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UM INTELECTUAL NA MIRA DA REPRESSÃO: MILTON SANTOS E O GOLPE DE 1964

AN INTELLECTUAL IN THE SIGHTS OF REPRESSION: MILTON SANTOS AND THE COUP OF 1964

Resumo

Este artigo analisa a experiência de repressão política sofrida por Milton Santos em consequência da instauração do golpe civil-militar de 31 de março de 1964 que destituiu o governo do presidente João Goulart. A problemática central se concentra na compreensão do processo de prisão e exílio do geógrafo e o que esses fatos representaram na sua trajetória. O texto tem como base documental fontes jornalísticas, militares e entrevistas e toma como referencial teórico as concepções de Jean François Sirinelli e Michel Pollack. Espera-se contribuir para elucidar aspectos ainda pouco investigados da trajetória política e intelectual de Milton Santos, enfatizando que o golpe de 1964 representou uma inflexão na vida de intelectuais brasileiros que estiveram sintonizados com ideais progressistas e empreenderam lutas na defesa de uma sociedade mais igualitária.

Palavras-chave:
Milton Santos; golpe de 1964; intelectuais; repressão; memória

Abstract

This paper analyzes the political repression experienced by Milton Santos in consequence from the coup d’état of March 31, 1964 that overthrew the president João Goulart. The main issue focuses on understanding the imprisonment and exile of the geographer and what such facts represented in his history. The text is grounded on journalistic, military and interview sources, and takes the ideas of Jean François Sirinelli and Michel Pollack as theoretical references. I hope I can contribute to elucidate aspects of Milton Santos’s political and intellectual life, which are still little investigated, emphasizing that the 1964 coup represented a turning point for Brazilian intellectuals who were attuned to progressive ideals and struggled for a more equalitarian society.

Keywords:
Milton Santos; 1964 coup; intellectuals; repression; memory

Introdução

Os ânimos estavam exaltados. A praça da Independência parecia pequena diante da multidão nela concentrada. No palanque, aplaudido intensamente, Gilberto Freyre (1900-1987) posicionou-se no microfone e começou seu discurso. Era 9 de abril de 1964. O ato marcava em Recife o fim da Marcha da família com Deus pela liberdade em agradecimento às Forças Armadas pela derrubada do governo João Goulart.1 1 Diário de Pernambuco, Recife, 10 abr. 1964, p. 4. Eventos semelhantes estavam ocorrendo em diversas cidades brasileiras legitimando o golpe de Estado dado em 31 de março daquele ano.

Em trecho da sua homilia, o renomado autor de Casa grande e senzala declarou: “Brasileiro nenhum, verdadeiramente brasileiro, pernambucano nenhum, verdadeiramente pernambucano, admite que sobre sua pátria desça aquela noite terrível em que só brilham, num céu tornado inferno, estrelas sinistramente vermelhas”. E seguiu palavreando em tons anticomunistas: “Nós desejamos continuar independentes de qualquer imperialismo, econômico, político ou ideológico. Sei que digo palavras duras”, enfatizou o orador, “mas não estamos, os brasileiros que procuramos ser dignos do Brasil, empenhados em vão no grande movimento saneador e renovador iniciado a 31 de março”. Movimento este “que há de tornar histórico o ano de 1964 e reafirmar, na história do nosso país, a aliança profunda, nos momentos mais agudos de crises nacionais, das Forças Cívicas e das Forças Armadas”.2 2 Ibidem.

Gilberto Freyre estava em consonância com o golpe civil-militar que pôs fim a curta experiência de democracia construída no país desde o fim do Estado Novo. E a situação não foi episódica; o intelectual não se arrependeu depois como aconteceu com muitos ao perceberem a contribuição dada na construção de uma ditadura no país. Em 1967, foi alçado como membro do recém-criado Conselho Federal de Cultura (CFC).3 3 CALABRE, Lia. Intelectuais e política cultural: o Conselho Federal de Cultura. Intellèctus, vol. II, Rio de Janeiro, ano 05, 17-18 mai. 2006, p. 2. Revista eletrônica. Disponível em: http://rubi.casaruibarbosa.gov.br/handle/fcrb/466. Acesso em: 15 ago. 2017. Em 1969, o escritor pernambucano brindou com dois dos seus artigos a coletânea intitulada O processo revolucionário brasileiro, elaborada atendendo ao projeto da Presidência da República com o intuito de celebrar o 5º aniversário da “revolução”.4 4 CARDOSO, Lucileide Costa. Os discursos de celebração da Revolução de 1964. Revista Brasileira de História, vol. 31, n. 62, São Paulo, 2011, p. 117-140. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v31n62/a08v31n62.pdf. Acesso em: 15 ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-01882011000200008.

A adesão de Gilberto Freyre ao golpe e à ditadura não é tema de que me ocupo neste artigo. Mas o destaque ao pensador e suas posições ajuda a adentrar nas veredas que busco percorrer. Muitos intelectuais brasileiros aderiram e estiveram confortáveis com a nova ordem implantada no país em 1964, conclamando discursos de celebração à “revolução” e do fim do comunismo nas terras brasileiras. Outros se acomodaram como puderam e, sem necessariamente aderir à nova situação, tentaram estrategicamente coexistir com o regime. Mas, para muitos, o cerco se fechou. O “movimento saneador e renovador”, nos dizeres de Freyre, tratou de atingir violentamente intelectuais mais libertários.

Silenciados, reprimidos, presos e exilados. Este foi o destino de muitos intelectuais, quer por suas posições contrárias ao golpe ou mesmo por terem atuado nas suas trajetórias acadêmicas e vidas públicas em questões consideradas progressistas. O geógrafo Milton Santos (1926-2001) foi um desses intelectuais que, diferentemente de Gilberto Freyre, tornou-se alvo direto das forças civis e militares que tomaram o poder no Brasil naquele outono de 1964. A seguir, o objetivo é conhecer e compreender a experiência de repressão política sofrida por Milton Santos frente ao golpe que derrubou o governo João Goulart. Penso como se processou esse episódio e como ele interferiu na trajetória intelectual da personagem. Trato o golpe como um momento de inflexão na vida de intelectuais brasileiros que adotavam um pensamento progressista e nutriam ideais de um país mais igualitário.

O Milton Santos de 1964

Baiano de Brotas de Macaúbas, negro, pai e com 38 anos de idade, Milton Santos era um intelectual renomado em 1964. Quando uso o termo intelectual me refiro a uma definição nos termos de Jean François Sirinelli. Os intelectuais não são entendidos exclusivamente pelo viés estreito do engajamento ou como meros grupos de pressão filiados a uma classe. É necessária uma perspectiva mais “ampla e sociocultural”. Os intelectuais, de uma forma geral, são “criadores e mediadores culturais”, transitam entre o mundo da política e da cultura. Não estabelecem caminhos lineares, mais sim itinerários marcados por sociabilidades nas quais “se interpenetram o afetivo e o ideológico”, sociabilidades que remetem tanto ao sentido de “redes” que estruturam, quanto ao “microclima que caracteriza um microcosmo intelectual particular”. São influenciados por fenômenos de geração e, da mesma forma, criam modelos a serem seguidos.5 5 SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René (org.). Por uma história política. Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ, 1996, p. 242-253-254-255.

Milton Santos começou seu itinerário acadêmico na década de 1940, na Faculdade de Direito da Bahia, tornando-se bacharel em 1948,6 6 SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996, p. 485. período em que o Brasil tentava curar as feridas abertas pela ditadura do Estado Novo (1937-1945), e o mundo, após o fim da sua Segunda Guerra (1939-1945), adentrava num novo conflito, a Guerra Fria, com contornos ideológicos bem demarcados entre o bloco capitalista representado pelos Estados Unidos e o comunista pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

O curso de Direito foi uma escolha possível para Milton Santos dentre as possibilidades no período, pois outras faculdades eram ainda mais inacessíveis para cidadãos negros na Bahia.7 7 GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos: uma leitura a partir da centralidade da técnica, dos diálogos com a economia política e da cidadania como práxis. Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana, Universidade de São Paulo (USP), 2011, p. 37. A Escola Politécnica, por exemplo, era uma das mais fechadas nesse sentido.8 8 Entrevista concedida por Milton Santos à revista Caros Amigos. Edição online. Disponível em: http://www.carosamigos.com.br/index.php/grandes-entrevistas/6047-entrevista-explosiva-com-milton-santos. Acesso em: 3 ago. 2017. A vida profissional do intelectual baiano antes do golpe de 1964 pode ser pensada em três frentes: trabalho na imprensa, cargos públicos e atuação como professor universitário.

