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PARA ALÉM DO ATLÂNTICO SUL: FUNDAMENTOS INSTITUCIONAIS E FINANCEIROS DO TRÁFICO DE ESCRAVOS DO RIO DE JANEIRO EM FINAIS DO SÉCULO XVIII* * Todas as obras e todos os documentos utilizados na pesquisa e na elaboração do artigo são citados nas notas e na bibliografia. O artigo não foi publicado em plataforma de pre-print.

BEYOND THE SOUTH ATLANTIC: INSTITUTIONAL AND FINANCIAL FOUNDATIONS OF RIO DE JANEIRO’S SLAVE TRADE AT THE TURN OF THE NINETEENTH CENTURY

Resumo

Este artigo visa apresentar uma análise dos fundamentos institucionais e financeiros do tráfico de cativos no porto do Rio de Janeiro durante as últimas décadas do século XVIII e primeiras do século XIX. A análise privilegia o estudo dos dilemas relacionados ao risco e à circulação de capitais que serviam de suporte ao comércio de viventes. Trata-se de uma perspectiva até agora pouco empregada pelos trabalhos que analisam o tráfico de escravos. O artigo foca as instituições mercantis nas quais os têxteis da Ásia eram colocados nos circuitos do comércio de humanos escravizados. Levantam-se críticas sobre problemas interpretativos do modelo bipolar e, além disso, chama-se a atenção para a necessidade de reavaliar o modelo segundo o qual teria prevalecido uma alta concentração na propriedade dos navios que circularam entre o porto e Áfricas sem considerar que as fontes fazem referência à consignação de navios e não à propriedade.

Palavras-chave
Rio de Janeiro; tráfico de escravos; instituições mercantis; história atlântica; negociantes

Abstract

This paper analyzes the institutional and financial foundations of Rio de Janeiro’s slave trade at the turn of the nineteenth century. It focuses particularly on issues related to risk-taking and capital investment which supported the trade. This is a perspective that has barely been used in researches about the business of slave trade. The paper focuses essentially on mercantile institutions in which Asia’s textiles were put into the slave trade. Specifically, it raises some questions on interpretative problems of the bipolar model, and it also draws the attention to the need to reassess the model according to which prevailed a high concentration in the property of ships that circulated between the port and the Africas during the period. However, contemporary sources usually speak about consignments but not about property.

Keywords
Rio de Janeiro; slave trade; mercantile institutions; Atlantic history; traders

Durante o último quartel do século XVIII e a primeira década do século XIX, a cidade do Rio de Janeiro configurou-se como um dos maiores importadores de escravos das Américas. Relações comerciais estreitas de velha data continuaram a ser desenvolvidas e potencializadas não só com a costa angolana, a região africana que fornecia a maior parte dos cativos com os quais a região Sul do Brasil se abastecia, mas também com alguns portos livres localizados na costa ocidental (ALENCASTRO, 2000ALENCASTRO, Luiz Felipe. O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul: séculos XVI-XVII. São Paulo: Companhia das letras, 2000., 2006ALENCASTRO, Luiz Felipe. Le versant brésilien de l’Atlantique-Sud: 1550-1850. Annales: Histoire, Sciences Sociales, Paris, v. 61, p. 339-382, 2006. Disponível em: <https://bit.ly/2BwNQYI>. Acesso em: 26 set. 2019.
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, p. 339-382; BIRMINGHAM, 1966BIRMINGHAM, David. Trade and conflict in Angola: the Mbundu and their neighbours under the influence of the Portuguese, 1483-1790. Oxford: Clarendon Press, 1966.; CANDIDO, 2013aCANDIDO, Mariana. An African slaving port and the Atlantic world: Benguela and its hinterland. Cambridge: Cambridge University Press, 2013a. CURTO, 2002CURTO, José. Álcool e escravos: o comércio luso-brasileiro do álcool em Mpinda, Luanda e Benguela durante o tráfico de escravos (1480-1830) e seu impacto nas sociedades da África Central Ocidental. Lisboa: Vulgata: 2002.; FERREIRA, 2003FERREIRA, Roquinaldo. Transforming Atlantic slaving: trade, warfare and territorial control in Angola, 1650-1800. Tese de doutorado em História, University of California, Los Angeles, 2003., 2012FERREIRA, Roquinaldo. Cross-cultural exchange in the Atlantic world: Angola and Brazil during the era of slave trade. Cambridge: Cambridge University Press , 2012.; FLORENTINO, 1997FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das letras , 1997., 2009, p. 69-119; FLORENTINO et al., 2004FLORENTINO, Manolo et al. Aspetos comparativos do tráfico de escravos para o Brasil (séculos XVIII-XIX). Afro-Ásia , Salvador, v. 31, p. 83-126, 2004. Disponível em: <https://bit.ly/2P7rQLO>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/10.9771/1981-1411aa.voi31.21072.
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, p. 99-102; KLEIN, 1978KLEIN, Herbert. The middle passage. Princeton: Princeton University Press , 1978., p. 23-50; MILLER, 1988MILLER, Joseph. Way of death: merchant capitalism and the Angolan slave trade, 1730-1830. Madison: University of Wisconsin Press, 1988.; RICHARDSON; SILVA, 2014RICHARDSON, David & SILVA, Filipa Ribeiro da (ed.). Networks and trans-cultural exchange: slave trading in the South Atlantic, 1590-1867. Leiden: Brill, 2014.; SILVA, 2011SILVA, Daniel Barros Domingues da. Crossroads: slave frontiers of Angola, 1780-1867. Tese de doutorado em História, Emory University, Atlanta, 2011.). Durante a primeira década do século XIX, os escravos procedentes de Moçambique começaram a aumentar substancialmente, razão pela qual é factível pensar que boa parte do tráfico se direcionou da costa ocidental para a costa oriental africana.

O tráfico de escravos da cidade de Rio de Janeiro é um tema amplamente analisado. Ainda que a cidade fluminense tenha sido uma importante consumidora de mão de obra escravizada, ela era maiormente um mercado de redistribuição de viventes, nomeadamente para regiões açucareiras de Campos de Goitacazes e cafeeiras do Vale da Paraíba, bem como mineiras. Sabe-se que, durante o período tardio de 1819-1830, pelo menos metade dos escravos foram redistribuídos para outras regiões do Brasil. Grandes remessas de cativos tinham como destino os centros mineiros do interior ou as zonas açucareiras da capitania de São Paulo. Escravos eram também enviados para as zonas pecuárias de Porto Alegre, onde os negociantes locais tinham fortes laços com os negociantes residentes no Rio de Janeiro. Do mesmo modo, durante o último quartel do século XVIII, inúmeros escravos foram exportados para o Rio da Prata, fundamentalmente para as cidades de Montevidéu e Buenos Aires, onde os negociantes portugueses recebiam em troca enormes quantidades de pesos ou patacas, tão necessárias para o comércio com o Índico. Pouco, porém, se sabe sobre esse amplo comércio.

Do outro lado do Atlântico os escravos eram enviados principalmente dos portos de Luanda e Benguela, além de outros, como Cabinda. Benguela era uma pequena cidade portuária localizada no sul de Angola que se vinculou ao mundo Atlântico através da exportação de viventes e se achava estreitamente ligada ao porto carioca (CANDIDO, 2013aCANDIDO, Mariana. An African slaving port and the Atlantic world: Benguela and its hinterland. Cambridge: Cambridge University Press, 2013a.). Suas exportações atingiram quase 10.000 escravos no final do século XVIII, embora esse número tenha diminuído até uma média de 6.000 durante a primeira década do século XIX. Luanda, por sua vez, exportava aproximadamente 10.000 ou 15.000 escravos ao despontar o século XIX, sendo sem dúvida um dos maiores entrepostos de comércio do Atlântico Sul (Figura 1).

Figura 1
Número de escravos desembarcados no Rio de Janeiro (1700-1800)

Este artigo visa apresentar uma análise dos fundamentos institucionais e financeiros do tráfico de cativos. Até agora, no que diz respeito ao Brasil, poucos estudos têm se perguntado pelos fundamentos institucionais que sustentavam o tráfico,1 1 Ver, por exemplo: Lovejoy e Richardson (1999, p. 333-355), Haggerty (2009, p. 817-834), Pearson e Richardson (2008, p. 765-780). Sobre fundamentos institucionais, ver: Van Doosselaere (2006), Greif (2006), Greif (2000, p. 251-284), Greif et al. (1994, p. 745-776), Williamson (1985). porém, sem uma análise que elucide o funcionamento das instituições mercantis, é impossível identificar com precisão os diferentes níveis de investimento de capital e os agentes que os empreenderam. Como a falta de tal perspectiva tem levado, por vezes, a conclusões imprecisas, um dos principais objetivos deste texto é chamar a atenção para alguns erros metodológicos e a necessidade de ler as fontes disponíveis com quadros analíticos mais rigorosos. Esse tipo de análise institucional, pouco empregada para estudar o tráfico de escravos, examina, portanto, os dilemas relacionados com o risco e a circulação de capitais que serviam de suporte ao comércio de viventes. Para isso, escolheu-se o porto do Rio de Janeiro.

Além de uma apresentação da historiografia, o texto está dividido em três partes. Em primeiro lugar, analisam-se as conexões entre o tráfico de viventes e o comércio do Índico, procurando rever algumas conclusões amplamente adotadas a respeito dos agentes que investiam no comércio de têxteis da Ásia e que, nas interpretações de parte da historiografia, controlavam a importação dessas manufaturas. Trata-se de um fenômeno central, pois, como é bem sabido, esses bens se constituíam como mercadorias de maior demanda na procura de seres humanos escravizados. Depois, chama-se a atenção para as instituições mercantis que sustentavam o Middle Passage, apresentando uma discussão sobre uma instituição fundamental, a consignação, a qual ainda tem sido pouco analisada pela historiografia. Em terceiro lugar, faz-se uma análise que foca a organização institucional do tráfico, apontando sobretudo para problemas interpretativos e metodológicos a respeito da ideia segundo a qual teria havido um domínio do capital local, isto é, que o comércio de cativos achava-se nas mãos de poucos negociantes de grosso trato.

Para um outro debate historiográfico

Segundo a informação disponível, a importação de seres humanos escravizados a partir da África e a sua posterior redistribuição para o interior do Brasil corresponderia a dois padrões bem definidos e quase opostos. É importante salientar que ainda são mínimas, para não dizer inexistentes, as pesquisas que se concentram no segundo fenômeno, pelo que se tornaria ainda necessário achar fontes para o seu adequado estudo. Segundo Fragoso (1982)FRAGOSO, João. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil de Rio de Janeiro, 1790-1830. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 1982., para o período tardio (1825-1833), momento para o qual há dados disponíveis, 4.297 traficantes realizaram pelo menos uma transação, representando 74% do total dos mercadores. Portanto, “traficantes eventuais” controlavam a maior parte das remessas. Acrescente-se que unicamente dezenove comerciantes fizeram transações de maneira contínua, sendo negociantes “regulares”, informação que leva o autor a concluir que, uma vez que os escravos eram desembarcados na capital fluminense, um grande numero de “pequenos empreendedores” aproveitava-se dos ganhos que a reexportação de força de trabalho escrava poderia produzir. Portanto, existia um grande número de agentes envolvidos no negócio (FRAGOSO, 1998FRAGOSO, João. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil de Rio de Janeiro, 1790-1830. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 1982., p. 206-207).

No entanto havia um modelo totalmente diferente na movimentação de cativos entre os portos africanos e o Brasil. Florentino (1997)FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das letras , 1997., por exemplo, acredita que essa parte do tráfico achava-se sob o controle de negociantes de grosso trato do Rio de Janeiro. Baseado nomeadamente nas entradas de navios publicadas na Gazeta do Rio de Janeiro após a abertura de portos, o autor assevera que, de um total de 186 pessoas envolvidas no tráfico, dezenove “empresas” de um total de 181 agentes envolvidos controlavam mais da metade (57%) do comércio. Pelo contrário, à maior parte dos comerciantes lhe foram consignados tão só 20% das embarcações. A partir de dados obtidos por meio do Trans-Atlantic Slave Trade Database, Silva (2010)SILVA, Daniel Barros Domingues da. The supply of slaves from Luanda, 1768-1806: records of Anselmo da Fonseca Coutinho. African Economic History, Madison, v. 38, p. 53-76, 2010. Disponível em: <https://www.jstor.org/stable/41756131>. Acesso em: 26 set. 2019.
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, por sua vez, deduz que, na região Sudeste do Brasil, 23 negociantes e companhias “financiavam” dez ou mais viagens, isto é, 520 viagens do total dos navios que aportaram no Rio de Janeiro, havendo, segundo o autor, uma concentração da “propriedade” do tráfico dos cativos no Middle Passage.

É fundamental salientar que, no que diz respeito à cidade do Rio de Janeiro, os dados para o período após a abertura dos portos correspondem exatamente aos extraídos dos jornais publicados na época. Ainda de maior relevância é frisar que, pelo menos na Gazeta do Rio de Janeiro, há informação de uma instituição particular chamada consignação. Ora, como se mostrará na terceira parte deste artigo, até agora prevalece uma tendência de associar consignação com propriedade do navio e financiamento da travessia, como se fossem a mesma coisa. Contudo, essa justaposição está longe de ser verdade, de acordo com as formas de investimento do capital envolvidas na dita instituição. Como se debaterá na última parte do artigo, a primeira interpretação confirma um desacerto que atualmente prevalece na historiografia sobre o suposto controle e domínio dos grandes negociantes.

