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A MODERNIZAÇÃO DA PERMANÊNCIA E AS MUDANÇAS NA AGROPECUÁRIA LATINO-AMERICANA DURANTE A GUERRA FRIA: UM ESTUDO A PARTIR DA AÇÃO DOS EUA NA ORGANIZAÇÃO DA EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA (1973-1979)1 1 Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografa utilizadas são referenciadas no artigo, fruto de tese de doutoramento: SANCHES JUNIOR, Jeferson de Lara. A modernização da permanência: institutos nacionais de pesquisa agropecuária na Argentina e no Brasil e as transformações no campo latino-americano no século XX (1956-1979). 2020. 269 p. Tese (Doutorado em Política Científica e Tecnológica) Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2020. Pesquisa financiada com bolsa de Doutorado pela Coordenação de Pessoal de Nível Superior - CAPES, processo 99999.000421/2016-02. Jefferson Sanches responsável pela pesquisa e escrita do artigo; Cristina de Campos responsável pela revisão, orientação e demais apontamentos.

THE MODERNIZATION OF PERMANENCE AND THE CHANGES IN LATIN AMERICAN AGRICULTURE DURING COLD WAR: A STUDY BY THE ACTION OF THE USA IN THE ORGANIZATION OF EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA (1973-1979)

Resumo

A pesquisa agrícola passa a ser v ista ao longo do século XX como f undamental para o desenvolvimento da A mérica Latina. Para atender a demanda, desenvolvem-se institutos de pesquisa agropecuária, visando conceder a essa área o respaldo científico para a empreitada. Nos anos de 1940, há uma intensificação desse processo, visto o papel desempenhado pela ciência na Segunda Guerra Mundial. Em relação ao Brasil, podemos observar a sua materialização através da formação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) nos anos de 1970. Destarte, este artigo tem como objetivo geral analisar a criação dessa instituição no contexto de transformação da produção agrícola mundial, mediante modificações promovidas pela ciência e tecnologia que caracterizaram a Revolução Verde, buscando compreender e analisar a intervenção dos EUA no processo de constituição institucional.

Palavras-chave
Revolução Verde; agricultura; século XX; Brasil; Embrapa

Abstract

Agriculture research has become a fundamental piece of Latin America’s development model adopted in the 20th century. To attend this demand, we percept the beginning of agriculture research institutes development as a method to give the necessary support to agricultural field. There was an intensification of this process in the 1940s, mainly about the role that science and technology played on Second World War. Taking the Brazilian situation, we can see the materialization of this process through Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foundation in the 1970s. This article’s main objective is to analysis this institution foundation in the context of the transformation passed by global crop production through modifications provided by science and technology, which was characterized by the Green Revolution, seeking to understand and analyze the EUA intervention in the institutional formation process.

Keywords
Green Revolution; agriculture; 20th century; Brazil; Embrapa

Introdução

O pós-Segunda Guerra Mundial revela-se como um período repleto de mudanças que condicionaram a economia, a política e a sociedade da América Latina ao longo das décadas seguintes. Tais modificações, tão profundas e estruturais que ainda se manifestam nos dias atuais, vieram acompanhadas de diversas descontinuidades e desafos, marcados pela ascensão de um processo de industrialização tardio em relação às nações europeias e aos EUA.

Fator preponderante na região desde o período colonial, a agricultura não foi esquecida nesse processo. Particularmente, a pesquisa agrícola, cuja tradição na região remonta ao século XIX, passa a ser vista ao longo do século XX como fundamental para o modelo de desenvolvimento adotado, seja para gerar divisas ou para fornecer matéria-prima para as indústrias em expansão. Visando atender a tamanha demanda e respaldar cientificamente suas ações, alguns países latino-americanos desenvolveram institutos de pesquisa agropecuária. A criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), estabelecida por lei em 1972 e definitivamente organizada no ano seguinte, coloca-se enquanto marco importante dessa empreitada.

O cenário apresentado se insere em um contexto marcado por mudanças mais abrangentes na conjuntura internacional, dentre as quais podemos destacar a “Revolução Verde”, caracterizada pela expansão do padrão tecnológico agrícola dos países do centro do capitalismo para regiões menos desenvolvidas e pela produção e difusão de sementes melhoradas e de técnicas agrícolas atendendo ao incremento da produtividade (FUCK, 2009, p. 34FUCK, Marcos Paulo. A coevolução tecnológica e institucional na organização da pesquisa agrícola no Brasil e na Argentina. Tese de doutorado, Política Científica e Tecnológica, Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas, 2009.). O modelo-base que a orientou deriva da experiência de grandes institutos coloniais de pesquisa agrícola e dos ensaios carreados por institutos como a Fundação Ford e a Fundação Rockefeller em países como México e Filipinas, com produtos como milho, trigo, batata e feijão (HAYAMI, RUTTAN, 1988, p. 306HAYAMI, Yujiro; RUTTAN, Vernon W. Desenvolvimento agrícola: teoria e experiências internacionais. Brasília: EMBRAPA- DPU, 1988.). Aliado a isso, podemos também destacar a participação da Food and Agricultural Organization (FAO) – repartição da Organização das Nações Unidas para a alimentação e agricultura –, do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) e de acordos e convênios com a Agência de Desenvolvimento Internacional do governo estadunidense (USAID).

Os movimentos de tais organismos e instituições delineiam a participação dos EUA no processo analisado, demonstrando como sua interferência e manutenção de seu poder hegemônico na América Latina, longe de ser algo homogêneo ou marcado exclusivamente por intervenções diretas (como o apoio e a participação nos golpes civis-militares na região), organizava-se de maneira dissimulada e efetivada em empréstimos, programas de treinamento, organização de cursos de pós-graduação, dentre outros. Neste aspecto, levando-se em consideração o emaranhado de relações e influências na América Latina no período, cabe compreender como se deu a relação dos EUA na fundação dessas instituições e os interesses e estratégias existentes para a sua configuração.

Valendo-se de uma narrativa que privilegiava o grande produtor, o conjunto de iniciativas mencionado atuou para perpetuar a estrutura concentrada de posse da terra então existente e a desigualdade no campo. Fome e miséria eram vistas como possibilidades para o comunismo e o nacionalismo. A modernização do campo, com o avanço dos níveis produtivos e a introdução de novos implementos, permitiria o arrefecimento desses problemas, sem colocar em xeque o predomínio do capitalismo e dos interesses dos grandes proprietários de terra. Em suma, modificava-se toda a estrutura produtiva para não se alterar a estrutura social baseada na exclusão de grande parte do campesinato aliado à manutenção da ordem pautada na grande propriedade fundiária, processo definido conceitualmente como “modernização conservadora” por Barrington Moore Jr (MOORE JR., 1967MOORE JR., Barrington. As origens sociais da ditadura e da democracia: senhores e camponeses na construção do mundo moderno. Lisboa: Cosmos, 1967.).

O autor constata três formas pelas quais a sociedade, ao longo da história, superou as estruturas sociais, políticas e econômicas predominantemente pré-capitalistas do Antigo Regime. O primeiro caminho ocorreu por meio das grandes revoluções burguesas, como as ocorridas na Inglaterra ao longo do século XVII e nos Estados Unidos e na França no século seguinte. Uma das características principais desses eventos foi o desenvolvimento de uma categoria social de base econômica independente, a burguesia industrial, cujas transformações desembocaram nas democracias burguesas, pilares da política ocidental contemporânea. O segundo modo também se caracteriza pelo seu aspecto capitalista, mas sem contar com uma burguesia com força e organização capazes de atacar as bases nas quais a sociedade se assentava, tendo ocorrido de forma mais evidente no Japão e na Alemanha, e marcada por seu caráter reacionário. Por fim, a terceira via seria o comunismo, exemplificada nas experiências da Rússia e da China (MOORE JR., 1967, p. 14-15MOORE JR., Barrington. As origens sociais da ditadura e da democracia: senhores e camponeses na construção do mundo moderno. Lisboa: Cosmos, 1967.).

A “modernização conservadora” representaria justamente a segunda situação, marcada pela passagem para um cenário de capitalismo industrial sem, todavia, contar com um processo revolucionário burguês clássico, como o ocorrido na Revolução Francesa. Nesse cenário, não se observou a destruição completa das estruturas herdadas do Antigo Regime no que tange à organização econômica, política e social da sociedade em questão. Houve, ao contrário, o aprofundamento dos laços políticos entre a classe proprietária de terras e a burguesia, marcado pela rearticulação de forças para instituir um novo contrato político e econômico, no qual os proprietários de terra não perderiam sua fonte de poder e continuariam a conduzir a política centrada em uma estrutura de dominação em que seus interesses permaneciam arraigados. No caso do Japão e da Alemanha, a modernização conservadora conduziu para a composição de um cenário marcado pela existência de uma indústria moderna paralelo a uma estrutura política conservadora, sendo uma das prin- cipais características a de alijar o campesinato da possibilidade de posse fundiária (PIRES, RAMOS, 2009, p. 412-415).

A discussão a que nos propomos dialoga intensamente com o conceito de modernização conservadora, porém consideramos que tal ideia não contempla a totalidade de nossa análise. Tema clássico quando se discute agricultura e modernização na América Latina, a modernização conservadora trata das modificações no capitalismo da região como algo incompleto em relação às mudanças promovidas pelos eventos revolucionários observados na Inglaterra, nos EUA e na França, conservando-se a propriedade fundiária enquanto privilégio de uma classe social. Acreditamos que, de fato, a Revolução Verde e a criação dos institutos de pesquisa agropecuária, materializada no Brasil pela Embrapa, podem ser explicadas por tal conceito, mas também que há novos campos que podem contribuir para a análise. O conceito não contempla, por exemplo, a utilização e a influência de uma narrativa construída com base em suposto caráter imparcial e desinteressado da ciência e tecnologia, atinente à ideologia da modernização e do progresso em voga no pós-guerra, que delegava ao conhecimento científico a capacidade de promover as transformações necessárias para o bem de todos. Contudo, tal discurso disfarça a tentativa de se garantir o predomínio da economia capitalista na região, atacando supostas influências comunistas e a ação de governos nacionalistas que atentavam contra os interesses dos EUA na América Latina.

Esse caráter de neutralidade será amplamente explorado pelos EUA, seu governo e pelas fundações filantrópicas na construção da Revolução Verde e estará presente na estruturação da Embrapa. Vistas como motores do progresso após 1945, ciência, tecnologia e modernização do campo serão abordadas com viés de desinteresse e filantropia, dissimulando o esforço realizado para se manterem alinhadas a uma região em forte contexto de polarização como o da Guerra Fria, ao passo que abria novos fancos para a exploração das empresas capitalistas. Ademais, tal narrativa privilegiava o grande produtor, atuando para perpetuar a estrutura concentrada de posse da terra então existente e a desigualdade no campo. Fome e miséria eram vistas como possiblidades para o comunismo e o nacionalismo. A modernização do campo, com o avanço dos níveis produtivos e da introdução de novos implementos, atuava para arrefecer esses problemas, sem colocar em xeque o predomínio do capitalismo e dos interesses dos grandes proprietários de terra. Em suma, modificava-se toda a estrutura produtiva para não se alterar a estrutura social baseada na exclusão de grande parte do campesinato. A esse processo, marcado pela exploração do suposto caráter isento da modernização do campo e do uso da ciência como forma de manter o status quo existente, damos o nome de modernização da permanência.

Dessa forma, propomos neste artigo a análise da criação da Embrapa inserida em um panorama de transformação da produção agrícola mundial, mediante modificações promovidas pela ciência e tecnologia, que caracterizaram a Revolução Verde e a participação dos EUA no processo, buscando desvelar pormenorizadamente o processo analisado. Para isso, iniciamos nossa abordagem discutindo como a ciência e tecnologia para a agricultura materializada na Revolução Verde tornou-se peça importante na relação entre os EUA e as regiões da periferia capitalista. Nossa abordagem parte de uma arguição enquanto tempo vivido, possibilitado pela discussão realizada através de documentos que versam sobre a política estadunidense para a agricultura, ciência e tecnologia no pós-guerra, além daqueles produzidos no período que contempla a primeira diretoria da empresa, entre 1973 e 1979, sob a presidência de Roberto Irineu Cabral, momento importante para o estabelecimento das linhas básicas de ação da empresa, e como tempo passado, mediante a produção bibliográfica que se debruça no contexto ao qual este artigo se dedica. Adiante, discutimos a fundação da Embrapa, tomando-a enquanto ponto de intersecção entre o cenário internacional favorável ao seu avanço, marcado pelo crescimento da oferta de insumos para o aumento da produtividade agrícola em escala global e o panorama que encontra no golpe civil-militar de 1964 a consolidação de um projeto para o campo brasileiro pautado em uma agenda que descartava a reforma agrária em prol da modernização de sua estrutura produtiva, privilegiando o discurso cientificista, arraigado em um olhar supostamente técnico, isento e naturalmente benéfico das mudanças introduzidas pela ciência e tecnologia. Por fim, abordamos a construção das relações entre o Brasil e os EUA, notadamente a partir da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e como os acontecimentos, durante e após o confito, também se orientam de acordo com as premissas de auxílio à modernização e à filantropia em voga, tomando como estudo de caso a participação do país norte-americano na organização da pesquisa e na formação de recursos humanos na Embrapa, em seu início. Ao final, comentários de conclusão.

