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CULTURA VISUAL E FALSIFICAÇÃO DE DINHEIRO: A TRAJETÓRIA DO FOTÓGRAFO VICTOR TELLES - 1861-1906* * Agradeço ao Museu do Dinheiro do Banco de Portugal, em Lisboa, pela cessão de reproduções de cédulas falsas do seu acervo, especialmente ao técnico de museologia, Sr. João Pedro Vieira; ao pessoal do Arquivo Público do Estado de São Paulo, pela cessão de reproduções de cédulas falsas do seu acervo; aos pareceristas, que me proporcionaram tornar este artigo mais consistente. Todas as obras e todos os documentos utilizados na pesquisa e na elaboração do artigo são citados nas notas e na bibliografia.

VISUAL CULTURE AND MONEY FORGERY: THE TRAJECTORY OF THE PHOTOGRAPHER VICTOR TELLES - 1861-1906

Resumo

Este artigo discute a falsificação de dinheiro pelo viés da história pessoal de um de seus grandes ícones no século XIX: o fotógrafo Victor Telles. Para tanto, propõe-se um estudo da trajetória do português naturalizado brasileiro e seu envolvimento em acusações de falsificação de dinheiro no Brasil e em Portugal no final do século XIX. Propõe-se compreender a implicação de Victor Telles na falsificação de papel-moeda, tendo em vista a cultura visual vigente e as práticas fotográficas do período.

Palavras-chave:
Fotografia; cultura visual; Victor Telles; falsificação de dinheiro; moedeiro falso

Abstract

This article discusses money forgery by addressing the personal trajectory of one of its main icons in the nineteenth century: the photographer Victor Telles. To do so, I begin by outlining an analysis of the photographer’s personal trajectory, who was born Portuguese and naturalized Brazilian, and his involvement in several charges of forgery both in Brazil and Portugal at the end of the nineteenth century. I aim to understand the implications of Victor Telles in the forgery crime, focusing on the prevailing visual culture at that time, as well as the photographic practices in the same context.

Keywords:
Photography; visual culture; Victor Telles; money forgery; illegal money producer

Introdução

No século XIX a falsificação de dinheiro foi definida como crime de moeda falsa e abrangia tanto a moeda metálica como a de papel.1 1 Artigo apresentado como produto final do pós-doutorado realizado no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense (UFF), sob supervisão da profa Dra Ana Maria Mauad, com etapa de pesquisa cumprida em Portugal viabilizada por meio do vínculo com a Universidade Nova de Lisboa (UNL), sob supervisão da profa Dra Maria Margarida Ribeiro de Medeiros. Significativa parte do trabalho foi realizada no âmbito do projeto de pesquisa intitulado “Fotógrafos, retratistas e litógrafos e o envolvimento no crime de moeda falsa, 1840-1900”, que contou com apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) por meio do programa Primeiros Projetos (Processo APQ-01013-14), e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), conforme convênio registrado no Siconv (793988/2013). Tal como hoje, era preciso uma legislação que inibisse as falsificações e punisse os falsificadores, divulgando ainda as falsificações existentes no mercado.2 2 As punições ao crime de moeda falsa estavam previstas no Código Criminal do Império e na Lei nº 52, de 3 de outubro de 1833. A partir dessa lei, as penas foram cumpridas na ilha de Fernando de Noronha. No entanto a falsificação ocupa, no contexto do século XIX, um lugar distinto no imaginário social. A leitura dos jornais da segunda metade desse século revela que a expressão moeda falsa é usada para caracterizar falsidades, enganos e traições. A expressão aparece em debates de caráter político, em críticas literárias, em folhetins, em anedotas, em pequenas histórias, em frases exemplares. Nesse contexto, o moedeiro falso era um personagem que mobilizava as atenções sociais, tendo sido, por exemplo, objeto de interesse em romances, alguns deles publicados em folhetins do período.

Dentre os diversos sujeitos implicados na falsificação de dinheiro naquela época, os mais interessantes são aqueles envolvidos com a produção de imagens: litógrafos, pintores (muitas vezes tratados como retratistas) e fotógrafos. Acredito que o trato com a produção de imagens facilitou a execução das falsificações. De modo especial, interessa-me discutir, neste artigo o envolvimento de fotógrafos com o crime. O caso do fotógrafo Victor Telles permite debater alguns aspectos do problema, em especial, situá-lo na cultura visual do período. Para tanto, será apresentada sua trajetória, procurando relacionar suas experiências individuais com o contexto histórico no qual viveu, contribuindo assim com um viés pouco explorado nos estudos sobre a história da fotografia.

É necessário destacar que o envolvimento de fotógrafos, pintores, litógrafos e gravadores com o crime de moeda falsa é assunto pouco pesquisado. Todavia, as pesquisas de dois autores são fundamentais para a discussão do assunto: Francisco Ferreira Júnior (2013)FERREIRA JÚNIOR, Francisco. Cândido Ribeiro: - pintor, falsário e degredado em Guarapuava - século XIX. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 27, 2013, Natal. Anais. Natal: ANPUH, 2013. Disponível em: <https://bit.ly/2kFmPNJ>. Acesso em: 10 mar. 2014.
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estuda o envolvimento do pintor português José Maria Cândido Ribeiro com falsificação de dinheiro nas décadas de 1840 a 1860, destacando, principalmente, o funcionamento da justiça no período e seu entrelaçamento com as questões políticas. Já Diego Galeano (2017)GALEANO, Diego. Un artista del delito: la circulación de moneda falsa entre el Rio de la Plata y Brasil. In: CAIMARI, Lila & SOZZO, Máximo (org.). Historia de la cuestión criminal en América Latina. Rosario: Prohistoria Ediciones, 2017, p. 195-233. discute o caso do fotógrafo francês Georges Raimbault e suas reincidentes falsificações de dinheiro no Brasil, Uruguai e Argentina, entre 1899 e 1933. Em minhas pesquisas, além de Victor Telles encontrei outros fotógrafos envolvidos com o crime, bem como menções ao uso da fotografia como método para reprodução de cédulas. No entanto, essas ocorrências serão tratadas em outras oportunidades.

O envolvimento de Victor Telles com o crime de moeda falsa pode ser acompanhado pelas notícias publicadas nos jornais do Brasil e de Portugal entre os anos de 1877 e 1890, e em três processos crime: um corrido em São Paulo, entre 1877 e 1878; outro no Rio de Janeiro, entre 1881 e 1883; e outro desenrolado em Coimbra, Portugal, entre 1886 e 1890. As acusações de falsificação de dinheiro contra Telles abrem caminho para explorar usos e apropriações das técnicas fotográficas disponíveis na época, principalmente no que tange às novas formas de reprodução de imagens, possibilitando problematizações em torno da cultura visual do período.

Interessa-me abordar aspectos da vida de Victor Telles (mas sem realizar uma biografia), em consonância com algumas proposições de Bourdieu (2000)BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, Marieta de Moraes & AMADO, Janaína (org.). Usos & abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2000, p. 183-191. e Levi (2000)LEVI, Giovanni. Os usos da biografia. In: FERREIRA, Marieta de Morais & AMADO, Janaina. Usos & abusos da história oral . Rio de Janeiro: Editora FGV, 1998, p. 167-182.. Tomamos de Bourdieu (Op. cit., p. 189) a noção de trajetória: “série de posições sucessivamente ocupadas por um mesmo agente (ou um mesmo grupo) num espaço que é ele próprio um devir, estando sujeito a incessantes transformações”. Isso evita a ideia de biografia como uma sucessão de acontecimentos coerentes e previsíveis comuns nas “histórias de vida”. Já Levi, conforme destaca Ferreira Júnior (2017, p. 17)FERREIRA JÚNIOR, Francisco. O rei dos falsários: a trajetória de um moedeiro falso no Brasil Imperial (1830-1861). 2017. Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017., “não ignora a importância do contexto e das estruturas sociais, que atuam na orientação dos sujeitos em forma de habitus e campos” (grifos do autor), como propõe Bourdieu, “mas também propõe levar em consideração as descontinuidades do eu biográfico através das incertezas, da racionalidade limitada e da incoerência interna dos sistemas normativos”. Ou seja, neste caso, acompanhar alguns aspectos da vida de Victor Telles consiste numa aproximação das sociedades nas quais ele viveu, todavia, por meio do rompimento que ele promove com as expectativas sociais que o acompanharam. Por um lado, ele era descendente de um revolucionário português que lutou contra D. Miguel em Portugal no final da década de 1820, apesar de não haver registros de atuação política em sua trajetória; por outro, era um imigrante que, em vez de ganhar posição de destaque na nova terra, ganha fama de criminoso, de moedeiro falso. Sem fazer um trabalho estrito de micro-história, adota-se aqui um de seus principais procedimentos: a redução de escala de observação (REVEL, 2010REVEL, Jacques. Micro-história, macro-história: o que as variações de escala ajudam a pensar em um mundo globalizado. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 15, n. 45, p. 434-444, set./dez. 2010. Disponível em <https://bit.ly/2Jq7bQG>. Acesso em: 20 mar. 2019. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-24782010000300003.
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), de modo a tratar de alguns problemas sociais e culturais que a trajetória de Victor Telles explicita, tendo por fio condutor seu nome próprio (GINZBURG; PONI, 1989GINZBURG, Carlo & PONI, Carlo. O nome e o como: troca desigual e mercado historiográfico. In: GINZBURG, Carlo et al. A micro-história e outros ensaios. Lisboa: Difel, 1989, p. 169-178.).

Antes de encerrar esta seção, gostaria de acrescentar mais duas discussões em torno da minha abordagem do crime de moeda falsa. A primeira se refere à noção de cultura visual. Paulo Knauss (2006)KNAUSS, Paulo. O desafio de fazer história com imagens: arte e cultura visual. ArtCultura, Uberlândia, v. 8, n. 12, p. 97-115, jan./jun. 2006. Disponível em: <http://www.artcultura.inhis.ufu.br/anteriorNr12.php>. Acesso em: 24 mar. 2019.
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, diante da variedade de enfoques teóricos propostos sobre a cultura visual, sugere a existência de dois modos de compreendê-la: um abrangente (William John Thomas Mitchell, Martin Jay, Margaret Dikovitskaya) e outro restrito (Chris Jenks, Nicholas Mirzoeff). Em consonância com a forma abrangente de pensar a cultura visual, compreendo-a como o conjunto da produção e circulação de imagens em determinada época. Como afirma Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses (2013)MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Fontes visuais, cultura visual, história visual: balanço provisório, propostas cautelares. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 23, n. 45, p. 11-36, jul. 2003. Disponível em: <https://bit.ly/2PvW63N>. Acesso em: 20 mar. 2019. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-01882003000100002.
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, está em questão reconhecer uma dimensão da cultura associada à visualidade, que engloba o visual, o visível e a visão. Em consonância com William J. T. Mitchell (2002)MITCHELL, William John Thomas. Mostrar o ver: uma crítica à cultura visual. Journal of Visual Culture, Londres, v. 1, n. 2, p. 165-181, 2002. Tradução. Disponível em: <https://bit.ly/2kquwaJ>. Acesso em: 13 mar. 2019.
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, a cultura visual é tomada aqui como construção visual do social e é pensada como maneira de estudar, como enfatiza Knauss (2006, p. 110)KNAUSS, Paulo et al. (org.). Revistas Ilustradas: modos de ler e ver no segundo reinado. Rio de Janeiro: Mauad X; Faperj, 2014., “diferentes experiências visuais ao longo da história em diversos tempos e sociedades”.