Na imprensa, inseriu-se logo após a sua formatura em Direito. Na ocasião, foi trabalhar como correspondente do jornal A Tarde em Ilhéus, zona cacaueira da Bahia, periódico de Ernesto Simões Filho (1886-1957) e que contava com uma circulação ampla em todo o estado. Na mesma cidade, tinha sido aprovado para ser professor de Geografia no Colégio Municipal de Ilhéus.9 9 Idem, ibidem, p. 39. Sua vida intelectual iniciou-se no mundo da geografia, onde permaneceu, deixando praticamente de lado seu título de magistrado. Retornando a Salvador, foi alçado a jornalista do mesmo A Tarde, permanecendo até 1964.10 10 CALMON, Jorge. O jornalista Milton Santos. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996, p. 62. Entre 1959 e 1961, o professor ainda assumiu o cargo de diretor da Imprensa Oficial da Bahia.11 11 Dados obtidos em: http://miltonsantos.com.br/site/biografia/. Acesso em: 3 ago. 2017. Seu reconhecimento intelectual lhe permitia construir um itinerário que estabelecia sociabilidades tanto com setores progressistas, quanto conservadores da sociedade baiana, como o próprio caso de Simões Filho.

Sua vida no ensino superior iniciou-se como docente da disciplina Geo- grafia Humana na Universidade Católica de Salvador, onde permaneceu de 1954 a 1960. No fim de 1958, defendeu doutorado em Letras na Universidade de Estrasburgo na França, que resultou na tese intitulada O centro da cidade do Salvador.12 12 GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 57. No início dos anos 1960, ingressou por concurso público como catedrático na Universidade da Bahia.13 13 SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo, op. cit., p. 485. Em finais da década de 1950, tinha ajudado a projetar e criar o Laboratório de Geomorfologia, seu espaço de socialização de ideias e conhecimentos. Para Délio José Ferraz Pinheiro, no laboratório, o geógrafo imprimiu “uma nova consciência metodológica” e revolucionou o “processo de pensar a geografia, fazendo surgir uma geração de pesquisas que seria um marco no Brasil”.14 14 PINHEIRO, Délio José Ferraz. Milton Santos e a Bahia de belas gravitas e verdades encobertas. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo, op. cit., 1996, p. 189. Milton Santos teve sua experiência intelectual marcada pela influência de geógrafos franceses, um aspecto comum da geração de intelectuais brasileiros da sua época dedicados à geografia.15 15 GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 32-24-69. No caso específico do baiano, sua maior influência se deu a partir do seu orientador de doutorado, Jean Tricart (1926-2003).

Nos cargos públicos, Milton Santos assumiu em 1961 a chefia do sub-gabinete da Casa Civil da Presidência da República na Bahia, nomeado pelo presidente Jânio Quadros (1917-1992), cargo em que permaneceu até a renúncia do chefe do poder executivo brasileiro. Após a vitória de Lomanto Júnior (1924-2015) para governar a Bahia em 1962, o geógrafo foi empossado presidente da Comissão de Planejamento do Estado - CPE, cargo importante para a discussão de grandes questões referentes à organização administrativa, econômica e social da Bahia e que ocupou até o período do golpe.16 16 Idem, ibidem, p. 74. Além dessas atuações, o intelectual também foi presidente da União Baiana de Escritores17 17 Novos Rumos, Rio de Janeiro, 21 a 27 jul. 1961, p. 3. e, em 1962, foi eleito presidente da Associação de Geógrafos Brasileiros, recebendo o apoio e respaldo de Caio Prado Júnior (1907-1990).18 18 GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 75.

Em 1964, Milton Santos já reunia uma vasta produção acadêmica, contando com artigos e livros publicados em diferentes espaços editoriais. Numa listagem apenas dos livros, destacam-se: O povoamento da Bahia: suas causas econômicas (1948), Estudos sobre geografia (1953), Os estudos regionais e o futuro da geografia (1953), Zona do cacau. Introdução ao estudo geográfico (1957), Estudos de geografia da Bahia (1958), A cidade como centro de região (1959), A rede urbana do Recôncavo (1959), O centro da cidade do Salvador (1959), Marianne em preto e branco (1960), dentre outros.

O reconhecimento intelectual de Milton Santos da década de 1950 aos anos 1960 era inconteste. Sua geração contava ainda com outros pensadores de renome e com ampla produção intelectual como Darcy Ribeiro (1922-1997) e Paulo Freire (1921-1997). Geração de pensadores num período em que o país, através de diferentes segmentos sociais, buscava empolgadamente progredir no campo da educação e construir um futuro mais igualitário e inclusivo para sua população, perpassando pela discussão da implantação das reformas de base, bandeira abraçada pelo governo Goulart. Realidade que foi abafada pelo golpe de 1964.

A experiência de repressão em 1964

Desde os primeiros dias após a vitória do golpe civil-militar contra o governo João Goulart, a repressão foi implacável. As Forças Armadas, capitaneadas pelo Exército, buscaram neutralizar qualquer atividade de resistência. Sob o título de “operação limpeza”, ações militares, articuladas com lideranças políticas civis, atingiram sujeitos considerados “subversivos”, conceito que se tornava bem elástico dependendo dos interesses dos agentes da repressão. Professores, operários, estudantes, camponeses: a força militar pegou quem podia pegar em nome da defesa da “segurança nacional”, da “sociedade ocidental”, “branca”, “cristã” e “capitalista”.

A Bahia fazia parte da 6ª Região Militar, juntamente com o vizinho estado de Sergipe e tinha como comandante o general Manoel Mendes Pereira. Na chefia do Estado Maior da Região estava o coronel Humberto de Souza Mello. Todos respondiam ao general Justino Alves, comandante do IV Exército cuja área de atuação eram os estados do Nordeste. Na Polícia Militar baiana, quem chefiava era o coronel Lourildo Barreto e no comando da Secretaria de Segurança Pública do Estado o coronel Francisco Cabral era quem ditava as ordens. Estes eram os postos chaves que garantiram a instauração do regime autoritário em terras baianas, se aliando a líderes políticos da União Democrática Nacional - UDN como Juracy Magalhães e Antônio Carlos Magalhães, do Partido Libertador - PL como Luís Vianna Filho, e ainda o governador Lomanto Júnior do Partido Trabalhista Brasileiro - PTB que conseguiu se acomodar ao cargo aderindo à “revolução” no apagar das luzes.

Os principais espaços para os quais os presos políticos eram direcionados na cidade de Salvador foram o quartel do 19º Batalhão de Caçadores (19 BC), o quartel do Barbalho, o Mont Serrat e o quartel de Amaralina. Entretanto, na prática, qualquer local estratégico poderia ser utilizado como ponto de encarceramento. Na primeira semana de abril, o comando do 2º Distrito Naval ordenou que a Empresa de Navegação Baiana disponibilizasse uma embarcação nomeada de Cachoeira. Transformada em prisão, na embarcação foram presos violentamente muitos trabalhadores membros de organizações sindicais da orla marítima de Salvador, acusados de “subversão” comunista.19 19 A Tarde, Salvador, 9 abr. 1964, p. 3.

Foi em meio a essa atmosfera de violência escancarada, justificada de diferentes formas, que o professor Milton Santos foi preso em abril de 1964. A notícia não foi amplamente divulgada na Bahia, nem na imprensa nacional logo após a prisão. O cárcere do intelectual baiano, além dos boatos que já corriam, só se tornou efetivamente público no mês de maio, estarrecendo muitos que não entendiam como um homem primorosamente dedicado às letras e a planos de melhoria social no âmbito do planejamento do Estado era um perigo para a “segurança nacional”.

Nas páginas do jornal carioca Correio da Manhã, em 8 de maio de 1964, a notícia da prisão do baiano saiu com o título: “Detenção suscita surpresa na Bahia”. As linhas transcritas na notícia assim diziam: “Encontra-se preso, em Salvador, há 28 dias, o professor universitário e jornalista Milton Santos”. Na ocasião, assumia as funções de “presidente da Comissão de Planejamento do Estado (CPE) e diretor do Gabinete de Geomorfologia da Universidade da Bahia, onde é, também, catedrático de Geografia Humana”. O professor, afirmava a matéria, ainda assumia o trabalho “de redator do vespertino A Tarde”.20 20 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 8 mai. 1964, p. 2.