Fome, miséria e a Revolução Verde: a ação do governo e das fundações filantrópicas dos EUA para a periferia capitalista na Guerra Fria

O fim da Segunda Guerra Mundial marca o início de uma nova postura dos EUA em relação a América Latina, exercendo uma política baseada na assistência técnica e fomento ao capital privado como forma de atender aos desejos por progresso econômico da região. Globalmente, percebe-se a preocupação crescente com o desenvolvimento dos países da periferia capitalista, notadamente aqueles impactados pelas transformações inerentes ao processo de industrialização em curso, como a rápida urbanização combinada com o crescimento populacional e maior demanda por produtos agrícolas. O desafo se colocava em capacitar essas áreas a atender a tais necessidades, o que passava obrigatoriamente por tornar a agricultura mais produtiva mediante o uso de tecnologias no campo (HAYAMI, RUTTAN, 1988, p. 2HAYAMI, Yujiro; RUTTAN, Vernon W. Desenvolvimento agrícola: teoria e experiências internacionais. Brasília: EMBRAPA- DPU, 1988.).

Observa-se, a partir de então, crescimento constante da importância desempenhada pelo ente privado nas relações com a América Latina, cujo papel, outrora exercido pelo governo dos EUA, passaria cada vez mais a ser feito por investimentos da iniciativa privada e por projetos de assistência técnica, transferência de capacidade tecnológica e programas alimentares, que teriam importância fundamental na região. Consideradas como elementos primordiais no desenrolar dos fatos ao longo do confito, ciência e tecnologia tornam-se elementos indispensáveis no mundo pós-guerra, ideia expressa no relatório Science The Endless Frontier, elaborado por Vannevar Bush, em 1945, com a finalidade de orientar a política de ciência e tecnologia dos EUA em tempos de paz.

De acordo com o documento, a pesquisa básica deveria ser incentivada e compreendida enquanto motor de todo o progresso pelo potencial de extensão de seus resultados em diversas áreas. Papel crucial nesse processo caberia à figura do cientista, a quem deveriam ser garantidas as totais condições para o desempenho de seu trabalho. Frente às novas responsabilidades inerentes a sua posição do pós-guerra, o governo dos EUA deveria promover o conhecimento científico e a formação de jovens pesquisadores, garantindo sua viabilidade não somente em seu território, mas em todo o mundo ocidental (BUSH, 1945, p. 18-19, 31-32BUSH, Vannevar. Science, the endless frontier. Washington D.C.: National Science Foundation, 1945.). A ciência deveria servir à humanidade por meio da luta contra doenças, gerando empregos e promovendo a segurança nacional, assegurando, destarte, a hegemonia estadunidense no período da Guerra Fria. Para isso, o fluxo de produção científica deveria ser contínuo e abundante, colocando-se enquanto ponto de partida do mundo que se estabelecia a partir de então.

Nesse cenário, os Estados Unidos lançaram sua estratégia, expressa no início de 1949, durante o discurso inaugural do mandato presidencial de Harry Truman. O Point IV4 4 Truman dividiu a sua fala em quatro pontos, sendo o Point III o chamado para a defesa militar do hemisfério contra o comunismo, que levaria à criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), e o Point IV o esforço em disseminar a influência americana nos países menos desenvolvidos através da transferência de tecnologia e da ideologia capitalista. Conforme indica Perkins, a OTAN e a assistência mediada pelo Point IV revelam-se como as faces da mesma moeda e expressam a crença de que os valores representados pelo capitalismo estadunidense deveriam prevalecer (PERKINS, 1997, p. 145). colocou-se como a iniciativa no pós-Segunda Guerra Mundial, que combina ciência e tecnologia mediante assistência técnica e incentivo ao investimento privado como elemento importante da política externa do governo dos EUA. A ação tinha por finalidade fazer com que o progresso técnico nas áreas da agricultura, saúde pública e educação atingissem de forma definitiva África, América Latina e Ásia, de modo que essas regiões utilizassem seus recursos humanos e naturais de forma mais eficiente e que isso lhes proporcionasse o alcance de melhores níveis de vida, resultando assim na produção de alimentos que acompanhasse o rápido crescimento da população, (EUA, 1949, p. 3), afastando o discurso comunista dos ouvidos famintos e insatisfeitos5 5 A assistência conferida pelo Point IV se basearia em projetos individuais, desenvolvidos para cada país, podendo também, em determinados casos, contemplar uma abordagem regional, envolvendo duas ou mais nações. Além do mais, no texto de sua proposta não há definição quanto ao prazo de duração, apresentando-se mais como um programa dinâmico e contínuo à procura não somente de objetivos específicos, mas de gerar um processo em longo prazo para o progresso mundial (EUA, 1949, p. 4-8). . Como contrapartida, o governo estadunidense esperava que os países participantes do convênio garantissem condições favoráveis para a livre circulação de capital privado, visando especialmente a proteção dos investimentos realizados por suas empresas, ao passo que estas se comprometiam em seguir minimamente as leis e garantir o desenvolvimento ante ao risco de expropriações e medidas protecionistas que as desfavorecessem (EUA, 1949, p. 24).

A chegada dos republicanos ao poder em 1952, com a eleição de Dwight Eisenhower, marca o tom do discurso anticomunista em relação à América Latina durante os anos de 1950 e reafirma a percepção da miséria e do subdesenvolvimento como catalisadores da revolução. Tal avaliação consta no relatório elaborado pelo irmão do presidente, Milton Eisenhower, cujo conteúdo enfatizava a demanda por desenvolvimento econômico e a necessidade de ação imediata pela melhoria no padrão de vida dos latino-americanos como ferramenta de combate ao comunismo. Uma vez mais, destaca-se a percepção de que pessoas em situação de pobreza poderiam buscar soluções radicais aos seus problemas, o que contrariaria os interesses dos EUA (SCHOULTZ, 2000, p. 373, 380-381SCHOULTZ, Lars. Estados Unidos: poder e submissão. Bauru: EDUSC, 2000.).

A solução para a situação foi lançada já no primeiro documento produzido pela administração Eisenhower, o relatório 144/1 do National Security Council (NSC 144/1) relativo às relações a serem empreendidas com a América Latina. Diante do anseio por melhores condições de vida na região, o documento revela em seu início o que julga ser uma tendência por parte da população em enxergar em governos de caráter nacionalista o caminho para alcançar esse objetivo. Isso demonstra que, para além do comunismo, a abordagem dos EUA ante a questão deveria ser pensada com a finalidade de deter a ascensão desses regimes, frente à observação de que o nacionalismo latino-americano se vincula historicamente a uma postura desfavorável aos EUA e cujo potencial poderia ser explorado pelos comunistas. Os objetivos elencados versam sobre a necessidade de ampliar a solidariedade entre os países do hemisfério sul em consonância com a agenda política dos EUA, promovendo o desenvolvimento político, econômico e militar da região, com o fto de reduzir e eliminar ameaças internas, garantir o acesso a insumos e a matérias-primas fundamentais para a sua segurança e promover a padronização das forças armadas latino-americanas mediante treinamento, doutrinação e oferta de equipamento (EUA, 1953, p. 6-7).

No âmbito econômico, o relatório recomenda a continuidade da política de assistência técnica iniciada com o Point IV de Harry Truman, ao afirmar que a ação do governo estadunidense se orientaria em revelar que o desenvolvimento econômico desejado seria alcançado por meio do capital privado (EUA, 1953, p. 8). Além do realce ao investimento privado, nota-se mais um endosso a um ponto levantado pelo Point IV, a garantia de um cenário interno propício aos investimentos, o que significava afastar toda e qualquer atitude contrária aos interesses dos Estados Unidos e de suas empresas, principalmente medidas de cunho nacionalista em um contexto no qual governos com essa orientação estavam à frente de economias importantes, como Getúlio Vargas, no Brasil, e Juan Domingo Perón, na Argentina. Por fim, o alinhamento observado nas propostas feitas por governos opostos, como o democrata Truman e o republicano Eisenhower, orientam para a consolidação do incentivo à difusão tecnológica mediante assistência técnica e à ênfase na participação da iniciativa privada como elemento da política de Estado para a América Latina advogada pelos EUA.

Todavia, antes mesmo da consolidação de uma política de Estado orientada à assistência técnica para a agricultura, o auxílio no combate à fome e o fomento à iniciativa particular no pós-guerra, podemos observar a ação de entes privados, com destaque para as fundações filantrópicas, como de grande importância na constituição da política externa com os países menos desenvolvidos. A atividade dessas organizações foi primordial e o que se observa, no desenrolar dos fatos, é que procedimentos que se iniciaram com a ação filantrópica foram elevados à categoria de políticas públicas e um dos principais elementos das relações internacionais dos EUA com o Terceiro Mundo6 6 No contexto analisado, o termo “Terceiro Mundo” refere-se à América Latina, África e Ásia, com exceção do Japão. ao passar dos anos. Para a compreensão desse processo, devemos observar principalmente a ação de duas grandes fundações, a Rockefeller e a Ford, que desde o início do século XX atuavam diretamente atentando para o combate à pobreza, a disseminação do capitalismo e o uso da ciência e tecnologia como ferramentas na relação com os países periféricos.

As fundações filantrópicas surgem no contexto de expansão industrial que se consolida na segunda metade do século XIX, ávido por novos mercados e fontes de matéria-prima que auxiliassem nesse avanço, especialmente o latino-americano. Elas são constituídas mediante a combinação das riquezas rapidamente acumuladas em um país jovem e de consciência puritana, da introdução de princípios financeiros e administrativos próprios da atividade capitalista para fundos de caridade e uma política de aumento dos impostos sobre as corporações. A reforma tributária realizada durante a administração de Woodrow Wilson (1913-1921), concedia isenção fiscal a toda contribuição realizada com fins de caridade. A medida serviu de incentivo à organização de fundações filantrópicas por famílias abastadas, visto que poderiam direcionar uma parcela de seus recursos sem a incidência de tributos para atividades concernentes aos seus interesses (ADAMS, 1970, p. 183-184ADAMS, Dale W. Relatório da Agency for International Development, Washington D.C., Estados Unidos da América. Agricultural development strategies in Brazil (1950-1970).).

Dessa forma, a instituição de uma fundação assegurava o uso da riqueza privada de seus proprietários para a ação pública e se valia da filantropia, cujo discurso se erigia em torno de pretensa ação desinteressada e movida unicamente pela caridade, para levar a cabo programas em situações políticas adversas, muitas vezes à margem da burocracia estatal, representando uma iniciativa de vanguarda na formação de políticas públicas mediante a criação de projetos-piloto com outros países onde a ação direta do governo dos EUA poderia causar algum embaraço. Logo, a ação das fundações revela-se como um elemento essencial para o poder público, não somente pela capacidade de parceria e assistência, mas também por substituir a ação deste. Os programas desenvolvidos serviriam como uma espécie de “laboratório”: as fundações se antecipariam nas ações e aquelas que obtivessem sucesso no âmbito da filantropia poderiam ser adotadas pelo governo estadunidense como práticas correntes em sua política externa (ADAMS, 1970, p. 177ADAMS, Dale W. Relatório da Agency for International Development, Washington D.C., Estados Unidos da América. Agricultural development strategies in Brazil (1950-1970).; NACLA, 1971, p. 22-23NORTH AMERICAN CONGRESS ON LATIN AMERICA (NACLA). Ciencia y Neocolonialismo. Buenos Aires: Ediciones Periferia, 1971.).

Fundada no início do século XX, de ação longeva e pioneira, a Fundação Rockefeller se coloca como um dos principais agentes nesse contexto. Ela foi estabelecida com vistas a administrar parte dos lucros auferidos pela família, que fez fortuna com petróleo, e terminou por desempenhar uma função central na filantropia como instrumento das relações internacionais de seu país. Ao longo de sua existência, observamos que a sua ação foi se alterando conforme as demandas exigiam, sendo que até os anos de 1920 sua atuação ocorria de forma mais pontual, como resposta a uma necessidade específica. Até os anos de 1940, seus esforços orientavam-se para a solução prática de problemas sociais, tendo no incentivo à pesquisa científica, especialmente em saúde pública, o principal instrumento de transformação. A partir da década de 1940, a instituição passa a dedicar espaço cada vez maior para as ciências agrícolas, ramo cujo envolvimento inicial data de trabalhos realizados na primeira década do século XX (FITZGERALD, 1994, p. 74FITZGERALD, Deborah. Exporting american agriculture: The Rockefeller Foundation in Mexico (1943-1953). In: CUETO, Marcos. Missionaries of Science: the Rockefeller Foundation and the Latin America. Bloomington: Indiana University Press, 1994.).

