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ENCENANDO A HISTÓRIA: AS ARTES NA “EXPOSIÇÃO INTERNACIONAL DO CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA” (RIO DE JANEIRO, 1922-1923)1 1 Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo. Meus sinceros agradecimentos aos pareceristas anônimos da Revista de História, pelas leituras argutas e a delicadeza dos comentários, que muito me auxiliaram na revisão deste artigo. Este texto é oriundo do projeto de pesquisa “O teatro da modernidade: o papel das artes na Exposição do Centenário da Independência (1922-3) a partir do acervo da Biblioteca Nacional”, apoiado pela Fundação Biblioteca Nacional (Edital PNAP-2020).

STAGING HISTORY: THE ARTS AT THE “INDEPENDENCE CENTENARY INTERNATIONAL EXPOSITION” (RIO DE JANEIRO, 1922-1923)

Resumo

Este artigo procura analisar tanto a produção artística efetivada ao longo da “Exposição Internacional do Centenário da Independência” (Rio de Janeiro, 1922-1923) quanto a realizada anteriormente e veiculada no evento e, enfim, a produção apresentada fora dos seus portões, mas que estabeleceu uma relação indelével com a Exposição. Para tanto, debruçamo-nos sobre vasta gama de obras pertencentes aos campos da literatura, do teatro, da fotografia, do cinema, da música e da pintura, produzidas pelos mais variados agentes, considerando igualmente as contribuições arquitetônicas responsáveis por empiricamente erigir os edifícios que abrigaram a Exposição. Buscamos compreender de que forma essas obras dialogam com os esforços da organização do evento no sentido de impor, por meio dele, signos da nacionalidade e um teatro da modernidade.

Palavras-chave
Exposição Internacional do Centenário da Independência; Exposições internacionais; Literatura e outras artes; Literatura brasileira; Rio de Janeiro

Abstract

This article analyzes the artistic production realized during the “Independence Centenary International Exposition” (Rio de Janeiro, 1922-1923), the previous artistic production presented there, and finally, the production that took place outside the Exposition but established an indelible relationship with it. To this purpose, we analyzed numerous works from literature, theater, photography, film, music, and painting produced by various actors, also considering the architectural contributions, responsible for empirically erecting the buildings that housed the Exposition. Furthermore, we seek to understand how these buildings dialogue with the organization of event’s efforts to impose signs of nationality and a theater of modernity through them.

Keywords
Independence Centenary International Exposition; International Expositions; Literature and other arts; Brazilian literature; Rio de Janeiro

Introdução

Brasil, 1922, centenário da Independência. Politicamente, o país vive sob o sistema republicano há três décadas, durante as quais imperam a turbulência política e o autoritarismo. A nação é governada (desde meados de 1919) por Epitácio Pessoa, a partir do Rio de Janeiro, então a capital do país. A data solene congrega uma série de eventos monumentais no sentido estrito, os quais procuram espalhar pelas principais cidades do país monumentos a ela alusivos – movimento que tem como ponto nevrálgico o Rio de Janeiro, onde se erige a “Exposição Internacional do Centenário da Independência”.

Para além do recinto onde se dá o certame, vários espaços da cidade organizam programas atinentes à efeméride, alguns explicitamente atrelados à Exposição do Centenário. Este artigo procurará analisá-los. Consideraremos, portanto, tanto as manifestações artísticas ocorridas no interior do evento quanto aquelas ocorridas em seu exterior, mas que estabeleceram uma relação próxima com a Exposição. O Theatro Municipal do Rio de Janeiro, por exemplo, tem papel simbólico no acontecimento, pois abre a “Temporada Lírica do Centenário” na data pátria, quando também se inaugura a Exposição, transmitindo, em um espetáculo que conta com a presença do Presidente da República, aquela que seria a primeira emissão radiofônica ocorrida no país. A ópera de Carlos Gomes “Il Guarany”, cantada por um elenco estelar e regida pelo notório Pietro Mascagni, deixa o aristocrático recinto para ser ouvida na cidade do Rio, Niterói e no interior da Exposição, pelos alto-falantes espalhados por ela. Ao longo de vários meses, a “Temporada Lírica” procura atualizar o público carioca do que vai pelos palcos da Europa, apresentando-lhe, pela primeira vez, a Tetralogia de Richard Wagner, que Renato Alvim esmiúça em um livro anunciado nos programas de cada uma dessas óperas (cf., por exemplo, WAGNER, 1922WAGNER, Richard. Programa completo da encenação de “La Walkyria”. Primeira Jornada do Anel de Nibelungo. Maestro concertador e diretor da orquestra: F. Weingartner. Temporada Lírica do Centenário. Encenado no Theatro Municipal do Rio de Janeiro a 22 set. 1922, X Récita. Turno A.).

O ideário de modernidade apregoado pela Exposição do Centenário e repercutido no principal teatro da cidade passava pela incorporação da cultura europeia – mesmo o elenco de “Il Guarany” era maciçamente estrangeiro e, destaque-se, a ópera fora escrita e estreada na Itália (em 1870) e era cantada em italiano. Para além do Municipal, destacamos o papel desempenhado na efeméride pelo Teatro Trianon, gerido, durante os primeiros meses da Exposição, pela companhia capitaneada por Leopoldo Fróes, uma das principais personalidades cênicas da época. No programa de “Il Guarany” de 16 de setembro, lê-se, após a apresentação dos créditos do espetáculo, um anúncio do Trianon e de sua estrela: “No Trianon – Leopoldo Fróes” (GOMES, 1922). A compra desse espaço publicitário não parece casual, mas sim o esforço de se estabelecerem laços entre a “Temporada Lírica do Centenário” e a temporada dramática do Trianon, esforço que tem continuidade no convite à apresentação, neste teatro pelo qual passava a “fina multidão de famílias da nossa alta sociedade” (NOSSOS TEATROS, 1922NOSSOS TEATROS. Fon-Fon, Rio de Janeiro, 21/10/1922, ano XVI, n. 42.), de artistas dos mais diversos cantos do Brasil, partícipes das apresentações regionalistas organizadas na “Exposição do Centenário”. Já a programação do recinto da exposição era acompanhada de perto pelo seu órgão oficial, a revista A Exposição de 1922, a qual procurava congregar esses eventos àqueles que eram efetivados em outras cidades do país – a exemplo da inauguração, em Santos, do Monumento aos Irmãos Andradas e em São Paulo, do Monumento do Ipiranga –, tomando-os como esforços localizados no intuito de atingir um bem comum.