Tem-se proposto que os negociantes de grosso trato sediados no porto carioca foram financiadores do tráfico. Assim, acredita-se que, em parte dos trabalhos produzidos durante as últimas décadas, os negociantes sediados nos portos brasileiros (em alguns casos chamados de brasílicos para diferenciá-los dos lusos) controlavam o transporte de escravos na travessia atlântica, sendo os donos dos navios e dos escravos neles transportados, isto é, o capital local era o responsável pelo financiamento do dito comércio. Nesse sentido, os negociantes lisboetas foram deixados totalmente de lado.2 2 Para além do trabalho de Miller (1988), estudos recentes têm chamado mais uma vez a atenção à necessidade de se pesquisar a participação dos negociantes lisboetas (Bohorquez; Menz, 2018, p. 403-429). Tal perspectiva substituiu antigas intepretações, que viam o comércio de escravos como uma operação que funcionava segundo o modelo triangular, propondo que o tráfico de viventes no Império Português seguia um modelo bilateral, diferente do que acontecia no Atlântico norte. Abordagem confirmada pelo fato de que, no Atlântico Sul, os navios iam e voltavam entre Brasil e África sem precisar aportar em Lisboa. Junto com a capital do império, os comerciantes da cidade, nacionais ou estrangeiros, deixaram de ser parte das narrativas que explicavam o funcionamento financeiro e marítimo do tráfico e o capital por eles investido ficou, a partir desse momento, totalmente invisibilizado nas pesquisas. Trabalhos recentes, porém, têm chamado a atenção para a necessidade de se estudar o envolvimento direto e indireto de negociantes estrangeiros sediados em Lisboa (BOHORQUEZ, [2020]BOHORQUEZ, J. Linking the Atlantic and Indian Oceans: Asian textiles, Spanish silver, global capital, and the financing to the Portuguese-Brazilian slave trade (ca. 1760-1808). Journal of Global History, [2020]. No prelo.).

O inconteste domínio do capital local brasileiro no comércio de escravos seria evidenciado pela possessão de produtos de grande demanda na costa de Angola, como, por exemplo, a cachaça. Na virada do século XVIII para o XIX, as bebidas alcóolicas atingiram 89% do total das compras que Angola fazia com a praça carioca. Embora se reconheça a importância desse produto nos laços comerciais que ligavam a costa dos dois continentes do Atlântico Sul, deve-se salientar o fato de que, se valorada a um preço de 73$836 réis, a cachaça exportada pelo Rio de Janeiro poderia ter financiado unicamente a compra de aproximadamente 10% dos escravos importados anualmente no porto.3 3 O tema tem sido amplamente estudado por Curto (2002, p. 352). Para o sobreavaliado papel da cachaça ver Menz e Acioli (2008, p. 68-70). Parece pouco plausível que o produto da cana brasileira pudesse ter contribuído para a compra de mais de 15% do total de escravos comercializados na viragem do século XVIII para o XIX. Junto à cachaça, outra mercadoria amplamente procurada na costa e no interior da África eram os têxteis manufaturados na Ásia.4 4 Ferreira (2001, p. 340-378), baseado em arquivos portugueses e brasileiros, foi o primeiro a analisar o papel das fazendas da Ásia. Para outras regiões da África: Roberts (1994, p. 117-145). Dados das importações angolanas mostram que, entre 1785-1797, os produtos classificados como da Índia perfaziam 33% do total; por sua vez, os produtos portugueses perfaziam 24%, enquanto os oriundos do norte da Europa atingiram 20% do total das importações angolanas; as produções brasileiras (80% de licores) eram de 23% (BAUSS, 1977BAUSS, Rudolph William. Rio de Janeiro : the rise of late colonial Brazil’s dominant emporium, 1777-1808. Tese de doutorado em História, Tulane University, New Orleans, 1977., p. 357; MENZ, 2012MENZ, Maximiliano. As “geometrias” do tráfico: o comércio metropolitano e o tráfico de escravos em Angola (1796-1807). Revista de Histórica, n. 166, p. 185-222, 2012. Disponível em: <https://bit.ly/2Bung2f>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.11606/issn.2316-9141.v0i166p185-222.
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, p. 185-222).

Sem dúvida, as importações asiáticas, basicamente têxteis (MACHADO, 2014MACHADO, Pedro. Ocean of trade: South Asian merchants, Africa and the Indian Ocean, c. 1750-1850. Cambridge: Cambridge University Press , 2014., p. 125-134; RIELLO; PARTHASARATHI, 2011RIELLO, Giorgio e PARTHASARATHI, Prasannan. The spinning world: a global history of cotton textiles, 1200-1850. Oxford: Oxford University Press, 2011.; RIELLO; TIRTHANKAR, 2009RIELLO, Giorgio & ROY, Tirthankar (ed.). How India clothed the world: the world of South Asian textiles, 1500-1850. Leiden: Brill, 2009.), figuraram num lugar de destaque. Segundo Florentino (2009)FLORENTINO, Manolo. Tráfico atlântico, mercado colonial e famílias escravas no Rio de Janeiro, Brasil, c. 1790-1830. História: questões e debates, Curitiba, v. 51, n. 2, p. 69-119, 2009. Disponível em: <https://bit.ly/2MCzD2V>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/105380/his.v51io.19985.
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, os dados confirmam, sem deixar dúvida, que os negociantes sediados no Rio de Janeiro e o seu capital local acabaram controlando o tráfico de humanos escravizados. Ainda segundo o autor, a percentagem de fazendas asiáticas seria, na verdade, de negociações realizadas por mercadores do Brasil que conseguiam despachar essas mercadorias diretamente dos portos da Ásia (ou de Lisboa) para o Brasil. Em outras palavras, Florentino (2009)FLORENTINO, Manolo. Tráfico atlântico, mercado colonial e famílias escravas no Rio de Janeiro, Brasil, c. 1790-1830. História: questões e debates, Curitiba, v. 51, n. 2, p. 69-119, 2009. Disponível em: <https://bit.ly/2MCzD2V>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/105380/his.v51io.19985.
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acredita que a parte das chamadas importações da Ásia, compradas por Angola, era recebida desde os portos do Brasil e de outros portos seguindo ordens dos comerciantes no Brasil. Uma leitura atenta mostra, porém, que nenhuma evidência que demonstre tal interpretação é apresentada (FLORENTINO, 2009FLORENTINO, Manolo. Tráfico atlântico, mercado colonial e famílias escravas no Rio de Janeiro, Brasil, c. 1790-1830. História: questões e debates, Curitiba, v. 51, n. 2, p. 69-119, 2009. Disponível em: <https://bit.ly/2MCzD2V>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/105380/his.v51io.19985.
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; FRAGOSO; FLORENTINO, 2001FRAGOSO, João & FLORENTINO, Manolo. O arcaísmo como projeto: mercado atlântico, sociedade agrária e elite mercantil em uma sociedade colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2001., p. 112). Parte da confusão está no fato dos funcionários da alfândega terem organizado a informação segundo a categoria made in e não conforme o porto de embarque. Ora, a relevância dos têxteis da Ásia no tráfico de viventes obriga a colocar atenção na maneira como esse comércio funcionava e as diferentes formas de investimento de capital que ele permitia. A segunda parte do artigo coloca o foco em alguns equívocos, e até exageros, que têm imperado a respeito da participação dos comerciantes sediados no Brasil e a maneira como os portos no assim chamado Atlântico Sul eram abastecidos de manufaturas asiáticas.

Histórias complexas: nem local, nem bilateral, nem imperial

Despregar o Brasil para além dos limites impostos pelo Atlântico Sul, projetando-o numa perspectiva global, é sem dúvida uma tarefa que está por se fazer. Tal empreitada obrigará o historiador a olhar para a Ásia, mas também a voltar seu olhar para a América espanhola, numa tentativa de incorporar tais espaços em análises bem mais complexas. Uma das hipóteses desta parte é precisamente a de que o tráfico se encontrava envolvido em interdependências que iam muito além dos férreos marcos bilaterais ou triangulares. Dito claramente, nem perspectiva triangular, nem bilateral, trata-se, portanto, de inserir o Atlântico Sul numa perspectiva global.5 5 As ideias desta seção retomam-se de Bohorquez ([2020]). Para desenvolver tal hipótese, estuda-se de maneira conjunta o financiamento do comércio da Ásia e o do tráfico de escravos na África, operação historiográfica que, aliás, pode surpreender alguns estudiosos, para os quais os dois espaços se apresentam totalmente desconexos. Assim, a máxima que diz que sem panos da Índia não há escravos e sem escravos não há açúcar se repete algumas vezes nos documentos do século XVIII, não deixando dúvida de que, aos olhos dos funcionários em Lisboa, os três tráficos aparecem estreitamente interligados. Embora se saiba da importância dos têxteis da Índia, e apesar de se ter recentemente chamado a atenção para o fato de que a maior parte das remessas de têxteis chegados a Angola foi realizada a partir de Lisboa (MENZ, 2012MENZ, Maximiliano. As “geometrias” do tráfico: o comércio metropolitano e o tráfico de escravos em Angola (1796-1807). Revista de Histórica, n. 166, p. 185-222, 2012. Disponível em: <https://bit.ly/2Bung2f>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.11606/issn.2316-9141.v0i166p185-222.
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), pouco ou quase nada se conhece sobre a forma como esses produtos eram importados do porto de Lisboa.

A respeito do comércio da Ásia, existem várias contradições sobre as quais é necessário refletir (ANTUNES, 2001ANTUNES, Luís Frederico Dias. Têxteis e metais preciosos: novos vínculos do comercio indo-brasileiro (1808-1820). In: FRAGOSO, João et al. (org.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, p. 381-420., p. 381-420; BAUSS, 1997BAUSS, Rudy. Textiles, bullion and other trades of Goa: commerce with Surat, other Areas of India, Luzo-Brazilian ports, Macau and Mozambique, 1816-1819. Indian Economic & Social History Review, Thousand Oaks, v. 34, n. 3, p. 275-287, 1997. Disponível em: <https://bit.ly/2J6GwqQ>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: https://doi.org/10.1177/001946469703400301.
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, p. 275-287; CARREIRA, 1995CARREIRA, Ernestina. O comércio português no Gujarat na segunda metade do século XVIII: as famílias Loureiro e Ribeiro. Mare Liberum, Coimbra, n. 9, p. 83-94, 1995., p. 83-94, 2014CARREIRA, Ernestina. Globalising Goa (1660-1820): change and exchange in a former capital of empire. Goa: [s.n.], 2014.; CUNHA, 2006CUNHA, José Manuel Telles. A carreira da Índia e Goa: apogeu e declínio crepusculares (1760-1835). In: LOPES Maria de Jesus dos Mártires. O império Oriental, 1660-1820. Lisboa: Estampa, 2006, p. 361-441., p. 361-441; NADRI, 2009NADRI, Ghulam. Eighteenth-century Gujarat: the dynamics of its political economy, 1750-1800. Leiden: Brill, 2009.; PINTO, 1995PINTO, Celsa. Lisbon investment in the Indian textile commerce: the Surat feeder. Mare liberum, Coimbra, n. 9, p. 217-233, 1995., p. 217-233, 2002). Primeiro, enquanto alguns autores brasileiros salientaram que o capital lisboeta era demasiado débil e, portanto, voltado exclusivamente para o fluxo exportador resultante do trabalho escravo (FLORENTINO, 1997FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das letras , 1997., p. 118), sabe-se, porém, que as armações para Ásia requeriam imensos investimentos de capital (PEDREIRA, 1995PEDREIRA, Jorge. Os Homens de negócio da praça de Lisboa de Pombal ao Vintismo (1755-1822): diferenciação, reprodução e identificação de um grupo social. Tese de doutorado em História, Universidade Nova de Lisboa, 1995., p. 337-338) - uma armação, por exemplo, podia requerer o capital equivalente à totalidade da fortuna de um negociante sediado no Brasil. Segundo, não é raro o leitor ficar com a impressão de que existe uma tendência a confundir comércio do Índico e Carreira da Índia, como se ambos fossem uma e a mesma coisa (LAPA, 1968LAPA, José Roberto Amaral. A Bahia e a carreira da Índia. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1968.). Porém, nada mais longe da realidade. Para evitar cair em semelhante confusão, é necessário ter em conta que o papel das armações dos barcos da Carreira da Índia durante o século XVIII em pouco ou nada correspondia ao desempenho que tinha atingido durante o monopólio da era das especiarias. O desempenho das armações financiadas pela Coroa não é comparável com as armações privadas precisamente no momento em que o comércio de escravos atingiu grande auge. Em meados do século XVIII, o rei liberou o comércio do Índico para qualquer vassalo interessado em investir seus capitais e essa abertura teve consequências evidentes e imediatas: durante o século XVI, 581 barcos da carreira fizeram o percurso do Índico, cifra que diminuiu para 162 no século XVII até atingir unicamente 1 navio por ano durante o século XVIII, pelo contrário, só durante 1771-1790, pelo menos 77 armações privadas levantaram âncoras em Lisboa em direção a Ásia -aproximadamente 4 barcos por ano (PINTO, 1995 p. 218).