O início da guerra na Ásia e na Europa levou ao realinhamento estratégico da Fundação Rockefeller quanto às suas atividades, provocando a sua concentração no continente americano. A decisão também estava atrelada à crescente percepção por parte dos países mais pobres da necessidade do aprimoramento tecnológico da agricultura em uma sociedade em constante transformação, marcada principalmente pela transição para uma sociedade urbana. Ao mesmo tempo, os países detentores de tais tecnologias enxergavam que o desenvolvimento agrícola se tornava um componente cada vez mais presente e fundamental nas relações internacionais. Nesse contexto, a fundação escolhe o México7 7 A escolha do México para o início de um projeto com a Fundação Rockefeller relaciona-se diretamente com o contexto político mexicano da década anterior. Lázaro Cárdenas foi eleito em 1934, defendendo uma plataforma nacionalista que contemplava a ampliação do processo de reforma agrária, iniciado com a Revolução Mexicana e a estatização dos recursos naturais em um país cujo capital estrangeiro, especialmente o estadunidense, participava desde o século XIX. Frente a um panorama desfavorável, a filantropia era vista como alternativa estratégica a algo que poderia ser considerado hostil, a ação governamental direta dos EUA, mas mantinha estreito vínculo com eles travestindo-se de um discurso pautado pela ação desinteressada e caridosa, marcando posição e buscando influenciar as tomadas de decisões. Ademais, cabe destacar que a iniciativa da Fundação Rockefeller foi facilitada pela eleição de Manuel Ávila Camacho como sucessor de Lazaro Cárdenas, um político de discurso mais moderado e que havia enfatizado ao longo de sua campanha menos a reforma agrária do que a garantia da posse da terra e a necessidade de modernização e industrialização da economia nacional, devendo assim, promover maior aproximação com os EUA, cujos investimentos serviriam para materializar suas intenções (OASA, 1982, p. 984; PERKINS, 1997, p. 104-106). para iniciar um programa de assistência técnica para o setor agrícola através da instalação do Office of Special Studies, instituição responsável pelo início do processo que culminaria com o desenvolvimento de novas variedades de trigo e milho, que servirá de condicionante fundamental na formação dos sistemas nacionais de ciência e tecnologia para a agropecuária em países como o Brasil (PERKINS, 1997, p. 103PERKINS, John. Geopolitics and the Green Revolution: wheat, genes, and the Cold War. Nova Iorque: Oxford University Press, 1997.).

Paralelo a isso, pode-se também pontuar enquanto marco deste contexto a criação de duas instituições por Nelson Rockefeller, um dos membros de destaque da poderosa família, entre 1946 e 1947: a American International Association (AIA) e o International Basic Economy Corporation (IBEC), sendo a primeira uma organização sem fins lucrativos, porém ambas com a finalidade de fomentar um modelo de desenvolvimento capitalista estadunidense por meio de atividades como a extensão rural e o desenvolvimento científico e tecnológico. A agropecuária apresentava-se como objeto de particular interesse dessas organizações, frente ao grande potencial produtivo demonstrado por países como o Brasil, especialmente em regiões ainda pouco exploradas, como o Cerrado, cuja realização, entretanto, colocava-se somente através de contínuo processo de modernização. Para viabilizar tal empreendimento, o IBEC contava com um instituto de pesquisa, o IBEC Research Institute (IRI), cuja função revelava-se na busca pelo desenvolvimento de investigações que permitissem a exploração desses recursos8 8 As atividades do IBEC e do IRI com a agricultura brasileira iniciaram-se com estudos para a recuperação de solos desgastados em regiões de produção cafeeira no estado de São Paulo já na década de 1940. O programa foi desenvolvido em parceria com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e tinha por base a Fazenda Cambuhy, localizada no município de Matão, situada em uma região de antiga ocupação cafeeira no estado e, então, considerada a maior unidade produtora de café do mundo, com aproximadamente 5,5 milhões de pés da rubiácea. A essa iniciativa se somaram projetos voltados às potencialidades de ocupação da terra pela agricultura e a posterior criação de estações experimentais em zonas de Cerrado, como São Joaquim da Barra, em São Paulo, e Anápolis, em Goiás (HARRINGTON, SORENSEN, 2004, p. 6; NEHRING, 2016, p. 208). (NEHRING, 2016, p. 209NEHRING, Ryan. Yield of dreams: marching West and the politics of scientific knowledge in the Brazilian agriculture research corporation (Embrapa). In: Geoforum. Vol. 77, p. 206-217, dez/ 2016.).

Os anos de 1950 assistem ao avanço das atividades das fundações filantrópicas no continente asiático, região que também apresentava elevados níveis de miséria e pobreza, fatores entendidos como de risco e instabilidade, especialmente após a vitória comunista na Revolução Chinesa, a Guerra da Coreia e o acirramento da situação no Vietnã. A preocupação com o avanço do comunismo, aliado ao aumento da população e ao risco que a fome e a miséria representavam, fez com que a filantropia estadunidense ampliasse suas ações na região, iniciando um projeto piloto na Índia, em 1952. O cultivo eleito para centralizar as atividades de pesquisa foi o arroz, base alimentar de boa parte do continente. Além das fundações e do governo estadunidense, o Banco Mundial foi a outra parte componente do processo na Índia, responsável por servir de base creditícia para o financiamento das atividades, bem como disponibilizar técnicos treinados por especialistas envolvidos no programa mexicano (OASA, 1982, p. 999OASA, Edmund K; JENNINGS, Bruce W. La naturaleza de la investigación social en la agricultura internacional: la experiencia norteamericana, el IRRI y el CIMMYT. In: El Trimestre Económico. Ciudad de Mexico, vol. 49, nº 196, p. 975-1012, out-dez/ 1982.; SHIVA, 1993, p. 29-31SHIVA, Vandana. The violence of Green Revolution: Third World agriculture, ecology and politics. Londres: Zed Books, 1993.).

O êxito no programa mexicano e a parceria entre a Ford e a Rockefeller na Índia levaram ao que podemos nomear de período áureo da Revolução Verde, nos anos de 1960 e 1970. As atividades do Office of Special Studies mexicano foram encerradas em 1960, dando lugar ao Centro Inter nacional de Mejoramiento de Maiz y Trigo (CIMMYT) em 1966, também vinculado à filantropia estadunidense e com seu escopo de ação ampliado. Em 1962, foi criado, pela Fundação Rockefeller e pela Fundação Ford em Los Baños, Filipinas, o International Rice Research Institute (IRRI) responsável por desenvolver novas variedades de arroz, cujos resultados foram ainda mais rápidos que seu congênere mexicano. Até o final da década de 1960, as duas fundações ainda criariam o Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT), na Colômbia, e o International Institute for Tropical Agriculture (IITA), na Nigéria. Frente à expansão das atividades e complexificação da estrutura de pesquisa, o ano de 1971 assistiu à criação do Consultative Group of International Agriculture Research (CGIAR), um grupo composto por fundações filantrópicas, agências internacionais e governos nacionais, com vistas a fomentar o desenvolvimento agrícola e a difusão da tecnologia (CLEAVER, 1972, p. 178; PERKINS, 1997, p. 115PERKINS, John. Geopolitics and the Green Revolution: wheat, genes, and the Cold War. Nova Iorque: Oxford University Press, 1997.; OASA, 2011, p. 9OASA, Edmund K. The political economy of international agricultural research: a review of CGIARS response to criticism of the ‘Green Revolution. In: GLAESER, Bernhard. The Green Revolution revisited: critique and alternatives. Nova Iorque: Routledge, 2011.).

A década de 1970 ficou marcada pelo aumento de sua abrangência geográfica e financeira por meio da fundação de novas instituições. Em 1972, foi estabelecido no Peru o Centro Internacional de la Papa (CIP), experiência que havia sido iniciada pela Fundação Rockefeller em 1950, e o International Crops Research Institute for the Semi-Arid Tropics (ICRISAT) em Hyderabad, na Índia. No ano seguinte, o grupo decidiu pelo avanço das ações em pecuária no continente africano com a instalação do International Laboratory for Research on Animal Diseases (ILRAD) em Nairobi, Quênia, e do International Livestock Centre for Africa (ILCA), na Etiópia. Em 1974, podemos observar a adição de iniciativas inovadoras no âmbito institucional, refletidas na organização do International Board for Plant Genetic Resources (IBPGR), em Roma, Itália, uma instituição destinada a ser vir de banco de material genético de diversos cultivos, e do West African Rice Development Association (WARDA), sediado em Monrovia, Libéria, um programa cooperativo entre quinze países da África Ocidental destinado à pesquisa do arroz e ao desenvolvimento agrícola. Por fim, em 1976, veio o International Centre for Agricultural Research in the Dry Areas (ICARDA), em Beirute, Líbano (OASA, 2011, p. 12-13OASA, Edmund K. The political economy of international agricultural research: a review of CGIARS response to criticism of the ‘Green Revolution. In: GLAESER, Bernhard. The Green Revolution revisited: critique and alternatives. Nova Iorque: Routledge, 2011.).

O ano de 1970 marca a coroação do processo conhecido por Revolução Verde. Norman Borlaug, um dos pioneiros no programa mexicano e então diretor da divisão de trigo do CYMMIT, foi laureado com o Nobel da Paz em virtude de seu trabalho responsável pelo desenvolvimento do “miracle wheat”, semente que representava a possibilidade da expansão da produção de duas a três vezes em curto período de tempo. As novas variedades de milho e arroz produzidas pelo CYMMIT e IRRI também apresentavam igual façanha, aumentando a produtividade desses cultivos em regiões que até então conviviam com a escassez de recursos, fome e miséria (GLAESER, 2011, p. 1GLAESER, Bernhard. Agriculture between the Green Revolution and ecodevelopment: which way to go? In: GLAESER, Bernhard. The Green Revolution revisited: critique and alternatives. Nova Iorque: Routledge, 2011.). A estrutura organizada pelo CGIAR se colocava como modelo de sucesso a ser adotado. Pensando desde os anos de 1950, tal modelo – pautado na criação de institutos centrados em regiões específicas, de clima árido e semiárido, por exemplo, e em produtos como o arroz, milho e trigo – servirá de base para o desenvolvimento de institutos nacionais de pesquisa ao redor do globo, dentre os quais a Embrapa.

Dessa maneira, o que havia iniciado como uma parceria entre o governo mexicano e uma fundação filantrópica tornava-se um modelo de política agrícola universal, financiado e disseminado internacionalmente. Como afirmou Edmund Oasa (2011, p. 12)OASA, Edmund K. The political economy of international agricultural research: a review of CGIARS response to criticism of the ‘Green Revolution. In: GLAESER, Bernhard. The Green Revolution revisited: critique and alternatives. Nova Iorque: Routledge, 2011., a partir de então, as ciências agrícolas não se limitavam mais às fronteiras nacionais. A Revolução Verde se coloca como um caso emblemático dessa dinâmica marcada pelo forte elo entre as fundações filantrópicas e o governo dos EUA, caracterizando-se por um conjunto de medidas organizadas que se tornou elemento fundamental na relação dos Estados Unidos para com o Terceiro Mundo no pós-guerra.

Além dos ganhos políticos, o processo representou uma excelente oportunidade para o avanço da atividade econômica estadunidense, em especial das corporações vinculadas à agricultura. Fora a necessidade constante de irrigação, as “sementes milagrosas” de trigo e arroz apresentavam os resultados esperados mediante a adoção de um conjunto composto por fertilizantes, pesticidas, implementos e técnicas agrícolas denominado “pacote tecnológico”. Dessa forma, observa-se a ex- pansão das atividades das indústrias multinacionais dedicadas à produção desses implementos desde o fim da Segunda Guerra Mundial, especialmente em países de média e grande extensão, nos quais se enxergava grande potencial de consumo. Não coincidentemente, são os mesmos países nos quais agências internacionais, fundações filantrópicas e governos fixam seu auxílio e atividade. A adoção do pacote tecnológico consolidou a integração do setor agrícola à indústria capitalista, tornando o produtor mais dependente do mercado, visto que sua produção passa a depender não somente de elementos da natureza, mas de sua capacidade de gerar receita ou ter acesso a crédito para adquirir insumos, outro fator que termina por privilegiar o grande produtor (CLEAVER, 1972, p. 179; DAHLBERG, 1979, p. 109-110DAHLBERG, Kenneth A. Beyond the Green Revolution: the ecology and politics of global agricultural development. Plenum Press, Nova Iorque e Londres, 1979.).

Alinhando o Brasil à Revolução Verde: política de ciência e tecnologia para a agricultura brasileira após 1964 e a criação da Embrapa

O golpe civil-militar de 1964 foi responsável por alterar sensivelmente as relações de poder existentes, bem como a orientação do Estado para o desenvolvimento nacional. Antes vinculado a um modelo nacional-autonomista, a agenda econômica passa a se guiar pela via do crescimento associado, abrindo a economia nacional ao capital externo e condicionando a estratégia de expansão a ele. É sobretudo a partir desse momento que a geração de conhecimento e a ciência e tecnologia passam a ser vistas como condição sine qua non na transformação do Brasil em potência econômica e militar. Quanto ao setor agrícola, observa-se paulatino abandono da proposta de reforma agrária como meio de alavancar o desenvolvimento do setor, tomando corpo a ideia de modernização da produção agrícola e a difusão de conhecimentos do centro para a periferia do capitalismo como arranjo adequado para a situação (SERAFIM, 2011, p. 159SERAFIM, Milena P. Agricultura familiar: uma “análise política” das políticas e instituições. Tese de doutorado, Política Científica e Tecnológica Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, 2011.).