É de se observar que o jornal que antes gritara “Basta” para o governo Jango, engrossando as fileiras dos que ansiavam por um golpe de Estado, nesse momento passava a expor os desmandos do regime autoritário que se construía no Brasil. Tinha entrado para a trupe dos que resistiam, mesmo que timidamente. Na continuidade da notícia, o Correio da Manhã destacou que Milton Santos tinha se apresentando ao comandante Manoel Mendes Pereira “logo que tomou conhecimento de que seu nome constava de uma das listas de detenções”. O fato teria ocorrido na primeira semana de abril e, desde então, o professor foi encarcerado no 19º Batalhão de Caçadores, recebendo apenas uma visita por semana.21 21 Ibidem.

Apresentado o formato do encarceramento, a matéria passou a retratar a surpresa e as possíveis causas de tal situação ocorrer com o intelectual baiano. Dizia-se que “os meios culturais da Bahia foram surpreendidos com a prisão”. A peça jornalística, ao mesmo tempo em que buscava apontar os motivos do cárcere, tendia a fazer uma defesa do preso político. Primeiro, afirmava que a causa foi o fato de o “professor ter sido o jornalista presidente, na Bahia, da Associação Brasileira de Escritores e de viajar constantemente para o exterior”. Entretanto, a matéria destacava, “nunca para a cortina de ferro”. Ou seja, nenhum país comunista. Mas, sim, tinha ido para a França, “onde se doutorou em Letras pela Universidade de Estrasburgo e para a África, em cuja Universidade Ibadã, pronunciou conferências, depois reunidas no livro Marianne em preto e branco”.22 22 Ibidem.

Seguindo na defesa do professor, o texto jornalístico destacava algumas das suas características: “Apolítico, jamais foi candidato a qualquer cargo eletivo, a não ser no período universitário quando, segundo depoimento dos seus contemporâneos de estudos, foi líder estudantil nacional contra a infiltração comunista na UNE”, coordenando “a campanha do então universitário José Bonifácio Coutinho Nogueira para a presidência daquela entidade.” No entendimento do articulista, não teria motivo para aquela prisão. Milton Santos, para Correio da Manhã, era anticomunista e sua trajetória no movimento estudantil era suficiente para provar.

Seguindo na peça jornalística, o periódico especulou outra possibilidade para a prisão do intelectual baiano: “No governo do sr. Jânio Quadros, o prof. Milton Santos foi chefe do Sub-Gabinete Civil da Presidência da Bahia, o que alguns alegam ter sido o motivo da prisão”. Sendo funcionário de figura polêmica como Jânio Quadros, talvez Milton Santos não merecesse perdão em tempos de “revolução”. Mas, em seguida, a notícia destacou a incongruência do argumento. No cargo, o professor teve como colega “no sub-gabinete militar, o próprio atual chefe de polícia da Bahia, coronel Francisco Cabral”.23 23 Ibidem. Ora, se ambos serviram a Jânio Quadros, porque só o professor estava sendo alvo de privação da sua liberdade, indagou o periódico carioca.

Encerrando o relato da experiência de repressão, o Correio da Manhã expressou a solidariedade que o geógrafo baiano vinha recebendo até aquele momento: “escritores, jornalistas e universitários baianos têm se movimentado no sentido de esclarecer os motivos da prisão do sr. Milton Santos. Nesse sentido, parlamentares do Estado vão procurar, amanhã, o ministro Milton Campos”.24 24 Ibidem.

Apesar de a notícia frisar que Milton Santos era apolítico, o distanciando veementemente de ser identificado como um homem filiado a sentimentos de esquerda e consequentemente identificado como comunista, algo caro para quem não desejava sofrer a força militar do regime que estava sendo instaurado no país, o intelectual baiano era um pensador livre e defendia posições políticas de caráter progressista, seja na imprensa, na universidade, em cargos administrativos e publicações acadêmicas. Tudo isso já era um motivo para ser mal visto pelos artífices do golpe.

Antes mesmo de assumir o cargo no governo Jânio Quadros, o intelectual baiano fez uma viagem a Cuba. O geógrafo foi enviado especial pelo jornal A Tarde na comitiva que o então candidato à presidência, o próprio Jânio, fez ao país que tinha acabado de ver triunfar sua revolução socialista. Como resultado da viagem, o professor baiano publicou uma série de matérias no A Tarde com o título “Visita a uma revolução”, constando um total de 13 colunas.

O estudo realizado por Bruno de Oliveira Moreira analisou o conteúdo dos artigos publicados por Milton Santos sobre a Revolução Cubana. Embora o periódico baiano adotasse uma postura conservadora em relação à nova realidade da ilha, os escritos de Milton Santos seguiram outro caminho. O A Tarde era veículo de socialização das ideias do geógrafo, mas a linha editorial do periódico baiano tinha outra tonalidade. Segundo Moreira, os artigos marcavam a “evidente simpatia” de Milton Santos pelo regime instaurado em terras cubanas.25 25 MOREIRA, Bruno de Oliveira. “Visita a uma revolução”: uma análise dos escritos de Milton Santos sobre a revolução cubana (1960). Revista de História (UFBA), vol. 2, n. 1, 2010, p. 100-120, p. 102. Essa simpatia destacava-se nos textos “tanto na avaliação positiva do contato com aquele país, quanto na atribuição de um caráter de símbolo ao movimento, ressaltando elogiosamente sua luta contra o imperialismo”.26 26 Idem, ibidem, p. 108.

Também na própria Comissão de Planejamento do Estado, Milton Santos teve uma atuação que para os representantes do golpe poderia ser considerada esquerdizante. Conforme Flávia Christina Andrade Grimm, a atuação do geógrafo “nesse órgão de planejamento foi voltada principalmente para o enfrentamento das desigualdades sociais e regionais da Bahia”. Segundo a autora, para o intelectual, “das diferentes propostas colocadas pela Comissão, a criação de impostos sobre fortunas foi a mais criticada por outras esferas públicas e da sociedade”, fato este que a escritora considera um exemplo da preocupação do pensador baiano com “a efetivação da cidadania no país”.27 27 GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 75.

Nas páginas do jornal A Tarde, edição de 9 de maio de 1964, foi publicada uma entrevista concedida pela cúpula militar na Bahia ao jornalista Walfrido Moraes. Os militares, dentre tantas questões feitas pelo repórter, foram instigados a expor suas ideias sobre a “revolução” que estavam fazendo. O coronel Marinho Freire Dantas, chefe da Segunda Seção do Exército, responsável pelo serviço de investigação e inteligência, apresentou algumas das suas ideias pelas quais é possível captar a sintonia do que de fato os agentes da repressão buscavam, e relacioná-la diretamente com a experiência traumática vivenciada por Milton Santos.

Centrando no comunismo como o principal mal que deveria ser combatido pela “revolução” na sociedade brasileira, o coronel buscou tratar da necessidade de se neutralizar seus propagadores. Explicou: “então como agente principal da subversão, nós nos preocupamos, frontalmente, profundamente, carinhosamente, desveladamente, com a busca não somente do comportamento da sociedade”, mas com “o comportamento desses indivíduos que esposam essas ideias”. Para o coronel, eram as ideias que precisavam ser combatidas antes de qualquer coisa. Na sua lógica, os agentes portadores dessas ideias maléficas seriam o alvo a ser atingido.28 28 A Tarde, Salvador, 9 mai. 1964, p. 1.

Seguindo no seu discurso, o militar buscou arrematar mais diretamente sua resposta ao repórter do A Tarde. Dizia ele: “para ser mais claro, nós vamos perscrutar o mundo estudantil, nós vamos perscrutar a elite intelectual, nós procuramos sentir o comportamento das massas, nós procuramos sentir, dentro daquilo que podemos chamar de oportunistas (...)”.29 29 Ibidem. Milton Santos era justamente parte dessa elite intelectual que o membro do Exército brasileiro buscava “perscrutar”.

Para embasar suas ideias, o coronel Marino Dantas se utilizou de uma interpretação particular do marxismo. Argumentou o militar: “É preciso significar aqui o que disse Lenine, o próprio Lenine, o reformulador do marxismo para o caso da Revolução Russa, nos primeiros lustros deste século”. E fechou o assunto: “é de maior valia aquele que ocupa uma cátedra e que é simpatizante do comunismo, do que cem pichadores comunistas radicais, pichando muros e paredes de uma cidade”.30 30 Ibidem.

Milton Santos era antes de tudo um intelectual progressista, um pensador livre e que tinha na geografia seu encanto. Mas não era qualquer geografia, era a geografia humana, que pensava espaço e povo como partes circundantes de uma mesma realidade social. O professor baiano era um homem de ideias e, em 1964, ter ideias era um perigo para aqueles que sabiam usar prioritariamente a força repressiva. O golpe de 1964 buscou cimentar, além de projetos reformistas ou revolucionários, ideias libertárias. O livre pensamento era um alvo para os artífices da derrubada de João Goulart. Nesse sentido, Milton Santos representava uma incompatibilidade com a nova ordem do país. E, na ótica militar, a alcunha de comunista lhe caia bem.

