentidos na antropologia. (Traduzido por Marcelo Moura Mello). Rio de Janeiro, Papéis Selvagens Edições. é seu primeiro livro traduzido para o português. Como foi a confecção deste livro?

PS: Foi uma experiência maravilhosa. Minha incansável editora e meu incansável tradutor foram excelentes, e o produto final é um livro com lindo design, com uma capa muito atrativa. Sou muito grato pelo interesse em meu trabalho.

Em livros como O gosto das coisas etnográficasSTOLLER, Paul. 2022. O gosto das coisas etnográficas. Os sentidos na antropologia. (Traduzido por Marcelo Moura Mello). Rio de Janeiro, Papéis Selvagens Edições. e Sensuous ScholarshipSTOLLER, Paul. 1997. Sensuous Scholarship. Filadélfia, Pennsylvania University Press., você confronta a constituição sensorial de epistemologias locais. Tal perspectiva permitiu abordar diferentes assuntos – como parentesco, feitiçaria, som e música – a partir de uma perspectiva sensorial. Você pode falar mais sobre essa perspectiva em relação ao estudo do corpo e da corporeidade?

PS: Por muitas gerações, os sentidos – e equívocos sensoriais3 3 | [Nota dos entrevistadores] Sensuous deceptions, no original. Para Stoller, em discursos acadêmicos os sentidos foram considerados como equívocos, permeados por enganos (e mesmo artifícios) que prejudicavam uma apreensão acurada da realidade. – foram omitidos da maioria dos discursos acadêmicos. Os sentidos não visuais têm sido considerados irrelevantes, teórica e cientificamente. Não se ouve nem cheira a teoria; ela é visualizada. Em meu novo livro, Wisdom from the EdgeSTOLLER, Paul. 2023. Wisdom from the edge. Writing Ethnography in Turbulent Times. Ithaca. Cornell University Press., discuto a abordagem puramente antropológica, que é dominada pela visão, para o estudo da possessão espiritual. Nesse capítulo tento demonstrar como cheiro, tato e som são intrínsecos a uma descrição e análise totalmente adequadas da possessão espiritual. Além do mais, pintar, esculpir e escrever são atos fundamentalmente corporificados. Uma mente, como gostava de dizer Merleau-Ponty, não pode pintar, esculpir ou, aliás, escrever. Adotar uma abordagem sensorial para o ofício da etnografia produz um conjunto completo de insights que destacam a sabedoria dos anciãos indígenas, uma sabedoria que, na era da petrocultura neoliberal, poderia nos tornar, nas palavras de Morton e Boyer, “humanos novamente”MORTON, Timoty; BOYER, Dominic. 2021. Hyposubjects: on becoming human. Londres, Open University Press..

Qual a relevância de estudar os sentidos no mundo contemporâneo?

PS: Estudiosos que adotam uma abordagem desincorporada para o estudo do mundo contemporâneo empregam uma epistemologia do século XIX para investigar as realidades sociais do século XXI, que são, por sua vez, moldadas pela acelerada tecnologia da Internet e das mídias sociais. Abordagens desincorporadas produziram resultados rápidos, em um contexto intelectual que recompensa a construção acelerada de teorias. As teorias aceleradas, em constante evolução, nos permitem, ou assim pensamos, entender as complexidades de um mundo em constante mudança. A abordagem corporificada que defendo, direta e indiretamente, em meu trabalho, incluindo em textos sobre os sentidos na antropologia, requer uma abordagem ponderada da bibliografia e da produção intelectual, a qual enfatiza a colaboração, modéstia intelectual, desaprendizado e [o uso] de metodologias periféricas. Esses métodos confrontam mais plenamente as incertezas e incompletudes da vida social contemporânea. Eu encorajaria acadêmicos mais jovens a reservar um tempo para se sintonizar com seus sentidos, e respeitar o que estão intuindo e sentindo, incorporando essa sintonia fina em seu trabalho etnográfico.