Ainda inserido no contexto de inflação e estagnação econômica, o governo de Humberto Castello Branco (1964-1967) lançou sua plataforma de ação através do Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) que, em linhas gerais, refletia a orientação do golpe que destituiu João Goulart ao reafirmar o respeito às leis do mercado, ao mesmo tempo em que defendia a necessidade da presença governamental para a melhoria na distribuição de renda e riqueza. Quanto ao setor agrícola, o programa incorporava as observações já estabelecidas, apresentando-o em seu aspecto retardatário e de baixa produtividade, condicionante fundamental nas constantes crises de abastecimento que provocavam a alta dos preços. Com a finalidade explícita de retomar o crescimento econômico, faziam-se necessárias propostas que significassem alterações profundas para o campo, ao proporcionar o fornecimento de alimentos e matérias-primas em quantidade para o setor urbano-industrial, além de garantir a geração de divisas para o financiamento das importações de bens de capital (NETO, 1997, p. 127-28NETO, Wesceslau Gonçalves. Estado e agricultura no Brasil: política agrícola e modernização econômica brasileira (1960-1980). São Paulo: Hucitec, 1997.).

Dentro dessa proposta, havia o diagnóstico sobre os principais fatores que dificultavam o uso de tecnologias que poderiam proporcionar o desenvolvimento das atividades agrícolas, dentre os quais estavam a estagnação da produtividade média, o desfalque verificado na escolarização do trabalhador rural e a disparidade na distribuição da terra no país. Como metas a serem atingidas, o PAEG elencou como prioridades para o setor agrícola o aumento da produção de alimentos, de matérias primas e de produtos exportáveis, e a diminuição das importações agrícolas, notadamente o trigo, aliado a demais orientações, como a previsão do fim do tabelamento de preços com vistas a incentivar a exportação, o aprimoramento da política de preços mínimos, a expansão do crédito agrícola, o aumento da capacidade de armazenamento e o incentivo ao uso de insumos e mecanização. Quanto à questão fundiária, o programa apresentava uma proposta modesta de reforma agrária que seria paulatinamente substituída pela política de modernização agrícola pautada na pesquisa, extensão rural e crédito. Assiste-se, então, a uma maior ênfase na colonização, com a distribuição de populações rurais e treinamento da mão de obra (CASTRO, 1984, p. 328CASTRO, Ana C. Ciência e tecnologia para a agricultura: uma análise dos planos de CLEAVER JR., Harry M. The contradictions of Green Revolution. In: The American Economic Review. Pitsburgh, vol. 62, nº. ½, 1972, p. 177-186.; NETO, 1997, p. 128-129NETO, Wesceslau Gonçalves. Estado e agricultura no Brasil: política agrícola e modernização econômica brasileira (1960-1980). São Paulo: Hucitec, 1997.).

O governo de Castello Branco tinha como principal preocupação o combate à infação, que impactava a economia brasileira desde fins da década de 1950, valendo-se de premissas liberais, o que significava a diminuição da participação estatal na economia através da redução dos investimentos públicos, afetando diretamente a ciência e tecnologia. Todavia, deve-se destacar que essa área era vista como campo estratégico pelos militares, compreensão derivada dos corredores da Escola Superior de Guerra (ESG), tendo por base a Doutrina de Segurança Nacional (DSN). Tal compreensão se inseria no contexto da Guerra Fria, em que a Ciência e Tecnologia (C&T) passaram a ser compreendidas como fatores-chave no campo da soberania e segurança nacional, bem como na luta contra o “inimigo externo”, no caso, o comunismo soviético. Logo, mesmo com as restrições impostas pela política econômica empreendida, observa-se como transformações do período a criação do Fundo de Desenvolvimento Técnico-Científico (FUNTEC), em 1964, bem como alterações na Capes e no CNPq que vinculassem ambos às premissas da ditadura e da DSN. Destoando da retórica nacionalista militar, observa-se com a PAEG o estímulo à entrada de capitais estrangeiros e o suprimento das demandas tecnológicas nacionais através de investimento e difusão de tecnologias de fora, fato observado na agricultura, cujo programa marca a guinada da modernização baseada na difusão de pacotes tecnológicos9 9 Segundo Ronaldo Conde Aguiar (1986, p. 42-43), entende-se o pacote tecnológico para a agricultura “como o conjunto de técnicas, práticas e procedimentos agronômicos que se articulam entre si e que são empregados indivisivelmente numa lavoura ou criação, segundo padrões estabelecidos pela pesquisa. Em outras palavras, o pacote tecnológico corresponde, por assim dizer, a uma linha de montagem, onde o uso de determinada tecnologia ou componente – sementes melhoradas, por exemplo – exige o uso de determinadas tecnologias ou componentes anteriores – máquinas e equipamentos para os serviços de preparo do solo; calagem para correção do solo – e leva ao emprego de determinadas tecnologias ou componentes posteriores – adubação e combate químico de pragas”. de insumos e máquinas, em detrimento do esforço em prol da política fundiária anterior (CASTRO, 1984, p. 328CASTRO, Ana C. Ciência e tecnologia para a agricultura: uma análise dos planos de CLEAVER JR., Harry M. The contradictions of Green Revolution. In: The American Economic Review. Pitsburgh, vol. 62, nº. ½, 1972, p. 177-186.; MOTOYAMA, QUEIROZ, VARGAS, 2004, p. 325-326MOTOYAMA, Shozo; QUEIROZ, Francisco de Assis; VARGAS, Milton. 1964-1985: sob o signo do desenvolvimento. In: MOTOYAMA, Shozo. Prelúdio para uma história: ciência e tecnologia no Brasil. São Paulo: EDUSP, 2004.).

Sucedendo Castello Branco, o governo de Artur da Costa e Silva (1967-1969) tinha como norte de sua política econômica a contenção da infação atrelada à aceleração do crescimento, materializado no Programa Estratégico de Desenvolvimento (PED), que tinha por finalidade orientar a ação governamental em 1967, o primeiro do governo de Costa e Silva, e planejar as atividades para os três anos seguintes. Diferentemente do ocorrido no governo anterior, cuja prioridade era sanar as contas públicas e conter o processo infacionário, o novo presidente se comprometia a não somente manter controlado o processo infacionário, como “consolidar a obra revolucionária” e, principalmente, “promover a aceleração do desenvolvimento”, possível somente com “um clima de ordem interna e estabilidade institucional” (BRASIL, 1967, p. 6, 8BRASIL. Ministério do Planejamento e Coordenação Geral. Diretrizes de Governo – Programa Estratégico de Desenvolvimento. Brasília, 1967.). Para o alcance dessas metas, o programa revela como premissas de ação a participação da iniciativa privada, fortalecendo a sua participação em detrimento do Estado, que deverá delegar ao setor privado tudo o que puder ser contratado, o incentivo à ciência e tecnologia, além de admitir o capital estrangeiro enquanto importante ferramenta para o desenvolvimento da economia brasileira, reforçando mais uma vez a plataforma liberal na qual se assentava a orientação econômica dos militares (BRASIL, 1967, p. 11BRASIL. Ministério do Planejamento e Coordenação Geral. Diretrizes de Governo – Programa Estratégico de Desenvolvimento. Brasília, 1967.).

A agricultura foi elencada como uma das áreas prioritárias de ação governamental e de incentivo ao avanço tecnológico. Enquanto ações estratégicas para o setor, o PED propunha a criação de programas para o aumento da produtividade de alimentos básicos, gado de corte e laticínios, incentivo ao uso de fertilizantes, defensivos, sementes melhoradas e mecanização, crédito agrícola e industrialização do meio rural. A elevação da produção e da produtividade agrícolas, através do uso de métodos intensivos em insumos e mecanização agrícola, era apontada como a primeira área estratégica do programa, vinculando-se diretamente às soluções para os gargalos de abastecimento, à questão infacionária e ao crescimento econômico em geral, que seriam atingidos por meio de uma “revolução tecnológica” no setor10 10 Além da agricultura, ciência e tecnologia aparecem pela primeira vez em uma plataforma de governo dentre as áreas estratégicas de atuação. Apesar da novidade e de reconhecer o investimento no setor como “uma das formas mais eficientes de vencer as etapas de desenvolvimento e eliminar o atraso econômico”, as recomendações são genéricas, comprometendo-se com o auxílio e fortalecimento da tecnologia nacional “em suas várias modalidades”, sem, todavia, especificá-las. Mesmo com essa lacuna, percebe-se o interesse expresso na criação e consolidação de fundos de desenvolvimento, dos quais se destaca a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), em 1969, com o objetivo precípuo de fomentar a pesquisa em ciência e tecnologia como ferramenta de desenvolvimento econômico (BRASIL, 1967, p. 62; DIAS, 2012, p. 99). (BRASIL, 1967, p. 49BRASIL. Ministério do Planejamento e Coordenação Geral. Diretrizes de Governo – Programa Estratégico de Desenvolvimento. Brasília, 1967.).

Lançado durante a presidência de Emilio Garrastazu Médici (1969-1974), as propostas para a agricultura expostas no Programa de Metas e Bases para a Ação do Governo podem ser vistas como continuação de seu predecessor por também se situarem em uma conjuntura econômica favorável e por reforçarem a orientação explícita contida anteriormente, ou seja, uma política de modernização que dispensasse transformações estruturais, como a reforma agrária. Os instrumentos financeiros e fiscais seriam ampliados, dentre os quais assinalavam-se medidas de incentivo fiscal, a expansão da política creditícia com a inserção dos bancos privados no processo e a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Agrícola (FUNDAG). Além do mais, o programa apresentava tratamento mais claro sobre o papel da pesquisa agrícola no processo de modernização, mas ainda sem cogitar a criação de um novo organismo estatal que organizasse a ação no setor, mesmo enfatizando a necessidade de reformulação do programa de pesquisa agrícola, de forma a enquadrá-lo na estratégia governamental (CASTRO, 1984, p. 332CASTRO, Ana C. Ciência e tecnologia para a agricultura: uma análise dos planos de CLEAVER JR., Harry M. The contradictions of Green Revolution. In: The American Economic Review. Pitsburgh, vol. 62, nº. ½, 1972, p. 177-186.; AGUIAR, 1986, p. 94AGUIAR, Ronaldo Conde. Abrindo o pacote tecnológico: Estado e pesquisa agropecuária no Brasil. São Paulo: Polis/CNPq, 1986.).

A crescente ênfase dada à importância de se transformar a agricultura brasileira através de sua modernização levou à criação do Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária (DNPEA), buscando maior integração entre os órgãos de pesquisa existentes e a formação de comissões que permitiriam traçar planos nacionais de investigação agropecuária (RODRIGUES, 1987, p. 227-28RODRIGUES, Cyro Mascarenhas. A pesquisa agropecuária no período do pós-guerra. In: Caderno Difusão Tecnológica. Brasília, v 4, nº 3, p. 205-254, set/dez/ 1987.). Na esteira dessas mudanças, o Ministério da Agricultura e o Ministério do Planejamento estabeleceram uma Comissão de Alto Nível para avaliar a situação da pesquisa agropecuária no país e realizar o diagnóstico do setor acerca de suas virtudes e gargalos existentes. O grupo era formado por oito técnicos11 11 A Comissão de Alto Nível era formada por Mozart Teixeira Liberal (Ministério da Agricultura), Oto Lyra Schrader (Ministério da Agricultura), Plínio Cordeiro Molleta (Ministério da Agricultura), Ivo Torturella (IICA), Salomão Aronovich (Administrador do Programa “Food for Peace” no Brasil), Antônio Sacundino São José (Agroceres/IBEC), Carlos Arnaldo Krug (IAC/FAO) e Clibas Vieira (Professor da Escola Superior de Agricultura e Veterinária de Viçosa/Minas Gerais) (MENGEL, p. 96, 2015). , dos quais seis eram agrônomos e um médico veterinário, sendo que cinco deles haviam realizado pós-graduação em nível de mestrado e doutorado nos EUA. Conforme expõe Alex Mengel (2015, p. 95)MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015., a comissão defendia transformações sob a perspectiva agronômica, baseada em métodos, tecnologias e conceitos delineados pela orientação presente nas ciências agronômicas estadunidenses, além de sofrer grande influência das recomendações provenientes de institutos, organizações e fundações pertencentes ou sob influência direta da política de Estado dos EUA, como o Instituto Interamericano de Ciências Agrícolas (IICA), vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), o IBEC, instituição da família Rockefeller, e a FAO – ONU.