Os órgãos de Segurança da 6ª Região Militar buscaram “perscrutar” a vida de Milton Santos. Instauraram inquérito e o investigaram buscando argumentos para a prisão do intelectual no 19º BC. Os argumentos não foram divulgados para a sociedade, ficando no campo da especulação. Entretanto, um documento oficial expedido pelos próprios órgãos militares em 1964 permite entender, de fato, a acusação que pesava contra o geógrafo. No documento, o general Manoel Mendes Pereira, destacou sua análise para o caso do professor:

Ministério da Guerra - IV Exército - 6ª Região Militar. Quartel General. Solução: Pelas averiguações, digo, conclusões das averiguações policiais a que mandei proceder pelo Major Paulo Antunes de Souza, encarregado para apurar a responsabilidades de todos aqueles que se envolveram na prática de atos que atentaram contra a Segurança Nacional, na área da Fundação Comissão de Planejamento Econômico deste Estado (CPE), verifica-se que os fatos apurados constituem crime da alçada da justiça comum, por isso que, previstas no Código Penal Brasileiro e em artigos da Lei n. 1802, de 5/1/54 (Lei de Segurança do Estado), cujo processo e julgamento são da competência da mesma justiça. Após uma análise da prova destes autos convenci-me de que nele são indiciados, em primeiro plano, o Prof. Milton Almeida dos Santos (nomeado pelo Gov. Lomanto), que exerceu a Presidência da CPE desde o início do atual Governo, até 9 de abril deste ano, quando foi detido para averiguações, digo, investigações, o qual está incurso no artº 312 do Código Penal Brasileiro e no artº 321 do mesmo diploma legal, nesse último em virtude de se haver tornado um “inocente útil”, deixando de responsabilizar funcionários subordinados que praticavam atos subversivos, na órbita da Fundação de que era presidente.31 31 BRASIL. Ministério da Guerra, IV Exército - 6ª Região Militar (Bahia-Sergipe). Documento sem código de identificação. 29 ago. 1964. Material arquivado no Banco de Dados do Brasil Nunca Mais. Pasta BNM_279, p. 16039. Disponível em: http://bnmdigital.mpf.mp.br/pt-br/. Acesso em: 5 ago. 2017.

O motivo da prisão parecia ser a atuação de Milton Santos na Comissão de Planejamento, só que nenhuma prova foi apresentada. Tratava-se de acusá-lo de “inocente útil”, por permitir a subversão nos trabalhos da Comissão. Nesse caso, tornava-se também um “subversivo” e consequentemente um perigo para a “segurança nacional”. No mesmo documento foram colocados como acusados, juntamente com o professor, Antônio Wilton Cerqueira Coelho, Walmir Cerqueira Coelho, Lauro da Silva Correia, José Gorender, José Almeida Bandeira Ramos, Fernanda Maria de Muniz, Johnson Santos, Ilce Marques de Carvalho, Gabriel Cedraz Nery, Hélio Oliveira da Silva, Mario Marins Oliveira, Milcarlos de Mocedraz e Aristeu Nogueira, este tido como o mais perigoso.

Aristeu Nogueira (1915-2006) era membro do comitê do Partido Comunista na Bahia. Tinha sido eleito suplente de deputado estadual utilizando a legenda do Partido Socialista Brasileiro - PSB e foi cassado na Assembleia Legislativa. Segundo as informações dos órgãos de segurança, tinha atuado na Comissão de Planejamento do Estado ora “propagando suas ideias, ora distribuindo material de propaganda, ora angariando fundos para o seu partido, ora finalmente utilizando a fábrica da CPE para” confeccionar “bônus para a Campanha de Alfabetização popular no município de Pojuca”, campanha esta sob “inspiração e fundo comunista”.32 32 Ibidem. Tudo isso, é claro, acobertado por Milton Santos, presidente da CPE.

A subversão na CPE era o argumento concreto que os militares acharam para justificar a prisão do geógrafo, mesmo sem uma divulgação do fato. Entretanto, penso, a esses motivos levantados juntava-se o conjunto da obra (suas ideias, publicações e círculos de amizade). Mais ainda, o intelectual baiano tinha outro agravante para a lógica dos golpistas: era negro. O golpe também era racista e não teve nenhuma condescendência com a comunidade negra brasileira.

Em relato memorialístico escrito nos anos 1990 pelo geógrafo francês Jean Tricart, orientador de doutorado de Milton Santos em Estrasburgo nos anos 1950, o depoente relembrou sua passagem na Bahia para trabalhar com seu orientando frisando justamente o conflito sociorracial que o baiano enfrentava por ser um intelectual negro com destaque e inserção em postos tradicionalmente ocupados pela elite baiana do período:

Milton era homem pontual, qualidade talvez herdada de seu pai, que culminou sua carreira de professor como inspetor do ensino primário do Estado da Bahia. Uma manhã em que tínhamos marcado encontro no Hotel da Bahia - único hotel moderno na cidade àquela época - para sair a trabalho de campo, estranhei-lhe o atraso. Que teria acontecido? Indaguei dos funcionários da recepção do hotel, todos da mais autêntica cor preta, e à telefonista mestiça - esse posto era hierarquicamente superior aos demais. Perguntei se tinham visto Milton Santos, redator-chefe de A Tarde. Naturalmente eles conheciam bem o jornal. Pediram-me uma descrição do homem, ao que respondi: “Ele é bem negro, como os senhores”. Resposta: “Então não pode ser redator-chefe, muito menos de A Tarde”. Pois é, o Brasil, como os Estados Unidos, é multirracial, mas nem um nem outro constituem o chamado melting post. Sê-lo-ão agora? Muitas das dificuldades enfrentadas por Milton Santos, sobretudo em sua carreira política - a começar por sua condenação pelo regime militar de 64 - vêm daí. Não fosse ele negro e todo mundo fingiria ignorar suas ideias liberais. Mas isso estava fora de cogitação, porque ele era negro e, apesar de suas origens humildes, tinha galgado todos os postos da hierarquia administrativa e política. Era pois uma ameaça tanto para a estabilidade social da oligarquia quanto para o profundo racismo em que esta se fundava.33 33 TRICART, Jean. Negro só pode ser africano. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996, p. 66.

No tocante a essas questões do itinerário público traçado por Milton Santos na Bahia dos tempos do golpe de 1964, podemos destacar que, se por um lado Milton Santos pertencia a uma elite intelectual, por outro, não vinha de família pertencente às oligarquias na Bahia, não contava com uma rede de proteção nos altos escalões do Estado brasileiro. Sua figura, do ponto de vista da origem, era destoante na tradição intelectual da Bahia.

Em estudo realizado por Paulo Santos Silva sobre a relação entre luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na Bahia no período de 1930 a 1949, é destacado pelo autor que, sendo “descendentes de proprietários rurais ou de segmentos urbanos bem situados no aparelho de Estado (promotorias públicas, magistério superior, magistratura) ou iniciativa privada, os intelectuais baianos eram também” membros “das classes dirigentes”. Nesse sentido, “não constituíam um subgrupo destas”. Antes de tudo, “eles eram a própria classe dirigente na dupla tarefa de se dedicar às letras e à atividade política”.34 34 SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na Bahia (1930-1949). Salvador: Edufba, 2000, p. 17. No rol dessa geração de intelectuais destacados por Silva, estavam “Wanderley Pinho, Nestor Duarte e Luís Vianna Filho”.

Milton Santos, nos anos de 1950 e 1960, destoava das características gerais desta intelectualidade baiana que se projetou no período estudado por Silva. Se em seu itinerário o geógrafo também se dedicava concomitantemente ao mundo da política e das letras, desenvolvia essas atividades sem ser de fato membro da própria classe dirigente baiana nem subgrupo desta, mas construía seu caminho transitando entre diferentes círculos relacionais. Isso foi crucial para seu desfecho traumático em 1964. Nesse sentido, diante da prisão do intelectual, mesmo com a solidariedade que começava a aparecer por parte de escritores, amigos e alunos, no turbilhão político que tomou o Brasil, Milton Santos ficou jogado ao acaso num primeiro momento. Nada o impediu de ser encarcerado como um criminoso.