A segunda questão busca construir um enquadramento contextual para a prática da falsificação de dinheiro, compreendida também a partir das perspectivas apontadas por Miles Orvell (1989)ORVELL, Miles. The Real Thing. Imitation and authenticity in american culture, 1880-1940. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1989., que identifica na sociedade americana do século XIX a existência de uma cultura da imitação ou cultura de replicação. Nos termos do autor, a fotografia era parte integrante de uma cultura de classe média que passou a aceitar replicações de todo tipo, como o mobiliário das casas, as reproduções de obra de arte etc. Destacam Vânia Carvalho e Solange Ferraz de Lima (2012, p. 59)CARVALHO, Vânia Carneiro de & LIMA, Solange Ferraz de. Cultura visual na era da reprodutibilidade técnica da imagem. Dobra[s], Barueri, v. 5, n. 11, p. 56-66, 2012. Disponível em: <https://dobras.emnuvens.com.br/dobras/article/view/163>. Acesso em: 20 mar. 2019. Doi: https://doi.org/10.26563/dobras.v5i11.163.
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que “Havia, no século XIX, uma estreita relação entre consumo, conforto, artificialismo e ilusão, e a fotografia era parte integrante desse complexo”. Para Orvell, a imitação tornou-se uma categoria central, na qual o artifício e a natureza são partes de uma estética geral. No caso em tela - a falsificação de dinheiro -, a fotografia foi um dos meios para promover a replicação, manipulando suas características técnicas em torno da similaridade com o objeto retratado. No entanto, essa imitação, se por um lado corresponde a um movimento cultural de uma sociedade na qual o consumo está em grande expansão e, portanto, assimila as réplicas, por outro, estabelece um ponto de tensão nessa cultura na medida em que os moedeiros falsos chamam para si uma prerrogativa do Estado. Mas, de qualquer modo, é no âmbito da cultura da imitação que eles estão inseridos.

A fotografia e a falsificação de dinheiro

Antes de passarmos à análise do caso de Victor Telles, é importante tecer considerações gerais sobre o domínio das técnicas fotográficas e seu emprego na falsificação de cédulas.

É necessário ressaltar que a apreensão de dinheiro falso com os suspeitos dá aos processos mais chance de punições. O inverso também acontece: em muitos casos levantados no período, as cédulas falsas são encontradas, mas não os responsáveis pelo crime. Isto pode ser afirmado a partir da ampla pesquisa realizada nos jornais da Hemeroteca Digital Brasileira (HDB).3 3 Projeto de pesquisa intitulado “Fotógrafos, retratistas e litógrafos e o envolvimento no crime de moeda falsa, 1840-1900”, Fapemig/CNPq (APQ-01013-14). A pesquisa compreendeu uma leitura de dois jornais de cada década, entre 1840 e 1900. A partir das expressões de busca “moeda falsa”, “notas falsas” e “cédulas falsas” foram levantadas matérias jornalísticas de diferentes gêneros que tratam do assunto da falsificação de dinheiro. Ao longo do período em estudo, a Caixa de Amortização4 4 Disponível em: <https://bit.ly/2m4THzP>. Acesso em: 30 nov. 2017. emitia exames de notas falsas apreendidas em casos investigados pela polícia. Tais exames são divulgados na imprensa como forma de dar publicidade às características das cédulas falsas. De modo geral, os exames avaliavam as cédulas falsas em comparação com as verdadeiras, verificando itens como a qualidade do papel, as características dos desenhos, a qualidade das cores exibidas e a adequação das assinaturas.

Por exemplo, na análise de 24 cédulas de 20$000 réis, 6ª estampa, 4ª série, encontradas na investigação que sofreu José Pedro de Oliveira Ferreira em 1877, na Corte, evidenciou-se que as verdadeiras eram impressas “em papel de linho bastante consistente, ao passo que as falsas examinadas o são em papel de algodão e com muito pouco corpo”5 5 NOTAS falsas. O Globo, Rio de Janeiro, ano IV, n. 287, Rio de Janeiro, 28/11/1877, p. 3. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=369381&pasta=ano%20187&pesq=>. Acesso em: 23 jul. 2018. . Esse aspecto está evidenciado nas figuras 1 e 2, nas quais vemos um exemplar de nota falsa de 20$000 réis da mesma estampa aludida no processo. Ainda que o exame não tenha sido feito a partir das cédulas encontradas com o investigado, o exemplar serve para demonstrar um dos principais procedimentos adotados ao se identificar a falsificação: atestar a falsidade por meio de assinatura no verso ou anverso das cédulas.

Figura 1
Anverso de uma cédula de 20 mil réis, 6ª estampa, 5ª série, nº 60.532, do Tesouro Nacional. Fonte: Acervo Arquivo do Estado de São Paulo.

Figura 2
Verso de uma cédula de 20 mil réis, 6ª estampa, 5ª série, nº 60.532, do Tesouro Nacional. Fonte: Acervo Arquivo do Estado de São Paulo.

No entanto, esse exemplo também serve para questionar o envolvimento de fotógrafos, pintores, litógrafos e gravadores na falsificação de dinheiro. De modo bem genérico, os pintores (retratistas) dominavam técnicas de desenho, pintura e retoque; litógrafos dominavam as técnicas da impressão da gravura em pedra. Tais conhecimentos os habilitavam a trabalhar no ramo de confecção e impressão de gravuras, assim como a, em princípio, produzir uma cédula falsa, como a do exemplo das figuras 1 e 2. Mas, onde entra o fotógrafo nessa história? Seguindo o mesmo raciocínio, podemos conjeturar que o envolvimento efetivo de alguns fotógrafos com a falsificação de dinheiro pode ter sido viabilizado pelo conjunto de conhecimentos que eles tinham que dominar para exercer seu ofício.

Mas existe outro aspecto a ser considerado com relação ao conhecimento visual das notas verdadeiras. Para tanto, vamos nos valer de uma situação ocorrida em Portugal, que passou por uma reforma monetária em 1891 devido a uma crise econômica de grande envergadura. Um dos resultados dessa crise foi a alteração do padrão monetário do país. Até então, prevaleciam as moedas metálicas de ouro e prata como padrão monetário. No entanto, isso foi modificado, passando a ter curso legal e obrigatório a moeda fiduciária, ou seja, o papel-moeda. Assim, nesse contexto de mudanças dos primeiros anos da reforma - isto é, de 1891 a 1894 -, houve registro de várias falsificações de papel-moeda. Entre esses casos, identificou-se três que envolviam a fotografia e fotógrafos. De um deles, pudemos obter um exemplar das cédulas falsas. Trata-se de um papel fotográfico que foi utilizado para reproduzir uma cédula de 1$000 réis (figuras 3, 4, 5 e 6).

Figura 3
Anverso de uma cédula de mil réis, série F, nº 11.082, do Banco de Portugal. Fonte: Acervo Museu do Dinheiro/Coleção do Banco de Portugal.

Figura 4
Verso de uma cédula de mil réis, série F, nº 11.082, do Banco de Portugal Fonte: Acervo Museu do Dinheiro/Coleção do Banco de Portugal.

Figura 5
Anverso de uma cédula falsa de mil réis, série B.o, nº 12.920, do Banco de Portugal Fonte: Acervo Museu do Dinheiro/Coleção do Banco de Portugal.

Figura 6
Verso de uma cédula falsa de mil réis, série B.o, nº 12.920, do Banco de Portugal Fonte: Acervo Museu do Dinheiro/Coleção do Banco de Portugal.

A cédula falsa foi confeccionada em papel fotográfico, comprovado pelo brilho da superfície e sua gramatura. Para obter uma cédula com duas faces, tudo leva a crer que dois papéis fotográficos foram colados, sendo cada um dos lados emulsionado para receber a respectiva reprodução da cédula verdadeira. É provável ainda que esse conjunto tenha sido prensado para ganhar melhor aderência de uma face à outra. O corte bem feito nas bordas garantiu a semelhança com o original. Outra possibilidade é que o papel fotográfico tenha sido emulsionado em ambos os lados. Na comparação entre as reproduções, verifica-se que a cédula falsa apresenta deficiências em relação à verdadeira. A principal delas diz respeito às cores utilizadas: na falsa, elas estão esmaecidas; na verdadeira, estão bem definidas. Nesta, apesar de prevalecerem os tons ocres, as diferentes tonalidades são identificadas; na falsa, há certa homogeneidade de cores, principalmente no verso, dificultando a leitura do brasão. Quando as cédulas foram apreendidas pela polícia, os jornais chegaram a destacar a grosseria da falsificação, espantando-se como era possível tomá-las por verdadeiras. No entanto, é necessário lembrar que havia pouco tempo que as cédulas passaram a ter mais circulação. Eram praticamente uma novidade e, portanto, as pessoas não as conheciam suficientemente, o que facilitou a ação dos falsificadores.

Partindo desse exemplo pode-se demonstrar uma das possibilidades de uso da fotografia no período, cientes de que o mesmo método usado em Portugal não necessariamente teve sucesso no Brasil. Para ter sucesso com as falsificações, um dos pontos cruciais era dominar alguns procedimentos necessários para a produção e reprodução de imagens. No que tange ao trabalho fotográfico propriamente dito, havia a necessidade de dominar a exposição da chapa no salão de poses, bem como fazer a cópia fotográfica e seus respectivos retoques e coloração. Acrescenta-se ainda o domínio da manipulação de agentes químicos para a sensibilização de chapas e papéis e também daqueles necessários à revelação dos clichês. Mesmo que um fotógrafo não realizasse pessoalmente todas as etapas da produção de uma fotografia, teria, com certeza, que saber os fundamentos dos seus procedimentos. Alguns fotógrafos, como foi o caso de Victor Telles, aliaram o trabalho fotográfico com o trabalho na imprensa. Nesse caso específico havia também a necessidade de domínio de técnicas para a realização de matrizes para impressão e a impressão propriamente dita. A impressão de gravuras por meios fotográficos foi assunto de tratados e manuais de fotografia ao longo do século XIX, como os de Monckhoven6 6 MONCKHOVEN, Désiré Van. Traité général de photographie. 4ª edição. Paris: Librairie Victor Masson et fils, 1863. Disponível em: <https://bit.ly/2lJCcVP>. Acesso em: 23 maio 2015. , Liébert7 7 LIÉBERT, Alphonse. La photographie en Amérique. Traité complet de photographie pratique. 3ª edição. Paris: [s. n.], 1878. Disponível em: <https://bit.ly/2k89wFm>. Acesso em: 20 maio 2015. e Bentes8 8 BENTES, José Antonio. Tratado theorico e pratico de photographia. Lisboa: Livraria de A. M. Pereira, 1866. , que abordam a confecção de gravuras por métodos como fotogravura, fototipia e fotolitografia.

Com a invenção constante de sistemas fotográficos, os métodos de impressão operam, por assim dizer, na lógica da cultura da replicação. Como afirma Orvell (1989, p. 2164, tradução nossa)ORVELL, Miles. The Real Thing. Imitation and authenticity in american culture, 1880-1940. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1989., a história da fotografia pode ser pensada a partir das diversas iniciativas para superar as limitações do meio e assim reforçar o poder da representação. Ao dominar variados conhecimentos do campo da produção e reprodução de imagens, o fotógrafo produzia “coisas” e reforçava a crença presente no imaginário popular de que seu fazer era o resultado de um processo mecânico de produção objetivo, e não o resultado da “manipulação artística e experimentação tecnológica”.