Ainda falta muito para ser pesquisado sobre os fundamentos e o funcionamento desses novos investimentos - por exemplo, não se conhece o principal destino de tais negociações (ANTUNES, 2001ANTUNES, Luís Frederico Dias. Têxteis e metais preciosos: novos vínculos do comercio indo-brasileiro (1808-1820). In: FRAGOSO, João et al. (org.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, p. 381-420. p. 389; FERREIRA, 2001FERREIRA, Roquinaldo. Dinâmica do comércio intracolonial: Geribitas, panos asiáticos e guerra no tráfico angolano de escravos (século XVIII). In: FRAGOSO, João et al (ed.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII) . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2001, p. 340-378. p. 362). Os barcos que zarpavam de Lisboa tinham nomeadamente dois destinos: a costa de Malabar, onde ficavam as praças portuguesas, a de Coromandel e o golfo de Bengala, dominada pela East India Company. Na verdade, mais do que um percurso direto Lisboa-Goa ou Lisboa-Calcutá, as embarcações saiam com ordens de percorrer diferentes pontos na costa da Índia. É precisamente por essa razão que a Coroa fez tudo quanto lhe foi possível para introduzir medidas que incentivassem os navios a dirigir-se a Goa antes de tornarem para Lisboa. Outro fenômeno tem a ver com o financiamento das armações, assunto pouco abordado pela historiografia disponível.6 6 Para as armações da Índia e a informação quantitativa ver Guinote et al. (2002).

Instituições e procura de têxteis

Como já foi dito, supõe-se que os negociantes residentes no Brasil tenham feito remessas de têxteis da Ásia diretamente de Lisboa para Angola, onde recebiam o pagamento em escravos. Valiam-se para isso de “intermediários” sediados em Lisboa, porém, eram eles que investiam e se achavam no comando do negócio. Por outro lado, acredita-se que os brasileiros teriam tido acesso direto aos mercados na Ásia, sem a necessidade de recorrer a intermediários. Parte dessa conclusão enviesada tem sido levantada da leitura dos resultados de Amaral Lapa, que evidencia que os barcos da Carreira da Índia aumentaram o número de paradas no Brasil em seu percurso para o Índico, pois, embora a Coroa tivesse proibido tal prática, houve certa permissividade. Deduz-se, portanto, que as escalas serviam para que negociantes brasileiros empregassem seu dinheiro na compra de fazendas da Índia, silenciando a respeito das quantidades, das frequências etc., isto é, sobre como teriam se organizado tais operações. Os navios estavam obrigados a voltar diretamente da Índia para Lisboa, sendo permitida escalas somente em Angola, sem tocar os portos do Brasil.

Lamentavelmente, não existem trabalhos sobre a Casa da Índia para a segunda metade do século XVIII e, portanto, desconhece-se totalmente quem descarregava e carregava mercadorias asiáticas. Além de alfândega, a instituição era o local onde se realizavam os leilões das fazendas, mas, sem um estudo sobre a instituição, torna-se difícil saber com exatidão quais negociantes intervinham no comércio de têxteis. Não obstante, é certo que as armações de Ásia não dependiam exclusivamente dos investimentos de capital pertencentes a grandes negociantes, pois o financiamento parece ser muito mais complexo do que, até aqui, se tem asseverado.

Em 1783, o negociante Daniel José da Fonseca, de Lisboa, apresentava-se perante a Junta do Comércio para pedir que fosse estudada a situação da sociedade mercantil que tinha estabelecido com Manuel Francisco da Silva e Pedro José da Fonseca. Segundo ele, os três tinham ajustado uma sociedade em 1772, tomando capitais a diferentes credores por pouco mais de 13:000$000 réis, aos quais se acrescentaram mais de 8:000$000 réis que tomaram emprestado na cidade de Goa, lá adquirindo fazendas por pouco mais de 13:000$000 réis. Os sócios voltaram para Lisboa um ano depois no navio Nossa Senhora do Monte do Carmo, para logo depois se dirigirem para Bahia, em 1782. Dado que ali não acharam demanda para a venda de todas as fazendas, decidiram comprar uma corveta para passar a Benguela. Enquanto Daniel José da Fonseca ficava na Bahia cobrando as dívidas da sociedade, os outros dois sócios foram à África para vender as mercadorias, ficando encarregado Silva de vender escravos e cobrar dívidas em Benguela, e Pedro José da Fonseca de transladar-se para o Rio de Janeiro, de onde devia enviar o produto da venda dos escravos para Lisboa. Os sócios, contudo, não atuaram como acordado e decidiram entregar as mercadorias a um capitão de navio que ia diretamente para o Rio de Janeiro com 450 escravos. O dinheiro não foi enviado para Lisboa, onde os credores esperavam o pagamento.7 7 Arquivo Nacional Torre do Tombo (ANTT), Junta do Comércio, Livro 121, f., 122v.-125r.

O exemplo da sociedade dos Fonseca e dos Silva mostra claramente que capitais eram tomados a crédito, quer em Lisboa, quer na Índia, e que o crédito era uma peça central nas negociações de escravos e na venda de têxteis, sendo preciso, portanto, perguntar como funcionava tal mercado de crédito. No que concerne ao século XVIII, a historiografia tem ignorado completamente o importante papel desempenhado por uma velha instituição mercantil, contudo uma leitura de mais de trezentas causas civis disputadas no Juízo da Índia e Mina durante a segunda metade do século XVIII permite concluir que as negociações da Ásia recorriam frequentemente ao mercado de crédito, sacando letras de risco.8 8 Provas documentais em Bohorquez (2016, p. 111). A precisão conceitual desse instrumento mercantil é fundamental: uma letra de risco é diferente de uma letra de giro e qualquer pessoa podia sacar letras de risco - armadores, capitães de navios, sobrecargas, calafates, carpinteiros. O instrumento determinava o pagamento, geralmente sessenta dias após a chegada do navio no porto especificado na letra. A letra de risco tinha caraterísticas bem particulares: 1) O credor assumia, como expunha o documento, “todo risco de terra, mar, fogo e inimigos”, desde a partida até à chegada do navio, o que quer dizer que, se o barco afundasse ou alguma coisa inesperada acontecesse durante a travessia, era o credor e não o devedor que assumiria a perda; 2) O dinheiro sacado era respaldado pelas fazendas adquiridas na Ásia, razão pelo qual, se algum conflito surgisse, elas serviam para assegurar o pagamento; 3) Uma letra de risco era sacada sobre um navio e uma travessia específica, o que impossibilitava o devedor de mudar de percurso (caso o fizesse, era obrigado a comunicar ao dono do capital ou a pagar maiores juros, se não tinha que assumir o risco) (GELDERBLOM, 2013GELDERBLOM, Oscar. Cities of commerce: the institutional foundations of international trade in the Low Countries 1250-1650. Princeton: Princeton University Press, 2013., p. 190-191; HOOVER, 1926HOOVER, Calvin. The sea loan in Genoa in the twelfth century. Quarterly Journal of Economics, Oxford, v. 40, n. 3, p. 495-529, 1926. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/1885175. Acesso em: 26 set. 2019. doi: https://doi.org/10.2307/1885175.
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, p. 495-529; MIGUEL-BERNAL, 1992MIGUEL-BERNAL, Antonio. La financiación de la carrera de Indias (1492-1824). Madrid: Fundación el Monte, 1992.; VAN DOOSSELAERE, 2006VAN DOOSSELAERE, Quentin. Commercial agreements and social dynamics in medieval Genoa. Cambridge: Cambridge University Press, 2006., 129-131).9 9 A alta taxa de juros se deve ao tempo necessário para o pagamento, que nas armações da Ásia era extremadamente longo, e não era elevada se se considera que o proprietário do capital corria o risco, sendo paga unicamente com o sucesso da expedição. Um exemplo de letra de risco: “Lisboa 22 maio 1780. Um conto e vente mil réis a sessenta dias depois de ter chegado a salvamento ao porto desta cidade o navio San Boaventura de que é senhorio Manuel Caetano de Mello e capitão Plácido Rodrigues que de presente está para seguir viagem em direitura aos portos da ilha da Madeira deste ao da Bahia e daquela aos da costa de Coromandel, China e alguns na costa de Malabar não sendo o de Goa nem aos que ficam desta para o norte e de volta em direitura para esta cidade de Lisboa com escala por Benguela ou Angola outro porto de América em que tomar refresco, outro qualquer navio que vier em lugar deste a conduzir as nossas fazendas, pagaremos nos abaixo assinados ao senhor Bento Alves da Cunha a quantia de um conto cento e vento mil réis que são procedidos de oito centos mil reis que ao fazer e assignar esta recebemos do dito senhor em dinheiro de contado e corrente neste reino para empregarmos em fazendas para o nosso particular negócio as quais levamos carregados no dito navio por o risco que o dito senhor lhe vai correndo de ida e volta sobre as ditas fazendas de nossa conta e mercê de mar fogo calcário inimigo e falso amigo (…) a tomamos sobre nós e lhe damos de premio quarenta por cento que junto ao capital faz a sobre dita quantia de um conto cento vente mil réis, e o dito risco principiara a correr desde que o dito navio levar a sua primeira ancora e se fizer à vela” (ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 4 n. 5 cx. 272).

Dado que não se dispõe de informação quantitativa, é impossível saber com certeza as quantidades de letras e capitais que foram movimentadas. Parece, porém, que existia um mercado de crédito bastante amplo durante as últimas décadas do século XVIII e as letras de risco geravam por um mercado especulador na praça de Lisboa, o que sem dúvida incrementava os ganhos. Por exemplo, em 19 de abril de 1785, Francisco Thomas da Costa, capitão do navio Duque de Bragança, destinado à Costa de Coromandel, junto com o quarto piloto, Luís Bernardo da Costa, sacou uma letra por 462$572 réis (incluso 40% de prêmios) a Bernarda da Silva. A letra passou pelas mãos de vários agentes em junho de 1785, julho de 1787 e novamente dezembro de 1792.10 10 ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 6 n. 5 cx. 270. No caso do calafate Simão Rodrigues, membro da tripulação do navio Nossa Senhora do Monte do Carmo, quinze pessoas lhe adiantaram dinheiro totalizando 5:000$000 réis, isto é, aproximadamente o valor do seu salário.11 11 Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), Índia, cx. 340.

A informação disponível sobre o amplo recurso à letra de risco aponta para o fato de que a centralização dos leilões na Casa da Índia determinava parcialmente que as mercadorias servissem de garantia para o pagamento das mesmas letras. Como se tem dito, os navios eram proibidos de fazer escalas no Brasil. Com isso, procurava-se fazer com que as vendas apenas fossem feitas em Lisboa, sendo impossível, portanto, descobrir o mecanismo pelo qual os comerciantes sediados no Brasil supostamente controlariam o acesso às mercadorias, uma vez que os leilões se faziam na Alfândega de Lisboa, ainda mais quando os investimentos eram feitos por uma grande variedade de agentes lá sediados.

Instituições e remessas de prata

Fica ainda uma hipótese que contribuiria para a demonstração do suposto controle exercido pelos negociantes sediados no Rio de Janeiro. Sabe-se muito bem que, nas escalas, os navios da Ásia carregavam ouro e patacas - fato inegável -; deduz-se disso que o dinheiro tinha de ser dos negociantes locais, em outras palavras, era capital de giro da praça carioca. A evidência disponível, porém, está longe de respaldar tal hipótese, pois, além das fazendas da Ásia serem leiloadas em Lisboa para assegurar o pagamento das letras de risco - o que imediatamente demostra a intervenção do capital da praça de Lisboa e a dispersão dos capitais empregados em tais negociações -, mais dois argumentos podem ser acrescentados.

Em primeiro lugar, nos livros da Junta do Comércio fica esclarecido que, com a proibição das escalas no Brasil, os negociantes de Lisboa peticionavam ao rei permissão para fazer escala na América Portuguesa e carregar metais. Poder-se-ia pensar que não tinham outra alternativa, pois eles próprios dependiam do capital carioca para beneficiar os recursos na Ásia (como querem alguns autores). Isso, contudo, não parece ter sido o caso, pois uma e outra vez se solicitava permissão para carregar metais no Rio de Janeiro, os quais correspondiam a “fazendas vendidas com essa convenção [serem pagas no Rio de Janeiro] aos comissários daquele continente” pagas por “fundos metálicos que ali tem de sua conta e da de alguns outros carregadores procedidos de ordens que se vem precisados a receber em pagamento de fretes e fazendas vendidas”.12 12 ANTT, Junta do Comércio, Livro 134, f., 189v.-190r., 205r.-206v.

Em segundo lugar, fica claramente apontado nas Balanças de Comércio que as patacas (pesos de prata) do Rio da Prata carregadas pelos navios da Ásia eram abonadas na praça de Lisboa e não na praça do Rio de Janeiro. Assim, em 1804, por exemplo, se abonavam 400:000$000 patacas carregadas em cinco navios que fizeram escala “por ordens que levaram desta capital”, transportando cada embarcação 200:000$000 réis. O valor era quase equivalente (404:646$438) a quantidade que tinha entrado na Casa da Moeda de Lisboa nesse mesmo ano. Em 1799 aconteceu o mesmo, pois os navios para Ásia tinham carregado no Rio de Janeiro 960:000$000 patacas, enquanto na Casa da Moeda de Lisboa tinham entrado 967:884$710 réis.13 13 ANTT, Junta do Comércio, Livro 196; 191. Isso quer dizer que, mesmo sendo embarcado no Rio de Janeiro pelos comerciantes locais, o dinheiro fazia parte do capital dos negociantes de Lisboa, que de outra maneira teriam de recebê-lo e despachá-lo mais uma vez para Ásia. O que implica não só custos de transporte, mas ainda um intervalo na chegada dos barcos do Brasil e dos vasos que iam para o Índico, o que naturalmente era demasiadamente difícil.