O Brasil fecha as portas, a França se abre

A prisão sem uma justificativa oficial e plausível do professor Milton Santos ganhou destaque internacional após a divulgação na imprensa em maio de 1964. Da França partiu uma tentativa de acolhida do intelectual baiano por parte da renomada Universidade de Toulouse. Por meio da Embaixada francesa no Brasil foi enviada uma carta para o respectivo Consulado na Bahia através do cônsul Raymond Vander Haegen. A carta continha um convite para o professor integrar o quadro de docentes da universidade francesa. A comunidade universitária europeia começava a abrir as portas para o preso político brasileiro.35 35 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 28 mai. 1964, p. 1.

O patrimônio do intelectual baiano eram suas ideias e seu reconhecimento mundial já naquela época. Ao invés de redes de solidariedade familiar movidas por linhagens oligárquicas, o geógrafo encontrou espaço no campo intelectual que buscou uma solução para o infausto que lhe abatia. Aspectos ideológicos e afetivos abriam um horizonte de possibilidades para o pensador baiano fora do seu próprio país. Suas redes de sociabilidade começaram a engendrar sua defesa. O curioso nesse processo é que a cúpula dirigente da Universidade da Bahia, lócus de trabalho do professor, seguiu outro caminho frente ao golpe. Em 9 de abril de 1964, o Conselho Universitário da instituição, sob a presidência do reitor Albérico Fraga (1904-1989), lançou nota em que indicou a “vitória da democracia contra o comunismo” e enfatizou seu “regozijo patriótico” e apoio as “Forças Armadas pela nobre e serena atitude que assumiram na preservação dos legítimos anseios do povo brasileiro”.36 36 A Tarde, Salvador, 10 abr. 1964, p. 3. Assinaram a nota do Conselho Universitário os seguintes sujeitos: Adriano de Azevedo Pondé, Arnaldo Silveira, F. Magalhães Netto, Maria Ivete Ribeiro de Oliveira, Carlos Geraldo de Oliveira, Antônio Queiroz Muniz, Lafayete Pondé, João Mendonça, João José Rescala, Luciano Mendes de Aguiar, Ismael de Barros, José Calasans, Carlos Furtado de Simas, Dirce F. Araújo, Hernani Sávio Sobral, Alceu Hiltner, Benjamin Salles, Nilmar Vicente Pereira da Rocha, Pedro Muniz Tavares Filho, Theonilo Amorim, José Vicente Torres Homem, Ivo Braga.

Não tenho informação se o geógrafo contou oficialmente com defesas de advogados que impetraram habeas corpus, mas, em 25 de junho de 1964, acabou sendo solto pelas Forças Armadas na cidade de Salvador, após já ter sofrido problemas de saúde no encarceramento. No dia seguinte, o Correio da Manhã publicou uma matéria intitulada: “Libertação desfaz equívoco: BA”. A notícia relatou o processo de prisão de Milton Santos e destacou que tal fato “resultou de grave equívoco” e causou “surpresa geral e protestos, tendo inclusive repercutido na França”, de onde veio o convite da universidade.37 37 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26 jun. 1964, p. 1.

Apesar das matérias jornalistas tentarem manter o foco de que foi um mal-entendido, um equívoco, de fato os artífices do golpe sabiam bem o que queriam e a quem queriam atingir. Milton Santos ficou preso por mais de dois meses e sua soltura só se procedeu, além das suas complicações de saúde, por conta da repercussão negativa que o caso estava gerando na comunidade intelectual baiana, brasileira e em outras bandas além mar.

Uma carta divulgada no espaço aberto ao leitor no Correio da Manhã no mesmo dia da soltura do intelectual buscava denunciar o tal “equívoco”. O autor se apresentava como Epifânio da Silva Teles e intitulou seu escrito de “Totalitarismo”. Sem medir as palavras diante do autoritarismo que se apresentava no país, Epifânio iniciou sua redação: “Sr. Redator. Aqui na Bahia, a vida não está normalizada. Estão presos, há mais de 70 dias, o geógrafo Milton Santos e o cantor e compositor Luiz Vieira”.38 38 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 jun. 1964, p. 5. O citado cantor preso junto com o geógrafo era o compositor da famosa música lançada em 1962, Menino passarinho - “Sou menino passarinho com vontade de voar...”, mas, em 1964, só existia espaço para gaiolas.

O autor da carta batia no mesmo argumento que outros defensores de Milton Santos propagavam, a ilegalidade e falta de justificativa da prisão, assim como a do cantor Luiz Vieira: “É de se ressaltar que não existe culpa formada para essas pessoas, tratando-se de mais uma arbitrariedade dos militares donos da sesmaria de Salvador, em nome da quartelada de 1º de abril”.39 39 Ibidem. Destemidamente, Epifânio ousava qualificar a “gloriosa revolução” como quartelada.

Seguindo na sua mensagem, tratou de denunciar o autoritarismo que estava sendo direcionado aos estudantes baianos. Categoricamente, afirmou o missivista: “no meio estudantil, a intervenção é total. Cancelam-se matrículas de estudantes por crime de opinião; o capitão Evandro destituiu membros de diretórios acadêmicos que foram eleitos democraticamente, pela vontade da maioria (...)”. Demarcando a característica nefasta no país que surgia, Epifânio afirmou ironicamente: “isto, aliás, não é de se estranhar no Brasil de agora, onde os ‘democratas’ em todos os setores mostram como se fazem eleições democráticas”. Nega-se o direito de opção, “apresenta-se o candidato ou chapa única, que ardentemente foram escolhidos por um grupo de militares. Que bela lição de totalitarismo”. Encerrando seu escrito, o autor destinou elogios ao periódico carioca. “Finalmente, quero dar meus parabéns pela linha de independência e bravura com que se tem conduzido este Jornal”.40 40 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 jun. 1964, p. 5.

O Correio da Manhã publicou essa carta mesmo com a notícia da soltura de Milton Santos, e logo abaixo respondeu ao remetente informando da libertação do geógrafo baiano. Mas, sem pestanejar, o jornal tratou de demonstrar o caso crítico do cantor Luiz Vieira, afirmando que “as autoridades locais deveriam informar” sua situação, “mas não fazem”. Por fim, o periódico respondeu concordando com o missivista e repudiando a intervenção nas eleições estudantis na Bahia.41 41 Ibidem. Não se sabe quem foi Epifânio da Silva Teles, mas pelo teor da sua carta aparenta ter sido alguém ligado ao movimento estudantil, talvez aluno de Milton Santos, ou mesmo colega de academia que teria se valido de pseudônimo para se manifestar.

Segundo a versão do político e escritor Sebastião Nery que, em 1964, era deputado estadual na Bahia e foi cassado com o golpe de 1964, também sofrendo prisão na capital baiana, Milton Santos acabou de fato sendo liberado do cárcere por conta do convite para seguir à França. Nesse processo, a interferência crucial foi feita pelo renomado historiador dos Annales, Fernand Braudel (1902-1985).42 42 NERY, Sebastião. Minhas lembranças de Milton Santos. Disponível em: http://www.oocities.org/br/jorgematheus2002/34mst.htm. Acesso em: 15 ago. 2017.

Conforme Nery relata, professores e intelectuais franceses que foram colegas de Milton Santos na Universidade de Estrasburgo durante seu doutorado, acionaram Braudel para tentar ajudar no caso. Com forte relação com o Brasil desde os anos 1930, quando lecionou e ajudou a construir o curso de História na Universidade de São Paulo (USP), Braudel tinha o reconhecimento de muitas autoridades brasileiras e uma delas era o próprio general Castelo Branco (1900-1967), eleito indiretamente pelo Congresso Nacional em 15 de março de 1964 para ser o primeiro presidente militar do regime autoritário que estava se construindo no país.43 43 Ibidem.

Castelo Branco, como relata Sebastião Nery em seu livro Socialismo com liberdade publicado em 1974, tinha sido adido militar na França, onde estabeleceu contatos com o historiador dos Annales. Em 1948, uma das ocasiões em que Braudel visitou o Brasil, Castelo Branco o tinha convidado para fazer uma palestra na Escola Superior de Guerra. O caso de Milton Santos não teria sido o único que contou com o apoio de Braudel. O intelectual francês também teria enviado uma carta a Castelo Branco pedindo a soltura de Caio Prado Júnior, também detido por força do golpe de Estado. Todo esse enredo Nery retirou da entrevista que realizou com Braudel durante seu exílio na França.44 44 NERY, Sebastião. Socialismo com liberdade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1974, p. 123-124.