Observamos, todavia, que os próceres da pátria são monumentalizados desde anos antes, por uma série de obras artísticas oriundas das penas de poetas, romancistas, dramaturgos, cronistas e pintores. Em 1902, Olavo Bilac escreve a “epopeia sertanista” O Caçador de Esmeraldas, situando no centro da cena, em tônus laudatório, o bandeirante Fernão Dias Paes Leme (1608-1681). No mesmo diapasão, Afonso Arinos escreve, em 1917, O Contratador de Diamantes, tomando por tema outra figura histórica, Felisberto Caldeira Brant (1772-1842). A entronização no sertão com o objetivo de explorarem pedras preciosas é legada a segundo plano nessas obras, emergindo o discurso laudatório àqueles homens que, no caso de Paes Leme, desvendaram os meandros do Brasil profundo (“Violador de sertões, plantador de cidades,/ Dentro do coração da Pátria, viverás!”, cf. BILAC, s.d. [1902]BILAC, Olavo. O Caçador de Esmeraldas: Episódio da Epopeia Sertanista do XVII Século. UNAMA: Belém, s.d. [1902]. Disponível em: <http://www.biblio.com.br/defaultz.asp?link=http://www.biblio.com.br/conteudo/olavobilac/ocacadordeesmeraldas.htm>. Acesso em: 4 set. 2021.
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), e no caso de Arinos, lutaram pela unidade nacional e contra os desmandos dos que visavam a conspurcar a (propalada) doce relação parental existente entre Portugal e o Brasil.

O Caçador de Esmeraldas é encenada depois da morte de seu autor, em 1919, no palco do Theatro Municipal de São Paulo, por elenco amador oriundo da aristocracia da cidade. Encenação historicamente informada: não apenas é escalado como elenco a nata paulistana do século XX – a qual se colocava como simbólica descendente espiritual daquela oriunda do século XVII, como bem lembra Sevcenko (1992)SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. –, como tal grupo concorre no intuito de produzir o figurino e a encenação que fizessem emergir o clima histórico da época (ARAUJO, 2013ARAUJO, Valdei Lopes de. História da historiografia como analítica da historicidade. In: História da Historiografia, Ouro Preto, n. 12, pp. 34-44, 2013. Disponível em: htps://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/620. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: 10.15848/hh.v0i12.620.
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), daí a utilização da prataria e das louças oriundas dos tempos coloniais, heranças de família3 3 No que diz respeito aos climas históricos, Valdei Araujo teoriza a partir de Gumbrecht, segundo o qual o “desejo por atmosfera e clima é um desejo por presença” (GUMBRECHT, 2012, posição 352 apud ARAÚJO, 2013, p. 42). Assim, a utilização de objetos ou textos oriundos do passado corporifica tais climas. Eles servem, a um só tempo, como “documento[s] de um passado morto” e “fonte[s] de efeitos de imediaticidade desses mundos” (ARAÚJO, 2013, p. 42). . O programa da peça mimetiza este esforço. Encampado pela “Secção de Obras do Estado de São Paulo”, tendo como fundo um tom pardo que recupera a pátina do tempo, apresenta um conjunto de memórias textuais e fotográficas de seu autor, alusivas às suas incursões nos sertões, a exemplo de suas fotografias ora ao redor da mesa de refeições onde se encontra um grupo de sertanejos (“Afonso Arinos. Em pleno sertão, 1914”, diz a legenda), ora vestindo trajes típicos, montado “no seu cavalo ‘O Sertanejo’, 1915”, tendo atrás de si, como pano de fundo, uma paisagem sertaneja típica (ARINOS, 1919, n.p. [p. 2, 4]ARINOS, Afonso. Programa completo da encenação de “O Contratador de Diamantes”. Drama em 3 atos e 1 quadro. Representado no Teatro Municipal de São Paulo em Benefício do Asilo dos Inválidos e da Sociedade de Cultura Artística, aos 12 e 14 de maio de 1919. Acervo particular de Sérgio Arruda.)4 4 Outro texto presente no programa, de autoria de Arthur Azevedo, dá detalhes sobre a sua composição: “Os dois últimos [atos da peça] ainda não estavam escritos [quando Arinos a lera aos colegas literatos]. O autor partia no dia seguinte para Minas, e era lá, sob o incomparável céu da sua província, rodeado de todos os encantos daquela maravilhosa paisagem, que pretendia concluir a peça.” (ARINOS, 1919, n.p. [p. 1]). .

Figura 1
Excertos do programa da encenação de “O Contratador de Diamantes” no Theatro Municipal de São Paulo

Ao mencionarmos a obra de Arinos e nos referirmos ao Theatro Municipal de São Paulo, certamente pensamos em um evento que a historiografia literária de matriz candidiana (cf. CANDIDO, 1975CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 5ª Ed. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1975.) considera central na formação do cânone literário brasileiro: a Semana de Arte Moderna, de 1922. Este evento e a produção artística que lhe é imediatamente posterior procuram igualmente oferecer coordenadas à interpretação do Brasil; coordenadas cujos pontos de contato com a produção citada anteriormente não podem ser deixados de lado: a busca por aquilo que seja brasileiro, o nacionalismo crítico. Embora as temáticas sejam semelhantes, diferem-se os vieses pelos quais elas são abordadas. Daí, Anita Malfati pintará negros libertos do academicismo pictórico e fará a sua obra percorrer cidades históricas e temas conectados às tradições nacionais, a exemplo do carnaval; e Mário de Andrade se enfronhará física ou espiritualmente pela Amazônia para dali trazer uma obra de grande liberdade estilística como Macunaíma. Anos mais tarde, o seu notável e já conhecido esforço de pesquisar o folclore nacional culminará numa obra como Danças Dramáticas do Brasil (publicada postumamente, em 1959), cujo segundo volume, dedicado às danças de matrizes africanas, aborda, entre outras, a Congada – como fizera Afonso Arinos em sua peça de 1917.