A partir de então, o planejamento da pesquisa agrícola, anteriormente em mãos de técnicos do Ministério da Agricultura, passa a ser orientado por indivíduos vinculados ao capital estrangeiro, notadamente estadunidense. O relatório final sinalizou a existência de três pontos positivos e sete negativos, elencando dezoito recomendações no total, dentre as quais a criação de um Conselho Superior de Pesquisa Agropecuária, cuja metade dos membros fosse composta por pessoas que não pertencessem aos quadros do ministério, e o incentivo à participação de economistas na formulação de projetos. Além do mais, sugeriu-se o estabelecimento de um plano de carreira aos pesquisadores e a paridade salarial com docentes universitários, a garantia de um orçamento regular e condizente às necessidades existentes, a autonomia administrativa e financeira às instituições de pesquisa e a ampliação das atividades que possibilitassem o maior conhecimento e possibilidades de exploração na Amazônia, Nordeste, Cerrado, norte do Paraná e sul do Mato Grosso (RODRIGUES, 1984, p. 224-25).

A Comissão de Alto Nível também elaborou um plano operacional para a utilização dos recursos obtidos por meio de empréstimos com instituições internacionais, notadamente as vinculadas à esfera hegemônica dos EUA. O Programa Especial de Pesquisa Agropecuária (PEPA) foi criado com o objetivo de aprimorar a capacidade técnica do DNPEA e de outros órgãos de pesquisa do país, através da formação de pesquisadores em nível de pós-graduação, e executar projetos de pesquisa definidos como prioritários ao desenvolvimento nacional. Conforme observa Cyro Rodrigues, o PEPA se caracteriza enquanto organização embrionária da Embrapa, com premissas institucionais muito semelhantes às que seriam seguidas pela futura instituição (RODRIGUES, 1984, p. 233-36).

Concernente às transformações cada vez mais constantes e direcionadas ao sistema de pesquisa agropecuária, reflexo da orientação ao setor determinada com o golpe civil-militar de 1964, e em continuidade à realização da Comissão de Alto Nível, o então ministro da Agricultura Luís Fernando Cirne Lima decidiu estabelecer um grupo de trabalho responsável pela análise e construção de propostas destinadas à reformulação da pesquisa agrícola nacional, instituída através da portaria nº 143, de 18 de abril de 1972. Inicialmente com dois componentes, José Irineu Cabral e Oto Lyra Schrader, o grupo foi ganhando novos especialistas, chegando ao total de sete12 12 O Grupo de Trabalho de 1972 era formado por Eduardo Bello (IICA), Francisco Arino da Costa e Silva (BID), Edmundo Fontoura Gastal (ASCAR/IICA), José Pastore (USP), Eliseu Roberto de Andrade (ACAR/ MG), José Irineu Cabral (Ministério da Agricultura/ABCAR/BID/IICA) e Oto Lyra Schrader (Ministério da Agricultura) (MENGEL, 2015, p. 97). , somados a um advogado para assessoria jurídica. Dos componentes, quatro eram engenheiros agrônomos, um médico veterinário, um economista e um cientista social, apontando a uma composição distinta da comissão anterior, por comportar membros provenientes das ciências sociais aplicadas. Todavia, enquanto continuidade, podemos indicar a formação ou o vínculo dos membros com instituições universitárias ou órgãos vinculados aos EUA ou a sua política externa. Por fim, nota-se que os componentes do grupo de trabalho vão desempenhar funções essenciais na organização da Embrapa ao longo de sua primeira década, como José Irineu Cabral e Eliseu Roberto de Andrade, futuros presidentes da instituição (CABRAL, 2005, p. 40CABRAL, J. Irineu. Sol da manhã: memória da Embrapa. Brasília: UNESCO, 2005.; MENGEL, 2015, p. 95-97MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015.).

O relatório final do grupo de trabalho, “Sugestões para a Formulação de Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária”, comumente conhecido por “Livro Preto”, foi entregue em junho de 1972 e trazia o resultado da avaliação e recomendações quanto às transformações a serem adotadas no setor. Assim como em pareceres anteriores, apresenta-se a agricultura enquanto setor vital para a economia nacional, mas organizada em uma estrutura produtiva defasada, pautada em métodos tradicionais de produção e com expansão baseada principalmente na ampliação da fronteira agrícola e de incentivos governamentais. Enquanto método de apresentação de suas conclusões, o relatório divide-se no levantamento dos aspectos positivos e negativos presentes na estrutura de pesquisa agrícola nacional apontados pelos técnicos. Quanto aos positivos enaltecia a estrutura dos laboratórios e campos de experimentação existentes no âmbito do DNPEA, o portfólio de resultados das pesquisas que permitiriam ganho imediato se aplicados de forma adequada, técnicos capacitados e meios de divulgação científica, indicando a estrutura existente a qual se assentaria às mudanças propostas.

Frente aos pontos positivos, os pontos de estrangulamento são apontados em número muito superior, totalizando trinta e um gargalos que, de acordo com a leitura do grupo de trabalho, praticamente inviabilizavam a atividade de pesquisa agrícola no país. Tal análise coaduna com a tese predominante no pós-golpe de 1964 sobre os motivos do atraso da agricultura brasileira centrarem-se na ausência de um processo de modernização que viabilizasse a elevação da produção e produtividade no campo. Ademais, o diagnóstico aponta como pontos críticos a necessidade de se reavaliar setores que passaram a ter destaque cada vez maior na ação estatal a partir dos anos de 1950, como o planejamento e a programação da atividade de pesquisa pública agrícola e vínculos mais estreitos com a iniciativa privada. Constata-se também o destaque dado ao que se percebia enquanto lacuna e deficiência na formação dos técnicos e pesquisadores, tanto em nível superior como em pós-graduação, bem como a defesa da autonomia financeira e administrativa ante a rigidez existente na captação de recursos, cujo exemplo a ser seguido era o do arranjo existente nos EUA, ambos pontos sensíveis e que servirão de norte para a fundação e o funcionamento da Embrapa em seu início (BRASIL, 2006, p. 19BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Sugestões para a Formulação de um Sistema de Pesquisa Agropecuária. Brasília, 2006.).

Partindo dos gargalos identificados e dos princípios responsáveis por delinear a ação, os técnicos reunidos no Grupo de Trabalho concluíram que, mesmo observando-se progressos no modelo vigente, a estrutura institucional existente, centrada no DNPEA, não atendia às necessidades de expansão e melhoria da pesquisa agropecuária nacional, em virtude da ausência de instrumentos fexíveis e ágeis para a execução. As alternativas consideradas cabíveis orbitavam em dinamizar as ações do DNPEA, buscando conceder-lhe a flexibilidade e a autonomia indispensáveis, conforme sugerido no relatório, ou a criação de uma empresa pública vinculada ao Ministério da Agricultura e responsável por realizar a pesquisa pública do setor no Brasil. Por se tratar de um órgão de administração indireta, a empresa pública contaria com os instrumentos necessários e a flexibilidade e a eficiência preconizadas nas recomendações técnicas expressas na avaliação do GT. Dessa forma, propunha--se a organização de um Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, dotado de um Conselho Nacional, de Conselhos Regionais, no qual a empresa pública de pesquisa substituiria as funções do DNPEA e centralizaria as ações do referido sistema, configurando-se como o principal elo da pesquisa agrícola entre o Governo Federal, os estados e a iniciativa privada, delineando, assim, a política de ciência e tecnologia agrícola brasileira13 13 Cabe destacar que as recomendações expostas no “Livro Preto” se inserem como elemento de um contexto mais abrangente, no qual as medidas são realizadas visando não somente a organização da pesquisa agropecuária nacional, mas refletem o seu arranjo e inserção na política econômica e de ciência e tecnologia no Brasil da ditadura civil-militar. Lançado em 1971, o I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) caracteriza a ação da ditadura em inserir a ciência e tecnologia na vereda do desenvolvimento do país, reunindo medidas de planejamento econômico para o período compreendido entre 1972 e 1974. Para a agricultura, a ciência e tecnologia também destinavam espaço de destaque nas previsões para a expansão do setor. O plano previa o incentivo à modernização do setor no Centro-Sul e sua inserção na proposta de integração nacional, desenvolvendo a agricultura no Nordeste, além de expandir a fronteira agrícola, incorporando os vales úmidos dessa região bem como as novas áreas na Amazônia e no Planalto Central. (BRASIL, 1971, p. 24-25). O I PND também traz a necessidade de coordenação e modernização da estrutura institucional de ciência e tecnologia nacional. O decreto nº 70.553, de 17 de maio de 1972, delibera sobre o setor de ciência e tecnologia no Brasil, determinando sua organização em forma de sistema integrado. Assim, a orientação de atividades e a organização orçamentária passaram a ser estabelecidas pelo Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT), cuja proposta seria elaborada pelo Ministério do Planejamento em conjunto com o CNPq. O PBDCT passou a ser o instrumento de planejamento do Sistema Nacional de Tecnologia, constituído através da ação coordenada de sistemas setoriais (dentre os quais a agricultura) e cuja primeira ocorrência se dá através do decreto nº 72.527, de 25 de julho de 1973, que institui o I Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o biênio 1973/1974 (BRASIL, 1972, p. 82-86). (BRASIL, 2006, p. 42-44BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Sugestões para a Formulação de um Sistema de Pesquisa Agropecuária. Brasília, 2006.).

Meses após a conclusão dos trabalhos que resultaram no “Livro Preto”, a lei nº 5.851, de 7 de dezembro de 1972, autoriza a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), definindo-a como subordinada ao Ministério da Agricultura, de direito privado e provida de autonomia administrativa e financeira. No texto, definiam-se suas finalidades como as de promover, estimular, coordenar e executar atividades de pesquisa agrícola no país, além de conceder apoio técnico e administrativo a organismos do Poder Executivo, sendo-lhe facultada o desempenho de funções através de convênios e parcerias com instituições públicas e privadas, nacionais ou estrangeiras. A empresa se estabelecia na estrutura do DNPEA, herdando seus laboratórios e estações experimentais, e contava com recursos provenientes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Banco Nacional de Crédito Cooperativo, Companhia Brasileira de Alimentos (Cobal) e Companhia Brasileira de Armazenamento (Cibrazem), além de verbas provenientes de contratos e convênios firmados com entes federativos, iniciativa privada e doações (BRASIL, 1972BRASIL. Lei n. 5851, de 7 de setembro de 1972. Autoriza o Poder Executivo a instituir a empresa pública, sob a denominação de Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e dá outras providências, Brasília, DF, dez. 1972.).

Relações entre Brasil e EUA e a ação estadunidense n a formação de técnicos da Embrapa

As relações dos EUA com o Brasil encontram no século XX um momento privilegiado de sua construção e consolidação. Apesar do vínculo existente desde a independência brasileira – os EUA foram a primeira nação soberana a reconhecer esse status –, as relações entre ambos se caracterizaram por sua descontinuidade ao longo de todo o século XIX, devido ao processo de formação dos respectivos territórios nacionais e aos confitos a ele inerentes, assim como à hegemonia inglesa e seus impactos na América Latina em tempos de pax britannica. O elo passa a se tornar mais consistente por meio do fortalecimento do movimento republicano que culminará com a proclamação em 15 de novembro de 1889, momento no qual o histórico político estadunidense foi espelho para o momento que se iniciava. Além do aspecto político, a abertura do mercado para o café brasileiro foi outro marco importante no estreitamento dos laços (HIRST, 2009, p. 19-20HIRST, Monica. Brasil-Estados Unidos: desencontros e afinidades. Rio de Janeiro: FGV, 2009.).

Os anos de 1930, notadamente as relações estabelecidas entre Roosevelt e Getúlio Vargas, marcam um período crucial no amadurecimento da ligação entre as duas nações, momento da história nacional que se inicia o processo de “americanização” do Brasil14 14 O “americanismo” repousava na difusão de premissas e conceitos que representariam determinados valores como sendo inerentes aos EUA e ao ser americano, como a democracia atrelada às noções de liberdade, direitos individuais e independência. Todavia, o componente ideológico mais importante seria o progressimo, ideia associada ao racionalismo, à abundância e à capacidade criativa do homem estadunidense, ao qual também se unem termos como progresso, ciência, tecnologia, racionalidade, eficiência, gerenciamento científico etc. O tradicionalismo (concepção marcada pelo mito da vida na cidade pequena, pela íntima relação com a natureza, pelo apego aos valores familiares, pela coragem e pelo temor a Deus) é o item que encerra a composição do americanismo enquanto noção que os EUA buscavam estender à América Latina no período analisado, notadamente o Brasil (TOTA, 2000, p. 19-20). . A Segunda Guerra Mundial se coloca como momento fundamental na consolidação desse ideal, no qual o americanismo passa a ser enxergado como ferramenta importante na construção da relação com os países latino-americanos, com vistas a consolidar a região enquanto aliada contra o Eixo (Alemanha, Itália e Japão), garantir o seu mercado consumidor e suas matérias-primas para o esforço de guerra. Esse período também consolida a posição do Brasil como aliado essencial e marca a sua ascensão como principal potência da região carreada pela ação direta dos EUA preocupado com a possibilidade de um país com tamanha extensão territorial cair em mãos inimigas. Deve-se também destacar que esse método de ação não ocorria somente por meio de ações governamentais, mas também contava com a participação de entes privados, dos quais destacam-se as fundações filantrópicas, especialmente a Fundação Rockefeller15 15 Além dos aspectos relativos à vulnerabilidade existente em relação ao aparato militar, enxergava-se a miséria e a pobreza existentes na região como fatores desestabilizadores, que colocavam em ameaça toda a América. Tal preocupação refletiu-se nas propostas defendidas para a região nas eleições presidenciais que reelegeram Franklin Roosevelt em 1940, sendo que a proposta do grupo chefado por Nelson Aldrich Rockefeller, denominada Junta, sagrou-se vencedora com a defesa do combate ao crescimento do comércio e influência do Eixo, mediante uma ação em que os EUA adequariam sua política aos movimentos nacionalistas latino-americanos. A proposta materializou-se com a produção de um relatório nomeado Hemisphere Economic Policy, o qual expressava como única forma de combate ao nazismo a adoção de medidas que tornassem a economia da América Latina mais estruturada e competitiva, comprando a produção agrícola e mineral como forma de elevar o nível econômico e servindo de mola propulsora para o desenvolvimento da região. (TOTA, 2000, p. 46TOTA, Antonio Pedro. O imperialismo sedutor: a americanização do Brasil na época da Segunda Guerra. São Paulo: Cia. das Letras, 2000.).