Isso significa, em termos técnicos, uma dificuldade em confirmar os resultados de algumas avaliações da época, que afirmaram a falsificação de cédulas por meio da fotografia, sem ter em mãos um exemplar da nota falsa. As cédulas falsas a que a pesquisa teve acesso no Brasil não são objetos fotográficos.9 9 Nos acervos do Arquivo Público do Estado de São Paulo, do Museu do Centro Cultural do Banco do Brasil e do Museu Histórico Nacional não constam notas falsificadas diretamente em papel fotográfico. Acredito que a técnica fotográfica pode ter sido uma das etapas de preparação da falsificação, mas não necessariamente o resultado final. Ou seja, não se trata de uma fotografia da cédula, como alguns laudos podem levar a crer. Mas, de qualquer forma, também não é possível afirmar que uma falsificação semelhante à realizada em Portugal não tenha circulado no Brasil.

Outro aspecto que facilitou o envolvimento da fotografia com o crime foi o fato de que fotógrafos ambulantes, ao se deslocarem pelo país, tinham a possibilidade de se retirar do local em caso de desconfiança, dificultando assim a identificação da origem das falsificações. Isso vale igualmente para a circulação entre países, pois, como destaca Diego Galeano (Op. cit., p. 196), o crime de falsificação de dinheiro assumiu também um modo de existência transnacional. O deslocamento dos moedeiros falsos entre países da América do Sul ou entre Brasil e Europa movimentou o negócio das falsificações, obrigando as autoridades dos países envolvidos a agirem conjuntamente.

A partir dessas breves reflexões, torna-se necessário destacar que a invenção da fotografia no século XIX e seu desenvolvimento coincidiram “com o surgimento do estado político moderno. A fotografia então se tornou uma parte integral do comportamento social das instituições burocráticas do estado” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001STURKEN, Marita & CARTWRIGHT, Lisa. Practices of looking: an introduction to visual culture. New York: Oxford University Press, 2001., p. 95, tradução nossa). Desse modo, “a versatilidade da imagem fotográfica gerou um amplo espectro de atividades de construção de imagem com o propósito de vigilância, regulação e categorização” (Ibidem, p. 95, tradução nossa). No entanto, o uso de técnicas fotográficas para fins de falsificação de notas ao longo do século XIX deixa claro que o estado moderno não foi eficaz em coibir os usos não autorizados dessas técnicas. Os fotógrafos se tornam assim sujeitos ativos na configuração da cultura visual oitocentista por meio da confecção de retratos, paisagens e, em alguns casos, notas falsas que, além de serem instrumentos de trocas monetárias, são produtos visuais que podem ser vistos como gravuras que veiculam imagens com diversos significados.

O contexto da fotografia no final do século XIX

Em 1877, chegou a São Paulo o fotógrafo Victor Telles. Na mesma década, outros fotógrafos também aportaram na capital da província. Alguns, como Severino, José Vollsack, Jean Georges Renouleau e Carlos Hoenen se estabeleceram por longo período; outros, como Walter Bradley, M. de Sá Vasconcellos (GOULART; MENDES, 2007GOULART, Paulo Cezar Alves & MENDES, Ricardo. Noticiário geral da photographia paulistana: 1839-1900. São Paulo: Centro Cultural São Paulo; Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2007.) e o próprio Victor Telles têm breve estadia, sendo São Paulo provavelmente apenas um ponto de partida para suas itinerâncias. Na época, a cidade contava com o importante estabelecimento de Militão Augusto de Azevedo, a Photographia Americana.

Desde a década anterior, como observam Goulart e Mendes (Ibidem, p. 93), percebe-se a “absorção da fotografia na vida corrente”, fenômeno proporcionado pela dinamização do setor. Com relação a São Paulo, os autores indicam cinco fatores para se compreender a dinâmica da fotografia a partir da década de 1860:

1) a incorporação de novos processos de produção e reprodução da imagem fotográfica; 2) o consequente barateamento, criando maior interesse e condições de aquisição; 3) a fixação do profissional na cidade; 4) a introdução de mecanismos destinados a ampliar o uso da fotografia, em particular o estereoscópio, bem como os álbuns para armazenar retratos; 5) o início da concorrência efetiva entre os estabelecimentos (Ibidem, p. 92).

Além dos fatores próprios do mercado fotográfico já apontados, a expansão da economia cafeeira na década de 1870 é um dos motivos da atração de fotógrafos para a capital, processo possivelmente impulsionado com a implantação e expansão da ferrovia na província. Está caracterizada desde então a difusão do retrato fotográfico como “objeto de troca ou de memória pessoal” (Ibidem, p. 99), levando à ampliação do mercado para o fotógrafo. Como afirma Mauad (2004, p. 7)MAUAD, Ana Maria. Entre retratos e paisagens: modos de ver e representar no Brasil oitocentista. Revista Studium, Campinas, n. 15, 2004. Disponível em: <https://bit.ly/2m4PcFr>. Acesso em: 2 nov. 2010.
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, “o barateamento dos custos, como também a ampliação do número de fotógrafos itinerantes, ao longo do segundo reinado, amplia o mercado consumidor configurando uma clientela cada vez mais heterogênea”.

De acordo com Ilsen About (2015, p. 4)ABOUT, Ilsen. Les photographes ambulants: Conditions et pratiques professionnelles d’un métier itinérant, des années 1880 aux années 1930. Techniques & Culture, Marseille, n. 64, 2015. Disponível em: <https://bit.ly/2makWsZ>. Acesso em: 12 mar. 2019. Doi: doi.org/10.4000/tc.7611.
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, a itinerância surge em virtude das primeiras experiências com as expedições fotográficas em fins dos anos 1830 e inaugura uma prática que consiste em elaborar os meios técnicos adequados para produzir imagens em viagens e transportá-las, muitas vezes, às sedes de sociedades científicas, jornais e instituições estatais que financiavam os empreendimentos. Os fotógrafos são designados como anônimos, itinerantes, volantes, ou ambulantes (KOSSOY, 2002KOSSOY, Boris. Dicionário histórico-fotográfico brasileiro: fotógrafos e o ofício da fotografia no Brasil (1831-1910). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2002.). Segundo Ilsen About (Op. cit., p. 10), a atividade dos fotógrafos se desenvolvia entre a mobilidade e o sedentarismo, destacando-se por certa imprecisão, na medida em que o sedentarismo poderia ser intermitente e a circulação aleatória, temporária ou permanente. Os deslocamentos foram condição para o exercício e a expansão da prática fotográfica no século XIX, seja na vertente das expedições fotográficas (SEGALA, 1998SEGALA, Lygia. Itinerância fotográfica e o Brasil Pitoresco. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rio de Janeiro, n. 27, p. 62-85, 1998.; VASQUEZ, 2003VASQUEZ, Pedro Karp. O Brasil na fotografia oitocentista. São Paulo: Metalivros, 2003.) - e que as Excursions Daguerriennes são as primeiras manifestações - ou pela expansão comercial da fotografia, que no Brasil foi pioneiramente discutida por Boris Kossoy (1980)KOSSOY, Boris. Origens e expansão da fotografia no Brasil: século XIX. Rio de Janeiro: Funarte, 1980..

Victor Telles foi um dos fotógrafos itinerantes no Brasil. De muitos não se sabe mais que o próprio nome, mas de Telles sabe-se um pouco mais, devido às suas experiências na capital paulista.

Ao chegar a São Paulo, em novembro de 1877, Victor Telles, como tantos outros fotógrafos na época, apresenta-se ao público da província por meio de nota publicada no jornal.10 10 ESTUDO Photographico. Diário de S.Paulo, São Paulo, 13/11/1877, p. 1-3. Disponível em: <https://bit.ly/2kbqtyH>. Acesso em: 23 jul. 2018. Era uma prática comum aos fotógrafos itinerantes, pois “como a maioria deles não se estabelecia definitivamente nas cidades visitadas, era por meio dos jornais que eles poderiam, de modo mais eficaz, tornar sua estada nas cidades mais produtiva” (ARRUDA; IZUMI, 2015ARRUDA, Rogério Pereira de & IZUMI, Luiza. Cultura fotográfica em Diamantina (MG), 1862-1900. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, n. 467, p. 183-218, 2015. Disponível em: <https://bit.ly/2lP2kyj>. Acesso em: 30 mar. 2019.
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, p. 188). O texto, com assinatura de Victor & Comp. e redigido na primeira pessoa do plural, informa que eles vinham do Rio de Janeiro, tendo feito percurso pelas cidades cisplatinas. Informa-se que o “Estudo Photographico”11 11 Nos jornais, o estabelecimento é apresentado como “Estudo Photographico” e não como estúdio. No entanto, também usaremos a nomenclatura Estúdio para o estabelecimento de Victor Telles. funcionava na rua Direita, nº 10, e faz considerações sobre a importância do retrato12 12 Abordagens sobre os significados históricos, sociais e estéticos dos retratos no século XIX podem ser conferidos nos estudos de Lavelle (2003) e de Fabris (2004). , que, “na verdadeira acepção do termo, além da indelével lembrança que deixa-se à família ou a amigos, na dura ausência de viagens eternas, ou passageiras, constitui igualmente a perícia, e reputação do artista que o fez”13 13 ESTUDO…, Op. cit., p. 2. . A ênfase no retrato ao se apresentar tem a ver com os dois carros-chefes dos anúncios de Victor & Comp.: os retratos de crianças e os retratos ao luar. Quanto ao segundo, o anúncio explica que “é imitando os maravilhosos e bellos effeitos do luar sobre qualquer imagem, que tiramos estes retratos, verdadeira e alta novidade na arte photographica”14 14 Ibidem, p. 3. . O anúncio pode ser um indicativo de que o fotógrafo realizava experimentações em seu estabelecimento, mas pode também indicar uma maneira própria de anunciar os retratos “a la Rembrandt”, isto é, empregando-se os efeitos sombreados na fotografia, tal como ensinados em alguns manuais do período, como os de Henry Peach Robinson15 15 ROBINSON, Henry Peach. Pictorial effect in photography. Hints on composition and chiaroscuro for photographers. London: Piper & Carter, 1869. Disponível em: <https://bit.ly/2JynHeR>. Acesso em: 2 jan. 2018. e o de Liébert16 16 LIÉBERT, Op. Cit., 1878. . No caso de Robinson, ele trata os princípios da composição fotográfica como se semelhantes à pintura, mas sem deixar de levar em conta as características literais da fotografia. O fotógrafo propunha, com seus ensinamentos, um justo equilíbrio entre a mimese e o artifício para alcançar um tipo de verdade geral. Nesse sentido, a realidade do que é retratado deixa de ser tão importante, passando a ter mais valor a verdade da imitação (ORVELL, Op. cit., p. 2164). Tais iniciativas conferiam à fotografia um estatuto artístico. Ao apelar para a imitação dos “maravilhosos e bellos effeitos do luar”, o anúncio lança um apelo publicitário para chamar a atenção de sua clientela, criando um diferencial no mercado competitivo da fotografia. Na década de 1870, como afirma Grangeiro (2000, p. 60)GRANGEIRO, Cândido Domingos. As artes de um negócio: a febre photographica: São Paulo: 1862-1886. Campinas: Mercado de Letras; Fapesp, 2000., “as casas de retratos espalhadas pela cidade contavam com considerável infraestrutura para o atendimento de um público ávido por retratos”. Portanto, cabia ao Estúdio Photographico de Victor & Comp. tentar impressionar sua potencial clientela.