Em um artigo recente, você escreveu sobre marasmos. Entre outras coisas, você relacionou os momentos de quietude com outras possibilidades de pensar o mundo e viver nele. Você também observou que a antropologia é uma ciência lenta em um mundo acelerado. Que estratégias a antropologia pode adotar para se reorientar neste mundo digitalizado e acelerado?

PS: O marasmo4 4 | [Nota dos entrevistadores] Doldrums, no original. Expressão que descreve períodos de estagnação, desânimo, apatia, inércia ou melancolia. Para Stoller, esses períodos podem ser caóticos e turbulentos, e simultaneamente podem representar momentos para a inspiração e mudanças substanciais. é uma metáfora adequada para nossos tempos turbulentos. Como alguém pode encontrar um espaço de quietude pacífica, um lugar entre o passado e o presente, entre a aldeia e o mato? Ao contrário de outros estudiosos, os antropólogos vivem rotineiramente entre-espaços: entre a aldeia e a mata, entre o estar-aqui e o estar-lá,5 5 | [Nota dos entrevistadores] O autor faz referência, aqui, a Clifford Geertz. entre a doença e a saúde, entre a vida e a morte. No pensamento sufi místico, esses espaços são chamados de barzakh, aquilo que une dois elementos díspares, como uma passarela que atravessa o rio caudaloso de um desfiladeiro profundo. Se você experiencia o barzakh, você é obrigado a desacelerar e contemplar sua situação. Do meio de uma passarela frágil, subitamente sua situação existencial entra em foco. Atrás de você está o seu passado, com seus confortos e desconfortos, alegrias e tristezas. Diante de você está a ansiosa incerteza do seu futuro. Nesse espaço turbulento entre o passado e o futuro, pode haver uma súbita clareza intelectual, um momento de inspiração criativa que o impulsiona para frente. De repente, você sabe quais perguntas fazer e quais estratégias textuais precisará empregar. Demanda tempo, esforço e disposição para correr os riscos de caminhar na frágil passarela e experimentar “o entremeio”. O tempo cura e revela. E como o Grateful Dead6 6 | [Nota dos entrevistadores] Stoller faz referência, aqui, à banda de rock estadunidense Grateful Dead. gosta de dizer: “velocidade mata”. Portanto, um bom estímulo para os antropólogos seria desacelerar, envolver-se no trabalho de campo de longa duração e adotar uma abordagem modesta e colaborativa para aprender sobre o mundo. Como Adamu Jenitongo me disse uma vez. “Você aprendeu muito (sobre nós), mas para entender nosso povo, você deve envelhecer conosco.” Como envelheci, espero continuar a obter consolo com a sabedoria de Adamu Jenitongo.

Quais são seus hábitos intelectuais? Como você encontra inspiração para escrever?

PS: Eu encontro inspiração na natureza. Todas as manhãs, caminho por uma bela floresta antiga, perto de minha casa. O que essas árvores testemunharam? Que histórias eles incorporam? Neste lugar especial, pensamentos inundam minha mente e, às vezes, tenho uma ideia para um livro, um ensaio ou uma frase. Caminhar na floresta é minha maneira de experimentar o barzakh. É minha frágil passarela, na qual minha mente desanuvia. A partir de então, sei como proceder. Seguindo a caminhada, volto para casa, sento-me em meu escritório e escrevo. Com a mídia social desligada, primeiro edito a redação do dia anterior e depois passo para o novo material. Em um bom dia, posso escrever quatro páginas. Essa prática de escrita lenta produz um acúmulo constante de páginas. Com o tempo, surge um ensaio, um capítulo ou um livro – alguns bons; outros, nem tanto. Escrever é um desafio constante e sou grato porque meu interesse e paixão por escrever continuam.

Quais são seus projetos atuais? Que continuidades e descontinuidades você vê entre o que está fazendo agora e sua experiência anterior?