A postura brasileira após o final do confito, já no governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1951), indicava o entendimento de ser merecedora de tratamento diferenciado por parte dos EUA, em virtude da dedicação empreendida em tempos de guerra16 16 Aliado a iniciativas do governo brasileiro para viabilizar o investimento estrangeiro no país, Dutra tomou um conjunto de medidas, como a repressão do movimento operário, política econômica de caráter liberal e o pronto alinhamento aos EUA no contexto da Guerra Fria, marcados pelo rompimento das relações diplomáticas com a URSS e a cassação do registro do Partido Comunista do Brasil (PCB). . Entretanto, segundo a ótica do governo estadunidense, o fim do confito trazia a necessidade da concentração de esforços para a reconstrução do mundo europeu pós-guerra através do Plano Marshall e a luta contra a expansão do comunismo. Quanto ao Brasil, seguindo a ideia norteadora para toda a América Latina, o entendimento era de que o país deveria amparar o seu desenvolvimento em seus recursos internos com o auxílio do capital privado internacional, centrado na atividade das corporações multinacionais dos EUA, não de seu Departamento de Estado17 17 O Departamento de Estado dos Estados Unidos da América equivale ao Ministério de Relações Exteriores, sendo o principal responsável pelos vínculos e pelas parcerias empreendidas com outras nações. .

Desde o final da Segunda Guerra Mundial, a relação entre Brasil e EUA, salvo durante a presidência de Castello Branco, esteve longe de ser linear ou marcada por alinhamento natural, sendo mais caracterizada pela disputa de interesses entre as duas nações e pela consolidação de suas respectivas posições em um mundo marcado pelo capitalismo em expansão e a sua ameaça materializada na URSS. Entretanto, mesmo com as idas e vindas diplomáticas, ora tendendo o Brasil a uma conduta mais autonomista, ora os EUA anunciando um afastamento de um estado chefado por apologistas da tortura, o que se percebe, desde 1945, é a defesa realizada por parte do governo estadunidense de marcar posição através da participação econômica e do investimento direto, principalmente das empresas privadas, mas também de bancos, instituições, programas de auxílio e assistência técnica sob a alçada de influência do Departamento de Estado. Fator importante nas relações estabelecidas entre os dois países, a concessão de crédito via empréstimo e a participação de universidades dos EUA se configuram enquanto elementos fundamentais não somente para a criação e estruturação da Embrapa, notadamente na formação de seus recursos humanos, mas de todo o sistema de pesquisa e extensão agropecuária brasileiro que se organizava, da qual a fundação da empresa se constitui enquanto peça primordial.

As parcerias estabelecidas com universidades estadunidenses foram um elemento importante na cooperação entre os dois países no período, relação que desembocará na criação da Embrapa e na formação de seus quadros técnicos na sua primeira década de existência. De escala modesta, o primeiro contrato foi feito ainda nos anos de 1950, entre a Purdue University e a Universidade Rural de Minas Gerais, hoje Universidade Federal de Viçosa. O programa foi expandido no final da década e, em 1963, as universidades de Wisconsin e Ohio State estabeleceram, respectivamente, convênios com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e com a Escola Superior Agrícola Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (ESALQ /USP), sendo que, no ano seguinte, a University of Arizona iniciou trabalhos com a Universidade Federal do Ceará (UFC). Por volta de 40 pesquisadores dos EUA trabalharam nos contratos, tendo dentre os objetivos auxiliar a expansão das universidades brasileiras e a estruturação dos departamentos em temas-chave, como agronomia e economia rural (ADAMS, 1970, p. 10ADAMS, Dale W. Relatório da Agency for International Development, Washington D.C., Estados Unidos da América. Agricultural development strategies in Brazil (1950-1970).).

A parceria com a Purdue University previa fornecimento de uma equipe de profissionais da universidade para trabalhos no Brasil formada por até 50 pesquisadores por ano de vigência, sendo o mais extenso dos contratos analisados. As pesquisas de milho e sorgo seriam feitas no Instituto de Pesquisas Agropecuárias do Centro-Oeste (IPEACO), em Sete Lagoas, Minas Gerais, futuro Centro Nacional de Pesquisa do Milho e Sorgo da Embrapa, enquanto que as atividades dedicadas ao feijão ocorreriam na Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais (BRASIL, 1972, p. 45-48BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato entre a República Federativa do Brasil e o Conselho Administrativo da Universidade de Wisconsin. Brasília, DF, 1972.). A outra frente diz respeito ao programa de treinamento a ser desenvolvido em parte no exterior, mediante a identificação de candidatos para a concessão de bolsas de estudo em universidades estrangeiras, e em parte no país, atuando diretamente nas universidades por meio da reorganização e instituição de cursos de pós-graduação, orientações acadêmicas e participação em grupos de pesquisa.

Em 1972, também foi assinado um acordo com a University of Wisconsin para a prestação de serviços na área de assistência técnica ao Ministério da Agricultura, com duração de 5 anos. A universidade forneceria o total de até 34 pesquisadores por ano para o desenvolvimento e a execução de projetos com soja e arroz. Além disso, a equipe se dedicaria a desenvolver e lecionar em cursos de pós-graduação das universidades brasileiras e selecionar candidatos para a realização de pós-graduação nos Estados Unidos (BRASIL 1972, p. 33-34BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato entre a República Federativa do Brasil e o Conselho Administrativo da Universidade de Wisconsin. Brasília, DF, 1972.).

Por fim, em 24 de janeiro de 1973, foi publicado no Diário Oficial o acordo de cooperação técnica com a University of Florida. Previsto para 5 anos, o acordo estabelecia o envio de pesquisadores e técnicos para a execução do Projeto Nacional de Pesquisa de Bovinos junto ao Instituto de Pesquisas Agropecuárias do Centro-Sul (IPEACS) e em cooperação com a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFR-RJ). Após esse período, a equipe seria destinada a localidades do interior para a difusão dos resultados obtidos. Ademais, os profissionais alocados no Brasil ficariam responsáveis por lecionar e desenvolver cursos de pós-graduação nas universidades brasileiras participantes do programa, bem como orientações acadêmicas, formação de cursos de treinamentos para técnicos do Ministério e auxílio na seleção de pessoal para a realização de cursos de mestrado e doutorado na University of Florida e demais instituições estrangeiras (BRASIL, 1973, p. 12-13BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato entre a República Federativa do Brasil e o Conselho Universitário da Universidade da Flórida. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 24 jan. 1973. Seção 1, p. 12-13.).

Além do acordo com o USAID, em 1976, houve um empréstimo feito pelo Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), dessa vez realizado diretamente pela Embrapa, concedendo crédito de US$ 40 milhões, dos quais US$ 12 milhões seriam destinados ao financiamento de bolsas de estudos e outros US$ 5,4 milhões para a compra de livros, equipamento e mobiliário de laboratório (IBRD, 1976, p. 16-23INTERNATIONAL BANK FOR RECONSTRUCTION AND DEVELOPMENT (IBRD). Loan agreement (Agricultural Research Project) between Federative Republic of Brazil and International Bank for Reconstruction and Development. Washington D.C., 1976.). A estruturação da empresa que se seguiu a sua criação, especialmente a promoção das atividades de pesquisa através da formação de seus recursos humanos, também contou com o auxílio de recursos do erário público nacional por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa pública vinculada ao Ministério do Planejamento e criada contemporaneamente à Embrapa. Em 6 de junho de 1973, houve a assinatura de um contrato de empréstimo entre ambas, com vistas a promover um programa intitulado “Projeto de Assistência Técnica para Implantação da Embrapa”, tendo por meta principal a organização do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária mediante assistência técnica internacional e o desenvolvimento de pesquisas em áreas consideradas como prioritárias para a agricultura nacional. (BRASIL, 1973, p. 1-3BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato de financiamento que entre si fazem a Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Brasília, DF, 1973.).

Os empréstimos realizados foram de fundamental importância para o estabelecimento de uma das pedras angulares da instituição em seu início, o treinamento de técnicos e pesquisadores; plano que contou com a participação decisiva de entidades estrangeiras, principalmente dos EUA, tanto para o seu financiamento como em parceria para a sua execução. Em 1974, a estatal iniciou o Programa de Recursos Humanos com o objetivo de superar um dos principais obstáculos identificados nos relatórios e diagnósticos feitos até então: a ausência de pesquisadores e técnicos qualificados, principalmente em nível de pós-graduação. Paralelo à realização de seminários e processos seletivos para preencher o quadro de funcionários permanentes, o programa era visto como “tarefa de maior relevância” e “incontestavelmente um dos mais importantes no campo do investimento em recursos humanos na área da agricultura de um país latino-americano”. A previsão era de que, ao término da primeira etapa do projeto, previsto para março de 1976, 80% dos pesquisadores pertencentes aos quadros da empresa fossem pós-graduados, ante a cifra de 10% existentes no início das atividades da estatal (BRASIL, 1975, p. 42BRASIL. Ministério da Agricultura. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Relatório de Atividades de 1974. Brasília, 1975.).

A obtenção das fontes de financiamento mediante os empréstimos se revelava de extrema importância na superação da ausência de técnicos e pesquisadores com formação adequada, frente às atividades que a empresa buscava realizar, atendendo simultaneamente à “natureza empresarial” da instituição e aos “reclamos da economia brasileira”, apresentando como trunfo para tal realização a sua organização autônoma e flexível, com o fto de formar um profissional atinente aos seus interesses e alinhado à sua política de pesquisa18 18 Alex Mengel expressa a projeção e a particularidade do programa ao afirmar que “o caso da Embrapa é um tanto singular, pois sua diretoria constituiu um amplo plano de seleção e formação de profissionais, de maneira bastante planejada. Nesse sentido, a instituição, para atingir os objetivos de seus criadores, não recrutou seu quadro, simplesmente. De forma planejada, os enviou para centros de pesquisa específicos. Tal política de seleção e formação deveria garantir que seus profissionais tivessem valores semelhantes, que falassem a mesma linguagem, que entendessem a agricultura e a realidade brasileira da mesma maneira e, assim, que concordassem em atuar no mesmo sentido” (MENGEL, 2015, p. 123). .

As bases que orientariam o programa foram expostas no relatório “Informações Sobre o Projeto de Pós-graduação (Versão Preliminar)”, elaborado pelo Departamento de Recursos Humanos da Embrapa, em 27 de janeiro de 197519 19 O relatório foi consultado através de documentação existente nos Anexos da tese de doutoramento de MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. 2015. 187 p. Tese. (Doutorado em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. . Em seu início, destaca-se a importância da criação de conhecimento pela instituição, o qual deveria materializar-se em “sistemas de produção” ou “pacotes tecnológicos”. Para a sua aplicação efetiva, fazia-se necessário o estudo não somente em áreas relativas à biologia, mas também em ciências sociais, principalmente aqueles que viessem a garantir a sua viabilidade econômica e a plena transferência aos agricultores. Dessa forma, verifica-se o caráter multidisciplinar do programa, visando à formação de técnicos em áreas distintas para que o conhecimento produzido em laboratório chegasse ao campo (BRASIL, 1975BRASIL. Ministério da Agricultura. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Relatório de Atividades de 1974. Brasília, 1975., apud MENGEL, 2015, p. 157-158MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015.). O relatório também expressa de forma clara que a eleição das áreas de especialização dos pesquisadores era prerrogativa da empresa, obedecendo estritamente ao programa definido para o Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária que ela encabeçava.