A aproximação dos 200 anos da Independência do país torna este um momento propício para o estudo da “Exposição do Centenário da Independência”. A observação, a partir da distância temporal, da forma como as memórias foram forjadas, permite-nos compreender o que se colocava em jogo no esforço de construção de nossa herança histórica: os seus relevos e os seus apagamentos. Jacques Le Gof reporta-se à concepção de “memória coletiva” segundo Pierre Nora – “‘o que fica do passado no vivido dos grupos, ou o que os grupos fazem do passado’” – e ressalva: a memória coletiva sofre a “pressão da história imediata em grande parte fabricada ao acaso pelo media” (LE GOFF, 1996, p. 472-473LE GOFF, Jacques. História e Memória. Tradução de Bernardo Leitão. 4ª Edição. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.), fazendo parte “das classes dominantes e das classes dominadas, lutando todas pelo poder ou pela vida, pela sobrevivência e pela promoção.” (LE GOFF, 1996, p. 475LE GOFF, Jacques. História e Memória. Tradução de Bernardo Leitão. 4ª Edição. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.).

Assim, a memória coletiva não é apenas uma conquista, mas sobretudo, instrumento e objeto de poder. Para tanto, a celebração das datas comemorativas, multiplicadas desde a laicização das festas, desempenha papel especial. Tais festas, conclamadas especialmente pelos conservadores e nacionalistas – para os quais “a memória é um objetivo e um instrumento de governo” (LE GOFF, 1996, p. 463LE GOFF, Jacques. História e Memória. Tradução de Bernardo Leitão. 4ª Edição. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.) –, fomentam a produção de estatuária, ou seja, de monumentos, objetos intencionalmente criados para a promoção da memória (LE GOFF, 1996, p. 464LE GOFF, Jacques. História e Memória. Tradução de Bernardo Leitão. 4ª Edição. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.). Todavia, ao se referir ao papel historicamente desempenhado pelo documento – tomado como “fundamento do fato histórico” pelos positivistas –, em contraposição ao monumento, o historiador procurará desmontar essa ambivalência:

O documento não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder. Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa.

[...]

O documento não é inócuo. É antes de mais nada o resultado de uma montagem, consciente

ou inconscientemente, da história.

[...]

É preciso começar por desmontar, demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições de produção dos documentos-monumentos (LE GOFF, 1996, pp. 545-548LE GOFF, Jacques. História e Memória. Tradução de Bernardo Leitão. 4ª Edição. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.).

Este artigo procura caminhar nesta direção, daí a ampliar o escopo de análise, fazendo uso, como postula Le Gof, de uma gama de documentos/monumentos pertencentes a campos variados como a literatura, o teatro, a música, as artes plásticas, a fotografia, a produção jornalística e a arquitetura. Neste sentido, filiamo-nos igualmente à perspectiva dos estudos interartes, refletindo sobre os pontos de contato entre as artes e a transdisciplinaridade existente ao consideramos qualquer objeto artístico (CLÜVER, 1997CLÜVER , Claus. Estudos interartes: conceitos, termos, objetivos. In: Literatura e Sociedade, vol. 2, n. 2, 1997, p. 37-55. Disponível em: htps://www.revistas.usp.br/ls/article/view/13267. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2237-1184.v0i2p37-55.
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, 2006CLÜVER, Claus. Inter Textus / Inter Artes / Inter Media. Aletria, jul.- dez. 2006, p. 11-41. Disponível em: htps://periodicos.ufmg.br/index.php/aletria/article/view/18067. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.17851/2317-2096.14.2.10-41
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) – sobretudo no que diz respeito ao contexto da modernidade, em que a “copenetração das artes” ganha cunho programático (cf. VERHAEREN, 1886VERHAEREN, Émile. Silhouetes d’artistes. Fernand Khnopf. L’Art moderne, 12 de setembro de 1886. p. 289-290.; RASULA, 2016RASULA, Jed. History of a Shiver: The Sublime Impudence of Modernism. New York: Oxford University Press 2016.).

Arma-se a cena: a cidade moderna celebra o Centenário da Independência do país

O Rio de Janeiro preparava-se para abrigar a, até então, “Exposição Nacional do Centenário da Independência”, desde 1920 (SANT’ANA, 2008SANT’ANA, Thaís Rezende da Silva de. A Exposição Internacional do Centenário da Independência: modernidade e política no Rio de Janeiro do início dos anos 1920. Dissertação de mestrado, História. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, 2008.). A cidade cujas belezas naturais foram cantadas por viajantes estrangeiros ao longo de séculos enceta, desde o princípio do século XX, um esforço de saneamento urbano em, grosso modo, duas etapas: a primeira, ocorrida ao longo da gestão do presidente Rodrigues Alves e do prefeito Pereira Passos, a partir de 1903, quando as ruas estreitas do centro da cidade e as suas inúmeras construções coletivas, habitadas pelas classes populares, são derrubadas em prol da construção de largas e retilíneas avenidas como a Avenida Central – rebatizada “Rio Branco” em 1912 –, e quando o porto é alargado; e a segunda, ocorrida a partir de 1920, quando o país é comandado por Epitácio Pessoa e o Rio, gerido pelo prefeito Carlos Sampaio – contratado, segundo Levy (2013a, pp. 12-13)LEVY, Ruth (Org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013a., com o intuito especial de preparar a cidade para festejos condignos da data pátria.