A primeira denúncia de falsificação contra Victor Telles

Os anúncios do Estudio Photographico continuaram a ser publicados até dezembro de 1877. Porém, não foi pelos serviços fotográficos que Victor Telles ganhou destaque nos jornais, mas pela notícia de sua prisão, em janeiro de 1878, devido a uma denúncia de falsificação de dinheiro. Isso possibilita conhecer mais alguns aspectos da trajetória do fotógrafo, já que a investigação da polícia de São Paulo ganhou repercussão em alguns jornais do país.17 17 Correio Paulistano (SP), Diário da Bahia (BA), Diário de São Paulo (SP), Diário do Rio de Janeiro (RJ), Gazeta de Campinas (SP), Gazeta de Notícias (RJ), Jornal da Tarde (RJ), Jornal do Commercio (RJ), Jornal do Pilar (AL), Monitor Campista (SP), O Cruzeiro (RJ), O Paiz (MA). Disponíveis em: <https://bit.ly/2iIR7M9>. Acesso em: 23 jul. 2018.

Inicialmente são publicados dois conjuntos de informações sobre Victor Telles: um relativo à vida do fotógrafo; outro à pretensa atividade criminosa. Do primeiro conjunto de informações, ficamos sabendo que ele era português de nascimento, tendo sido naturalizado brasileiro, casado e proveniente do Rio Grande do Sul, onde tinha família. Sobre a suposta atividade criminosa, afirma-se que ele teria se envolvido com falsificações de dinheiro e cheques em Montevidéu, no Uruguai. Todavia, é a divulgação dos resultados da investigação policial, publicados no Correio Paulistano e reproduzidos em outros jornais18 18 Diário de São Paulo, ano XIII, n. 3629, 24 jan. 1878, p. 2; Jornal do Commercio, ano LVII, n. 24, 24 jan. 1878, p. 2; Diário do Rio de Janeiro, ano 61, n. 23, 24 jan. 1878, p. 2. , que traz o teor das acusações contra Telles, seu sócio João Esprik de Verny e outros suspeitos. São 26 pontos, transcritos na íntegra do relatório do chefe de polícia, que resumem o teor das investigações e balizam a denúncia contra Telles e os demais envolvidos. A seguir, relatarei os principais aspectos do inquérito reproduzidos na matéria do Correio Paulistano.19 19 MOEDA falsa. Correio Paulistano, São Paulo, 23/01/1878, p. 1. Disponível em: <https://bit.ly/2kc3405>. Acesso em: 8 jan. 2017.

Os autos do processo, replicados na íntegra pelos jornais, informam que, em Pelotas (RS), Victor Telles era conhecido como “homem falto de recursos”, mas que em pouco tempo passou a exibir excelente condição financeira “gastando, às mãos cheias, dinheiro que não se sabia de onde vinha” Um ponto do relatório informa sobre comentários em Pelotas de que Telles era um moedeiro falso em sociedade com um alemão e, juntos, falsificavam grandes quantias do Tesouro Nacional. Em outro ponto, afirma-se que, em certo momento, ele se retirou do Rio Grande do Sul, não informando seu destino, e que também teria abandonado a mulher e seus filhos. Consta ainda no relatório que ele fora a Montevidéu procurar artistas para imprimir mil contos de réis, ou que ele partira para não voltar. Outro aspecto dá conta que sua partida é que coincidiu com a de outras pessoas do seu círculo de amizade e com o aparecimento de cédulas falsas de 100$000 réis em Pelotas. Afirma-se ainda que as chapas das cédulas de tais falsificações teriam sido vendidas por Telles. Alega-se que, no Rio de Janeiro, teria posto em circulação 100:000$000 réis com a ajuda de uma prostituta. Já em Santos, Telles teria mostrado chapas para confecção de selos e de cédulas a um amigo, bem como materiais para falsificação de moedas. Ao mesmo amigo teria tentado vender cédulas falsas de 20$000 réis, destacando que em nada se diferenciavam das verdadeiras, pois ele tinha preparativos para confeccioná-las melhor que qualquer outro no Brasil. Já sobre sua presença na cidade de São Paulo, afirma-se no relatório que Telles “é apontado, pela voz publica, como moedeiro falso, e que se elle, nesta cidade, não fabricou moeda falsa, manifestou, ao menos que tinha a intenção de fabricar”20 20 Ibidem, p. 1. .

Quanto aos seus parceiros, o relatório policial afirma que o alemão João Esprik Verny era o responsável por guardar as chapas matrizes e pela coloração das libras esterlinas, e que

Telles tem outros auxiliares operarios que são: Francisco Simon, que se emprega como operario de sua confiança em todos os trabalhos concernentes a ouro, prata, e estanho; e Caetano Ligi que aparentando empregar-se em photographia, tem por missão retocar o papel que se tem de pôr em circulação; Paulo Ottwil que é gravador, e finalmente Amarante que foi encarregado por Telles de procurar individuos que entrassem com dinheiro para a conclusão do fabrico da moeda falsa (Ibidem, p. 1).

As avaliações dos peritos e as evidências do crime

Na perícia do material apreendido, concluiu-se que as moedas e as cédulas eram verdadeiras; as chapas eram de pouco uso para retratar, mas algumas serviam para confeccionar daguerreótipo e outras para fotogravura; afirma-se que o papel de linho não tinha aplicação própria para fotografia, mas servia, como outros, para envolver clichês.21 21 PROCESSOS Criminais, Moeda Falsa, Secretaria de Polícia de São Paulo, Réus: Antônio Joaquim de Carvalho Amarante e Victor Telles Rebello, n. de ordem: 3994, notação: 1739, 1878. Acervo do Arquivo do Estado de São Paulo. No entanto, são requisitados dois laudos sobre os produtos encontrados na casa de Telles e Verny. O primeiro é assinado pelos fotógrafos Carlos Hoenen e Militão Augusto de Azevedo. Eles confirmam que os materiais encontrados possuem uso na fotografia e na fotogravura e destacam que “o systema a daguerreotypo está exaurido, porém o de photogravura ainda é novo, e que conta a elles peritos que só no Rio de Janeiro é que há dous anos de esta parte que estão trabalhando por este systema”22 22 Ibidem, p. 210-215. .

Os seis suspeitos (Victor Telles, João Esprik Verny, Francisco Simon, Caetano Luigi, Paulo Atwill e Antônio Amarante) ficam presos até fevereiro de 1878, quando são soltos devido a um habeas corpus, que os concede o direito de aguardar o processo em liberdade. A partir das investigações do delegado de polícia, o promotor público oferece denúncia somente contra Telles e Amarante, pois considera que as suspeitas contra os outros presos não têm fundamento23 23 Ibidem. . Será que o fato de os operários terem ofícios bem definidos os favoreceu? Será que Amarante, que teria uma suposta função de aliciador, oferecia mais perigo à sociedade que os demais? Segundo a denúncia, Telles teria incorrido nas penas previstas na Lei nº 52, de 3 de outubro de 1833, combinada com o artigo 34 do Código Criminal.24 24 A Lei nº 52/1833 definia o modo de recolhimento das moedas de cobre em circulação na época, devido à grande intensidade das falsificações, bem como definia as punições para os fabricadores e passadores de moeda falsa e todos os papéis de crédito. Por meio dessa lei, a ilha de Fernando de Noronha foi estabelecida como lugar da prisão dos condenados. Já o artigo 34 do Código Criminal definia as penas para os casos de tentativa de realizar crimes. Como Amarante morreu no final de março, após envolvimento em uma briga, somente Telles respondeu ao processo.

Acusados e testemunhas: peças-chave no processo contra Victor Telles

A leitura do processo crime contra Telles e Amarante permite conhecer outros detalhes da acusação devido ao teor dos depoimentos dos acusados e das testemunhas. Não cabe, nos objetivos mais estritos deste artigo, discutir cada uma das peças do processo. Todavia, vale a pena destacar alguns aspectos que permitem relacionar as práticas fotográficas com a falsificação de dinheiro.25 25 Todas as questões, deste ponto ao final desta seção do artigo, estão embasadas na leitura do processo criminal (PROCESSOS…, 1878).

A investigação policial foi iniciada pelo Chefe de Polícia Francisco de Paula Rebello e Silva sob a alegação de que o fotógrafo Victor Telles se encarregava de fabricar e passar notas falsas, envolvendo algumas pessoas do seu círculo de convivência.

No seu depoimento, Telles afirma ser natural de Coimbra e ter chegado ao Brasil aos 14 anos de idade, fixando residência em Rio Grande (RS). No entanto, no seu passaporte consta que ele saiu de Portugal em 1861, aos 16 anos, sendo natural da vila Miranda do Corvo, distrito de Coimbra. Ele tinha 1,64m de altura, olhos claros, cabelos castanhos, cor de pele “natural”. Ele não menciona os motivos que o fizeram emigrar para o Brasil. Em Portugal, nos discursos dos políticos liberais, afirmava-se que os jovens emigravam para fugir da prestação do serviço militar (MONTEIRO, 2007MONTEIRO, Isilda Braga da Costa. A emigração para o Brasil e a fuga ao recrutamento militar - uma questão em debate na segunda metade do século XIX. In: SOUSA, Fernando de et al. (coord.). A emigração portuguesa para o Brasil. Porto: Cepese; Edições Afrontamento, 2007, p. 385-400.). Portanto, como não havia cumprido o serviço militar, Telles assinou termo de fiança obrigatório no qual garantia que “se apresentaria ou faria substituir, caso fosse chamado para o serviço militar” (Ibidem, p. 395). No entanto, as explicações para o movimento migratório em Portugal não eram tão simples assim, como mostra a bibliografia de referência26 26 Discussão ampla sobre a emigração de Portugal para o Brasil é feita nos estudos de Sousa et al. (2007) e Arruda et al. (2013). Cf. também o portal Remessas: Rede emigração Europa do Sul-América do Sul, disponível em: https://bit.ly/2m8c9HT. Acesso em: 10 set. 2019. .

Ele declara que exercia o ofício de fotógrafo há cerca de um ano, tendo sido, anteriormente, comerciante no ramo de tecidos e de madeiras. Em virtude de os seus negócios não serem bem-sucedidos no Rio Grande, resolveu ir para o Rio de Janeiro, onde permaneceu por dois anos. Na corte ele atua inicialmente como preposto de leiloeiro, depois comprando produtos em leilões para revendê-los. No entanto, após contrair febre amarela, deixa a cidade e muda-se para Montevidéu, sob recomendação médica.

Na capital uruguaia, Telles reencontra Esprik Verny, que conhecia somente de vista do Rio Grande. Com ele, inicia o aprendizado da fotografia, tornando-se ambos sócios no ofício. Alegando perseguições políticas, Telles sai de Montevidéu com destino a São Paulo. Para lá também se dirigiram Verny e os demais empregados. A intenção de Telles e Verny era manter sociedade em São Paulo. No entanto, divergências não esclarecidas no processo fizeram com que rompessem relação, não efetivando, portanto, a sociedade.

No depoimento de Telles, ora parece que ele conhece bem os procedimentos da fotografia, ora ele destaca sua inexperiência na área, lançando certa dúvida sobre até que ponto dominava os detalhes de seu novo ofício. Pelos depoimentos, vê-se que seus auxiliares contavam com mais experiência do que ele. Telles montou uma equipe que lhe permitia fazer funcionar seu estúdio fotográfico, mesmo com sua pouca experiência no ramo. Ele contava com o retratista italiano Caetano Luigi, que fazia retratos a óleo, e o fotógrafo alemão Francisco Simon, que se encarregava da impressão das fotografias e também prestava auxílios gerais. Pode-se supor que Telles dominasse, naquela ocasião, os procedimentos relativos ao salão de poses, estando, portanto, preparado para fazer os retratos, ficando os demais procedimentos a cargo de seus auxiliares. Essa estrutura do Estúdio Photographico não era diferente dos demais estúdios do período. O empreendimento de Telles teria alçado ainda maior peso caso sua sociedade com Verny fosse mantida, pois este dominava a fototipia, a fotolitografia, a fotogalvanografia e todos “os sistemas da arte fotográfica”.