É essencial, contudo, fazer uma análise que transcenda as Balanças de Comércio, sobrepondo-lhes uma perspectiva microeconômica (o que não quer dizer micro-história). Não há dúvida que os negociantes cariocas tinham acesso às patacas do Rio de Prata e que durante o último quartel do século intensificam-se as relações comerciais entre as duas praças em razão das reexportações de escravos (BORUCKI, 2011BORUCKI, Alex. The slave trade to the Rio de la Plata, 1777-1812: Trans-imperial networks and Atlantic warfare. Colonial Latin American Review, v. 20, n. 1, p. 81-107, 2011. Acesso em: 26 set. 2019. doi.org/10.1080/10609164.2011.552550
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, p. 81-107). Porém, é importante especificar o tipo de operação e sobretudo a instituição que poderia ter permitido aos negociantes cariocas participar nas negociações da Ásia. Segundo os relatos de António José da Mota, negociante de Lisboa amplamente envolvido no armamento de navios para Bengala e Costa do Malabar, ele tinha enviado grande parte dos seus fundos para o Rio de Janeiro no barco Águia d’América, que tinha chegado de Benguela ao dito porto com setecentos escravos e retornado a Benguela por uma carregação equivalente. Além dos capitais, produto dos escravos, ele era dono de cabedais resultantes da venda de fazendas que tinha adquirido nos leilões da Casa da Índia, que foram “vendidas a negociantes da América e da Costa d’África e que passaram letras para serem pagas no Brasil”.14 14 ANTT, Junta do Comércio, Livro 134, f., 105r.-106v.

Vários comerciantes lisboetas investiam seus cabedais, e também cabedais alheios, em circuitos que envolviam o Índico e o Atlântico. Só recentemente começaram a ser estudados esses agentes cujas operações atingiam simultaneamente o tráfico de escravos e o comércio da Ásia (BOHORQUEZ, 2016BOHORQUEZ, J. Globalizar el sur: la emergencia de ciudades globales y la economía política de los imperios portugués y español: Rio de Janeiro y La Habana durante la Era de las Revoluciones. Tese de doutorado em História, European University Institute, Florencia, 2016.). Na terceira parte do artigo, será explorado o caso de António de Souza Portela, mas outros podem ser mencionados, como o de José António Pereira15 15 AHU, Rio de Janeiro, doc. 13.699; doc. 13.951; AHU, Pará, doc. 8.197; doc. 8.400; AHU, Pernambuco, doc. 17.563; ANTT, Juízo Índia e Mina, mç. 58 n. 7 cx. 182; ANTT, JC, L. 128 f., 24v-25v; L. 130 f., 63r-68v, 100r; L. 131 f. 161v-163r; L. 133 f., 31v -33v, 178v-182r; L. 132, f., 145r-v. e o de Manuel Eleutério de Castro, contratador de Angola que mantinha negócios no Índico.16 16 ANTT, Junta do Comércio, Livro 122, f. 144v.-147r. Ainda como exemplo, há o caso de Manuel de Souza Freira e Companhia, que em 1797 solicitaram à coroa uma graça especial. Segundo informação apresentada perante a Junta de Comércio, eles mantinham uma parte dos moradores do presídio de Benguela e, além disso, eram proprietários de quatro navios que traficavam nessa carreira (muito provavelmente numa rota bilateral). Tinham-se proposto a resgatar cativos em Cabinda para levá-los para o Brasil. Assim, o barco Anjo do Senhor tinha levantado âncoras para ir à procura de escravos que seriam levados para o Rio de Janeiro, onde já estava o Ama de Lisboa, e a última embarcação esperava 120 fardos de têxteis de Surat, que se achavam depositados no porto franco de Lisboa. Como eles disseram, a negociação do Anjo do Senhor dependia da chegada do Ama de Lisboa, pois os solicitantes pediam que, caso não conseguirem o número de escravos em Cabinda, fossem autorizados a levar a carga, quer para Benguela, quer para Luanda.17 17 ANTT, Junta do Comércio, Livro 130, f.,143r-v.

Mais investigações são necessárias para saber qual parte do capital os negociantes brasileiros poderiam ter investido nas ditas negociações da Ásia, caso o tivessem feito. É essencial, porém, salientar que possuir algum capital não significa poder investi-lo em operações que precisam de um giro de capital tão longínquo.18 18 Por exemplo, quando a coroa quis incentivar o envio de escravos para o Pará, os negociantes de Benguela disseram que não tinham capital para assumir semelhante risco e que seus fundos não admitiam o giro, pois no Pará pagavam-se os escravos em gêneros que só em Lisboa eram vendíveis e que, para dessa cidade irem às fazendas de giro, era necessário um fundo de 200,000 cruzados, “o que o presente aqui nenhum tinha por si só” (AHU, Angola, d. 12). Poderia ocorrer, por exemplo, que negociantes sediados no Brasil participassem nas armações com carregação, mas não com letras de risco. As duas coisas são diferentes, pois enquanto os que sacavam letras de risco contribuíam parcialmente para o financiamento do seguro do navio (lembre-se que o credor mantinha o risco do capital durante parte do percurso e, dessa maneira, os armadores ou comerciantes diminuíam o seu risco), os que entregavam dinheiro para a compra de têxteis unicamente teriam produzido um frete (quer dizer, um ganho para o armador). Pesquisas precisam ser feitas a esse respeito.

No final do século XVIII, quando se debatia a permissão ou interdição de carregamento de metais nas escalas no Brasil, diferentes argumentos pró e contra foram enfatizados. De uma parte, destacava-se que as ditas carregações impactavam na competição entre as armações dirigidas para a Costa de Coromandel e as que iam procurar carregação na do Malabar (as quais parecem não funcionar da mesma maneira) e que isso constituía sem dúvida um dos pontos centrais da discussão, acrescentando-se que, muito provavelmente, a maior parte daquele capital não era de brasileiros. Um dos textos expõe claramente que se tinha permitido receber no Rio de Janeiro patacas livres de qualquer direito (o que tem de ser salientado) e que, na falta delas, em seu lugar recebiam meias dobras (às quais muito provavelmente deveriam pagar direitos, algo que não estava sendo feito). Porém, “esta mesma parte não é dos Brasileiros mas sim do negociante de Lisboa, que para a ter ali vende muito antes a sua fazenda aos seus comissários e aos angolistas”.19 19 ANTT, Ministério dos Negócios Estrangeiros, mç. 258 cx. 955. Devia considerar-se com muita atenção que, se os carregadores fossem obrigados a esperar em Lisboa os metais vindos do Brasil, seria necessário que tivessem um fundo em dobro para poderem negociar com a Ásia. Além disso, o transporte do Brasil até Lisboa sem dúvida afetaria, indireta mas igualmente, os preços dos produtos coloniais e dos escravos. Portanto, para os negociantes lisboetas era melhor despachar seus cabedais a partir do Rio de Janeiro, para não terem que esperar até eles chegaram a Lisboa, trajeto que implicava custos de transporte.

Em 1806, João Pereira de Souza Caldas armou seu barco Ligeiro para Bengala, mas a embarcação foi apresada pelos ingleses e levada para Inglaterra, razão pela qual dispõe-se de mais informações. Segundo os sobrecargas, ao deixar Lisboa, o barco levava 2:000$000 réis e tinham mais 20:000$000 réis a receber no Rio de Janeiro. Essa partida estava longe de se igualar aos 42:510$000 réis que um dos sobrecargas tinha arranjado em Lisboa “de sua conta e de seus amigos” (os sobrecargas eram pessoas encarregadas da negociação, isto é, de cumprir as ordens dos investidores ou do dono do navio). Caldas só tinha investido na armação do barco com cem pipas de vinho. Para além disso, um negociante de Bengala tinha emprestado 14,000 rúpias. Os sobrecargas, junto com o próprio armador, confessaram ter recebido vários cabedais a risco “para serem inclusos em letras do governo sobre o Rio de Janeiro”. Caldas, por sua vez, defendia que tinha deixado Lisboa com uma letra de 40:000$000 réis “sobre o Erário do Rio de Janeiro cujo pagamento ali se verificará”.20 20 ANTT, Junta de Comércio, Livro 138, f.,138r-145v.

É ainda necessário aprofundar-se mais nos mecanismos e instituições usados para carregar metais nos navios da Ásia, o que permitirá demostrar se o dinheiro se investia por conta e risco dos comerciantes da praça carioca, não sendo simplesmente adiantado por estes. O exemplo do negociante sediado no Rio de Janeiro, Francisco Pinheiro Guimarães, dá algumas pistas que permitem aprofundar essa questão. Ele atuava como agente da Companhia de Pernambuco e Paraíba, a qual fez algumas armações para Ásia no final da década de 1770 e primeiros anos da década de 1780. As cartas escritas desde Lisboa sobre a armação do Netuno e do Polifemo são de grande interesse para compreender como funcionava a operação.

Guimarães devia comprar cinquenta caixas de açúcar e pipas de aguardente de Parati para serem carregadas no navio, mas, mesmo assim, lhe solicitavam entregar aos sobrecargas Félix José da Costa e Manuel Alfonso Morgado 40$000 até 50$000 cruzados em meias dobras de 6$400 ou em patacas espanholas “se houver” (16:000$000 ou 20:000$000 réis). Segundo os administradores em Lisboa, não lhes parecia que Guimarães tivesse qualquer inconveniente em arranjar o dinheiro, pois, para o embolso “passará vossa mercê letras seguras sobre nós”. Diziam-lhe ainda que a pontualidade com que estavam sendo pagas tais letras daria segurança para que os “negociantes dessa praça [Rio de Janeiro] hão de estimar mais de passar seus cabedais ao Reino por esta forma do que correr-lhe o risco por navios desembolsando um e meio por cento”.21 21 ANTT, Companhia de Pernambuco e Paraíba, Livro 289. O dinheiro carregado era, portanto, capital que os negociantes no Rio de Janeiro teriam que remeter a Lisboa, resultado de anteriores consignações de mercadorias. Em correspondência de 1º de outubro de 1779, os administradores informavam que estavam certos da última carta onde Guimarães informava a entrega do dinheiro e das letras que tinha sacado para serem pagas em Lisboa. O mesmo aconteceu numa segunda negociação, feita em 1782, dessa vez com o navio Conceição, que a Companhia despachava para a Ásia e para o qual se solicitava a Guimarães a entrega aos sobrecargas de 250 mil cruzados (100:000$000 réis), sendo carregados no navio 41:274$945 réis e sacadas 24 letras para serem pagas em Lisboa (uma media de 1:714$789 cada uma) (Tabela 1).

Tabela 1
Letras sacadas no Rio de Janeiro, navio Polifemo, 1779

Por causa da falta de pesquisas específicas, é impossível asseverar a extensão de tal prática, que, sem dúvida, favorecia os carregadores da Ásia, mas também os negociantes do Brasil e de Lisboa, que se viam beneficiados ao poupar os custos de transporte, e muito possivelmente os isentava do pagamento de impostos em Lisboa, ao receberem letras e não metais a serem entregues na casa da moeda (COSTA et al, 2013COSTA, Leonor et al. O ouro do Brasil. Lisboa: Imprensa Nacional, 2013.) - porém se pagavam juros pelo tempo da espera. É importante se aprofundar no estudo de todos esses fenômenos para entender melhor a natureza de tais negociações.22 22 Como tem mostrado Ferreira (2001, p. 364), há casos de expedições que “dependiam de letras passadas no Rio”. Contudo, uma conclusão pode ser tirada: o fato de se carregar e despachar prata num navio da Ásia não é prova fidedigna de que os comerciantes baseados no Brasil estavam arriscando seus capitais ou participando das negociações.

Agentes e instituições

Uma das provas empregadas para comprovar o suposto “controle” dos negociantes cariocas no envio de têxteis, quer de Lisboa, quer da Ásia, é o caso de Bernardo Viana - aliás, é a única prova apresentada. Segundo Fragoso e Florentino (2001, p. 114-115)FRAGOSO, João & FLORENTINO, Manolo. O arcaísmo como projeto: mercado atlântico, sociedade agrária e elite mercantil em uma sociedade colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2001., Viana adiantou capitais para a negociação do Índico despachando-os diretamente do Rio de Janeiro e “Bernardo, por intermédio de Antônio de Souza Portella, negociante de Lisboa, emprestara vultosos recursos a Moura”, os quais deveriam ser pagos em até seis anos. É impossível asseverar com certeza se tal operação se assemelha ao tipo de prática descrita no caso da companhia de Pernambuco e Paraíba. Já, segundo o próprio documento, “ao suplicante [Viana] que adiantou dinheiros para ao comércio da Ásia para se embolsar pela cobrança das mesmas letras”.23 23 Arquivo Nacional do Rio de Janeiro (ANRJ), Junta do Comércio, cx. 377, pc. 1.

Devido à falta da correspondência mercantil entre Viana e Portela, é difícil sustentar com exatidão as condições de tal operação. No entanto, se se considerar a informação mencionada anteriormente e a que será apresentada sobre Viana, poder-se-ia deduzir que muito provavelmente Portela, sabendo que teria fundos futuros no Rio de Janeiro, como produto de seus escravos consignados a Viana ou das letras de Moura, solicitaria a Viana o carregamento de cabedais para Ásia num dos navios que ele armara ou no qual arriscava capital. Se devia ou não pagar juros, ou se se tratava de crédito, é muito difícil de saber; fica claro, não obstante, que Viana não “emprestara” cabedais a Moura nem tinha entrado com esse dinheiro na negociação da Ásia, não sendo um exemplo de como os negociantes do Brasil enviavam mercadorias diretamente de Portugal para Angola. Este, aliás, é o único exemplo apresentado pelos autores para provar seu argumento.