Sampaio, que era engenheiro, possuía há anos os direitos de realização do arrasamento do Morro do Castelo, sendo, todavia, impedido de viabilizar a obra portentosa por falta de recursos financeiros. Ao longo de seus pouco mais de dois anos de mandato, de agosto de 1920 a 15 de novembro de 1922, caberia a ele a gestão de uma série de obras públicas que preparariam o terreno para a realização de uma Exposição a qual comemoraria a “maioridade do Brasil no meio das nações mais velhas do mundo”, demonstrando os “esforços extraordinários consumidos em um século de atividade” (LIVRO DE OURO, [1923] apud LEVY, 2013b, p. 11LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.). Dentre a série de intervenções urbanas, cujo objetivo era submeter a natureza majestosa às mãos hu-

manas – a exemplo da construção da Avenida do Contorno (atual Rui Barbosa), que ligaria os bairros do Flamengo e de Botafogo, da reconstrução da Avenida Atlântica, parcialmente destruída pelas ressacas de 1921, da construção de hotéis majestosos como o Glória (LEVY, 2013b, p. 13LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.) e das obras em torno da Lagoa Rodrigo de Freitas –, destaca-se, pelo seu caráter ambicioso, a remoção do Morro do Castelo, enfronhado no coração da cidade, para que ali, e na porção de terra que nasceria com o aterramento da adjacente Praia de Santa Luzia, fosse erigida a Exposição do Centenário.

A partir de meados de 1921, quando o desbastamento paulatino do Morro é iniciado (a última porção apenas seria demolida em 1924, embora praticamente a sua totalidade já houvesse ruído em novembro de 1922, cf. VILAS BOAS, 2013, p. 89VILAS BOAS, Naylor. A Exposição e o Morro do Castelo: investigações digitais sobre a forma urbana no centro do Rio de Janeiro. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013.), este se torna um dos assuntos centrais na imprensa carioca, seja no noticiário e nos textos cronísticos publicados nos diários, seja na reportagem fotográfica publicada nos semanários ilustrados5 5 Conferir, por exemplo, OS PREPARATIVOS DO CENTENÁRIO, 1922, n. 2, que apresenta fotografias de diversos trechos da praia de Santa Luzia, aterrados com o arrasamento do Morro do Castelo, onde se levantariam os pavilhões da Exposição. .

As vozes dissonantes à empreitada são variadas. O Castelo, além de ser habitado por milhares de pessoas, possuía espaços públicos importantes: além do antigo complexo dos Jesuítas, formado pelo Colégio, pela Igreja de Santo Inácio e pelo Observatório, instalado nas ruínas de uma catedral jamais terminada, existia ali uma antiga edificação a qual a tradição apontava ser a primeira Casa de Câmara e Cadeia da cidade (VILAS BOAS, 2013, p. 87VILAS BOAS, Naylor. A Exposição e o Morro do Castelo: investigações digitais sobre a forma urbana no centro do Rio de Janeiro. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013.). A presença humana no Morro do Castelo remontava aos períodos iniciais da colonização do Rio de Janeiro pelos portugueses, tanto que remanesciam ali os restos mortais de um de seus principais próceres, Estácio de Sá. Criticava-se a destruição dos edifícios históricos, o desalojamento dos indivíduos que ali viviam e a destruição da topografia sinuosa da cidade em prol de um modernismo que tudo aplainava6 6 Certo cronista anônimo lamenta: “num futuro não muito longe, a paisagem carioca enfeada pelo modernismo.”. Cf. OS PREPARATIVOS PARA O CENTENÁRIO, 1922, n. 24. . Após registrar o entusiasmo de certo grupo “elegante” no que concernia ao arrasamento do morro, um cronista anônimo da Fon-Fon reporta-se à conversa que tivera com uma mulher humilde que ali habitava, pagando, com muito custo, um aluguel de 80 mil réis – valor não desprezível, mas que ainda assim era baixo, considerando-se os preços das acomodações da cidade, naquela época de crise habitacional –, e que agora temia não ter onde morar (OS HUMILDES, 1922OS HUMILDES. Fon-Fon, Rio de Janeiro, 08/07/1922, ano XVI, n. 27.). Concluído o arrasamento, o senador Irineu Machado vai a público denunciar que a municipalidade abandonara os desalojados (O ARRASAMENTO DO MORRO..., 1922, p. 2O ARRASAMENTO DO MORRO do Castelo. Gazeta de Notícias, 11/11/1922, p. 2.).

A barbárie inerente à modernização é, no entanto, deixada de lado por parte considerável dos cronistas da época, sobretudo quando a obra é concluída, emergindo o sentimento de euforia frente à destruição daquele que era tido como um monumento da pestilência (pulverizara-se a ideia de que o Morro reteria os miasmas oriundos do mar, estragando o ar da cidade) e da pobreza – não era raro que as lavadeiras habitantes dali descessem à fonte que se situava aos pés do morro, desincumbindo-se de suas tarefas diante das vias recém-urbanizadas e da sociedade afrancesada que por elas desfilava. Tanto que, em março de 1923, o cronista João da Cidade, num texto que é emblema da especulação imobiliária enfrentada em todos os tempos pelas metrópoles, sugere à municipalidade, para o bem de seus cofres, construir um bairro moderno sobre a planície que restara do arrasamento do Morro (CARIOCA, 1923, p. 2CARIOCA, João. Cidade. In: Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 16/03/1923, p. 2.).

As obras de transformação do Morro do Castelo e do mar em planície geraram, a princípio, incredulidade. Numa crônica jornalística que mais tarde viria a ser publicada no volume impresso Cock-tail, um dos mais profícuos autores da época, Benjamin Costallat, destila ironia sobre o local onde se pretendia instalar a Exposição:

O local da exposição é, segundo dizem as más línguas, na praia de Santa Luzia. Mas, por enquanto, esse local ainda é mar. Mar em comprimento, mar em largura.