As relações pregressas de Telles com Roberto Tavares e Fernandes da Cunha, que se originavam do Rio Grande do Sul, bem como suas divergências, precipitaram o rumo dos acontecimentos. Uma colaboração dessas pessoas com a chefia de polícia, em virtude de terem algum envolvimento criminal, principalmente Fernandes da Cunha, não pode ser descartada. Como demonstrou Ferreira Júnior (Op. cit.), o pintor moedeiro falso José Maria Cândido Ribeiro colaborou com a polícia, passando informações sobre as falsificações de moeda em curso no país, em troca de benefícios no cumprimento de sua sentença. Mas é ainda surpreendente que a sentença tenha sido anunciada tão rapidamente, em maio do mesmo ano. Nela, o juiz considera que a investigação não demonstra a intenção de Telles fabricar moeda falsa na cidade, inocentando-o. Nos meses seguintes, o fotógrafo se esforça para reaver todos os pertences apreendidos em seu Estúdio Photographico.

A denúncia contra Telles fica evidentemente enfraquecida porque não são encontrados materiais inequívocos que pudessem ser destinados à fabricação de cédulas e, principalmente, porque não há apreensão de cédulas ou moedas falsas. É encontrada com ele a parte de uma chapa para impressão de cédula de dez pesos uruguaios que Telles afirma ter recebido de presente de um conhecido para demonstrar a habilidade artística que tinha um preso de Buenos Aires, algo que não foi suficiente para condená-lo.

No Rio de Janeiro: carnaval, gravuras e, novamente, a falsificação de dinheiro

A sentença do juiz de direito é, certamente, um alívio para Victor Telles. Porém, mesmo com o resultado favorável, sua reputação sai bastante comprometida por estar associada à falsificação de dinheiro. Ainda que não impeça de todo, este fato, com certeza, dificulta bastante a continuidade de seu trabalho como fotógrafo na promissora capital de São Paulo. Por essa razão, Telles parte para o Rio de Janeiro algum tempo após o fim do processo.

Uma vez na corte, Victor Telles instala, em fevereiro de 1880, seu Estúdio Photographico na rua da Carioca, nº 32, denominado ora Victor Telles & C., ora Victor & C. Lá ele anuncia encarregar-se de todos os trabalhos concernentes à arte fotográfica, mas com um diferencial: os retratos fantasiados, por estar às vésperas do carnaval. Além disso, os retratos podem ser feitos também em grupos, “com as cores naturais dos seus vestuários”27 27 ESTUDO Photographico. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 2/02/1880, p. 4. (ESTUDO…, 1880ESTUDO Photographico. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 2/02/1880, p. 4. Disponível em: <https://bit.ly/2lLs8LQ>. Acesso em: 23 jul. 2018.
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, p. 4). E, como outros fotógrafos o faziam, Telles destaca que atende fora de casa para a realização de retratos e vistas.

Apesar do revés sofrido em São Paulo, Victor Telles parecia ter recuperado suas forças. Em seus anúncios nos jornais da Corte, ele ampliou os serviços que anteriormente oferecia. Seus reclames indicam que ele estava mais comprometido com seu ofício de fotógrafo, pois anunciou os retratos (em diversos sistemas) e as vistas impressas. Assim, na capital do Império, ele passou a realizar o projeto que o levou a São Paulo e que tanto o rompimento com João Esprik Verny quanto a denúncia de falsificação de moeda não permitiram realizar. Seu estúdio fotográfico oferecia os seguintes serviços:

Retratos em porcelana, Retratos coloridos, Retratos em cartão, Retratos instantâneos, Retratos ao luar, Retratos a óleo, Retratos a fantasia, Retratos em vidro, Aquarelas, Molduras, Anúncios americanos, Vistas litográficas, Vistas topográficas. Desde todos os mais ínfimos preços, até aos mais altos. AOS POBRES GRÁTIS (Sistema de clínica médica!!!).28 28 Esse sistema de clínica médica, destinado aos pobres, é algo que parece fugir ao trabalho de fotografia e produção de imagens oferecido pelo Estúdio Photographico, não havendo qualquer consideração sobre o assunto nos jornais consultados. Veremos à frente que, em Portugal, esse serviço causou alguns transtornos ao fotógrafo. PHOTOGRAPHOS. A Folha, Rio de Janeiro, ano I, n. 1, 21/06/ jun. 1880, p. 4. Disponível em: <https://bit.ly/2mbKtSC>. Acesso em: 23 jul. 2018.

Na cidade do Rio de Janeiro, a casa de fotografia de Victor & C. promove a publicação de algumas gravuras nos jornais. Ao todo são onze gravuras, publicadas na página quatro dos jornais A Folha e O Globo. No primeiro, elas são apresentadas como um mimo aos leitores e servem para exemplificar os serviços executados em seu estabelecimento fotográfico. Duas dessas gravuras cumpriam uma função notadamente comercial, podendo as demais serem vistas como uma maneira de oferecer um atrativo visual aos leitores, mais comuns, no entanto, nas publicações ilustradas, notadamente nas revistas, conforme demonstrado pela bibliografia sobre o assunto (ANDRADE, 2004ANDRADE, Joaquim Marçal Ferreira de. História da fotorreportagem no Brasil: a fotografia na imprensa do Rio de Janeiro de 1839 a 1900. Rio de Janeiro: Elsevier; Fundação Biblioteca Nacional, 2004.; KNAUSS et al., 2014KNAUSS, Paulo et al. (org.). Revistas Ilustradas: modos de ler e ver no segundo reinado. Rio de Janeiro: Mauad X; Faperj, 2014.; LUCA, 2018LUCA, Tania Regina de. A ilustração [1884-1892]: circulação de textos e imagens entre Paris, Lisboa e Rio de Janeiro. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2018.).

Algumas dessas gravuras, como “Aída - Entrada das tropas egípcias”; “A queda do Niagara”; “A cabra-cega”; “O toque da Alvorada”; “Convento de Cornuailles”; “O Cabo de Horn” e “Uma escola de compositores em Berlim” parecem ser estampas disponíveis na época, copiadas provavelmente por meio da litografia. Possivelmente, elas circulavam como estampas avulsas, demonstrando que os impressos serviram a vários produtos editoriais (KNAUSS et al., 2014KNAUSS, Paulo et al. (org.). Revistas Ilustradas: modos de ler e ver no segundo reinado. Rio de Janeiro: Mauad X; Faperj, 2014.; ZENHA, 2004ZENHA, Celeste. O negócio das vistas do Rio de Janeiro: imagens da cidade imperial e da escravidão. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 2, n. 34, p. 23-50, jul./dez. 2004. Disponível em: <https://bit.ly/2kayBzD>. Acesso em: 24 mar. 2019.
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). Já as gravuras “Entrada do Catete”, “Cachoeira de Paulo Afonso” e “Vista de uma parte da cidade da Bahia”, além de exibirem representações nacionais (de cidades e da natureza), podem ser cópias de originais fotográficos sem autoria definida ou mesmo cópias de gravuras. Segundo Joaquim Marçal Ferreira de Andrade (2004, p. 180-181)ANDRADE, Joaquim Marçal Ferreira de. História da fotorreportagem no Brasil: a fotografia na imprensa do Rio de Janeiro de 1839 a 1900. Rio de Janeiro: Elsevier; Fundação Biblioteca Nacional, 2004., a gravura “Cachoeira de Paulo Afonso” (Figura 7) já havia sido publicada na revista Illustração Brasileira em agosto de 1876. Na ocasião, ela foi publicada como sendo uma gravura tirada de uma fotografia feita pela Comissão Geológica do Império do Brasil. Como Marc Ferrez era o fotógrafo da Comissão, segundo afirma Joaquim Andrade, provavelmente ele era o autor da fotografia. O autor aponta ainda que a mesma imagem foi publicada posteriormente, em 1882, como litogravura (no entanto, com baixa qualidade), na revista Arquivo das Famílias, por Henrique Fleiuss, editor de ambos os periódicos.

Figura 7
Página do jornal A Folha - Jornal da Tarde, 07/07/1880, p. 4. Fonte: Acervo Fundação Biblioteca Nacional.

A publicação dessas gravuras aponta para uma vasta discussão em torno da circulação de imagens no século XIX (KNAUSS et al., 2014KNAUSS, Paulo et al. (org.). Revistas Ilustradas: modos de ler e ver no segundo reinado. Rio de Janeiro: Mauad X; Faperj, 2014.). Em recente trabalho, Tania Regina de Luca (2018, p. 183)LUCA, Tania Regina de. A ilustração [1884-1892]: circulação de textos e imagens entre Paris, Lisboa e Rio de Janeiro. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2018., ao estudar a revista A Ilustração (1884-1892), demonstra que a cultura visual do período era marcada por uma “circulação transatlântica de mercadorias, aí incluídos impresso e imagens” A partir do estudo da revista, ela discute os diversos processos de troca, circulação e apropriação de gêneros textuais, inclusive imagens que vigoraram na época. Entre as questões discutidas pela autora, ela destaca que a publicação de conteúdos originários de outras fontes era comum no período; em alguns casos poderia ser resultado de uma parceria, em tantos outros, não. No caso específico d’A Ilustração, que possuía um acordo com a revista Le Monde Illustré, a publicação de conteúdo já divulgado anteriormente significava uma apropriação e ressignificação do material, prática que redundava na produção de novos significados para a imagem. Ela destaca também que predominava a falta de informação de autoria das imagens quando se tratava de fotografia, diferentemente de pinturas e esculturas.29 29 É possível construir uma visão geral dos procedimentos da imprensa, no que tange à imagem, a partir da menção de alguns aspectos observados pela autora: 1) a quase totalidade de artistas e estabelecimentos gráficos fluminenses era constituída por estrangeiros; 2) havia grande importação de gravuras; 3) grande concorrência entre as publicações de mesma natureza; 4) resistência em remunerar artistas pelas publicações de seus textos ou imagens; e 5) não havia reprodução direta da fotografia nos impressos, levando a considerável grau de subjetividade no processo de transferência de suporte. Deste modo, ao publicar gravuras sem mencionar os primeiros autores das imagens, Victor Telles repetia um procedimento comum no período.30 30 Isso remete à questão dos direitos autorais, principalmente de textos literários, que Tania de Luca não aprofunda, mas fornece alguns indícios para discussão.

De certo modo, é possível afirmar que a reprodução de cédulas pelo moedeiro falso é similar à apropriação de estampas sem a devida indicação de autoria: eles copiavam as cédulas existentes com auxílio das técnicas fotográficas e as punham em circulação. Desse modo, seja no caso da gravura ou da cédula, o procedimento é semelhante: pôr em circulação imagens que pertencem a outra fonte de produção. Todavia, no caso das notas, tratava-se de um crime.

O nome de Victor Telles voltou aos jornais em novembro de 1881, novamente associado ao crime de moeda falsa. Ele é denunciado por fabricar e colocar em circulação dinheiro falso, juntamente com os fotógrafos Antônio de Castro Martins, Oscar Zoé de Vasconcellos e Francisco Gomes Pinto.