Ora, o que se expõe no documento é que Antônio Rodrigues de Moura (angolista) tinha sacado várias letras para serem pagas no Rio de Janeiro a Bernardo Viana (Tabela 2). As três, feitas em Lisboa em favor do vendedor das fazendas, António de Souza Portela, correspondiam a 15:000$000 réis, declarando que se pagaria por elas o valor “que lhe vendi (…) postas que sejam no dito porto [Luanda]” e Portela assumia o risco de mar até Angola. Em Benguela, sacou-se mais uma letra por Moura para ser paga a Viana, esta de Joaquim José Coimbra. A Tabela 2 mostra as remessas de escravos feitas por Moura destinadas a pagar as letras devidas a Portela. Após a morte de Portela, os administradores da casa deram ordem para remeter seus cabedais diretamente de Angola para Lisboa e, se fosse impossível fazê-lo, recomendavam empregar a Carlos José Moreira no Rio de Janeiro, e não a Viana, como vinha sendo feito. Por essa razão o negociante em Luanda expõe no documento que nada devia a Viana e que só se limitava a seguir ordens remetidas de Lisboa.

Tabela 2
Somas correspondentes ao valor de escravos enviados para o Rio de Janeiro para o pagamento de letras devidas a Antônio de Souza Portela

Portela não era um simples “intermediário”, como erroneamente querem os autores (FLORENTINO, 2009FLORENTINO, Manolo. Tráfico atlântico, mercado colonial e famílias escravas no Rio de Janeiro, Brasil, c. 1790-1830. História: questões e debates, Curitiba, v. 51, n. 2, p. 69-119, 2009. Disponível em: <https://bit.ly/2MCzD2V>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/105380/his.v51io.19985.
https://bit.ly/2MCzD2V...
, p. 88; FRAGOSO; FLORENTINO, 2001FRAGOSO, João & FLORENTINO, Manolo. O arcaísmo como projeto: mercado atlântico, sociedade agrária e elite mercantil em uma sociedade colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2001., p. 114-115). Natural de Viana, tinha atuado durante dez anos no cargo de administrador da Companhia de Pernambuco e Paraíba24 24 ANTT, Ministério do Reino, mç. 678, doc. 29. e, além disso, frequentemente negociava no Índico - nos anos noventa do século XVIII, por exemplo, solicitou permissão para mandar construir navios em Damão e levá-los carregados para Lisboa.25 25 ANTT, Junta do Comércio, Livro 131, f., 115v., 132v-133v. Ao mesmo tempo, fazia parte da sociedade dos Loureiros, Hubbens e Colfs, que exercia certo controle sobre o tráfico na costa do Malabar,26 26 ANTT, Junta do Comércio, Livro 125 f., 74v-77r. Ver também Pinto (2002, p. 39). e aparece, ademais, sacando letras de risco para seus negócios na Ásia.27 27 ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 2 n. 5 cx. 189.

Vasta informação documental não deixa dúvida que Viana operou como consignatário de vários negociantes residentes em Lisboa ou em Angola. Aproximadamente durante os mesmos anos em que ocorreram as negociações entre Portela e Moura, Viana recebeu escravos de José Nogueira da Rocha, que requereu o embargo ao negociante sediado no Rio de Janeiro, acusando-o de lhe dever 11:699$709 réis. Viana, por sua vez, defendeu-se dizendo que os supostos herdeiros de Rocha não eram filhos legítimos - sendo, portanto, inabilitados para semelhante cobrança -, acrescentando que a galera que se pretendia embargar era de Portela e mostrando cartas onde se demostrava que ela navegava com as carregações deste. Testemunhas afirmavam ter visto as últimas cartas em que Portela comunicava a Viana as ordens de como este teria que realizar essas negociações.28 28 AHU, Angola, cx. 86 doc. 16; cx. 103, doc. 62. Quando os bens do ex-governador de Benguela, Francisco Paim de Câmara, foram arrematados, em 1798, Bernardo Viana tinha em seu poder 7:081$560 réis, quantia da qual Viana requereu 128$640 réis de comissões. Não fica esclarecido, contudo, se poderia tratar-se de negociações com escravos.29 29 AHU, Rio de Janeiro, d. 12207. Nesse sentido é de interesse o caso de Francisco José da Costa, que entregou a Francisco José de Melo uma carregação correspondente a 219$870 réis que deveria levar para Angola e lá vender para empregar o produto na compra de escravos que “deveria remeter para o Rio de Janeiro a João Gomes Barroso procurador da mesma corveta daquela cidade e dela então ver remetido o produto dos escravos em efeitos da terra” (ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 7, n. 2, cx. 194).

Além disso, Viana achava-se envolvido em negociações com outros mercadores de Lisboa, sempre atuando como consignatário, e uma dessas operações comerciais causou grande escândalo tanto em Lisboa quanto em Angola. Trata-se das atividades mercantis de Bernardo Nunes Portela, que tinha estudado Direito na Universidade de Coimbra e sido degredado por seis anos, em 1764, para Luanda, onde não só participou no Senado da Câmara, como também desempenhou o cargo de juiz e, uma vez de volta a Lisboa, começou a coletar capitais e estabelecer sociedades para o comércio com Angola. O negociante teria estabelecido pelo menos quatro sociedades com diferentes mercadores: a primeira com Francisco Xavier Nogueira, João António Vieira e Manoel Pereira Valle, na qual investiu 3:000$000 réis e, segundo a viúva, haveria de produzir 47:000$000 réis; a segunda com Manuel Bernardes Vivas, piloto da corveta Santíssimo Sacramento, que no momento de sua morte devia ainda 223$000 réis, de uma letra no valor de 1:000$000 réis assinada em Angola para ser paga em Pernambuco.

Além dessas duas negociações, ele tinha criado uma sociedade em Lisboa, em 25 de junho de 1785, com António Martiniano José da Silva Souza. Segundo a escritura, os dois sócios tinham estabelecido uma sociedade sobre a corveta Santíssimo Sacramento: Portela ficaria em Lisboa como caixa enquanto Souza viajaria para Angola. O caixeiro ficava obrigado a fazer as remessas de fazendas e aprontar os fundos necessários para a compra enquanto o sócio enviaria de Angola, diretamente ou através do Brasil, o dinheiro produzido pela venda das fazendas, tarefa pela qual não ganharia comissão. As fazendas seriam enviadas a risco dos dois sócios, acontecendo o mesmo com o dinheiro tomado a crédito em Lisboa. Ao chegar a Angola, Souza deveria enviar o produto em letras ou dinheiro para o Brasil, onde se comprariam produtos coloniais para se venderem em Lisboa. Fica esclarecido na escritura que Bernardo Viana seria o consignatário para essa operação e que, na ausência dele, seriam empregados José Pereira Guimarães e João da Costa Pinheiro “procuradores deles sócios no Rio de Janeiro”.30 30 ANTT, Cartório de Lisboa 2do, Livro 629 cx. 133, f. 90r. Ver também Livro 627 cx. 132, ff. 89r-90r.

Em 1800, Portela apresentou-se perante a Junta do Comércio de Lisboa para solicitar ao rei que os cabedais que lhe eram devidos em Angola fossem enviados para Lisboa, pois seus credores não aceitavam esperar mais. Segundo ele, Souza devia enviar-lhe pouco mais de 40:000$000 réis. O rei tinha ordenado ao governador de Angola que estudasse a situação dos ditos negócios, pois um dos credores de Portela tinha falecido e a viúva cobrava o dinheiro.31 31 Sobre os negócios de Bernardo Nunes Portela ver: ANTT, Inventários orfanológicos, Letra B, mç. 23, n. 7; Junta do Comércio, Livro 132, ff. 94r-v; Juízo Índia e Mina, mç. 11, n. 1, cx. 198; mç. 26, n. 14, cx. 213; mç. 39, n. 5, cx. 226; mç. 28 n. 2 cx. 215; AHU, Angola, cx. 80, doc. 57; cx. 81, doc. 25, 42- 43; cx. 100, doc. 14; cx. 102, doc. 21; cx. 107, doc. 19; cx. 108, doc. 4. A Junta de Comércio estipulou que, se Portela pretendia ser o principal credor “como dono dos fundos com que estabelecera a casa mercantil, isto é positivamente falso, porque em Lisboa mesmo há credores de grandes somas além dos muitos que o sócio [Souza] havia de lá contrair estando no manejo do grande comércio que se sabe”. Parte do crédito adiantado era investido na compra de fazendas da Índia.

Um desses credores era justamente António de Souza Portela (de quem já se tratou), que não tinha sociedade, mas remetia fazendas para Martiniano. Segundo as autoridades de Angola, Martiniano Souza tinha falido e, portanto, seus bens não conseguiam pagar os cabedais “que tinha a seu cargo”. O conflito entre Martiniano e Bernardo agravou-se a tal nível, que o primeiro decidiu imprimir um estado de contas em que o segundo aparecia devendo-lhe mais de 10:000$000 réis, o que Bernardo negava, fazendo o mesmo e publicando um balanço em que Martiniano lhe era devedor de 80:000$000 réis. Imprimir balanços privados e fazê-los circular no público era altamente condenado no mundo dos negócios e o desajuste nas contas era tal que a “disparidade esta…raras vezes se terá visto em Juízo”.32 32 AHU, Angola, cx. 81, doc. 25.

O estado de contas de Portela apresentava quatro remessas de fazendas para Angola, uma delas através do Rio de Janeiro, todas juntas atingindo 83:000$000 réis. Parece, além disso, que ele teria recebido através de Bernardo Viana várias partidas correspondentes a partilha de ganhos da sociedade, que somavam 19:000$000 réis, aos quais devia acrescentar-se 2:000$000 réis, produto dos fretes da corveta, totalizando 21:750$361 réis. Tendo em conta que as remessas e demais despesas somavam mais de 100:000$000 réis, podia deduzir-se que Martiniano devia os referidos 80:000$000 réis. Por sua parte, as autoridades em Angola criticavam as contas de Bernardo, pelas quais pretendia que “o sócio lhe seja devedor de todo o cabedal da sociedade que aliás na maior parte é alheio”. As autoridades locais achavam que os bens embargados deviam servir para o pagamento de pouco mais de 87:000$000 réis de dívidas, entre as quais aparecia António de Souza Portela, que no entanto reclamava 48:000$000 réis.

A consignação: o enredo das contas entre o sertão e o oceano

Os negociantes de Angola sofreram as consequências das desordens causadas pelas negociações de Bernardo Portela. Em 1801, o rei ordenou “arrematar e remeter tudo quanto pertencia a aquela herança” para Lisboa, provocando uma resposta dos comerciantes de Luanda, que se apresentavam, por sua vez, como consignatários dos de Lisboa e praças do Brasil. Apesar de advertirem sobre as calamitosas consequências que a implementação de tal provisão poderia ter, a partir de Lisboa insistiu-se no envio imediato dos capitais.33 33 ANTT, Ministério do Reino, mç. 605.

As negociações em Angola dependiam de amplos níveis de crédito e cadeias de endividamento atavam negociantes dos portos com os de Portugal e do Brasil, bem como com os que adentravam os sertões à procura de escravos. Por exemplo, em 1802, se dizia que em Benguela moravam treze negociantes e que 426 andavam no sertão com “fazendas dos negociantes desta praça”.34 34 AHU, Angola, cx. 107, dc. 30. Em 1792, em um informe sobre o comércio de Angola, expunha-se que brancos, pardos e negros saíam de Luanda com avultadas cargas de fazendas para se embrenharem nos sertões ao resgate de cativos. Não havia esperanças de recuperar esses capitais, pois os traficantes ficavam nos sertões “vivendo como gentios” e gerando sentimentos de inimizade entre os povos africanos e os portugueses, almejando o não pagamento de suas dívidas e fugindo das querelas judiciais.

Pessoas experimentadas no funcionamento desse tráfico expunham que se podia reputar perdas em torno de 1,500,00 cruzados (600:000$000 réis) “sendo talvez uma grande parte pertencente a nossa praça de Lisboa”. No entanto, há que se referir a uma diferença entre os negociantes de Luanda e os de Benguela, pois, de acordo com o documento, enquanto os primeiros confiavam na mão de um só negociante valores de 60:000$000 a 40:000$000 réis, os últimos apenas arriscavam 2.000 até 5.000 cruzados (800$000 até 2:000$000 réis). Ademais, os negociantes de Angola e outros que ali trabalhavam entregavam seus cabedais a homens sem o “menor crédito”, concluindo-se que havia “o inconveniente de fazendas serem habitualmente confiadas aos negros e pardos espalhados pelas terras dos seus parentes nossos inimigos”, ou, ainda, aos brancos, “pois não são poucos que se acham pelos sertões foragidos e debochados com as negras, depois de consumirem as fazendas que se lhe confiaram”.35 35 AHU, Angola, cx. 77, dc. 86.

Um desses foragidos era Inácio José de Souza. Degredado, e algum tempo depois autorizado a passar a morar no Rio Grande, preferiu ficar a traficar no Novo Redondo, valendo-se dos capitais dos negociantes de Benguela, que, em razão da sua boa reputação, lhe confiaram avultados cabedais. Muitos deles remeteram imensas fazendas, pois era evidente que Souza enviava a partir do interior um grande número de escravos e que grandes remessas de mercadorias eram internadas para o sertão por sua conta e risco. Os fluxos e refluxos ajudaram-no a adquirir uma excelente reputação, que não iria, contudo, ser muito duradora, visto que se tornou devedor de vários negociantes que, além da certeza de pagamento, esperavam obter imensos lucros. No entanto, um dia partiu de Novo Redondo para Benguela com oitenta escravos e nunca mais voltou - na verdade teria ido para Molembo, onde a sua espera estava um navio holandês -, tendo deixado para seus credores pelo menos uma carta “mais ofensiva e descarada que consoladora”.36 36 AHU, Angola, cx. 79, dc. 14.