Conta-se, porém, e o Dr. Carlos Sampaio com Deus, que a derrubada do morro do Castelo fará ali uma segunda Holanda, ainda mais bem aterrada, ainda mais vitoriosa sobre o mar (COSTALLAT, 1923, p. 164COSTALLAT, Benjamin. Cock-Tail (continuação das crônicas de “Mut, Jef & C.”). 5 Milheiros. Rio de Janeiro: Grande Livraria Leite Ribeiro, 1923.).

As mutações apoteóticas fazem, todavia, parte da mítica das Exposições Internacionais (RYDELL, 1985RYDELL, Robert W. All the World’s a Fair: Visions of Empire at American International Expositions, 1876-1916. Chicago: The University of Chicago Press, 1985.): “Os pavilhões pareciam irreais dentro da noite!/ [...] numa bacanal de luzes e de coloridos, os palácios pareciam suspensos, flutuantes, aéreos como um sonho que se vai dissipar!”, dirá o mesmo cronista uma vez que o certame é inaugurado (COSTALLAT, 1923, p. 270COSTALLAT, Benjamin. Cock-Tail (continuação das crônicas de “Mut, Jef & C.”). 5 Milheiros. Rio de Janeiro: Grande Livraria Leite Ribeiro, 1923.). Robert Rydell exemplifica o fato em detalhes em All the world’s a fair, voltado às Exposições Internacionais ocorridas nos Estados Unidos entre 1876 e 1916. Os comitês de organização desses eventos não economizavam no intuito de explicitar os ápices aos quais chegara o desenvolvimento técnico. Para tanto, rios eram desviados, construindo-se nos recintos miniaturas dos canais venezianos. Cidades eram erigidas a partir do zero, a exemplo das “White Cities” que comportavam a secção principal de vários desses certames, desde a “World’s Columbian Exposition” de 1893, ocorrida em Chicago (RYDELL, 1985RYDELL, Robert W. All the World’s a Fair: Visions of Empire at American International Expositions, 1876-1916. Chicago: The University of Chicago Press, 1985.). A cor branca não era escolhida ao acaso; funcionando, na serenidade, paz e saneamento que simbolizava, como contraponto aos espaços desses certames voltados aos divertimentos – como se dava, no evento de Chicago, com o âmbito da “Midway”, área marcada pela diversidade étnica e geográfica de seus indivíduos. Rydell apanha, de uma novela contemporânea à Exposição de Chicago, um excerto que exemplifica, com laivos racistas e pseudocientificistas, a relação contrapontística existente entre os dois lados da feira:

Na Midway, tudo é meio sujo e bárbaro. Ela o ensurdece com o seu barulho; as piores pessoas lá dentro são avaras e más; e as melhores são apenas crianças na sua ignorância, e quando você se sente confuso com os cheiros, os sons e as vistas, que estão sempre mudando como um destes caleidoscópios, e quando você sai daquela babel de uma milha de comprimento onde você foi cotovelado e enganado, você passa debaixo de uma ponte – e de repente você está num grande e belo silêncio. Os anjos do Edifício das Mulheres sorriem e abençoam você, e você sabe que, no que parecia um passo, você passou da escuridão à luz (RYDELL, 1985RYDELL, Robert W. All the World’s a Fair: Visions of Empire at American International Expositions, 1876-1916. Chicago: The University of Chicago Press, 1985., traduzimos)7 7 No original: “In the Midway it’s some dirty and all barbaric. It deafens you with noise; the worst folks in there are avaricious and bad; and the best are just children in their ignorance, and when you’re feelin’ bewildered with the smells and sounds and sights, always changin’ like one o’ these kaleidoscopes, and when you come out o’ that mile-long babel where you’ve been elbowed and cheated, you pass under a bridge – and all of a sudden you are in a great, beautiful silence. The angels on the woman’s Buildin’ smile down and bless you, and you know that in what seemed like one step, you’ve passed out o’ darkness and into light.” .

Densamente iluminadas e refletidas pelo espelho d’água que as permeava, as Cidades Brancas eram como cidades fantásticas, materialização, graças às evoluções técnicas tornadas possíveis pelos homens (PESAVENTO, 1997PESAVENTO, Sandra Jatahy. Exposições Universais: espetáculos da modernidade do século XIX. Estudos Urbanos. Série Arte e Vida Urbana. São Paulo: Editora Hucitec, 1997.; RYDELL, 1985RYDELL, Robert W. All the World’s a Fair: Visions of Empire at American International Expositions, 1876-1916. Chicago: The University of Chicago Press, 1985.), dos prodígios pintados pelos cenógrafos das revistas (ou reviews) e mágicas teatrais – espetáculos tão populares no período, nos Estados Unidos como no Brasil. É novamente Costallat que tece as loas ao engenho humano, capaz de engendrar obras oriundas dos mais diversos campos, da arte à indústria, dos laboratórios às oficinas:

Em terra, as cúpulas, boiando iluminadas dentro do espaço noturno, cobriam a exposição da inteligência e do trabalho dos homens. Embaixo daqueles palácios feéricos de luz, havia a arte, havia a indústria, havia o sagrado produto dos laboratórios, das oficinas, havia, em resumo, tudo aquilo que o homem faz para o seu conforto, para a sua felicidade, para rodear a existência de um pouco de beleza... (COSTALLAT, 1923, p. 271COSTALLAT, Benjamin. Cock-Tail (continuação das crônicas de “Mut, Jef & C.”). 5 Milheiros. Rio de Janeiro: Grande Livraria Leite Ribeiro, 1923.).