As relações entre Victor Telles e os demais envolvidos no processo eram bem estreitas. Seu nome é citado constantemente no processo, tendo sido atribuído a ele o negócio da falsificação de dinheiro.31 31 SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Moeda Falsa. Rio de Janeiro, Revista Criminal. Réu: Antônio de Castro Martins. Caixa 148, n. 2790, gal c, 1881. Acervo do Arquivo Nacional. p. 32, 33, 38, 90, 93, 98, 100, 101, 195, 197, 248, 250, 251, 255, 270, 271, 283, 296, 318, 323, 335, 393. Telles, no entanto, não é ouvido, uma vez que não foi encontrado. Assim, apesar de ter sido denunciado pelo delegado de polícia e de ter seu nome citado por algumas testemunhas no momento do interrogatório, ele não é pronunciado, pois o juiz de Direito, em sua sentença, afirma não ter elementos contra Telles no processo.32 32 Ibidem, p. 393. Mais uma vez Victor Telles escapa de uma acusação, mas ele não é o único. Um dos outros denunciados, Oscar Zoé, também não é pronunciado. Tal sorte não têm os fotógrafos Antônio de Castro Martins e Francisco Gomes Pinto, pronunciados e condenados a cumprir pena na ilha de Fernando de Noronha.33 33 Antônio de Castro Martins e Francisco Gomes Pinto foram condenados com base nos artigos 174 e 175 do Código Criminal, combinados com os artigos 8 e 9 da Lei nº 52/1833. O total da pena foi de onze anos e oito meses.

Sobre o destino de Telles, as testemunhas não dão muitos esclarecimentos. A Gazeta da Tarde chega a afirmar: “dizem uns, está actualmente em Portugal, outros que está em Montevidéu, e outros ainda, em Campinas”.34 34 NOTAS Falsas. Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 11/11/1881, p. 1. Disponível em: <https://bit.ly/2kwxxX5>. Acesso em: 23 jul. 2018. Também pela imprensa é possível ver registros de importação de produtos fotográficos vindos de Portugal em seu nome, com destino ao Recife. Mas será em um novo processo, respondido em Coimbra em 1886, que encontraremos informações sobre as viagens de Victor Telles pelo interior do Brasil.

Em Coimbra: novo processo

A falsificação da moeda brasileira no exterior é um dos principais desafios enfrentados pelas autoridades no século XIX. O dinheiro falso entrava no Brasil escondido nos navios e, principalmente, na bagagem dos viajantes estrangeiros e também brasileiros que aqui ingressavam, após suas viagens (CÂMARA, 2012CÂMARA, Bruno Augusto Dornelas. O “retalho” do comércio: a política partidária, a comunidade portuguesa e a nacionalização do comércio a retalho, Pernambuco 1830-1870. 2012. Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2012.).

A responsabilização dos portugueses pela presença de dinheiro falso no Brasil é um importante aspecto desse problema.35 35 Em levantamento feito no jornal Diário do Rio de Janeiro, nas décadas de 1840, 1850 e 1860, verificou-se que, do total de matérias publicadas sobre falsificação de dinheiro, 74,63% referem-se a casos ocorridos no Brasil, 21,17% em Portugal, e 4,2% em outros países (ARRUDA et al., 2018). Nas matérias dos jornais, grande parte das falsificações ocorridas no Brasil é atribuída a portugueses. Da mesma forma, parte das notícias sobre o crime de moeda falsa em Portugal refere-se à falsificação de moeda brasileira. Nesse sentido, é possível afirmar que Portugal e os portugueses são vistos, no período, como participantes ativos no crime de moeda falsa brasileira (Cf. ARRUDA et al., 2018ARRUDA, Rogério Pereira de et al. O crime de moeda falsa e sua abordagem pelo jornal Diário do Rio de Janeiro, 1840-1869. Aedos, Porto Alegre, v. 10, n. 22, p. 140-165, ago. 2018. Disponível em: <https://bit.ly/2lFp8k9>. Acesso em: 22 mar. 2019.
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; CÂMARA, 2012CÂMARA, Bruno Augusto Dornelas. O “retalho” do comércio: a política partidária, a comunidade portuguesa e a nacionalização do comércio a retalho, Pernambuco 1830-1870. 2012. Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2012.).

Em 1886, um novo processo envolvendo o fotógrafo Victor Telles tem grande repercussão nos jornais de Portugal e do Brasil. Nos dois países ele foi tratado como criminoso e hábil falsificador, não havendo controvérsias em relação à sua culpabilidade. Ele é denunciado por tentativa de falsificação de dinheiro brasileiro em Portugal. O processo é levado adiante pelas autoridades policiais e judiciais portuguesas e pelo governo brasileiro por meio da ação do cônsul brasileiro sediado na cidade do Porto, Manoel José Rebello. O processo teve longo desenrolar, chegando a uma sentença somente em 1890.36 36 Os aspectos tratados deste ponto em diante são fruto da consulta ao processo criminal movido contra Victor Telles em Coimbra. QUERELA, Comarca de Coimbra. Réu: Victor Telles de Vasconcellos, Maço 12, Dep. VI, Est. 15, Tab. 6, n. 8, 1886. Acervo do Arquivo da Universidade de Coimbra.

Tal como acontece em São Paulo, Victor Telles não porta nenhuma nota falsa ao ser preso, nem é encontrado dinheiro falso nas duas buscas que a polícia fez em sua residência em Sobral, freguesia de Ceira, em Coimbra. Por isso, segundo a acusação, ele é indiciado por tentativa de falsificação das notas do Império do Brasil, utilizando-se da fotografia e da fotogravura para tal finalidade.

Na defesa de Victor Telles, seu advogado refuta ponto por ponto a denúncia, dando atenção especial ao argumento de que a fotografia e a fotogravura seriam utilizadas como principais métodos da falsificação.

Antes de discutir alguns trechos da defesa do advogado, abordaremos o destino de Victor Telles assim que ele sai do Rio de Janeiro, logo após sua segunda denúncia de falsificação em 1881. Detalhes da sua vida antes e depois de ter deixado o Rio de Janeiro estão presentes no processo, notadamente nos depoimentos prestados por ele e por seu denunciante, Antônio Esperança. Em primeiro lugar, revela-se que seu nome é Victor Telles de Vasconcellos e não Victor Telles Rebello e Vasconcellos. No Brasil, ele usou por todo o tempo o sobrenome Rebello, que era do seu pai. Inicialmente, ele se apresenta como solteiro, corrigindo-se em seguida como viúvo.

Diante das autoridades portuguesas, Victor Telles tenta ocultar seus embaraços com a polícia no Brasil a respeito da falsificação de dinheiro. Afirma que suas complicações com a polícia no Rio de Janeiro se referiram a porte de armas proibidas em casa, sem fundamento. E que, em Portugal, havia sido condenado a seis dias de prisão correcional por emprego de arma de fogo. No entanto, estava cada vez mais difícil ocultar a verdade, diante da menção ao assunto da falsificação pelas testemunhas, o que leva o comissário de polícia de Coimbra, Adriano Saldanha, a encontrar um jornal brasileiro de 1878 no qual o relato da investigação contra Telles havia sido publicado.37 37 Commércio do Porto, Porto, 22/06/1886, p. 1. Consultado no acervo de periódicos da Biblioteca Nacional de Portugal. Com a intenção de fundamentar as acusações contra ele, o teor da investigação feita em São Paulo é transcrito no processo.

Em seu depoimento, Victor Telles afirma que, após residir no Rio de Janeiro em torno de dois anos, trabalhando em seu Estúdio Photographico, regressa para Portugal, onde permanece por cerca de um ano. Depois disso, volta para o Brasil, chegando a Pernambuco. De lá vai para o Pará, onde permanece por cerca de um ano. Em Belém do Pará, o fotógrafo estabelece uma casa de fotografia denominada Casa Preta, em 1882, da qual não existem muitas informações. O Diário de Belém transcreve matéria publicada no Diário de Notícias, na qual são sugeridas algumas investigações, entre elas “o desaparecimento de um photographo, estabelecido à rua da Trindade, casa negra?”38 38 O DIÁRIO de Notícias. Diário de Belém do Pará, Belém, ano XV, n. 275, 7/12/1882, p. 2. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=222402&pasta=ano%20188&pesq=>. Acesso em: 23 jul. 2018. , e acrescenta:

Falla-se com certa insistência, que existe entre nós uma companhia de gatunos de gravata limpa, que se emprega em emitir notas falsas do thesouro nacional. O desapparecimento do photographo Victor coincide com os boatos à seu respeito, de ser um dos agentes da empresa, affirma-se mesmo que elle suspendera com uma boa soma.39 39 Ibidem, p. 1.

O fotógrafo desapareceu porque voltou novamente para Portugal, onde se manteve por cerca de um ano em Lisboa, segundo ele, e de onde não saiu senão para visitar um irmão no Porto.

No seu retorno ao Brasil o fotógrafo aporta na Bahia, iniciando um novo giro, principalmente pelo Sul do Brasil, mas também por Uruguai, Argentina, Paraguai e Bolívia. Ele não menciona se viajava acompanhado; todavia, Antônio Esperança, que acusara o fotógrafo, afirma que viajaram ele, Victor Telles e Manoel da Silva Araújo Guimarães. Antônio Esperança, quando lhe foi perguntado se sabia o motivo da viagem, afirma que perguntou a Manoel Guimarães que tipo de negócio eles montavam e teve em resposta que era segredo. O mesmo Manoel Guimarães teria acrescentado que “Vasconcellos era homem de rara habilidade, bom fotógrafo, bom gravador, bom químico, que tinha aprendido em New York na casa onde se fazem as notas para o Brasil”40 40 QUERELA…, Op. Cit., p. 18. .

O novo retorno de Victor Telles para Portugal teria sido motivado por uma carta do pai, em que se dizia que se quisesse vê-lo vivo, teria que se apressar. Alegando esse pedido paterno, Victor Telles parte de Maceió para Lisboa em abril de 1885. Antes de sua partida ele teria se encontrado com Antônio Esperança na floresta do Catumbi, no Rio de Janeiro. O fotógrafo informa seu regresso à Europa, dizendo que seguiria para a Bahia a fim de obter visto em seu passaporte, pois não conseguiria isto na Corte. No encontro, fica acordado que Telles entregaria à família de Esperança quatro libras, e que lhe mandaria da Europa mais quinze libras. A promessa não é cumprida. Quando ambos já estavam em Portugal, Victor Telles não se prontifica a ajudá-lo. Desse modo, tais promessas não cumpridas teriam estimulado o rancor de Antônio Esperança e sua intenção de vingança, o que resultou em uma denúncia contra Telles, levando-o a responder um processo que se desenrolou por cerca de quatro anos.

Os argumentos da defesa de Victor Telles

Na denúncia apresentada contra o fotógrafo, considera-se que ele era “tido e havido como fabricador e passador de notas falsas do Thesouro do Brasil” e que após visitar as principais partes do Império e os países vizinhos, voltou para Portugal.41 41 Ibidem, p. 95. No entanto, mesmo tendo saído do Brasil,

continuou o mesmo Victório Telles de Vasconcellos a ter relações com diversos brasileiros, que o auxiliavam a miúdo, e, por meio da photographia e fotogravura, em que é perito, tentou mais uma vez falsificar notas do Thesouro do Brasil.42 42 Ibidem, p. 95.

Devido a essa conclusão, o auto de querela pede seu indiciamento de acordo com a legislação portuguesa, principalmente o Código Penal de 188443 43 O Código Penal português, no artigo 206, no qual Victor Telles foi enquadrado, prevê a pena de degredo por vinte e cinco anos. A convenção assinada entre Brasil e Portugal, em 1855, estabelecia que as falsificações de dinheiro de um país no outro seriam punidas de acordo com a legislação do país no qual o indiciado fosse preso e processado. , pertinente aos crimes cometidos, e em conformidade com a convenção assinada por Brasil e Portugal em 1855.