O relatório publicado em 197820 20 O documento que utilizamos como fonte descreve os resultados do programa de pós-graduação da Embrapa até o primeiro semestre de 1978. sobre o programa de pós-graduação da Embrapa nos dá uma clara dimensão das ações voltadas ao aprimoramento dos pesquisadores e desenvolvidas até então. As atividades foram realizadas em instituições brasileiras e estrangeiras, com peso considerável às estadunidenses. Cabe destacar que, em relação aos participantes do projeto de formação, a empresa levou em consideração o total de pesquisadores beneficiados, inclusive aqueles que interromperam o treinamento por motivos que iam de baixo rendimento acadêmico àqueles que pediram demissão ao longo do percurso. No total, incluindo as pós-graduações concluídas, interrompidas ou em andamento, o plano de aprimoramento atendeu a 1.390 técnicos até meados de 1978, dos quais 1.081 eram da própria empresa e 278 de outras instituições (TABELA 1, revelando que a formação também tinha como meta atender não somente a estatal, mas todo o Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (BRASIL, 1978, p. 3BRASIL. Ministério da Agricultura. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Departamento de Recursos Humanos. Relatório Programa de Pós-Graduação até o 1º Semestre de 1978. Brasília, 1978.)

Tabela 1
Quantidade de pesquisadores atendidos pelo Programa de Pós-Graduação da Embrapa (1973-1978)

De todos os pesquisadores beneficiados pelo programa, cerca de 75% (1.036) foram atendidos por uma instituição de ensino brasileira. Ao todo, 28 universidades públicas federais, estaduais, particulares e institutos de pesquisa participaram do processo, recebendo 995 estudantes em nível de mestrado e 41 em doutorado (BRASIL, 1978, p. 3BRASIL. Ministério da Agricultura. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Departamento de Recursos Humanos. Relatório Programa de Pós-Graduação até o 1º Semestre de 1978. Brasília, 1978.). Importante destacar que mais da metade dos pós-graduandos (677) iniciaram sua formação em quatro instituições brasileiras: Universidade Federal de Viçosa (UFV), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Escola Superior Agrícola “Luís de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (ESALQ /USP), universidades que possuíam contratos de convênio para a organização de seus programas de pós-graduação e departamentos em ciências agrícolas com, respectivamente, a Purdue University, University of Wisconsin, University of Arizona e Ohio State University, todas estadunidenses, contando com recursos provenientes dos acordos com a USAID, BIRD e FINEP (MENGEL, 2015, p. 145MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015.).

Quanto à formação no exterior, 354 pesquisadores começaram a pós-graduação em instituições espalhadas por 17 países, totalizando 210 em mestrado e 144 em doutorado, pouco mais de 25% dos treinandos envolvidos. Ao avaliarmos a participação de universidades estrangeiras no processo, observa-se a forte presença dessas instituições na formação de doutores. Dos 185 indivíduos que iniciaram, concluíram ou interromperam o seu doutoramento pelo programa da Embrapa até 1978, 144 deles, quase 78% do total, fizeram-no fora do Brasil (TABELA 2). Por fim, é mister salientar o fato de ser os EUA o principal destino dos técnicos brasileiros no exterior, concentrando significativamente a participação no processo de formação. Dos 354 pesquisadores que iniciaram o treinamento em nível de mestrado e doutorado no exterior, 299 (aproximadamente 85% do total) o fizeram em 39 universidades estadunidenses (TABELA 3). Um em cada três participantes (100 alunos) concluíram, interromperam ou estavam com o curso em andamento em meados de 1978 nas universidades cujos contratos foram analisados e contaram com os recursos do empréstimo com o USAID, sendo 42 deles na University of Florida, 29 na University of Wisconsin e 29 na Purdue University. Outras três universidades (University of California (Davis), University of North Carolina e University of Mississipi), as quais não tivemos acesso aos contratos de assistência técnica, mas que presumimos terem recebido, assim como as demais universidades e instituições estrangeiras, recursos dos empréstimos para a viabilização do programa, apresentam participação significativa no processo e contaram com 83 formandos. Destarte, seis universidades estadunidenses concentraram pouco mais da metade de todos os participantes do programa de recursos humanos da empresa em instituições fora do país.

Tabela 2
Pesquisadores do Programa de Pós-Graduação da Embrapa no Brasil e no exterior e participação no total de treinandos22 22 Termo conforme a documentação consultada. (1973-1978)
Tabela 3
Quantidade de participantes e percentual por país no total de investigadores do Programa de Pós-Graduação da Embrapa no exterior

Considerações finais

A exploração da narrativa centrada no uso da ciência e tecnologia e na expansão da produção de alimentos foi fundamental na construção da relação entre os EUA e o Terceiro Mundo durante a Guerra Fria. As práticas implementadas de forma metódica e intensa nessas áreas resultavam em frutos apresentados como naturalmente benéficos e alinhados ao progresso e à modernidade. Como expressa Nick Cullather, os novos tipos de trigo e arroz serviram de base para programas de figuras como Ferdinando Marcos, nas Filipinas, e Suharto, na Indonésia. A retórica baseada no desenvolvimento e a promessa de soluções para a pobreza promovidas pela ciência permitiram a esses regimes neutralizarem antagonismos, apelando para supostas demandas universais, naturais da humanidade, como a elevação dos padrões de consumo e o fortalecimento nacional, para identificar os que se opunham ao governo como opositores do progresso (CULLATHER, 2004, p. 245CULLATHER, Nick. Miracles of modernization: the Green Revolution and the apotheosis of technology. In: DIPLOMATIC HISTORY. Oxford, vol. 28, n. 2, 2004, p. 227-254.).

Assim, os países do centro do capitalismo, especialmente os EUA, colocaram--se como os principais beneficiários da disseminação de novas práticas de produção. De um lado, governo e fundações filantrópicas se valiam do processo para defender seus interesses em um cenário marcado pela luta contra o comunismo, cuja viabilidade mediante a revolução e a capacidade de ameaçar os interesses do West Hemisphere havia sido revelado na China, na Coreia, no Vietnã e em Cuba, além da existência da União Soviética como potência. Consequentemente, a modernização da agricultura, caracterizada na Revolução Verde, pode ser entendida como prática reacionária a esse processo, ao buscar entregar aquilo que o comunismo prometia pela revolução com reformas marcadas por uma ideia de progresso movido pela ciência.

Marcadas por forte vínculo durante a Segunda Guerra Mundial e diretamente influenciadas pela estratégia que então se adotara para o combate ao Eixo, as relações entre os governos brasileiro e estadunidense após o confito possuem perfil de fraturas e descontinuidades determinadas pela geopolítica da Guerra Fria e por transformações relacionadas à política externa de cada nação. Mesmo diante da postura instável do governo dos EUA, podemos observar o estímulo frequente deste ente aos contatos da iniciativa privada de seu país com o Brasil, influindo decisivamente para que corporações, entidades filantrópicas e universidades ocupassem posição destacada em sua política externa. Ademais, é fundamental apontar que, para além do vai e vem diplomático, o elemento ideológico, baseado nas premissas do americanismo, no progressismo e no desenvolvimento, vão moldar as relações entre ambos os países, inclusive em momentos de repulsa à ação dos EUA na América Latina.

Tal fator fica evidente quando avaliamos como o desenvolvimento da agricultura brasileira no pós-guerra e o avanço do planejamento estatal para o setor desembocaram na fundação da Embrapa. Observa-se, na narrativa elaborada, a preo- cupação com a modernização a todo custo, com o treinamento de pesquisadores e a inserção de métodos provenientes da prática agrícola estadunidense como condição sine qua non para a expansão da agricultura brasileira. Além disso, destaca-se o fato de assuntos e preocupações candentes no período de instituição da empresa, como o aprimoramento dos recursos humanos e a ocupação dos solos do Cerrado, terem sido “antecipados” por diagnósticos promovidos por corporações e agências dos EUA, com destaque para a Fundação Rockefeller e universidades, ainda nos anos de 1940, contando com o apoio decisivo de recursos e assessoria provenientes de órgãos públicos estadunidenses, como o USAID, e instituições paralelas à sua política externa, como o BIRD e a OEA.

O investimento refletido nas ações de treinamento técnico em universidades estadunidenses coloca-se enquanto pedra angular desse processo. O empenho realizado no aprimoramento técnico através do Programa de Pós-Graduação da Embrapa, responsável pela introdução de 1.390 pesquisadores em cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior, ocorreu com a estreita e fundamental participação dos Estados Unidos. Desse montante, observa-se a predominância na formação em nível de mestrado, representando aproximadamente 75%, cuja formação se deu predominantemente no Brasil, ao passo que a formação de doutores ocorreu majoritariamente fora do país, com destaque para a participação de universidades dos EUA. Todavia, vale ressaltar que boa parte dos investigadores formados no país passaram por universidades que possuíam convênios de cooperação e assistência técnica com universidades estadunidenses responsáveis por orientar a formação de cursos de pós-graduação no Brasil voltados às ciências agrícolas.

Considerando o fato de que os profissionais com PhD possuíam, em tese, maior tendência a ocupar cargos de chefa na definição não somente dos rumos da pesquisa da empresa, mas também da agenda de política científica e tecnológica para o setor, pode-se afirmar que a definição da pauta e dos rumos da pesquisa agrícola brasileira foi condicionada diretamente por esse contato, visto que os formados traziam consigo premissas e orientações adquiridas fora do país. Além do mais, os pesquisadores formados no exterior levaram conceitos e premissas importantes na conformação das políticas públicas para a agricultura e para a ciência agrícola de seus países de origem, formatando-os de acordo com os conhecimentos e as prioridades adquiridos fora. Tais aspectos mostram como a universidade, os institutos de pesquisa, bem como os técnicos e cientistas são um locus essencial na disseminação das novas práticas de produção

A ação dos EUA também terminou por amealhar a simpatia por parte de brasileiros e latino-americanos, boa parte formada por sua elite intelectual, com bolsas de estudos e parcerias com universidades da região, arrefecendo um sentimento de oposição provocado pela percepção de participação do governo dos EUA nos golpes militares. As políticas agrícolas e de ciência e tecnologia desses países pautavam-se de acordo com as premissas lançadas pela intelligentsia estadunidense. Muitas vezes considerada como hostil, a intervenção do governo estadunidense mais uma vez foi suplantada pela iniciativa das fundações filantrópicas, que exploraram o caráter desinteressado de sua ação para estender sua influência e seus valores compartilhados com o governo de um país com mercado em expansão e que apresentava diversidade de possibilidades no setor agropecuário.

Tudo isso nos revela a formação de uma complexa rede de interesses e condicionantes, na qual a elaboração de um discurso de combate à pobreza e miséria na periferia do capitalismo dissimulava a preocupação com o avanço da “ameaça comunista” (principalmente após a Revolução Cubana) e, principalmente, a garantia da presença de empresas e instituições estadunidenses em países com imenso potencial agrícola, como o caso brasileiro, fazendo com que seus interesses também fossem levados em consideração, angariando a simpatia da opinião pública e reforçando a percepção de nação desenvolvida, o norte a ser seguido.