Diante do olhar atento dos cronistas e das objetivas dos fotógrafos e cinegrafistas, a cidade do Rio de Janeiro preparava a grande mágica. Sobejam registros impressos dos pormenores do desbastamento do Morro, do aterramento da Praia de Santa Luzia e dos pavilhões em fase de construção, seus trabalhadores posando entre andaimes ou diante de certa obra de arte feita de gesso, que coroaria a porta principal de certo edifício (OS PREPARATIVOS PARA O CENTENÁRIO, 1922, n. 24OS PREPARATIVOS PARA O CENTENÁRIO. Fon-Fon. Rio de Janeiro, 17/06/1922, ano XVI, n. 24.). As notícias passam a circular internacionalmente à medida que vários países aceitam o convite para erigirem seus pavilhões no evento. A 13 de setembro de 1922, um “International News” rodado pela Pathé britânica, denominado Brazil Prepares For Centennial Exposition (Gaumont Graphic Newsreel/British Pathé, 1922), esquadrinhava, em menos de um minuto, do desbastamento do Morro ao processo de construção dos Pavilhões, multiplicando os enquadramentos das possantes mangueiras de água que destruíam, com o Morro do Castelo, o que sobrava da velha cidade, explicitando o domínio do homem sobre a natureza (Figura 2).

Figura 2
Print do filme Brazil Prepares For Centennial Exposition, em que se vê um trabalhador manejando um jato d’água direcionado ao Morro do Castelo

A pirotecnia servia a objetivos claros. Moretin refere-se à “carnificina do espírito” ocorrida nesses eventos, que procuravam celebrar processos industriais e promover a exaltação das mercadorias, medindo, a partir dessa régua, “o progresso das nações” (Moretin, 2011bMORETTIN, Eduardo. As exposições universais e o cinema: história e cultura. In: Revista Brasileira de História. São Paulo, vol. 31, n. 61, 2011b, pp. 231-249. Disponível em:htps://www.scielo.br/j/rbh/a/J3qp6YhmBwRZq96CRfnxQfc/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S0102-01882011000100012.
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). Hardman atrela as Exposições Internacionais ao afã exibicionista burguês, que assemelha a sociedade capitalista a uma “ininterrupta coleção de mercadorias”, as quais são fetichizadas. Neste sentido, as Exposições transformam-se em seus santuários (HARDMAN, 2005, p. 64, 62HARDMAN, Francisco Foot. Trem-Fantasma: a ferrovia Madeira-Mamoré e a modernidade na selva. 2ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.). Já Marly Mota inscreve as Exposições no âmbito da “comunidade modernamente inventada”, que se concretiza por meio de “símbolos, práticas, comportamentos e valores firmemente ancorados na vida social” (MOTTA, 1992, p. 2MOTTA, Marly Silva da. “Ante-sala do paraíso”, “vale de luzes”, “bazar de maravilhas” – a Exposição Internacional do Centenário da Independência (Rio de Janeiro – 1922). Rio de Janeiro: CPDOC, 1992. Disponível em: htps://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/6763. Acesso em: 5 ago. 2022.
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). Daí o Brasil fazer-se presente em várias Exposições Universais antes de organizar a sua: esteve, por exemplo, na mencionada “World’s Columbian Exposition”, ocorrida em Chicago, em 1893; na da Filadélfia, em 1876; e na de Saint Louis, em 1904 – utilizando ali, como pavilhão, o Palácio Monroe, o qual seria reconstruído no Rio de Janeiro, situando-se junto a uma das portas da Exposição do Centenário e funcionando como prédio administrativo.

O primeiro artigo do número de abertura da revista A Exposição de 1922 mostra o alinhamento dos organizadores do certame a esse ideário. Ao longo de duas páginas, Pádua Resende, à guisa de Editorial, principia realizando um balanço dos anos posteriores à Guerra, no Brasil e no mundo. Após sublinhar a solidificação da democracia ao redor do mundo e entre os Estados da nação – deixando de lado o fato de o Rio de Janeiro estar vivenciando estado de sítio, que duraria um ano –, explicita quais eram os intuitos do evento:

Mostrar, portanto, [...], os resultados que alcançamos, nas várias esferas de nossa atividade política, social e econômica, no decorrer destes últimos cem anos, deve constituir presunção legítima dos dirigentes da atual Exposição brasileira, não só para revelar o labor nacional, mas, precisamente, para documentar a nossa perfeita integração ao progresso geral das nações (RESENDE, 1922RESENDE, Pádua. A exposição nacional de 1922. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 07/1922, n. 1.).

A associação, ocorrida no Brasil, entre as Exposições e as efemérides, reforça o sentido de nação e de comunidade imaginada a elas atrelada. Antes, em 1908, o país comemorou o Centenário da Abertura dos Portos com uma ambiciosa “Exposição Nacional”. Várias características do evento de 1908 se veriam mimetizadas no certame de 1922. Também em 1908, dera-se relevância à unidade nacional, representada pela exibição de produtos oriundos de ao redor do país, criando-se um microcosmo nacional dentro de seus limites – tanto que a praça central se denominava “Brasil” e era percorrida por uma estrada de ferro em miniatura, figuração da sonhada, porém inexistente, via de concatenação entre todos os Estados brasileiros. Além disso, o evento organizava-se depois de concluída a reforma urbana da cidade – leia-se, das áreas do centro da cidade e de Botafogo, bairro onde se situavam casarões de várias famílias abastadas (CARVALHO, 2014CARVALHO, Danielle Crepaldi. Luz e sombra no écran: realidade, cinema e rua nas crônicas cariocas de 1894 a 1922. Tese de doutorado, Teoria e História Literária, Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, 2014.) –, enformando uma ideia de progresso urbano de raízes europeias (mormente francesas). A “Exposição Nacional de 1908” também promoveu a instalação de um teatro e organizou uma programação de dramas e comédias nacionais, cumprindo uma agenda defendida por décadas pelos dramaturgos, que cobravam da municipalidade a instalação de uma companhia teatral gerida pelos seus cofres, a qual pudesse concorrer com as operetas, os vaudevilles, as revistas de ano e afins; espetáculos preferidos pelo público à época.