O fim do encarceramento do geógrafo baiano não é o fim dessa história. Sua experiência traumática e a ação da repressão seguiriam assombrando seus caminhos. Ao sair da cadeia, não restava a Milton Santos espaço de sobrevivência no país em meio ao autoritarismo que, como uma planta rasteira, se ramificava criando raízes por todos os cantos. Ao contrário do sentido pregado pelo intelectual, a geografia que a ditadura buscava impor ao país não era humana, mas, sim, de segurança e desenvolvimento, com corpos dóceis e espaços altamente produtivos.

O caminho do pensador baiano naqueles tempos sombrios só poderia ser o de muitos intelectuais brasileiros: o exílio. Assim como Darcy Ribeiro, Paulo Freire e tantos outros, Milton Santos não cabia mais em seu país, o vasto território brasileiro tornou-se pequeno paras suas ideias. A Universidade de Toulouse estava de portas abertas, mas as coisas não foram tão simples para o geógrafo. Os chefes militares baianos seguiram sem permitir sua saída do solo brasileiro. O fato talvez se devesse ainda aos empecilhos do inquérito policial que se desenrolava em segredo na burocracia militar.

Em documento datado de 19 de agosto de 1964, referente à conclusão do IPM feita pelo general Manuel Mendes Pereira sobre a atuação do Milton Santos na Comissão de Planejamento da Bahia, o militar indicou a seguinte decisão:

Este comando reitera os pedidos de prisão preventiva feitos contra os senhores Milton de Almeida Santos e Waldir Cerqueira Coelho e representa sobre a necessidade dessa medida excepcional ser estendidas aos indiciados Aristeu Nogueira Campos, José Gregório Gorender, José Alberto Bandeira Ramos, no interesse da segurança pública e por conveniência da instrução criminal, de acordo com o Art. 43 da Lei 1802, em virtude de serem militantes ativos do extinto Partido Comunista Brasileiro e agitadores subversivos. (...) No presente IPM, poderiam ter sido procedidas mais algumas diligências. Todavia reconhecendo a extensão do trabalho levado a efeito pelo encarregado do IPM e considerando ser “quando de fato e sua autoria estiverem esclarecidos” (arts 113 e 120 do CJM), resolvo determinar a remessa destes autos com urgência. Remetam-se cópias desta solução e do Relatório deste IPM, ao Exmo Cmt do IV Ex, ao Encarregado do IPM de âmbito nacional, bem como cópia do Relatório ao Exc Governador do Estado - Publique-se e cumpra-se. Em 19 de agosto de 1964. General Manoel Mendes Pereira - Cmt da 6ª RM.45 45 BRASIL. Ministério da Guerra, IV Exército - 6ª Região Militar (Bahia-Sergipe). Documento sem código de identificação. 29 ago. 1964. Material arquivado no Banco de Dados do Brasil Nunca Mais. Pasta BNM_279, p. 16039. Disponível em: http://bnmdigital.mpf.mp.br/pt-br/. Acesso em: 5 ago. 2017.

O general Manoel Mendes Pereira tinha mais convicção de que Milton Santos era comunista, “subversivo”, do que provas cabais. Mas, de fato, não precisava de provas, o que valiam eram os ideais da “gloriosa revolução”. Tudo era uma questão de interpretação. O golpe foi um momento de acerto de contas e, independentemente do tamanho da dívida, restava aos “devedores” pagar e, muitas vezes com juros.

Apesar da decisão enfática do general contra o intelectual e mesmo Milton Santos continuando a ser vigiado, ele não voltou a ser preso. Sua agonia agora se fazia em lutar para sair do país. Possivelmente, o geógrafo não voltou a ser preso porque, além dos problemas de saúde que teve, o caso já tinha ganhado repercussão internacional com a solidariedade de diversos intelectuais, de setores da imprensa e meios políticos, sendo inconveniente para os militares encarcerá-lo mais uma vez. Ou então, o juiz auditor pode ter decretado a inocência de Milton Santos no final do processo, mas esse aspecto é apenas uma mera especulação da minha parte, uma vez que não conto com a sentença do magistrado e nem mesmo com informações se o processo de fato seguiu até o final nos trâmites da Justiça.

Desfeitos os embaraços, somente no findar do ano de 1964 Milton Santos conseguiu finalmente a autorização para deixar o Brasil. Em 26 de dezembro, o geógrafo partiu para o exílio em Paris com o compromisso de montar um curso de Geografia Humana na Universidade de Toulouse. Ao mesmo tempo em que o professor partia para alavancar sua carreia internacional, levava as dores de um país atingido por um golpe de Estado, a impossibilidade de permanecer no seu espaço, o vazio dos desterrados. No aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, onde pegou o voo internacional, Milton Santos confessou ao repórter do Correio da Manhã sua angústia. Apresentava-se “nervoso e dizia que embora” tivesse “estudado na França, Universidade de Estrasburgo, onde fez muitas amizades, sentia-se pesaroso em deixar o país, o convívio de seus alunos na Universidade da Bahia”.46 46 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 de dezembro de 1964. p.1.

O caminho de partida de muitos intelectuais brasileiros, como Milton Santos, foi um processo comum durante a ditadura civil-militar que foi construída no país após 1964, como já afirmamos. Mas esse caminho muitas vezes ocorreu de forma inversa. Em outras ocasiões, e até mesmo no período de 1964, o Brasil acolheu intelectuais exilados de outros países, a exemplo de Portugal. Conforme estudos de Lucileide Costa Cardoso, durante a ditadura de Salazar em terras portuguesas, alguns historiadores escolheram o Brasil como local de refúgio. Este foi o caso de Jaime Cortesão (1884-1960) que permaneceu no país de 1940 a 1957, sendo profissionalmente acolhido nos primeiros momentos pelo Gabinete Português de Leitura e pela Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro; e de Joaquim Barradas Carvalho (1920-1980), que chegou ao país justamente em 1964, se inserindo na Universidade de São Paulo e permanecendo até 1970. Tal processo foi denominado pela autora como “migração científica”.47 47 CARDOSO, Lucileide Costa. Historiografia portuguesa amordaçada e migração científica para o Brasil. In: MUNIZ, Altemar da Costa; PASSOS, Luis Carlos dos Passos (org.). História política: interfaces e diálogos. Porto Alegre: Edipucrs; Ceará: Eduece, 2016. p.51,64,65,66,71,72.

No exílio, Milton Santos permaneceu na França até 1971.48 48 GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 25. Depois, o geógrafo percorreu por terras diversas. Seu retorno ao Brasil se deu em 1977, no período em que se iniciava a lenta abertura do regime autoritário sob o comando do general Ernesto Geisel. Num reencontro com a sua terra, o intelectual ainda esperou dois anos para conseguir lecionar numa universidade no país. Em 1979, começou a ensinar na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), permanecendo até 1983 quando ingressou por concurso público na Universidade de São Paulo (USP) onde permaneceu até a aposentadoria.49 49 Dados obtidos em: http://miltonsantos.com.br/site/biografia/. Acesso em: 3 ago. 2017. Nesse período, Milton Santos produziu muitos trabalhos também renomados e conquistou títulos internacionais como o importante Prêmio Vautrin Lud, que corresponde ao Nobel de Geografia.50 50 SANTOS, Milton. O centro da cidade do Salvador: estudo de geografia urbana. 2ª edição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Salvador: EdUFBA, 2008, segunda orelha do livro.

Em sua vida pós-repressão política em 1964, foram raros os momentos registrados em que Milton Santos falou sobre o processo que sofreu na ocasião da derrubada do governo João Goulart. Um desses momentos foi a entrevista que concedeu em São Paulo ao jornalista Fernando Conceição em 1996, ano em que recebeu a aposentadoria compulsória aos 70 anos de idade. A entrevista teve uma pauta ampla, mas, em momento específico, o entrevistador direcionou ao geógrafo algumas questões referentes ao período do golpe.

Uma das perguntas formuladas pelo jornalista foi a seguinte: “Quando o senhor se mudou da Bahia e quais as circunstâncias dessa mudança”. Respondeu Milton Santos:

Eu deixei a Bahia no fim de 1964, após ter passado uma temporada preso e outra temporada menor no hospital. Os meus colegas franceses me haviam feito um convite para eu ir ensinar na França. Em dezembro de 64 eu viajei. Primeiro fui dar aula de Geografia na Universidade de Toulouse.51 51 CONCEIÇÃO, Francisco. Milton Santos, uma biografia. Edição do autor, 2016, p. 27. Disponível em: http://fernconc.wixsite.com/miltonsantos/biography. Acesso em: 18 ago. 2017.

Seguindo em suas questões, o jornalista indagou mais diretamente Milton Santos sobre sua prisão: “O que motivou a ação do Exército contra o senhor”.