PS: Meu projeto atual emerge de mais de 30 anos de estudo de campo entre imigrantes da África Ocidental na cidade de Nova York. Nesses 30 anos longe de casa, como meus amigos mudaram? Como a imigração moldou sua identidade em constante mudança? Como eles enfrentaram questões de amor e perda como estrangeiros em uma terra estranha? Depois de tanto tempo em Nova York, o que os conforta? Que estratégias empregam para manter seu bem-estar? Como eles lidam com questões de saúde e adoecimento? Como se adaptam às questões sociais e físicas associadas ao envelhecimento? Considerando a resiliência social e cultural de meus amigos da África Ocidental na cidade de Nova York, temos muito a aprender com seus pensamentos sobre esses elementos essenciais da condição humana. Sou muito grato por eles terem continuado a compartilhar suas experiências comigo.

Adoramos suas respostas, Paul, são muitos ensinamentos para a antropologia e para a vida mesma, você traz muita sensibilidade em suas palavras

PS: Obrigado por compilar um conjunto tão estimulante de perguntas!

Referências bibliográficas

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  • MERLEAU-PONTY, Maurice. 1992. Signos. São Paulo, Martins Fontes.
  • MERLEAU-PONTY, Maurice. 1999. Fenomenologia da percepção. São Paulo, Martins Fontes.
  • MERLEAU-PONTY, Maurice. 2002. A prosa do mundo. São Paulo, Cosac Naify
  • MERLEAU-PONTY, Maurice. 2004. O Olho e o Espírito. São Paulo, Cosac Naify.
  • MORTON, Timoty; BOYER, Dominic. 2021. Hyposubjects: on becoming human. Londres, Open University Press.
  • STOLLER, Paul; OLKES, Cheryl. 1987. In Sorcery’s Shadow: A Memoir of Apprenticeship among the Songhay of Niger. Chicago, University of Chicago Press.
  • STOLLER, Paul. 1989. The taste of Ethnographic Things: The Senses in Anthropology. Filadélfia, University of Pennsylvania Press.
  • STOLLER, Paul. 1992. The cinematic griot. The ethnography of Jean Rouch. Chicago, University of Chicago Press.
  • STOLLER, Paul. 1995. Embodying Colonial Memories: Spirit Possession, Power, and the Hauka in West Africa. Londres, Routledge.
  • STOLLER, Paul. 1997. Sensuous Scholarship. Filadélfia, Pennsylvania University Press.
  • STOLLER, Paul. 2002. Money Has No Smell. The Africanization of New York City. Chicago, University of Chicago Press.
  • STOLLER, Paul. 2014. Yaya’s Story: The Quest for Well-Being in the World. Chicago, University of Chicago Press.
  • STOLLER, Paul. 2022. O gosto das coisas etnográficas. Os sentidos na antropologia. (Traduzido por Marcelo Moura Mello). Rio de Janeiro, Papéis Selvagens Edições.
  • STOLLER, Paul. 2023. Wisdom from the edge. Writing Ethnography in Turbulent Times. Ithaca. Cornell University Press.
  • 1 |
    [Nota dos entrevistadores] Agência federal estadunidense, fundada em 1961 por John F. Kennedy, voltada para a execução de políticas de cooperação entre os Estados Unidos e os países em desenvolvimento.
  • 2 |
    [Nota dos entrevistadores] O título do livro permite distintas traduções, desde Sabedoria do limiar até Sabedoria desde (ou a partir do) o limiar. A palavra “edge” também se presta a distintas traduções: borda, margem, periferia, limite, fronteira.
  • 3 |
    [Nota dos entrevistadores] Sensuous deceptions, no original. Para Stoller, em discursos acadêmicos os sentidos foram considerados como equívocos, permeados por enganos (e mesmo artifícios) que prejudicavam uma apreensão acurada da realidade.
  • 4 |
    [Nota dos entrevistadores] Doldrums, no original. Expressão que descreve períodos de estagnação, desânimo, apatia, inércia ou melancolia. Para Stoller, esses períodos podem ser caóticos e turbulentos, e simultaneamente podem representar momentos para a inspiração e mudanças substanciais.
  • 5 |
    [Nota dos entrevistadores] O autor faz referência, aqui, a Clifford Geertz.
  • 6 |
    [Nota dos entrevistadores] Stoller faz referência, aqui, à banda de rock estadunidense Grateful Dead.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023
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