O evento projetado para o ano de 1922 internacionaliza-se poucos meses antes de sua inauguração, com a confirmação da presença de treze das nações convidadas: Portugal, Bélgica, Noruega, Tchecoslováquia, México, Dinamarca, Itália, Inglaterra, França, Suécia, Japão, Estados Unidos e Argentina. A organização acolhe o fato de forma entusiástica, pois estava ávida, nas palavras de Pádua Resende, para apresentar a evolução crescente do país e, assim, demonstrar o seu “parentesco histórico” (RESENDE, 1922RESENDE, Pádua. A exposição nacional de 1922. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 07/1922, n. 1.)8 8 A este respeito, conferir também Sant’ana (2008). com as velhas civilizações.

Desta forma, sobejam, nos números da revista, os textos e as fotografias alusivos às diversas delegações estrangeiras presentes no país, as quais são festejadas em inúmeros jantares dançantes, banquetes, piqueniques e visitas organizados entre a Exposição e os sítios locais chiques do Rio de Janeiro e de suas imediações; eventos que atendiam aos paladares da imprensa ilustrada da cidade e fomentavam o repúdio num cronista como Lima Barreto. Ele, que um ano antes acusara Carlos Sampaio de construir hotéis sofisticados e um teatro portentoso como o Municipal, inacessíveis à maioria da população – explicitando, de modo arguto, a segmentação da cidade em suas partes: a “europeia” e a “indígena”, já que o prefeito fazia cobrir com pedregulhos bairros populares, enquanto asfaltava o “areal deserto” de Copacabana (BARRETO, 1921, ed. 656BARRETO, Lima. O prefeito e o povo. In: Careta, Rio de Janeiro, 15/01/1921, ano XIV, n. 656.) –, agora intitulava o alcaide, com ironia, de “a maior surpresa da ‘Exposição’”: “Não há dia em que ele não pronuncie, no mínimo, quatro [discursos]. Seja num ‘pavilhão’, seja num almoço bucólico na Tijuca, S. Exa. está sempre disposto a falar e fala.” (BARRETO, 1922, ed. 751BARRETO, Lima. Congressos. In: Careta, Rio de Janeiro, 7/10/1922, ano XV, n. 746.).

Lima Barreto escolhe olhar a Exposição do Centenário da distância que separava o certame do subúrbio de Todos os Santos, onde ele vivia. Distanciando-se do ofuscamento gerado pelo “bacanal de luzes e de coloridos” (COSTALLAT, 1923, p. 270-271COSTALLAT, Benjamin. Cock-Tail (continuação das crônicas de “Mut, Jef & C.”). 5 Milheiros. Rio de Janeiro: Grande Livraria Leite Ribeiro, 1923.) dali oriundos, explicita o que enxerga de frivolidade e artifício. Assim o cronista resume o cronograma dos numerosos congressos organizados durante o evento:

  1. dia – Inauguração. Banda de música. Hino Nacional. Discurso do Presidente.

  2. dia – Chá dançante, para estudo das teses a debater.

  3. dia – Subida no Corcovado e apreciação empolada de “la naturaleza”.

  4. dia – Passeio na Avenida e adjacências ainda para estudo das teses.

  5. dia – Espetáculo no Municipal, em chinês.

  6. dia – “Football”, etc.

  7. dia – Encerramento. Banda de Música. Hino Nacional. Discurso do Presidente, concluindo, segundo um filósofo chinês, que o mais sábio é não agir.

Eis aí (BARRETO, 1922, n. 746BARRETO, Lima. Uma surpresa da Exposição. In: Careta, Rio de Janeiro, 11/11/1922, ano XV, n. 751.).

O resumo, embora fictício, relaciona-se de modo verossímil com as atividades que ocorriam durante os muitos congressos realizados ao longo da Exposição. No entanto, nada havia de futilidade em tais programas. Ao esquadrinhar os arquivos referentes às Exposições norte-americanas, Rydell levanta documentos que comprovam o uso de recursos públicos tanto em sua organização quanto no envio de delegações a certames congêneres ocorridos no estrangeiro. Havia claro intuito de propaganda, não apenas no que dizia respeito às mercadorias publicizadas pelas empresas estadunidenses que tomavam parte dos certames, mas no que concernia ao poderio do país (RYDELL, 1985RYDELL, Robert W. All the World’s a Fair: Visions of Empire at American International Expositions, 1876-1916. Chicago: The University of Chicago Press, 1985.). Daí os Estados Unidos trazerem à Exposição, além de centenas de expositores, numeroso contingente de integrantes das forças armadas, os quais, embora participassem amistosamente dos desfiles capitaneados pelo Brasil e exibissem o seu cavalheirismo em diversos eventos dançantes, não escondiam que o país se tratava de uma potência bélica. Costallat nota o fato tão logo tira os olhos das radiâncias da Exposição e os volta à baía de Guanabara:

No mar, porém, dentro das couraças daqueles navios, imóveis e às escuras, havia outra exposição. Uma miserável exposição! Cada uma das nações ali representadas, as mesmas que em terra exibiam a sua arte e a sua indústria, procurava exibir um canhão maior, uma couraça mais resistente, um navio mais possante. E por estar às escuras, essa exposição do mar não deixava por isso de ser a verdadeira exposição das nações...

[...]

Logo, – e eu pensava na admirável orquestra do México, cantadora da sua alma e dos seus sofrimentos, mas olhava para os canhões dos couraçados norte-americanos, logo a verdadeira exposição que as nações vieram aqui fazer não é a de terra e sim a do mar, não é com os pavilhões e sim com ‘dreadnoughts’, não é com artistas e sim com marinheiros...

E então compreendi toda a inutilidade da exposição de terra, falsamente colorida, falsamente alegre, falsamente iluminada, feita de gesso, feita de fantasia, transitória, passageira, fraca, teatral diante da realidade das couraças bem de ferro, dos obuses bem de aço, de toda aquela organização de morte e de extermínio, eterna como a humanidade e que a humanidade eterniza para a sua própria desgraça... (COSTALLAT, 1923, pp. 272-273COSTALLAT, Benjamin. Cock-Tail (continuação das crônicas de “Mut, Jef & C.”). 5 Milheiros. Rio de Janeiro: Grande Livraria Leite Ribeiro, 1923.).