Eu creio que eu tinha uma situação na presidência da Comissão de Planejamento Econômico da Bahia (CPE), eu era cercado por um grupo de pesquisadores de todas as áreas de desenvolvimento, e nós tínhamos algumas propostas correspondentes à nossa posição de homens de boa vontade. Isso nos levou a ser suspeitos pelo novo regime que estava se instalando. 52 52 Idem, ibidem, p. 27.

Em sua fala, Milton Santos evitou utilizar termos que identificassem um posicionamento político claro. Ao invés disso, o intelectual deu destaque à ideia de que estava rodeado e fazia parte de um grupo de “homens de boa vontade”. Entretanto, como identificado nos documentos emitidos pelos próprios órgãos de segurança da Bahia em 1964, a alcunha que caia sobre o geógrafo era a de um homem comunista. Seus companheiros atuantes na CPE eram considerados “subversivos”, a exemplo do próprio Aristeu Nogueira, membro da cúpula do PCB baiano.

Seguindo em sua entrevista, o jornalista ainda continuou questionando o professor sobre o ponto da sua prisão. Perguntou ele: “Houve alguma acusação de caráter ideológico? O senhor disse que algumas propostas de intervenção urbana teriam desagradado”.

Não, não, era mais na questão social. Por exemplo, nós íamos propor um imposto sobre a fortuna. À época o Estado podia taxar. Essa era uma das ideias que tínhamos na CPE. Mas também está ligada a outros fatos. Em 1960, eu acompanhei o [futuro] presidente Jânio Quadros a Cuba e na volta escrevi vários artigos mostrando o que era a revolução cubana. Com isso, comecei a fazer parte dos arquivos do Exército nesse momento.53 53 Idem, ibidem, p. 28.

Apesar de o geógrafo tentar se desvencilhar da ideia de motivação ideológica, pautando pela ideia vaga de questão social, no fim da sua fala, cunhando um ponto de contradição, acabou frisando sobre seus escritos relacionados a Cuba e que afinal tinham sidos publicados pelo jornal A Tarde, o que de fato também se tratava de posicionamento ideológico. Milton tinha tecido elogios a ilha comunista, uma das maiores representantes do “perigo vermelho” na América Latina dos anos 1960, e isso no contexto de 1964 não era pouca coisa.

Ao identificar de forma sucinta e aparentemente despolitizada que os motivos da sua prisão foram alguns aspectos da sua atuação na CPE e seus artigos sobre Cuba, Milton Santos optou por silenciar sobre sua posição de ser em 1964 um intelectual e administrador público negro numa sociedade baiana extremamente tradicional e racista. Nem tampouco associa o ocorrido a sua experiência como um professor progressista de uma universidade pública importante no estado e que foi palco de forte intervenção militar com repressão a estudantes e também a outros professores. Instituição que não saiu em sua defesa e, por meio do seu Conselho Universitário, deu apoio ao golpe.

Conforme análise de Michel Pollack, “existem nas lembranças de uns e de outros zonas de sombra, silêncios, não-dito”. Essas “zonas” têm uma função importante na memória e muitas vezes uma dessas funções é a de proteção do próprio sujeito que faz um esforço em externar suas lembranças. Nessa lógica, o silêncio sobre o passado também pode ser um ato de resistência.54 54 POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, vol. 2, n. 3, Rio de Janeiro, 1989, p. 3-15, p. 5. Seguindo esse raciocínio, é possível inferir que os silêncios de Milton Santos sobre sua experiência de repressão no golpe de 1964 não advêm apenas de um desinteresse em aprofundar o assunto, mas, sim, podem ser entendidos como um esforço do intelectual em se autoproteger e se preservar diante da narrativa de um momento traumático da sua trajetória e da própria sociedade do seu país. Desta forma, suas respostas ao jornalista parecem resultar de um esforço em dizer apenas o possível, resguardando o máximo suas dores no limbo da memória.

Considerações finais

A experiência de repressão sofrida por Milton Santos permite apresentar como a violência gerada pelo golpe civil-militar foi implacável desde os primeiros momentos após a derrubada do governo João Goulart. Nesse sentido, não foram atingidos apenas opositores políticos, formalmente defensores das reformas de base, ligados a partidos ou empenhados em fazer uma revolução comunista. Intelectuais progressistas entraram no rol dos alvos do regime autoritário que se construía.

As prisões ocorriam de forma arbitrária sem justificativas plausíveis para a sociedade. Mas, dependendo do cidadão preso, o acontecimento ganhava repercussão na imprensa nacional e internacional. Nos casos específicos dos intelectuais, o campo se abria numa rede de solidariedade buscando proteger seus pares, buscando brechas para acomodações. Entretanto, isso não quer dizer que todos os intelectuais estavam do mesmo lado e se solidarizavam. Afinal, vimos que Gilberto Freyre estava em sintonia, defendendo veementemente os artífices do golpe e seus objetivos.

O caso de Milton Santos sugere ainda que o golpe de 1964 causou um ponto de inflexão na vida de intelectuais brasileiros produtores de ideias mais libertárias. Enquanto no início dos anos 1960 se pensava em como tirar o país do subdesenvolvimento, criando estratégias de melhorias das condições sociais e com amplos projetos para a educação, como foi a criação da Universidade de Brasília, a derrubada do governo João Goulart representou um acinzentar no horizonte de quem sonhava e tinha planos de construção de uma sociedade mais igualitária.

Por outro lado, como o itinerário de Milton Santos indica, a experiência traumática do golpe e da repressão direcionou muitos intelectuais brasileiros para uma vida acadêmica em outros países, disseminando conhecimento e adquirindo maiores bagagens epistemológicas. Imagino que deveria ser uma contradição nas cabeças desses sujeitos. O exílio era uma falta, um cerceamento, uma dor, uma imposição e, ao mesmo tempo, lhes proporcionava um momento de prazer e sucesso no que concerne a suas trajetórias acadêmicas, sucesso no conhecer e no ensinar. Tornavam-se assim intelectuais transnacionais, intelectuais do mundo. Mas, que retornaram a terra natal quando tiveram oportunidade e, no Brasil, essa realidade só começou a se configurar no fim dos anos 1970.