Na sua defesa, o advogado Antônio Cesar Augusto Calixto alega que não havia fundamento legal no processo, nem em matéria de fato, nem de direito. Ou seja, a tentativa de falsificação não havia sido provada, e o enquadramento legal não era aplicável ao que o inquérito havia apurado. O conteúdo principal da defesa estava organizado nos seguintes itens: a) o suposto crime; b) as notas apreendidas; c) a máquina fotográfica; d) os precedentes (onde se refuta cada uma das testemunhas); e) as visitas dos brasileiros; f) lei aplicável; e g) corolários. Aos propósitos deste artigo, interessa particularmente o item “a máquina fotográfica”, pois nele se discute o pretenso uso da fotografia e da fotogravura como método para as falsificações.

Inicialmente, o advogado compara a fotografia e a fotogravura para deixar claro que a primeira não forneceria um resultado aceitável caso se reproduzisse uma nota. Ele lança as perguntas: “a photographia pode representar sobre o papel a nota nítida e vivamente expressiva, como o original da gravura em aço? Ainda os mais leigos poderão confundir jamais a suavidade da gravura em aço com as asperezas da reproducção photographica?”44 44 Ibidem, p. 249. . A resposta esperada seria “não”. Assim, ele descarta a possibilidade da falsificação das notas pela técnica fotográfica, uma vez que elas não seriam aceitas como verdadeiras. Descartada esta hipótese, ele lança mão de uma longa argumentação para provar que Victor Telles não poderia realizar as falsificações por meio da fotogravura, visto que não foram encontrados com o fotógrafo os equipamentos apropriados para tanto. Para dar credibilidade aos seus argumentos, o advogado cita o tratado de fotogravura e galvanoplastia de Brandely, no qual se afirma que a fotografia servia apenas para reproduzir os contornos de sombras e luz de qualquer desenho sobre um papel especial e com preparados e reagentes próprios.

O advogado também afirma que a máquina fotográfica apreendida era comum e, portanto, não apropriada para a execução de fotogravuras. Ele ainda se pergunta sobre a ausência de objetos apropriados para a fotogravura, como chapas de aço, ingredientes químicos para galvanoplastia, pilhas, papel cartão, instrumentos de gravura, máquina e tintas para impressão. Ou seja, sem eles, as falsificações por meio da fotogravura não poderiam ser feitas e argumenta que mesmo se o fotógrafo tivesse tais materiais, isto não configuraria tentativa de falsificação. No máximo, poderia indicar atos preparatórios que a lei não pune, o que também não seria o caso.

Victor Telles foi absolvido em abril de 1890, principalmente porque não havia provas da existência das pretensas notas falsificadas.

Considerações finais

A discussão empreendida neste artigo mostrou como um fotógrafo itinerante exerceu seu ofício nos finais do século XIX e teve uma vida conturbada, cercada de acusações de falsificação de dinheiro. Não se pode afirmar se ele era, realmente, um moedeiro falso e teve habilidade de se defender ou se as acusações contra ele não procediam. As constantes acusações e a proximidade com pessoas envolvidas com o crime produzem muitas desconfianças. No entanto, aqui não se objetiva emitir uma sentença sobre Victor Telles, mesmo porque, como afirma Celeste Zenha (1985, p. 126)ZENHA, Celeste. As práticas da justiça no cotidiano da pobreza. Revista Brasileira de História , São Paulo, v. 5, n. 10, p. 123-146, mar./ago. 1985. Disponível em: <https://bit.ly/2kCNfzN>. Acesso em: 12 out. 2016.
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, a verdade que condena ou absolve um denunciado não pode ser identificada prontamente com um fato do passado, mesmo que esteja amparada no mundo concreto, sendo que a absolvição ou a condenação de alguém se trata de uma verdade produzida pelos autos.

Sua condição de migrante, sua trajetória profissional ligada ao comércio e à fotografia demonstram que ele viveu e experimentou na prática o habitus (BOURDIEU, 2000BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, Marieta de Moraes & AMADO, Janaína (org.). Usos & abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2000, p. 183-191., p. 186) de seu grupo social, mas ao mesmo tempo trilhou caminhos próprios. No que tange à sua inserção no comércio, ele seguiu um caminho percorrido por um grupo específico de migrantes que trabalhavam como caixeiros nos centros urbanos e exerciam atividades no setor terciário. Segundo Fernando Sousa (2013, p. 30)SOUSA, Fernando de. Os portugueses. De colonos a imigrantes. In: ARRUDA, José Jobson de Andrade et al. (org.). De colonos a imigrantes: I(E)migração portuguesa para o Brasil. São Paulo: Alameda , 2013, p. 21-36., era a designada “emigração clássica”. Ele se inseria na tradição de emigrantes portugueses que saíam de Portugal e sabiam ler e escrever, portanto eram bem assimilados pelo comércio (Ibidem).

No que se refere à fotografia, sua experiência como migrante e sua inserção em um novo ambiente social e cultural permitiram que ele buscasse novos caminhos profissionais, explorando as oportunidades oferecidas pela nova terra. Como fotógrafo, experimentou a itinerância como tantos outros que viram a oportunidade aberta pela nova forma de representação social e construção de identidades. A viagem era um imperativo que se apresentou a diversos fotógrafos diante de um mercado que, por um lado, apresentava demandas crescentes, se se considerasse a extensão territorial do país; por outro, não era capaz de assimilar de forma efetiva todos os fotógrafos no âmbito local. Mas essa era uma característica mundial da expansão da nova invenção. Assim, como fizeram pessoas de outros ofícios ou profissões, foi necessário realizar seu trabalho como ambulante. Em suas viagens percorreu grande parte do país, navegou por rios, trilhou os caminhos das regiões Sul, Sudeste, Norte e Nordeste, demonstrando que o deslocamento espacial era parte constitutiva da configuração do seu lugar social e profissional. As viagens de tantos fotógrafos no século XIX possibilitaram a expansão da fotografia pelo país, apresentada como índice de civilização e modernidade, em consonância com os padrões europeus, contribuindo, ainda, para a difusão de objetos visuais da cultura material (ABOUT, Op. cit., p. 2). Sua prática colaborou na conformação de um habitus fotográfico (Ibidem, p. 17) e na consolidação da fotografia como um elemento importante da sociabilidade moderna. Suas viagens não se reduziram às fronteiras do Brasil: ele percorreu vários países vizinhos e também inscreveu sua prática nas viagens intercontinentais entre a América e a Europa.

A itinerância fez parte do habitus de muitos fotógrafos no século XIX, um imperativo para a obtenção de sucesso financeiro e, por que não, de reconhecimento social e profissional. Para permanecer no mercado competitivo da fotografia era necessário viajar. Mas esse trânsito intenso também foi um aspecto que favoreceu a prática da falsificação de dinheiro, pois dificultava a ação e vigilância das autoridades. A itinerância de fotógrafos pelos países vizinhos, entre o Brasil e a Europa e, ainda, as várias notícias que informam a apreensão de cédulas falsas nos navios chegados do exterior, confirmam a existência transnacional do crime de moeda falsa.

O fotógrafo migrante, seja ele português ou de outra nacionalidade, ao se envolver com as práticas criminosas, de certo modo rompia com as expectativas sociais gerais e de modo mais preciso com as de seu grupo de origem, confirmando a sugestão de Levi (Op. cit.) de que há um espaço significativo de liberdade para atuação individual que foge às determinações estruturais; mas essa não seria a condição de todo comportamento individual desviante? No caso de Victor Telles, ele provinha de uma família que trazia na sua história a menção honrosa de ter lutado em prol da pátria. Seu envolvimento com a justiça, por meio de acusação de crime de falsificação de dinheiro, poderia ser pensado como um rompimento com as expectativas de seu grupo familiar, mesmo que ele tenha se naturalizado brasileiro. Vale destacar que, por ocasião da denúncia em Portugal, o repórter do Commercio do Porto45 45 Commercio do Porto, Porto, n. 153, 20 jun. 1886, p. 1. Consultado no acervo de periódicos da Biblioteca Nacional de Portugal. observara que “pertence a uma família de bom nome, e com serviços à causa da liberdade”, fato lembrado também por ocasião do julgamento.

Do ponto de vista da cultura visual, o desconhecimento das características das notas verdadeiras abre espaço para o engano em diversos níveis: entre os falsificadores, entre a população e até mesmo entre o pessoal das instituições públicas ou privadas responsáveis por algum tipo de manejo das cédulas. É preciso destacar que as pessoas precisaram ser “educadas” para reconhecer visualmente a falsificação de notas e isto requer algum conhecimento específico: a) da parte dos usuários comuns, que precisavam se atentar para características físicas e visuais das notas que até então não faziam parte do seu repertório; e b) da parte dos produtores e reprodutores de imagem, que precisavam conhecer todo o processo de produção fotográfica ou, na ausência dessa visão ampla, possuir parceiros que executem outras etapas da tarefa de falsificação.

Destaquei em alguns pontos do artigo que a fotografia se inseria num contexto novo, de emergência da cultura da imitação, ela própria fundamental nesse processo, como destacou Miles Orvell (Op. cit.). As diversas formas de manipulação do assunto ao ser fotografado, as intervenções posteriores à execução da imagem fazem parte desse contexto no qual mais importante que produzir a verdade, seria proporcionar convencimento. As técnicas fotográficas e as demais técnicas de produção e reprodução de imagens foram apropriadas para cumprir essa finalidade: convencer e iludir. Os moedeiros falsos, ao utilizarem tais procedimentos, operam dentro desta lógica e muitos deles conseguiram obter sucesso. Coube ao Estado e ao sistema bancário elaborar estratégias de segurança para fazer frente a esse processo.

Até onde pudemos acompanhar, Victor Telles permaneceu em Sobral, freguesia de Ceira, Coimbra. De certa forma, foi uma pessoa assídua nos tribunais da região46 46 Os processos envolvendo Victor Telles estão sob a guarda do Arquivo Histórico da Universidade de Coimbra, Portugal. . Em 1886, foi processado por atirar em uma pessoa, sem, no entanto, feri-la. No ano seguinte, ele respondeu por exercer a “profissão da clínica médica” sem a devida competência legal, mas não é condenado. Em 1899, ele ofendeu corporalmente uma lavadeira, quando ambos estavam dentro do rio Eça. Já em 1906, respondeu a outro processo por causar danos à empresa que construía um caminho de ferro na região. Nessa ocasião, Telles foi multado pelos danos causados, mas também indenizado, pois os trilhos estavam sendo assentados em suas terras, sem sua devida autorização.

Enfim, o envolvimento de Victor Telles com o sistema policial-jurídico do período é uma via para tratar não somente de aspectos da sua vida, mas também das sociedades nas quais ele viveu. Victor Telles foi um fotógrafo com fama de moedeiro falso que soube se defender provando sua inocência, e nos deixou perguntas ainda a serem respondidas… Por ora, seguiremos o conselho de Luiz Gama, seu advogado, em uma defesa pública do seu cliente, em São Paulo, quando pediu o fim das acusações e desconfianças: é hora e tempo de baixar as cortinas.