  • 4
    Truman dividiu a sua fala em quatro pontos, sendo o Point III o chamado para a defesa militar do hemisfério contra o comunismo, que levaria à criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), e o Point IV o esforço em disseminar a influência americana nos países menos desenvolvidos através da transferência de tecnologia e da ideologia capitalista. Conforme indica Perkins, a OTAN e a assistência mediada pelo Point IV revelam-se como as faces da mesma moeda e expressam a crença de que os valores representados pelo capitalismo estadunidense deveriam prevalecer (PERKINS, 1997, p. 145PERKINS, John. Geopolitics and the Green Revolution: wheat, genes, and the Cold War. Nova Iorque: Oxford University Press, 1997.).
  • 5
    A assistência conferida pelo Point IV se basearia em projetos individuais, desenvolvidos para cada país, podendo também, em determinados casos, contemplar uma abordagem regional, envolvendo duas ou mais nações. Além do mais, no texto de sua proposta não há definição quanto ao prazo de duração, apresentando-se mais como um programa dinâmico e contínuo à procura não somente de objetivos específicos, mas de gerar um processo em longo prazo para o progresso mundial (EUA, 1949, p. 4-8).
  • 6
    No contexto analisado, o termo “Terceiro Mundo” refere-se à América Latina, África e Ásia, com exceção do Japão.
  • 7
    A escolha do México para o início de um projeto com a Fundação Rockefeller relaciona-se diretamente com o contexto político mexicano da década anterior. Lázaro Cárdenas foi eleito em 1934, defendendo uma plataforma nacionalista que contemplava a ampliação do processo de reforma agrária, iniciado com a Revolução Mexicana e a estatização dos recursos naturais em um país cujo capital estrangeiro, especialmente o estadunidense, participava desde o século XIX. Frente a um panorama desfavorável, a filantropia era vista como alternativa estratégica a algo que poderia ser considerado hostil, a ação governamental direta dos EUA, mas mantinha estreito vínculo com eles travestindo-se de um discurso pautado pela ação desinteressada e caridosa, marcando posição e buscando influenciar as tomadas de decisões. Ademais, cabe destacar que a iniciativa da Fundação Rockefeller foi facilitada pela eleição de Manuel Ávila Camacho como sucessor de Lazaro Cárdenas, um político de discurso mais moderado e que havia enfatizado ao longo de sua campanha menos a reforma agrária do que a garantia da posse da terra e a necessidade de modernização e industrialização da economia nacional, devendo assim, promover maior aproximação com os EUA, cujos investimentos serviriam para materializar suas intenções (OASA, 1982, p. 984OASA, Edmund K; JENNINGS, Bruce W. La naturaleza de la investigación social en la agricultura internacional: la experiencia norteamericana, el IRRI y el CIMMYT. In: El Trimestre Económico. Ciudad de Mexico, vol. 49, nº 196, p. 975-1012, out-dez/ 1982.; PERKINS, 1997, p. 104-106PERKINS, John. Geopolitics and the Green Revolution: wheat, genes, and the Cold War. Nova Iorque: Oxford University Press, 1997.).
  • 8
    As atividades do IBEC e do IRI com a agricultura brasileira iniciaram-se com estudos para a recuperação de solos desgastados em regiões de produção cafeeira no estado de São Paulo já na década de 1940. O programa foi desenvolvido em parceria com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e tinha por base a Fazenda Cambuhy, localizada no município de Matão, situada em uma região de antiga ocupação cafeeira no estado e, então, considerada a maior unidade produtora de café do mundo, com aproximadamente 5,5 milhões de pés da rubiácea. A essa iniciativa se somaram projetos voltados às potencialidades de ocupação da terra pela agricultura e a posterior criação de estações experimentais em zonas de Cerrado, como São Joaquim da Barra, em São Paulo, e Anápolis, em Goiás (HARRINGTON, SORENSEN, 2004, p. 6HARRINGTON, Jerome F. SORENSEN, Bill W. O desenvolvimento das terras de Cerrado no Brasil: a experiência do IRI. São Paulo: Ceres, 2004.; NEHRING, 2016, p. 208NEHRING, Ryan. Yield of dreams: marching West and the politics of scientific knowledge in the Brazilian agriculture research corporation (Embrapa). In: Geoforum. Vol. 77, p. 206-217, dez/ 2016.).
  • 9
    Segundo Ronaldo Conde Aguiar (1986, p. 42-43)AGUIAR, Ronaldo Conde. Abrindo o pacote tecnológico: Estado e pesquisa agropecuária no Brasil. São Paulo: Polis/CNPq, 1986., entende-se o pacote tecnológico para a agricultura “como o conjunto de técnicas, práticas e procedimentos agronômicos que se articulam entre si e que são empregados indivisivelmente numa lavoura ou criação, segundo padrões estabelecidos pela pesquisa. Em outras palavras, o pacote tecnológico corresponde, por assim dizer, a uma linha de montagem, onde o uso de determinada tecnologia ou componente – sementes melhoradas, por exemplo – exige o uso de determinadas tecnologias ou componentes anteriores – máquinas e equipamentos para os serviços de preparo do solo; calagem para correção do solo – e leva ao emprego de determinadas tecnologias ou componentes posteriores – adubação e combate químico de pragas”.
  • 10
    Além da agricultura, ciência e tecnologia aparecem pela primeira vez em uma plataforma de governo dentre as áreas estratégicas de atuação. Apesar da novidade e de reconhecer o investimento no setor como “uma das formas mais eficientes de vencer as etapas de desenvolvimento e eliminar o atraso econômico”, as recomendações são genéricas, comprometendo-se com o auxílio e fortalecimento da tecnologia nacional “em suas várias modalidades”, sem, todavia, especificá-las. Mesmo com essa lacuna, percebe-se o interesse expresso na criação e consolidação de fundos de desenvolvimento, dos quais se destaca a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), em 1969, com o objetivo precípuo de fomentar a pesquisa em ciência e tecnologia como ferramenta de desenvolvimento econômico (BRASIL, 1967, p. 62BRASIL. Ministério do Planejamento e Coordenação Geral. Diretrizes de Governo – Programa Estratégico de Desenvolvimento. Brasília, 1967.; DIAS, 2012, p. 99DIAS, Rafael de Brito. Sessenta anos de política científica e tecnológica no Brasil. Campinas: Ed. Unicamp, 2012.).
  • 11
    A Comissão de Alto Nível era formada por Mozart Teixeira Liberal (Ministério da Agricultura), Oto Lyra Schrader (Ministério da Agricultura), Plínio Cordeiro Molleta (Ministério da Agricultura), Ivo Torturella (IICA), Salomão Aronovich (Administrador do Programa “Food for Peace” no Brasil), Antônio Sacundino São José (Agroceres/IBEC), Carlos Arnaldo Krug (IAC/FAO) e Clibas Vieira (Professor da Escola Superior de Agricultura e Veterinária de Viçosa/Minas Gerais) (MENGEL, p. 96, 2015MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015.).
  • 12
    O Grupo de Trabalho de 1972 era formado por Eduardo Bello (IICA), Francisco Arino da Costa e Silva (BID), Edmundo Fontoura Gastal (ASCAR/IICA), José Pastore (USP), Eliseu Roberto de Andrade (ACAR/ MG), José Irineu Cabral (Ministério da Agricultura/ABCAR/BID/IICA) e Oto Lyra Schrader (Ministério da Agricultura) (MENGEL, 2015, p. 97MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015.).
  • 13
    Cabe destacar que as recomendações expostas no “Livro Preto” se inserem como elemento de um contexto mais abrangente, no qual as medidas são realizadas visando não somente a organização da pesquisa agropecuária nacional, mas refletem o seu arranjo e inserção na política econômica e de ciência e tecnologia no Brasil da ditadura civil-militar. Lançado em 1971, o I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) caracteriza a ação da ditadura em inserir a ciência e tecnologia na vereda do desenvolvimento do país, reunindo medidas de planejamento econômico para o período compreendido entre 1972 e 1974. Para a agricultura, a ciência e tecnologia também destinavam espaço de destaque nas previsões para a expansão do setor. O plano previa o incentivo à modernização do setor no Centro-Sul e sua inserção na proposta de integração nacional, desenvolvendo a agricultura no Nordeste, além de expandir a fronteira agrícola, incorporando os vales úmidos dessa região bem como as novas áreas na Amazônia e no Planalto Central. (BRASIL, 1971, p. 24-25BRASIL. I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) – 1972/74. Brasília, 1971.). O I PND também traz a necessidade de coordenação e modernização da estrutura institucional de ciência e tecnologia nacional. O decreto nº 70.553, de 17 de maio de 1972, delibera sobre o setor de ciência e tecnologia no Brasil, determinando sua organização em forma de sistema integrado. Assim, a orientação de atividades e a organização orçamentária passaram a ser estabelecidas pelo Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT), cuja proposta seria elaborada pelo Ministério do Planejamento em conjunto com o CNPq. O PBDCT passou a ser o instrumento de planejamento do Sistema Nacional de Tecnologia, constituído através da ação coordenada de sistemas setoriais (dentre os quais a agricultura) e cuja primeira ocorrência se dá através do decreto nº 72.527, de 25 de julho de 1973, que institui o I Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o biênio 1973/1974 (BRASIL, 1972, p. 82-86BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato entre a República Federativa do Brasil e a Fundação de Pesquisa da Universidade de Purdue. Brasília, DF, 1972.).
  • 14
    O “americanismo” repousava na difusão de premissas e conceitos que representariam determinados valores como sendo inerentes aos EUA e ao ser americano, como a democracia atrelada às noções de liberdade, direitos individuais e independência. Todavia, o componente ideológico mais importante seria o progressimo, ideia associada ao racionalismo, à abundância e à capacidade criativa do homem estadunidense, ao qual também se unem termos como progresso, ciência, tecnologia, racionalidade, eficiência, gerenciamento científico etc. O tradicionalismo (concepção marcada pelo mito da vida na cidade pequena, pela íntima relação com a natureza, pelo apego aos valores familiares, pela coragem e pelo temor a Deus) é o item que encerra a composição do americanismo enquanto noção que os EUA buscavam estender à América Latina no período analisado, notadamente o Brasil (TOTA, 2000, p. 19-20TOTA, Antonio Pedro. O imperialismo sedutor: a americanização do Brasil na época da Segunda Guerra. São Paulo: Cia. das Letras, 2000.).
  • 15
    Além dos aspectos relativos à vulnerabilidade existente em relação ao aparato militar, enxergava-se a miséria e a pobreza existentes na região como fatores desestabilizadores, que colocavam em ameaça toda a América. Tal preocupação refletiu-se nas propostas defendidas para a região nas eleições presidenciais que reelegeram Franklin Roosevelt em 1940, sendo que a proposta do grupo chefado por Nelson Aldrich Rockefeller, denominada Junta, sagrou-se vencedora com a defesa do combate ao crescimento do comércio e influência do Eixo, mediante uma ação em que os EUA adequariam sua política aos movimentos nacionalistas latino-americanos. A proposta materializou-se com a produção de um relatório nomeado Hemisphere Economic Policy, o qual expressava como única forma de combate ao nazismo a adoção de medidas que tornassem a economia da América Latina mais estruturada e competitiva, comprando a produção agrícola e mineral como forma de elevar o nível econômico e servindo de mola propulsora para o desenvolvimento da região.
  • 16
    Aliado a iniciativas do governo brasileiro para viabilizar o investimento estrangeiro no país, Dutra tomou um conjunto de medidas, como a repressão do movimento operário, política econômica de caráter liberal e o pronto alinhamento aos EUA no contexto da Guerra Fria, marcados pelo rompimento das relações diplomáticas com a URSS e a cassação do registro do Partido Comunista do Brasil (PCB).
  • 17
    O Departamento de Estado dos Estados Unidos da América equivale ao Ministério de Relações Exteriores, sendo o principal responsável pelos vínculos e pelas parcerias empreendidas com outras nações.
  • 18
    Alex Mengel expressa a projeção e a particularidade do programa ao afirmar que “o caso da Embrapa é um tanto singular, pois sua diretoria constituiu um amplo plano de seleção e formação de profissionais, de maneira bastante planejada. Nesse sentido, a instituição, para atingir os objetivos de seus criadores, não recrutou seu quadro, simplesmente. De forma planejada, os enviou para centros de pesquisa específicos. Tal política de seleção e formação deveria garantir que seus profissionais tivessem valores semelhantes, que falassem a mesma linguagem, que entendessem a agricultura e a realidade brasileira da mesma maneira e, assim, que concordassem em atuar no mesmo sentido” (MENGEL, 2015, p. 123MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. 2015. 187 p. Tese de doutorado, Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2015.).
  • 19
    O relatório foi consultado através de documentação existente nos Anexos da tese de doutoramento de MENGEL, Alex A. Modernização da agricultura brasileira e pesquisa no Brasil: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. 2015. 187 p. Tese. (Doutorado em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade). Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.
  • 20
    O documento que utilizamos como fonte descreve os resultados do programa de pós-graduação da Embrapa até o primeiro semestre de 1978.
  • 21
    Na documentação, consta uma divisão entre “Embrapa” e “Bolsista da Embrapa” relativa à unidade de origem. A título de simplificação dos dados e por entendermos não comprometer a aferição, decidimos por uni-los na designação “Embrapa”.
  • 22
    Termo conforme a documentação consultada.
  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografa utilizadas são referenciadas no artigo, fruto de tese de doutoramento: SANCHES JUNIOR, Jeferson de Lara. A modernização da permanência: institutos nacionais de pesquisa agropecuária na Argentina e no Brasil e as transformações no campo latino-americano no século XX (1956-1979). 2020. 269 p. Tese (Doutorado em Política Científica e Tecnológica) Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2020. Pesquisa financiada com bolsa de Doutorado pela Coordenação de Pessoal de Nível Superior - CAPES, processo 99999.000421/2016-02. Jefferson Sanches responsável pela pesquisa e escrita do artigo; Cristina de Campos responsável pela revisão, orientação e demais apontamentos.

Fontes Documentais

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  • BRASIL. I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) – 1972/74 Brasília, 1971.
  • BRASIL. Lei n. 5851, de 7 de setembro de 1972. Autoriza o Poder Executivo a instituir a empresa pública, sob a denominação de Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e dá outras providências, Brasília, DF, dez. 1972.
  • BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato entre a República Federativa do Brasil e o Conselho Administrativo da Universidade de Wisconsin Brasília, DF, 1972.
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  • BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato de financiamento que entre si fazem a Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) Brasília, DF, 1973.
  • BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária. Contrato entre a República Federativa do Brasil e o Conselho Universitário da Universidade da Flórida. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 24 jan. 1973. Seção 1, p. 12-13.
  • BRASIL. Ministério da Agricultura. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Relatório de Atividades de 1974 Brasília, 1975.
  • BRASIL. Ministério da Agricultura. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Departamento de Recursos Humanos. Relatório Programa de Pós-Graduação até o 1º Semestre de 1978 Brasília, 1978.
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Editado por

Editores Responsáveis
Miriam Dolhnikoff e Miguel Palmeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2021
  • Aceito
    25 Ago 2022
Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História Av. Prof. Lineu Prestes, 338, 01305-000 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (55 11) 3091-3701 - São Paulo - SP - Brazil
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