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  • 1
    Diário de Pernambuco, Recife, 10 abr. 1964, p. 4Diário de Pernambuco, Recife, 10 abr. 1964, p. 4..
  • 2
    Ibidem.
  • 3
    CALABRE, Lia. Intelectuais e política cultural: o Conselho Federal de Cultura. Intellèctus, vol. II, Rio de Janeiro, ano 05, 17-18 mai. 2006, p. 2. Revista eletrônica. Disponível em: http://rubi.casaruibarbosa.gov.br/handle/fcrb/466. Acesso em: 15 ago. 2017CALABRE, Lia. Intelectuais e política cultural: o Conselho Federal de Cultura. Intellèctus, vol. II, Rio de Janeiro, ano 05, 17-18 mai. 2006. Revista eletrônica. Disponível em: Disponível em: http://rubi.casaruibarbosa.gov.br/handle/fcrb/466 . Acesso em: 15 ago. 2017.
    http://rubi.casaruibarbosa.gov.br/handle...
    .
  • 4
    CARDOSO, Lucileide Costa. Os discursos de celebração da Revolução de 1964. Revista Brasileira de História, vol. 31, n. 62, São Paulo, 2011, p. 117-140. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v31n62/a08v31n62.pdf. Acesso em: 15 ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-01882011000200008CARDOSO, Lucileide Costa. Os discursos de celebração da Revolução de 1964. Revista Brasileira de História, vol. 31, n. 62, São Paulo, 2011, p. 117-140. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v31n62/a08v31n62.pdf . Acesso em: 15 ago. 2017. DOI: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v31n62/a08v31n62.pdf. Acesso em: 15 ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-01882011000200008.
    http://www.scielo.br/pdf/rbh/v31n62/a08v...
    .
  • 5
    SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René (org.). Por uma história política. Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ, 1996, p. 242-253-254-255SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René (org.). Por uma história política. Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ, 1996..
  • 6
    SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996, p. 485SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996..
  • 7
    GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos: uma leitura a partir da centralidade da técnica, dos diálogos com a economia política e da cidadania como práxis. Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana, Universidade de São Paulo (USP), 2011, p. 37GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos: uma leitura a partir da centralidade da técnica, dos diálogos com a economia política e da cidadania como práxis. Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana, Universidade de São Paulo (USP), 2011..
  • 8
    Entrevista concedida por Milton Santos à revista Caros Amigos. Edição online. Disponível em: http://www.carosamigos.com.br/index.php/grandes-entrevistas/6047-entrevista-explosiva-com-milton-santos. Acesso em: 3 ago. 2017Entrevista concedida por Milton Santos para a revista Caros Amigos. Edição online. Disponível em: Disponível em: http://www.carosamigos.com.br/index.php/grandes-entrevistas/6047-entrevista-explosiva-com-milton-santos Acesso em: 3 de agosto de 2017.
    http://www.carosamigos.com.br/index.php/...
    .
  • 9
    Idem, ibidem, p. 39.
  • 10
    CALMON, Jorge. O jornalista Milton Santos. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996, p. 62CALMON, Jorge. O jornalista Milton Santos. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996..
  • 11
    Dados obtidos em: http://miltonsantos.com.br/site/biografia/. Acesso em: 3 ago. 2017.
  • 12
    GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 57.
  • 13
    SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo, op. cit., p. 485.
  • 14
    PINHEIRO, Délio José Ferraz. Milton Santos e a Bahia de belas gravitas e verdades encobertas. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo, op. cit., 1996, p. 189PINHEIRO, Délio José Ferraz. Milton Santos e a Bahia de belas gravitas e verdades encobertas. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996..
  • 15
    GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 32-24-69.
  • 16
    Idem, ibidem, p. 74.
  • 17
    Novos Rumos, Rio de Janeiro, 21 a 27 jul. 1961, p. 3Novos Rumos, Rio de Janeiro, 21 a 27 jul. 1961, p. 3..
  • 18
    GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 75.
  • 19
    A Tarde, Salvador, 9 abr. 1964, p. 3A Tarde, Salvador, 9 abr. 1964, p. 3..
  • 20
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 8 mai. 1964, p. 2Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 8 mai. 1964, p. 2..
  • 21
    Ibidem.
  • 22
    Ibidem.
  • 23
    Ibidem.
  • 24
    Ibidem.
  • 25
    MOREIRA, Bruno de Oliveira. “Visita a uma revolução”: uma análise dos escritos de Milton Santos sobre a revolução cubana (1960). Revista de História (UFBA), vol. 2, n. 1, 2010, p. 100-120, p. 102MOREIRA, Bruno de Oliveira. “Visita a uma revolução”: uma análise dos escritos de Milton Santos sobre a revolução cubana (1960). Revista de História (UFBA), vol. 2, n. 1, 2010, p. 100-120. Disponível em: Disponível em: https://slidex.tips/download/visita-a-uma-revolucao . Acesso em: 13 ago. 2017.
    https://slidex.tips/download/visita-a-um...
    .
  • 26
    Idem, ibidem, p. 108.
  • 27
    GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 75.
  • 28
    A Tarde, Salvador, 9 mai. 1964, p. 1A Tarde, Salvador, 10 abr. 1964, p. 3..
  • 29
    Ibidem.
  • 30
    Ibidem.
  • 31
    BRASIL. Ministério da Guerra, IV Exército - 6ª Região Militar (Bahia-Sergipe). Documento sem código de identificação. 29 ago. 1964. Material arquivado no Banco de Dados do Brasil Nunca Mais. Pasta BNM_279, p. 16039. Disponível em: http://bnmdigital.mpf.mp.br/pt-br/. Acesso em: 5 ago. 2017BRASIL. Ministério da Guerra, IV Exército - 6ª Região Militar (Bahia-Sergipe). Documento sem código de identificação. 29 ago. 1964. Material arquivado no Banco de Dados do Brasil Nunca Mais. Pasta BNM_279, p. 16039. Disponível em: Disponível em: http://bnmdigital.mpf.mp.br/pt-br /. Acesso em: 5 ago. 2017.
    http://bnmdigital.mpf.mp.br/pt-br...
    .
  • 32
    Ibidem.
  • 33
    TRICART, Jean. Negro só pode ser africano. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996, p. 66TRICART, Jean. Negro só pode ser africano. In: SOUZA, Maria Adélia Aparecida de (org.). O mundo do cidadão. Um cidadão do mundo. São Paulo: Editora Hucitec, 1996..
  • 34
    SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na Bahia (1930-1949). Salvador: Edufba, 2000, p. 17SILVA, Paulo Santos. Âncoras de tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na Bahia (1930-1949). Salvador: Edufba, 2000..
  • 35
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 28 mai. 1964, p. 1Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 28 mai. 1964, p. 1..
  • 36
    A Tarde, Salvador, 10 abr. 1964, p. 3A Tarde, Salvador, 9 mai. 1964, p. 1.. Assinaram a nota do Conselho Universitário os seguintes sujeitos: Adriano de Azevedo Pondé, Arnaldo Silveira, F. Magalhães Netto, Maria Ivete Ribeiro de Oliveira, Carlos Geraldo de Oliveira, Antônio Queiroz Muniz, Lafayete Pondé, João Mendonça, João José Rescala, Luciano Mendes de Aguiar, Ismael de Barros, José Calasans, Carlos Furtado de Simas, Dirce F. Araújo, Hernani Sávio Sobral, Alceu Hiltner, Benjamin Salles, Nilmar Vicente Pereira da Rocha, Pedro Muniz Tavares Filho, Theonilo Amorim, José Vicente Torres Homem, Ivo Braga.
  • 37
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26 jun. 1964, p. 1Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 jun. 1964, p. 5..
  • 38
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 jun. 1964, p. 5Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 dez. 1964, p. 1..
  • 39
    Ibidem.
  • 40
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 jun. 1964, p. 5.
  • 41
    Ibidem.
  • 42
    NERY, Sebastião. Minhas lembranças de Milton Santos. Disponível em: http://www.oocities.org/br/jorgematheus2002/34mst.htm. Acesso em: 15 ago. 2017NERY, Sebastião. Socialismo com liberdade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1974..
  • 43
    Ibidem.
  • 44
    NERY, Sebastião. Socialismo com liberdade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1974, p. 123-124__________. Minhas lembranças de Milton Santos. Disponível em: http://www.oocities.org/br/jorgematheus2002/34mst.htm. Acesso em: 15 ago. 2017.
    http://www.oocities.org/br/jorgematheus2...
    .
  • 45
    BRASIL. Ministério da Guerra, IV Exército - 6ª Região Militar (Bahia-Sergipe). Documento sem código de identificação. 29 ago. 1964. Material arquivado no Banco de Dados do Brasil Nunca Mais. Pasta BNM_279, p. 16039. Disponível em: http://bnmdigital.mpf.mp.br/pt-br/. Acesso em: 5 ago. 2017.
  • 46
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 de dezembro de 1964. p.1.
  • 47
    CARDOSO, Lucileide Costa. Historiografia portuguesa amordaçada e migração científica para o Brasil. In: MUNIZ, Altemar da Costa; PASSOS, Luis Carlos dos Passos (org.). História política: interfaces e diálogos. Porto Alegre: Edipucrs; Ceará: Eduece, 2016. p.51,64,65,66,71,72_________. Historiografia portuguesa amordaçada e migração científica para o Brasil. In: MUNIZ, Altemar da Costa & PASSOS, Luís Carlos dos Passos (org.). História política: interfaces e diálogos. Porto Alegre: EdiPUCRS; Ceará: Eduece, 2016..
  • 48
    GRIMM, Flávia Christina Andrade. Trajetória epistemológica de Milton Santos, op. cit., p. 25.
  • 49
    Dados obtidos em: http://miltonsantos.com.br/site/biografia/. Acesso em: 3 ago. 2017.
  • 50
    SANTOS, Milton. O centro da cidade do Salvador: estudo de geografia urbana. 2ª edição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Salvador: EdUFBA, 2008, segunda orelha do livroSANTOS, Milton. O centro da cidade do Salvador: estudo de geografia urbana. 2ª edição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Salvador: Edufba, 2008. .
  • 51
    CONCEIÇÃO, Francisco. Milton Santos, uma biografia. Edição do autor, 2016, p. 27. Disponível em: http://fernconc.wixsite.com/miltonsantos/biography. Acesso em: 18 ago. 2017CONCEIÇÃO, Francisco. Milton Santos, uma biografia. Edição do autor, 2016, p. 27. Disponível em: Disponível em: http://fernconc.wixsite.com/miltonsantos/biography . Acesso em: 18 ago. 2017.
    http://fernconc.wixsite.com/miltonsantos...
    .
  • 52
    Idem, ibidem, p. 27.
  • 53
    Idem, ibidem, p. 28.
  • 54
    POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, vol. 2, n. 3, Rio de Janeiro, 1989, p. 3-15, p. 5POLLAK, Michel. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, vol. 2. n. 3, Rio de Janeiro, 1989, p. 3-15..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Fev 2019
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    01 Ago 2017
  • Aceito
    07 Mar 2018
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