A historiografia tem estudado amplamente esses processos de endividamento e adiantamentos, assim como trajetórias de negociantes (CANDIDO, 2013bCANDIDO, Mariana. South Atlantic exchanges: the role of Brazilian-born agents in Benguela, 1650-1850. Luso-Brazilian Review, Madison, v. 50, n. 1, p. 53-82, 2013b. Disponível em: <https://www.jstor.org/stable/43905253>. Acesso em: 26 set. 2019.
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p. 53-82; FERREIRA, 2006FERREIRA, Roquinaldo. Biografia, mobilidade e cultura atlântica: A micro-escala do tráfico dos escravos em Benguela, séculos XVIII-XIX. Tempo, Niterói, v. 10, n. 20, p. 33-59, 2006. ISSN 1980-542X. Disponível em: <https://bit.ly/2J8xUjm>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-77042006000100003.
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, p. 33-59). Os resultados das pesquisas têm apontado que tais cadeias de endividamento permitiam distribuir os diferentes riscos das etapas do trato, reduzindo a manutenção e possessão de escravos para o menor tempo possível (MILLER, 1988MILLER, Joseph. Way of death: merchant capitalism and the Angolan slave trade, 1730-1830. Madison: University of Wisconsin Press, 1988., p. 178-179, 186, 286, 295, 298-299). Esta parte do artigo procura contribuir para o debate alertando sobre a importância da instituição mercantil conhecida como consignação, que se traduz numa remessa de mercadorias que o consignador fazia para o consignatário, na qual o risco e propriedade das mercadorias era mantida sempre pelo primeiro, sendo o segundo encarregado simplesmente da venda das fazendas e da remessa dos lucros, recebendo uma comissão de venda. É fundamental fazer uma diferença entre crédito e consignação, assim como entre consignação e propriedade, que não são correspondentes; por exemplo, o consignador podia em dado momento ordenar a remessa das mercadorias para outro consignatário ou o consignatário podia recebê-las e não se ocupar delas (LOPEZ; IRVING, 1967LOPEZ, Robert & IRVING, Robert. Medieval trade in the Mediterranean world: illustrative documents. New York: Columbia University Press, 1967., p. 212, 378; NASH, 2005NASH, R. C. The organization of trade and finance in the British Atlantic economy, 1600-1830. In: COCLANIS, Peter (org.). The Atlantic economy during the seventeenth and eighteenth centuries: organization, operation, practices and personnel. Columbia: University South Caroline Press, 2005, p. 95-112., p. 95-112; TRIVELLATO, 2009TRIVELLATO, Francesca. The Familiarity of strangers: the Sephardic diaspora, Livorno, and cross-cultural trade in the Early Modern period. New Haven: Yale University Press, 2009.. p. 153-175).

O exemplo de Antônio Carvalho Ribeiro, negociante de Benguela, ilustra bem as complexidades do sistema de consignação.37 37 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 356, pc. 2. Em 1811, João Barbosa Braga escreveu uma carta para o negociante do Rio de Janeiro José da Rocha reportando a morte do seu companheiro Ribeiro e informando que tinha sido nomeado testamenteiro e que começaria a organizar os documentos do falecido para o pagamento de dívidas e remessas de capitais. No Rio de Janeiro, quatro comerciantes apresentaram-se perante as autoridades locais para reclamar seus direitos, aproximadamente 20:000$000 réis, dos quais Ribeiro era devedor. Com Rocha, que reclamava a metade do capital, estavam José Luiz Alves, José de Souza Reis e João Souza. Segundo o inventário das dívidas, a maior parte das partidas correspondia a fazendas consignadas, das quais Alves reclamava 5:000$000 réis de mercadorias que tinha consignado e mais 120$000 réis de outras, que Carvalho lhe tinha comprado. Os credores apresentaram documentos, entre os quais algumas cartas cujo conteúdo é de grande interesse.

Em 8 de agosto de 1810, Ribeiro escreveu uma carta para Rocha, aceitando as contas da venda dos “meus escravos” e informando terem sido entregues, pela corveta Rainha dos Anjos, fatura e recibos de fazendas que “de conta de vossa mercê e de seu irmão” tinham sido consignadas. É essencial assinalar que, enquanto enviava os escravos por conta e risco dele, os negociantes no Rio de Janeiro faziam o mesmo com as fazendas. O valor das remessas feitas por Rocha era de 8:000$000 réis “com o seu prêmio arbitrado”. Ao que parece, devido às queixas de seus consignatários, Ribeiro explicava na carta o porquê do prémio, garantindo-lhes que “presentemente se tem vendido faturas com prémio de 23%, e estes cativos a fretes, comissões e outras mais despesas”, razão pela qual o proprietário das fazendas obtinha grandes ganhos. Os consignatários podiam conferir a veracidade dos fatos com os negociantes José Pereira de Souza e Inácio Texeira Carneiro, que por sua vez tinham consignado fazendas a João Barbosa Braga.

Na galera Restaurador, que saiu de Benguela para Rio de Janeiro, Ribeiro tinha remetido “da minha conta” setenta escravos, os quais iam consignados a Rocha, que devia vendê-los “como entender”.38 38 Trans-Atlantic Slave Trade Database. N. 19.348 carregando 550 escravos dos quais, ao menos, setenta iriam por conta e risco de Ribeiro. Alertava também para umas letras que tinha sacado sobre o consignatário no Rio de Janeiro, pois, achando que talvez as remessas de Rocha demorariam muito tempo para chegar, decidiu comprar 2:302$805 réis a Manuel de Souza, sacando uma letra sobre Rocha para ser paga a Antônio José Pinto, que esperava que seu consignatário pagasse, “ficando vossa mercê certo que há de ter remessas [de escravos] por redondo, e que não hei de ficar mal”. A letra era sacada, portanto, com a garantia de fundos futuros. Além dessa, outras letras foram sacadas, uma para o pagamento de mantimentos e outra para a compra de fazendas e, antes da morte de Ribeiro, certa porção de fazendas lhe foram consignadas, parte das quais adiantadas pouco antes de sua morte a alguns sertanejos. Por outra parte, tinha comprado 2:000$000 réis de mercadorias a Manuel Joaquim de Azevedo, que deviam ser pagas com uma letra a Joaquim Pereira d’Almeida.

José Luiz Alves foi outro dos credores que demostrou os seus direitos através de uma carta. Em missiva enviada de Benguela em 17 de novembro de 1809, Ribeiro informava ter-lhe sido entregues duas faturas, a primeira de 4:000$000 réis, a risco de Alves, e a segunda, de 3:000$000 réis, pertencente a José Manuel de Mesquita Irmãos. Tratava-se, portanto, de consignações diferentes em que cada negociante mantinha o risco e propriedade sobre as fazendas. Apesar da falta de sortimentos adequados, Ribeiro já tinha começado a vender a metade das mercadorias de Mesquita Irmãos “com o prêmio que julgou vossa mercê não alcançara tão cedo e nem se tem vendido há muito tempo que foi a 50%”, portanto, para vender o restante das fazendas, era necessário enviar um novo sortimento. Igualmente, para vender as mercadorias de Alves, precisava que lhe fossem enviados um fardo de chitas e setenta ou oitenta coromandéis azuis, além doutros têxteis, pois sem eles “não posso vender e nem tomar a mim”. Como resultado da venda da metade das fazendas de Mesquita Irmãos, ele sacava uma letra sobre Bartolomeu Alves Ferreira.

Uma segunda carta, escrita para Alves avisava terem sido entregues 997$840 réis do novo sortimento para a venda da primeira consignação. Ficava claro que se tratava de “sortimento para as fazendas que param em meu poder de conta de vossa mercê”. No entanto, à chegada da nova remessa, Ribeiro contava-lhe que seria bastante difícil realizar vendas naquele momento, pois era impossível achar compradores devido à escala do navio Vasco da Gama, que tinha chegado da Costa de Malabar. Ribeiro tinha mesmo recebido fazendas desse navio, pelo que lhe era impossível tomar as de Alves, porém, até esse momento, tinha vendido unicamente 1:000:$000 réis “a um sertanejo meu o qual me entregou logo 14 escravos para encontro da mesma quantia para eu embarcar por conta do mesmo sertanejo”.39 39 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 356, pc. 2. Fica claro que, na negociação das fazendas de Alves, Ribeiro não assumia nenhum risco, nem na venda nem na remessa de escravos; nesse caso o “sertanejo” assumia o risco até à chegada dos escravos ao Rio de Janeiro e estes, uma vez vendidos, serviam para pagar a dívida.

Há mais um exemplo que permite esclarecer as negociações já descritas. Trata-se do caso de José Joaquim da Silva Braga, que, em junho de 1807, embarcou no Arlequim junto com o capitão Francisco Xavier Alvares de Mello, levando fazendas por 7:075$340 réis. As mercadorias tinham sido consignadas, em primeiro lugar, a ele e, na sua ausência, ao capitão do barco por José Gonçalves Rodrigues. Contudo, ao chegar a Luanda, Braga faleceu, sendo então necessário inventariarem-se seus bens, mas, apesar de todas as diligências feitas pelo capitão para que as mercadorias da fatura não entrassem no inventário, ele não teve sucesso e as autoridades locais arguiram diversas dificuldades para saber com exatidão quais seriam os bens de Braga. De fato, um dos problemas era que numa fatura “junta que foi achada entre os papéis do dito falecido se não mostra quem é o legitimo senhorio daquelas fazendas”. Além disso, Braga tinha agido de uma maneira bastante desconcertante a respeito da contabilidade dos livros, pois tinha disposto de porção de fazendas como se estas fossem de sua propriedade, com anotações simples “sem declaração alguma de que pertenciam a esta ou aquela pessoa fazendo remessa de alguns fardos para Benguela por sua conta e risco”. O juiz em Luanda acreditava que, no caso das fazendas não serem propriedade de Braga, ele não teria enviado remessas sem identificar o verdadeiro proprietário. As transações ficavam ainda mais difíceis de identificar porque o defunto tinha feito remessas de cera para o Brasil “por conta de quem pertencer”, além de ter comprado “porções de escravos e marcando-os com uma marca que mandou fazer”.

Tudo isso impedia identificar que parte de seus bens lhe pertenciam ou não. Entre os seus papéis achou-se por exemplo uma letra de 419$000 réis, sacada por António José de Castro, a pagar a sessenta dias depois da chegada da corveta São Domingos valor “que é por outra igual quantia que ao fazer e assinar desta recebi do senhor Joaquim da Silva Braga para compra de escravos que de minha conta e minha companhia levo carregados”. Note-se que Braga vendeu fazendas a Castro, que, por sua vez, carregou escravos por sua conta e risco. Como consignatário de Rodrigues, Braga limitava-se nessa transação a vender mercadorias que seriam pagas, muito provavelmente em dinheiro, sessenta dias após a chegada da corveta no Rio de Janeiro.40 40 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 388, pc. 1. Pela operação, possivelmente receberia uma comissão.

Analisada pela perspectiva da consignação, isto é, propriedade, investimento e risco, todas essas transações mercantis aparecem com um grau de complexidade bem maior, que deveria ser separado do estudo do crédito ou não ser simplesmente reduzido a ele. Os direitos de propriedade e o risco eram identificados com exatidão em cada uma das transações. É o caso de Ribeiro, que podia limitar-se estritamente à venda das fazendas enviadas do Rio de Janeiro, pelo que não parece correr risco nenhum, ganhando uma comissão, ou decidir-se as “tomar para mim”, passando assim de consignatário a devedor. Nesse caso, os escravos eram enviados para o Rio de Janeiro por sua conta e risco.

De um porto para outro: os barcos e os mil e um proprietários

Introduzir na análise a perspectiva da consignação permite levantar algumas dúvidas sobre conclusões há muito tempo aceitas, baseadas em leituras com marcos conceituais pouco definidos e que, portanto, podem conduzir a possíveis erros interpretativos. Com base essencialmente nos dados disponíveis sobre a entrada de navios no porto do Rio de Janeiro, tem-se proposto que um número muito reduzido de negociantes controlava o tráfico transatlântico, situação que se diferenciava nitidamente da reexportação de escravos para o interior do Brasil. Admite-se sem oferecer explicação nenhuma que os que atuavam como consignatários eram, portanto, os donos da carregação, navio e armação, sem reparar que nauclerus, emporos e usurero (proprietário do navio, comerciante, e dono do capital) não necessariamente se confundiam. Pelo menos depois de 1808, quando os dados disponíveis são levantados, nomeadamente pela Gazeta do Rio de Janeiro, a operação ali documentada reduz-se à entrada de barcos consignados a um negociante em particular. Confundir isso com a propriedade de todos os escravos, o financiamento da armação e a propriedade da carga conduzida para África é um grave erro, o que não nega ter havido concentração ou grandes traficantes. O exemplo que será mostrado, busca, portanto, chamar a atenção para a necessidade de ler as bases de dados disponíveis com maior precisão conceitual.

Nas operações descritas entre Alves e Riberio, o primeiro consignava fazendas e, no final da década, aparece também armando navios para o resgate de cativos, quando utilizava duas embarcações de sua propriedade, sendo difícil determinar em que momento teria dado início a essa atividade. Nos anos de 1817 e 1818, quando de sua falência, suas duas embarcações fizeram várias viagens para Cabinda: a Feliz Eugenia saiu de Rio de Janeiro em 26 de setembro de 1817, voltando em 11 de fevereiro de 1818, com 596 escravos, para novamente sair em 3 de março, carregando na sua volta, em 22 de novembro, mais 479 escravos; por sua vez, a Feliz Carlota saiu do Rio de Janeiro em 13 de setembro de 1817, voltou em 22 de março de 1818 de Cabinda com 287 escravos e fez mais uma viagem para África, retornando ao Rio de Janeiro em 14 de novembro com 265 cativos.41 41 Trans-Atlantic Slave Trade Database, n. 75, 108, 63, 105. Ao analisar os papéis da casa falida nota-se que, além de muitas letras, Alves tinha sacado “diversas mais por fazendas compradas para a negociação dos dois navios”.42 42 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 363, pc. 1. Ainda que fosse o proprietário das embarcações, dependia amplamente do crédito para o financiamento da carregação necessária para comprar cativos.