  • *
    Agradeço ao Museu do Dinheiro do Banco de Portugal, em Lisboa, pela cessão de reproduções de cédulas falsas do seu acervo, especialmente ao técnico de museologia, Sr. João Pedro Vieira; ao pessoal do Arquivo Público do Estado de São Paulo, pela cessão de reproduções de cédulas falsas do seu acervo; aos pareceristas, que me proporcionaram tornar este artigo mais consistente. Todas as obras e todos os documentos utilizados na pesquisa e na elaboração do artigo são citados nas notas e na bibliografia.
  • 1
    Artigo apresentado como produto final do pós-doutorado realizado no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense (UFF), sob supervisão da profa Dra Ana Maria Mauad, com etapa de pesquisa cumprida em Portugal viabilizada por meio do vínculo com a Universidade Nova de Lisboa (UNL), sob supervisão da profa Dra Maria Margarida Ribeiro de Medeiros. Significativa parte do trabalho foi realizada no âmbito do projeto de pesquisa intitulado “Fotógrafos, retratistas e litógrafos e o envolvimento no crime de moeda falsa, 1840-1900”, que contou com apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) por meio do programa Primeiros Projetos (Processo APQ-01013-14), e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), conforme convênio registrado no Siconv (793988/2013).
  • 2
    As punições ao crime de moeda falsa estavam previstas no Código Criminal do Império e na Lei nº 52, de 3 de outubro de 1833. A partir dessa lei, as penas foram cumpridas na ilha de Fernando de Noronha.
  • 3
    Projeto de pesquisa intitulado “Fotógrafos, retratistas e litógrafos e o envolvimento no crime de moeda falsa, 1840-1900”, Fapemig/CNPq (APQ-01013-14).
  • 4
    Disponível em: <https://bit.ly/2m4THzP>. Acesso em: 30 nov. 2017.
  • 5
    NOTAS falsas. O Globo, Rio de Janeiro, ano IV, n. 287, Rio de Janeiro, 28/11/1877, p. 3. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=369381&pasta=ano%20187&pesq=>. Acesso em: 23 jul. 2018.
  • 6
    MONCKHOVEN, Désiré Van. Traité général de photographie. 4ª edição. Paris: Librairie Victor Masson et fils, 1863. Disponível em: <https://bit.ly/2lJCcVP>. Acesso em: 23 maio 2015.
  • 7
    LIÉBERT, Alphonse. La photographie en Amérique. Traité complet de photographie pratique. 3ª edição. Paris: [s. n.], 1878. Disponível em: <https://bit.ly/2k89wFm>. Acesso em: 20 maio 2015.
  • 8
    BENTES, José Antonio. Tratado theorico e pratico de photographia. Lisboa: Livraria de A. M. Pereira, 1866.
  • 9
    Nos acervos do Arquivo Público do Estado de São Paulo, do Museu do Centro Cultural do Banco do Brasil e do Museu Histórico Nacional não constam notas falsificadas diretamente em papel fotográfico.
  • 10
    ESTUDO Photographico. Diário de S.Paulo, São Paulo, 13/11/1877, p. 1-3. Disponível em: <https://bit.ly/2kbqtyH>. Acesso em: 23 jul. 2018.
  • 11
    Nos jornais, o estabelecimento é apresentado como “Estudo Photographico” e não como estúdio. No entanto, também usaremos a nomenclatura Estúdio para o estabelecimento de Victor Telles.
  • 12
    Abordagens sobre os significados históricos, sociais e estéticos dos retratos no século XIX podem ser conferidos nos estudos de Lavelle (2003)LAVELLE, Patrícia. O espelho distorcido: imagens de indivíduos no Brasil oitocentista. Belo Horizonte: UFMG , 2003. e de Fabris (2004)FABRIS, Annateresa. Identidades virtuais: uma leitura do retrato fotográfico. Belo Horizonte: UFMG, 2004..
  • 13
    ESTUDO…, Op. cit., p. 2.
  • 14
    Ibidem, p. 3.
  • 15
    ROBINSON, Henry Peach. Pictorial effect in photography. Hints on composition and chiaroscuro for photographers. London: Piper & Carter, 1869. Disponível em: <https://bit.ly/2JynHeR>. Acesso em: 2 jan. 2018.
  • 16
    LIÉBERT, Op. Cit., 1878LIÉBERT, Alphonse. La photographie en Amérique. Traité complet de photographie pratique. 3ª edição. Paris: [s. n.], 1878. Disponível em: <https://bit.ly/2k89wFm>. Acesso em: 20 maio 2015.
    https://bit.ly/2k89wFm...
    .
  • 17
    Correio Paulistano (SP), Diário da Bahia (BA), Diário de São Paulo (SP), Diário do Rio de Janeiro (RJ), Gazeta de Campinas (SP), Gazeta de Notícias (RJ), Jornal da Tarde (RJ), Jornal do Commercio (RJ), Jornal do Pilar (AL), Monitor Campista (SP), O Cruzeiro (RJ), O Paiz (MA). Disponíveis em: <https://bit.ly/2iIR7M9>. Acesso em: 23 jul. 2018.
  • 18
    Diário de São Paulo, ano XIII, n. 3629, 24 jan. 1878, p. 2; Jornal do Commercio, ano LVII, n. 24, 24 jan. 1878, p. 2; Diário do Rio de Janeiro, ano 61, n. 23, 24 jan. 1878, p. 2.
  • 19
    MOEDA falsa. Correio Paulistano, São Paulo, 23/01/1878, p. 1. Disponível em: <https://bit.ly/2kc3405>. Acesso em: 8 jan. 2017.
  • 20
    Ibidem, p. 1.
  • 21
    PROCESSOS Criminais, Moeda Falsa, Secretaria de Polícia de São Paulo, Réus: Antônio Joaquim de Carvalho Amarante e Victor Telles Rebello, n. de ordem: 3994, notação: 1739, 1878. Acervo do Arquivo do Estado de São Paulo.
  • 22
    Ibidem, p. 210-215.
  • 23
    Ibidem.
  • 24
    A Lei nº 52/1833 definia o modo de recolhimento das moedas de cobre em circulação na época, devido à grande intensidade das falsificações, bem como definia as punições para os fabricadores e passadores de moeda falsa e todos os papéis de crédito. Por meio dessa lei, a ilha de Fernando de Noronha foi estabelecida como lugar da prisão dos condenados. Já o artigo 34 do Código Criminal definia as penas para os casos de tentativa de realizar crimes.
  • 25
    Todas as questões, deste ponto ao final desta seção do artigo, estão embasadas na leitura do processo criminal (PROCESSOS…, 1878PROCESSOS Criminais, Moeda Falsa, Secretaria de Polícia de São Paulo, Réus: Antônio Joaquim de Carvalho Amarante e Victor Telles Rebello, n. de ordem: 3994, notação: 1739, 1878. Acervo do Arquivo do Estado de São Paulo.).
  • 26
    Discussão ampla sobre a emigração de Portugal para o Brasil é feita nos estudos de Sousa et al. (2007)SOUSA, Fernando de et al. (coord.). A emigração portuguesa para o Brasil . Porto: Cepese; Edições Afrontamento, 2007. e Arruda et al. (2013)ARRUDA, José Jobson de Andrade et al. (org.). De colonos a imigrantes: I(E) migração portuguesa para o Brasil. São Paulo: Alameda, 2013.. Cf. também o portal Remessas: Rede emigração Europa do Sul-América do Sul, disponível em: https://bit.ly/2m8c9HT. Acesso em: 10 set. 2019.
  • 27
    ESTUDO Photographico. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 2/02/1880, p. 4.
  • 28
    Esse sistema de clínica médica, destinado aos pobres, é algo que parece fugir ao trabalho de fotografia e produção de imagens oferecido pelo Estúdio Photographico, não havendo qualquer consideração sobre o assunto nos jornais consultados. Veremos à frente que, em Portugal, esse serviço causou alguns transtornos ao fotógrafo. PHOTOGRAPHOS. A Folha, Rio de Janeiro, ano I, n. 1, 21/06/ jun. 1880, p. 4. Disponível em: <https://bit.ly/2mbKtSC>. Acesso em: 23 jul. 2018.
  • 29
    É possível construir uma visão geral dos procedimentos da imprensa, no que tange à imagem, a partir da menção de alguns aspectos observados pela autora: 1) a quase totalidade de artistas e estabelecimentos gráficos fluminenses era constituída por estrangeiros; 2) havia grande importação de gravuras; 3) grande concorrência entre as publicações de mesma natureza; 4) resistência em remunerar artistas pelas publicações de seus textos ou imagens; e 5) não havia reprodução direta da fotografia nos impressos, levando a considerável grau de subjetividade no processo de transferência de suporte.
  • 30
    Isso remete à questão dos direitos autorais, principalmente de textos literários, que Tania de Luca não aprofunda, mas fornece alguns indícios para discussão.
  • 31
    SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, Moeda Falsa. Rio de Janeiro, Revista Criminal. Réu: Antônio de Castro Martins. Caixa 148, n. 2790, gal c, 1881. Acervo do Arquivo Nacional. p. 32, 33, 38, 90, 93, 98, 100, 101, 195, 197, 248, 250, 251, 255, 270, 271, 283, 296, 318, 323, 335, 393.
  • 32
    Ibidem, p. 393.
  • 33
    Antônio de Castro Martins e Francisco Gomes Pinto foram condenados com base nos artigos 174 e 175 do Código Criminal, combinados com os artigos 8 e 9 da Lei nº 52/1833. O total da pena foi de onze anos e oito meses.
  • 34
    NOTAS Falsas. Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, 11/11/1881, p. 1. Disponível em: <https://bit.ly/2kwxxX5>. Acesso em: 23 jul. 2018.
  • 35
    Em levantamento feito no jornal Diário do Rio de Janeiro, nas décadas de 1840, 1850 e 1860, verificou-se que, do total de matérias publicadas sobre falsificação de dinheiro, 74,63% referem-se a casos ocorridos no Brasil, 21,17% em Portugal, e 4,2% em outros países (ARRUDA et al., 2018).
  • 36
    Os aspectos tratados deste ponto em diante são fruto da consulta ao processo criminal movido contra Victor Telles em Coimbra. QUERELA, Comarca de Coimbra. Réu: Victor Telles de Vasconcellos, Maço 12, Dep. VI, Est. 15, Tab. 6, n. 8, 1886. Acervo do Arquivo da Universidade de Coimbra.
  • 37
    Commércio do Porto, Porto, 22/06/1886, p. 1. Consultado no acervo de periódicos da Biblioteca Nacional de Portugal.
  • 38
    O DIÁRIO de Notícias. Diário de Belém do Pará, Belém, ano XV, n. 275, 7/12/1882O DIÁRIO de Notícias. Diário de Belém do Pará, Belém, 7/12/1882, p. 2. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=222402&pasta=ano%20188&pesq=>. Acesso em: 23 jul. 2018.
    http://memoria.bn.br/DocReader/docreader...
    , p. 2. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=222402&pasta=ano%20188&pesq=>. Acesso em: 23 jul. 2018.
  • 39
    Ibidem, p. 1.
  • 40
    QUERELA…, Op. Cit., p. 18.
  • 41
    Ibidem, p. 95.
  • 42
    Ibidem, p. 95.
  • 43
    O Código Penal português, no artigo 206, no qual Victor Telles foi enquadrado, prevê a pena de degredo por vinte e cinco anos. A convenção assinada entre Brasil e Portugal, em 1855, estabelecia que as falsificações de dinheiro de um país no outro seriam punidas de acordo com a legislação do país no qual o indiciado fosse preso e processado.
  • 44
    Ibidem, p. 249.
  • 45
    Commercio do Porto, Porto, n. 153, 20 jun. 1886, p. 1. Consultado no acervo de periódicos da Biblioteca Nacional de Portugal.
  • 46
    Os processos envolvendo Victor Telles estão sob a guarda do Arquivo Histórico da Universidade de Coimbra, Portugal.

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    Editado por

    Editores responsáveis pela publicação: Júlio Pimentel Pinto e Flavio de Campos

    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2020
    • Data do Fascículo
      2020

    Histórico

    • Recebido
      14 Ago 2018
    • Aceito
      03 Abr 2019
    Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História Av. Prof. Lineu Prestes, 338, 01305-000 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (55 11) 3091-3701 - São Paulo - SP - Brazil
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