Esse mercado de crédito precisa de ser estudado, o que implica, sem dúvida, associar o financiamento das armações com redes de crédito globais, e não estudá-lo exclusivamente como um negócio dependente do potentado de homens de grosso trato do Rio de Janeiro. Semelhantemente a Alves, é muito provável que Elias A. Lopes recorresse a amplas redes de crédito para financiar suas armações, pois, quando da sua morte, em 1815, ele aparece com quantidades importantes de fazendas da Ásia depositadas na alfândega da cidade, atingindo mais de 40:000$000 réis, propriedade de um grande negociante da praça, que eram comumente utilizados para demostrar o poderio do grupo mercantil local, assim como o controle que exercia sobre o comércio de escravos. A conclusão, contudo, não é totalmente adequada (FLORENTINO, 1997FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das letras , 1997., p. 126), pois o inventário de dívidas e letras mostra indubitavelmente que essas mercadorias tinham sido compradas poucos meses antes da morte de Lopes e que, para comprá-las, o negociante tinha sacado várias letras a pagar no prazo de um ano. Quase 80% do valor das fazendas da Ásia (que perfaziam 20% do valor total dos bens) depositadas na alfândega não era composto por bens de Lopes, mas simplesmente crédito.43 43 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 348, pc. 1. Pelo menos 50% das ditas dívidas pertenciam a negociantes portugueses sediados em Lisboa e na Índia.

Essa informação indica que as armações muito comumente dependiam de letras e que o mercado de crédito era fundamental para o financiamento de operações mercantis. Desse modo, não seria estranho que mesmo apólices de seguros fossem pagas logo após as embarcações voltarem e os escravos serem vendidos. Essas redes de crédito achavam-se longe de estar confinadas a um “capital local”, pelo contrário, funcionavam por se acharem inseridas em redes maiores.

O exemplo de Joaquim do Rosário Monteiro ilustra com bastante claridade como aconteciam as armações de navios para as negociações da África. Logo após a morte de Monteiro, seu genro fez uma viagem para o Rio de Janeiro, buscando ajustar as contas com o sócio do sogro, Custódio de Souza Guimarães. Segundo o testamenteiro, Guimarães tinha demorado muito tempo para entregar as contas e quando o fez essas não correspondiam à realidade. Além dos desajustes, a embarcação do negociante do Rio de Janeiro tinha sido capturada pelos ingleses no Cabo da Boa Esperança e Guimarães tinha cobrado o dinheiro da indenização. Mesmo com grandes dificuldades para ler e interpretar corretamente os livros de contas apresentados aos juízes, as operações de Monteiro e Guimarães esclarecem com alguma exatidão quem assumia o risco e mantinha a propriedade em cada uma das diferentes operações.

Em 1812, Guimarães enviou para Moçambique um estado de contas autenticado em cartório e, além disso, o sócios fizeram um ajuste de contas, em 1815, dessa vez por petição do testamenteiro. As partidas achadas no ajuste feito em 1812 (as quais começavam em 1809) não concordavam com as do ajuste de 1815, demonstrando que, além de aparecerem mais partidas do que as declaradas em 1809, Guimarães tinha carregado valores relativos a comissões e juros. Segundo o testamenteiro, o consignatário tinha procedido a “extorquir a seu arbítrio as escandalosas corretagem e juros”, mas os livros de contas dos sócios escrituravam informação de atividades comerciais diferenciadas: mesmo se os dois negociantes eram sócios em algumas empreitadas, Guimarães era consignatário de Monteiro para a chegada dos seus barcos ao porto carioca e os negócios eram bastante confusos, pois envolviam duas embarcações: o Restaurador e o Providente.

O testamenteiro recusava uma partida equivalente a 8:000$000 e 13:000$000 réis que Guimarães pretendia e que, segundo ele, correspondia a diferentes operações, entre as quais 600$000 réis de comissão pelo Providente e mais 3:000$000 réis de juros gerados por diversas partidas. Apesar de terem sociedade no Restaurador, Guimarães só atuava como consignatário de Monteiro nas negociações do Providente,44 44 Trans-Atlantic Slave Trade Database, n. 19.371; 49.064; 7.094. serviço pelo qual obtinha uma comissão. É possível deduzir isso, uma vez que o genro não aceitava uma partida de 1:019$500 réis de dívidas por cobrar vendas de escravos, “por quanto as ordens que acompanharam as remessas não eram para vender fiado mas sim expressamente a dinheiro”.

Em 21 de junho de 1809, a galera Restaurador saiu do Rio de Janeiro com destino a Moçambique, voltando no dia 28 por ter feito aguada. Nessa ocasião, Monteiro tinha feito uma companhia com Joaquim Pereira d’Almeida e, precisando de dinheiro para costear a expedição, Guimarães concordou em tomar partes iguais na nova negociação “porque de outra sorte não tinha mais com que lhe satisfazer 6:000$000 réis ou mais que até então lhe devia”. É de grande interesse a organização da armação e a quantidade de escravos carregados em Moçambique. Os dois carregaram fazendas por 9:557$983 réis e Monteiro comprou as mercadorias sacando quatro letras (Tabela 3).

Tabela 3
Valor das mercadorias compradas por Joaquim do Rosario Monteiro, galera Restaurador, 1811

Em razão do Restaurador ter sido capturado pelos ingleses no Cabo da Boa Esperança, dispõe-se do livro de carga do navio e, portanto, do total de escravos embarcados. No livro indica-se o dia 26 de novembro de 1811 e que o navio deixou o porto levando 502 escravos (Tabela 4), porém é necessário enfatizar que estes não correspondiam exclusivamente à negociação Guimarães-Monteiro e, mesmo se 71% do total dos cativos fossem por conta e risco deles, os 29% restantes faziam o trato por conta e risco de outros remetentes, gerando, portanto, frete para o dono do navio. A negociação na verdade incluía dezessete remetentes e vinte destinatários e, se tivesse chegado a seu porto de destino, a galera apareceria na Gazeta consignada a um só negociante (Guimarães), o que levaria ao levantamento de conclusões como a que sugere que existiria uma concentração do negócio em um reduzido grupo de homens de grosso trato. Além disso, como bem demostra o caso de Monteiro, não é possível atribuir a propriedade e o financiamento de todos os vasos que aparecem consignados ao nome de Guimarães na Gazeta da cidade.

Tabela 4
Escravos carregados no navio Restaurador, 1811

Outras embarcações parecem apontar para a validade de tal hipótese, para a qual se fazem necessárias mais pesquisas. O brigue Boa Hora, cujo proprietário era Manoel Gomes Correia, saiu da Bahia com destino à Costa da Mina, de onde voltou em junho de 1813 com 390 escravos de 394 embarcados. Desses 394 escravos, 122 iam a conta e risco de 32 proprietários, entre os quais alguns carregados pela equipagem. Isso quer dizer que do total, 70% dos escravos navegava por conta e risco do senhorio e caixa do brigue.45 45 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 435, pc. 2. Fica ainda por estudar como esse grande número de interessados traficava entre ambos os lados do Atlântico, mas há mais evidências, pois, segundo Silva (2010)SILVA, Daniel Barros Domingues da. The supply of slaves from Luanda, 1768-1806: records of Anselmo da Fonseca Coutinho. African Economic History, Madison, v. 38, p. 53-76, 2010. Disponível em: <https://www.jstor.org/stable/41756131>. Acesso em: 26 set. 2019.
https://www.jstor.org/stable/41756131...
, é possível concluir que os negociantes teriam feito os envios de escravos carregando-os em grupos em diferentes navios. Assim, para o período 1768-1806, ele supõe, ao analisar os livros de contas de Anselmo Coutinho, que o negociante teria enviado uma média de cinquenta homens escravizados em cada navio e quase a metade de suas remessas eram somente de um a dez escravos (SILVA, 2010SILVA, Daniel Barros Domingues da. The supply of slaves from Luanda, 1768-1806: records of Anselmo da Fonseca Coutinho. African Economic History, Madison, v. 38, p. 53-76, 2010. Disponível em: <https://www.jstor.org/stable/41756131>. Acesso em: 26 set. 2019.
https://www.jstor.org/stable/41756131...
, p. 53-76). Essa evidência, sem dúvida, de alguma maneira é contraditória com a ideia de que uma concentração da propriedade teria ocorrido. É possível pensar que uma maior concentração consolidou-se ao avançar do século XIX, porém o fenômeno deveria ser explicado mais claramente, com sólida evidência empírica. São hipóteses a serem comprovadas se, de fato, o Middle Passage foi uma oportunidade para uma maior quantidade de agentes e se a suposta concentração deve ser revisada.

Pode-se finalizar o texto com o exemplo de José António d’Oliveira, que carregou em vários navios fazendas por sua conta e risco e a consignar ou entregar a Vitorino da Costa Almeida e a Manuel Lopes da Silva em Moçambique.46 46 ANRJ, Junta do Comércio, cx. 445, pc. 3. Como resultado dessas remessas, 25 escravos foram enviados na Elisabeth, embarcação presa pelos ingleses no Cabo da Boa Esperança. Para provar suas perdas, Oliveira apresentou ampla documentação, incluindo faturas e cartas que tinha recebido e enviado para ou desde Moçambique. Numa delas, datada de 24 setembro de 1812, Silva informava Oliveira de sua chegada no dia 5 de outubro, contando-lhe que logo depois de ter chegado tinha ido a casa de Almeida para lhe entregar as cartas escritas pelo próprio Oliveira. Dado que nesse dia não conseguiram conversar, voltou no dia seguinte. Silva dava-lhe conta das palavras que Almeida tinha empregado ao dizer-lhe “que era asneira e tolice mandar aquelas coisas para Moçambique”, e que logo devia ficar esclarecido que não “faria nada a seu beneficio despropositando (porque merecia uma outra resposta) disse-lhe que somente a vista disso via que ele não fazia em Moçambique por vossa mercê o que vossa mercê fazia no Rio a bem dos seus interesses”. Devido à negativa de Almeida em aceitar a consignação das fazendas de Oliveira, os dois decidiram que Silva as tomaria e beneficiaria seguindo as ordens do proprietário no Rio de Janeiro. Há outras cartas nas quais se adiantava a Oliveira o estado dos negócios de suas fazendas, onde o consignatário se queixava das dificuldades para a venda e salientava todos os esforços feitos por ele para evitar qualquer perda (“grande diligência que fiz, porém, não pude alcançar maiores preços em consequência do mal estado da terra”). Já no final de outubro, informava o produto da venda das fazendas, tinha comprado até esse momento trinta escravos, 25 dos quais seriam embarcados na Elisabeth e, junto com os escravos, enviava duas contas de venda em que ficava esclarecido o produzido pelas fazendas consignadas.

Conclusões

Uma análise dos fundamentos institucionais do tráfico de escravos permite levantar novas questões sobre conclusões e consensos há muito tempo aceitos. Este texto propôs que o Atlântico deveria ser analisado numa perspectiva maior, conectado não só com o financiamento das negociações da Ásia, mas também com a América espanhola, indo além dos modelos triangular e bipolar. É, sem dúvida, o aprovisionamento de têxteis manufaturados na Índia, mercadoria indispensável para o comércio, que permite concluir que este estava longe de ter sido financiado e controlado por negociantes locais e que os circuitos de circulação de capital que o sustentavam conheciam fronteiras que iam bem além do Atlântico Sul.

Uma análise institucional permite igualmente levantar pelo menos duas hipóteses. Em primeiro lugar, é necessário conectar o financiamento do tráfico de escravos com o das negociações de Ásia, ressaltando as peculiaridades dos instrumentos mercantis neles utilizados. O amplo recurso à letra de risco no segundo caso é só um dos exemplos que permitem refletir sobre as múltiplas funções e operações dos agentes envolvidos. Os metais carregados nos navios da Ásia por negociantes sediados no Rio de Janeiro não necessária e exclusivamente lhes pertenciam ou eram por eles investidos na compra de têxteis, visto que as negociações eram bem mais complexas e remetem a diversos mecanismos que deveriam ser estudados. Em segundo lugar, analisar as negociações entre Brasil e África pela perspectiva da consignação leva a análises bem mais complexas, que, além de alertar sobre os problemas de agência, questionam claramente a ideia segundo a qual tais negociações estariam sendo controladas e financiadas por um pequeno grupo de negociantes de grosso trato. Inquestionavelmente, em lugar de salientar a suposta superioridade do capital local, seria necessário começar a pesquisar o mercado de crédito (mecanismos e instituições) que suportava o financiamento do tráfico, o que, por sua vez, deixa espaço para novas explicações do porquê de os navios aparecerem consignados a um reduzido número de comerciantes. Porém, para responder a essas questões, é necessário serem feitas mais investigações.

  • *
    Todas as obras e todos os documentos utilizados na pesquisa e na elaboração do artigo são citados nas notas e na bibliografia. O artigo não foi publicado em plataforma de pre-print.
  • 1
    Ver, por exemplo: Lovejoy e Richardson (1999, p. 333-355)LOVEJOY, Paul & RICHARDSON, David. Trust, pawnship, and Atlantic history: the institutional foundations of the Old Calabar slave trade. The American Historical Review, Cambridge, v. 104, n. 2, p. 333-355, 1999. Disponível em: <https://bit.ly/2P8k9W2>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.1017/S0021853714000073.
    https://bit.ly/2P8k9W2...
    , Haggerty (2009, p. 817-834)HAGGERTY, Sheryllynne. Risk and risk management in the Liverpool slave trade. Business History, Abingdon, v. 51, n. 6, pp. 817-834, 2009. Disponível em: <https://bit.ly/2J9QKqu>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.1080/00076790903266844.
    https://bit.ly/2J9QKqu...
    , Pearson e Richardson (2008, p. 765-780)PEARSON, Robin & RICHARDSON, David. Social capital, institucional innovation and Atlantic trade before 1800. Business History , Abingdon, v. 50, n. 6, p. 765-780, 2008. Disponível em: <https://bit.ly/2W1DWHP>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.1080/00076790802420336.
    https://bit.ly/2W1DWHP...
    . Sobre fundamentos institucionais, ver: Van Doosselaere (2006)VAN DOOSSELAERE, Quentin. Commercial agreements and social dynamics in medieval Genoa. Cambridge: Cambridge University Press, 2006., Greif (2006)GREIF, Avner. Institutions and the path to the modern economy: lessons from the medieval trade. Cambridge: Cambridge University Press , 2006., Greif (2000, p. 251-284)GREIF, Avner. The fundamental problem of exchange: a research agenda in historical institutional analysis. European Review of Economic History, Cambridge, v. 4, n. 3, p. 251-284, 2000. Disponível em: <https://bit.ly/2pEwc2r>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.1017/S1361491600000071.
    https://bit.ly/2pEwc2r...
    , Greif et al. (1994, p. 745-776)GREIF, Avner et al. Coordination, commitment, and enforcement: the case of merchant guilds. Journal of Political Economy, Chicago, v. 102, n. 4, pp. 745-776, 1994. Disponível em: <https://www.jstor.org/stable/2138763>. Acesso em: 26 set. 2019.
    https://www.jstor.org/stable/2138763...
    , Williamson (1985)WILLIAMSON, Olivier. The economic institutions of capitalism. New York: The Free Press, 1985..
  • 2
    Para além do trabalho de Miller (1988)MILLER, Joseph. Way of death: merchant capitalism and the Angolan slave trade, 1730-1830. Madison: University of Wisconsin Press, 1988., estudos recentes têm chamado mais uma vez a atenção à necessidade de se pesquisar a participação dos negociantes lisboetas (Bohorquez; Menz, 2018BOHORQUEZ, J. & MENZ, Maximiliano. State contractors and global brokers: the itinerary of two Lisbon merchants and the transatlantic slave trade during the eighteenth century. Itinerario, Cambridge, v. 42, n. 3, p. 403-429, 2018. Disponível em: <https://bit.ly/2J9Mual>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.1017/S0165115318000608.
    https://bit.ly/2J9Mual...
    , p. 403-429).
  • 3
    O tema tem sido amplamente estudado por Curto (2002, p. 352)CURTO, José. Álcool e escravos: o comércio luso-brasileiro do álcool em Mpinda, Luanda e Benguela durante o tráfico de escravos (1480-1830) e seu impacto nas sociedades da África Central Ocidental. Lisboa: Vulgata: 2002.. Para o sobreavaliado papel da cachaça ver Menz e Acioli (2008, p. 68-70)ACIOLI, Gustavo & MENZ, Maximiliano. Resgate e mercadorias: uma análise comparada do tráfico luso-brasileiro em Angola e na Costa da Mina (século XVIII). Afro-Ásia, n. 37, p. 43-73, 2008. ISSN 0002-0591. Disponível em: <https://bit.ly/33QHxeK>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://dx.doi.org/10.9771/1981-1411aa.v0i37.21152.
    https://bit.ly/33QHxeK...
    .
  • 4
    Ferreira (2001, p. 340-378)FERREIRA, Roquinaldo. Dinâmica do comércio intracolonial: Geribitas, panos asiáticos e guerra no tráfico angolano de escravos (século XVIII). In: FRAGOSO, João et al (ed.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII) . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2001, p. 340-378., baseado em arquivos portugueses e brasileiros, foi o primeiro a analisar o papel das fazendas da Ásia. Para outras regiões da África: Roberts (1994, p. 117-145)ROBERTS, Richard. West Africa and the Pondicherry textile industry. The Indian Economic & Social History Review, Thousand Oaks, v. 31, n. 2, p. 117-145, 1994. Disponível em: <https://bit.ly/33U3Qjp>. Acesso em: 26 set. 2019. doi: http://doi.org/10.1177/001946469403100201
    https://bit.ly/33U3Qjp...
    .
  • 5
    As ideias desta seção retomam-se de Bohorquez ([2020])BOHORQUEZ, J. Linking the Atlantic and Indian Oceans: Asian textiles, Spanish silver, global capital, and the financing to the Portuguese-Brazilian slave trade (ca. 1760-1808). Journal of Global History, [2020]. No prelo..
  • 6
    Para as armações da Índia e a informação quantitativa ver Guinote et al. (2002)GUINOTE, Paulo et al. As armadas da Índia. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2002..
  • 7
    Arquivo Nacional Torre do Tombo (ANTT), Junta do Comércio, Livro 121, f., 122v.-125r.
  • 8
    Provas documentais em Bohorquez (2016, p. 111)BOHORQUEZ, J. Globalizar el sur: la emergencia de ciudades globales y la economía política de los imperios portugués y español: Rio de Janeiro y La Habana durante la Era de las Revoluciones. Tese de doutorado em História, European University Institute, Florencia, 2016..
  • 9
    A alta taxa de juros se deve ao tempo necessário para o pagamento, que nas armações da Ásia era extremadamente longo, e não era elevada se se considera que o proprietário do capital corria o risco, sendo paga unicamente com o sucesso da expedição. Um exemplo de letra de risco: “Lisboa 22 maio 1780. Um conto e vente mil réis a sessenta dias depois de ter chegado a salvamento ao porto desta cidade o navio San Boaventura de que é senhorio Manuel Caetano de Mello e capitão Plácido Rodrigues que de presente está para seguir viagem em direitura aos portos da ilha da Madeira deste ao da Bahia e daquela aos da costa de Coromandel, China e alguns na costa de Malabar não sendo o de Goa nem aos que ficam desta para o norte e de volta em direitura para esta cidade de Lisboa com escala por Benguela ou Angola outro porto de América em que tomar refresco, outro qualquer navio que vier em lugar deste a conduzir as nossas fazendas, pagaremos nos abaixo assinados ao senhor Bento Alves da Cunha a quantia de um conto cento e vento mil réis que são procedidos de oito centos mil reis que ao fazer e assignar esta recebemos do dito senhor em dinheiro de contado e corrente neste reino para empregarmos em fazendas para o nosso particular negócio as quais levamos carregados no dito navio por o risco que o dito senhor lhe vai correndo de ida e volta sobre as ditas fazendas de nossa conta e mercê de mar fogo calcário inimigo e falso amigo (…) a tomamos sobre nós e lhe damos de premio quarenta por cento que junto ao capital faz a sobre dita quantia de um conto cento vente mil réis, e o dito risco principiara a correr desde que o dito navio levar a sua primeira ancora e se fizer à vela” (ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 4 n. 5 cx. 272).
  • 10
    ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 6 n. 5 cx. 270.
  • 11
    Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), Índia, cx. 340.
  • 12
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 134, f., 189v.-190r., 205r.-206v.
  • 13
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 196; 191.
  • 14
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 134, f., 105r.-106v.
  • 15
    AHU, Rio de Janeiro, doc. 13.699; doc. 13.951; AHU, Pará, doc. 8.197; doc. 8.400; AHU, Pernambuco, doc. 17.563; ANTT, Juízo Índia e Mina, mç. 58 n. 7 cx. 182; ANTT, JC, L. 128 f., 24v-25v; L. 130 f., 63r-68v, 100r; L. 131 f. 161v-163r; L. 133 f., 31v -33v, 178v-182r; L. 132, f., 145r-v.
  • 16
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 122, f. 144v.-147r.
  • 17
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 130, f.,143r-v.
  • 18
    Por exemplo, quando a coroa quis incentivar o envio de escravos para o Pará, os negociantes de Benguela disseram que não tinham capital para assumir semelhante risco e que seus fundos não admitiam o giro, pois no Pará pagavam-se os escravos em gêneros que só em Lisboa eram vendíveis e que, para dessa cidade irem às fazendas de giro, era necessário um fundo de 200,000 cruzados, “o que o presente aqui nenhum tinha por si só” (AHU, Angola, d. 12).
  • 19
    ANTT, Ministério dos Negócios Estrangeiros, mç. 258 cx. 955.
  • 20
    ANTT, Junta de Comércio, Livro 138, f.,138r-145v.
  • 21
    ANTT, Companhia de Pernambuco e Paraíba, Livro 289.
  • 22
    Como tem mostrado Ferreira (2001, p. 364)FERREIRA, Roquinaldo. Dinâmica do comércio intracolonial: Geribitas, panos asiáticos e guerra no tráfico angolano de escravos (século XVIII). In: FRAGOSO, João et al (ed.). O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII) . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2001, p. 340-378., há casos de expedições que “dependiam de letras passadas no Rio”.
  • 23
    Arquivo Nacional do Rio de Janeiro (ANRJ), Junta do Comércio, cx. 377, pc. 1.
  • 24
    ANTT, Ministério do Reino, mç. 678, doc. 29.
  • 25
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 131, f., 115v., 132v-133v.
  • 26
    ANTT, Junta do Comércio, Livro 125 f., 74v-77r. Ver também Pinto (2002, p. 39)PINTO, Celsa. A commercial resurgence, 1770-1830. Telichery: Irish, 2002..
  • 27
    ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 2 n. 5 cx. 189.
  • 28
    AHU, Angola, cx. 86 doc. 16; cx. 103, doc. 62.
  • 29
    AHU, Rio de Janeiro, d. 12207. Nesse sentido é de interesse o caso de Francisco José da Costa, que entregou a Francisco José de Melo uma carregação correspondente a 219$870 réis que deveria levar para Angola e lá vender para empregar o produto na compra de escravos que “deveria remeter para o Rio de Janeiro a João Gomes Barroso procurador da mesma corveta daquela cidade e dela então ver remetido o produto dos escravos em efeitos da terra” (ANTT, Juízo da Índia e Mina, mç. 7, n. 2, cx. 194).
  • 30
    ANTT, Cartório de Lisboa 2do, Livro 629 cx. 133, f. 90r. Ver também Livro 627 cx. 132, ff. 89r-90r.
  • 31
    Sobre os negócios de Bernardo Nunes Portela ver: ANTT, Inventários orfanológicos, Letra B, mç. 23, n. 7; Junta do Comércio, Livro 132, ff. 94r-v; Juízo Índia e Mina, mç. 11, n. 1, cx. 198; mç. 26, n. 14, cx. 213; mç. 39, n. 5, cx. 226; mç. 28 n. 2 cx. 215; AHU, Angola, cx. 80, doc. 57; cx. 81, doc. 25, 42- 43; cx. 100, doc. 14; cx. 102, doc. 21; cx. 107, doc. 19; cx. 108, doc. 4.
  • 32
    AHU, Angola, cx. 81, doc. 25.
  • 33
    ANTT, Ministério do Reino, mç. 605.
  • 34
    AHU, Angola, cx. 107, dc. 30.
  • 35
    AHU, Angola, cx. 77, dc. 86.
  • 36
    AHU, Angola, cx. 79, dc. 14.
  • 37
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 356, pc. 2.
  • 38
    Trans-Atlantic Slave Trade Database. N. 19.348 carregando 550 escravos dos quais, ao menos, setenta iriam por conta e risco de Ribeiro.
  • 39
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 356, pc. 2.
  • 40
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 388, pc. 1.
  • 41
    Trans-Atlantic Slave Trade Database, n. 75, 108, 63, 105.
  • 42
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 363, pc. 1.
  • 43
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 348, pc. 1.
  • 44
    Trans-Atlantic Slave Trade Database, n. 19.371; 49.064; 7.094.
  • 45
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 435, pc. 2.
  • 46
    ANRJ, Junta do Comércio, cx. 445, pc. 3.

Fontes

Fontes
  • Arquivo Histórico Ultramarino, Angola, cx. 107, dc. 30.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Angola, cx. 77, dc. 86.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Angola, cx. 79, dc. 14.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Angola, cx. 80, doc. 57; cx. 81, doc. 25, 42- 43; cx. 100, doc. 14; cx. 102, doc. 21; cx. 107, doc. 19; cx. 108, doc. 4.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Angola, cx. 81, doc. 25.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Angola, cx. 86 doc. 16; cx. 103, doc. 62.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Angola, d. 12.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Índia, cx. 340.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Pará, doc. 8.197; doc. 8.400.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Pernambuco, doc. 17.563.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Rio de Janeiro, d. 12207.
  • Arquivo Histórico Ultramarino , Rio de Janeiro, doc. 13.699; doc. 13.951.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, Junta do Comércio, cx. 348, pc. 1.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro , Junta do Comércio, cx. 356, pc. 2.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro , Junta do Comércio, cx. 356, pc. 2.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro , Junta do Comércio, cx. 363, pc. 1.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro , Junta do Comércio, cx. 377, pc. 1.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro , Junta do Comércio, cx. 388, pc. 1.
  • Arquivo Nacional do Rio de Janeiro , Junta do Comércio, cx. 435, pc. 2.
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    Editado por

    Editores responsáveis: Iris Kantor e Rafael de Bivar Marquese

    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jun 2019
    • Data do Fascículo
      2019

    Histórico

    • Recebido
      11 Jul 2018
    • Aceito
      16 Maio 2019
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