Esse esforço de exibir uma imagem bem-acabada de país civilizado/industrializado, explicitado pelos Estados Unidos, também era nutrido pelo Brasil. Ao longo do texto que abre a publicação de A Exposição de 1922, Resende sublinha que o periódico tinha por objetivo apresentar, para além do que fora exibido ao público, o “repositório histórico destes últimos cem anos de atividade nacional” (RESENDE, 1922RESENDE, Pádua. A exposição nacional de 1922. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 07/1922, n. 1.). A revista tratava, portanto, de redigir uma historiografia ilustrada do país, esforço que procura realizar ao longo de seus números.

Em Orfeu Extático na Metrópole, Nicolau Sevcenko (1992)SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. efetiva um exímio trabalho de exegese dos usos e costumes da sociedade paulistana dos anos de 1920. Destaca a relevância desempenhada pelos eventos pátrios no estabelecimento de um censo de coesão da cidade que se industrializava graças à mão de obra estrangeira. Sublinha o papel que as artes desempenhavam no intento – daí a destacar o papel da “peça brasileira” de Afonso Arinos “O contratador de diamantes” (1917), cujo intuito era de mergulho nos sertões em busca daquilo que seria nacional.

Sevcenko considera, ademais, que um esporte como o futebol teve grande força agregadora, destacando as multidões que se deslocavam de todos os cantos da cidade para assistir aos seus times preferidos (SEVCENKO, 1992SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.). O Rio de Janeiro não ficava atrás nesse intuito de elaborar estratégias de coesão. O papel desempenhado pela “Exposição do Centenário da Independência” para isso é fundamental. Portanto, vários elementos que Lima Barreto afirma jocosamente comporem os programas dos congressos ocorridos em seu solo – Hino Nacional, louvores a “la naturaleza” , espetáculos no Municipal, competições futebolísticas, etc. (BARRETO, 1922, n. 746BARRETO, Lima. Uma surpresa da Exposição. In: Careta, Rio de Janeiro, 11/11/1922, ano XV, n. 751.) – não só efetivamente ocorriam como adquiriam importante sentido de brasilidade.

Por isso, é fundamental observarmos o diálogo existente entre a Exposição do Centenário e os prog ramas do Theatro Municipal do R io de Janeiro e das salas da cidade voltadas aos eventos culturais. Ademais, os eventos esportivos, embora não sejam foco específico deste artigo, não podem deixar de ser mencionados, uma vez se multiplicaram durante o certame, congregados em “Olimpíadas latino-americanas”9 9 Observar, a esse respeito, a reportagem fotográfica voltada à abertura das Olimpíadas, que ocorrera no “stadium” do Fluminense, palco das competições, a qual apresenta duas fotografias em que se veem a arena e o público que acompanha as competições, em planos gerais, detalhando-se, nas páginas seguintes, os “sportsmen” norte-americanos, japoneses e ingleses que dela participavam – como se observa, o evento não congregava apenas a América Latina. Cf. AS GRANDES COMEMORAÇÕES, 1922. e que deram pasto ao apetite do público e da imprensa cronística por meses; explicitando, com a referência à mitologia grega10 10 Teriam sido, segundo a mitologia grega, inventadas por Hércules em homenagem ao pai, Zeus. , as profundas bases nas quais o edifício da Exposição procurava se sustentar. Terezinha Silva atrela a referência à Grécia ao “helenismo decorativo e superficial [que] se manifestou na maioria dos escritores da belle époque”, que liam mesmo o esporte a partir desta perspectiva (Silva, 2014, p. 234SILVA, Terezinha V. Zimbrão da. Machado de Assis e o mulato de “alma grega”. Machado de Assis em linha, Rio de Janeiro, v. 7, pp. 229-239, 2014. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/mael/a/SQc68r9Y7WTFgDjbP7QzfRG/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S1983-68212014000200015.
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).

Figura 3
Capa do 2º número da revista A Exposição de 1922

As influências classicizantes emergem em edifícios como o célebre edifício da Academia Brasileira de Letras, construído à imagem e semelhança do Petit Trianon francês para servir de sede do Pavilhão da França, e nas próprias capas da revista A Exposição de 1922 (Imagem 4): que trazem um portal sustentado por colunas clássicas, ao longo das quais há uma série de efígies alusivas ao passado e ao presente, de autoria de G. Bloow, presidindo-se o acento heroico (os brasões do Império e da República, uma moradia indígena, lunetas, trombetas, uma locomotiva, um navio a vapor...).

Os referidos portais ilustrados na capa da publicação são mantidos ao longo dos números, alterando-se o seu interior. No correspondente ao 2º número, por exemplo, em primeiro plano, uma mulher (possivelmente a alegoria da República) carrega louros e uma tocha, e ampara um menino que carrega um pomo de ouro, enquanto ao fundo as chaminés de uma fábrica cospem fumaça (A EXPOSIÇÃO DE 1922A EXPOSIÇÃO DE 1922: Órgão da Comissão Organizadora. Rio de Janeiro. [18 Volumes, sendo 11 em 1922 e 7 em 1923]. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DOCREADER/DocReader.aspx?bib=800899>. Acesso em: 4 set. 2021.
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, 1922, n. 2A EXPOSIÇÃO DE 1922, Rio de Janeiro, 08/1922, n. 2.). Entre os pórticos e as efígies traça-se uma linha de continuidade da antiguidade grega à modernidade que o Brasil desejava abraçar. Mais: Império e República encimam cada uma das colunas. Séculos de exploração colonial ou as lutas ocorridas em vários estados do país pela sua independência de Portugal são apagados, preponderando o signo da amizade entre os dois países. Tão logo o esperado presidente de Portugal chega ao Rio de Janeiro, para os festejos de inauguração da Exposição11 11 Dois Pavilhões do evento pertenciam a Portugal: o de Honra e o de Comércio e Indústria. , a revista louva a forma como esse país se fazia representar dentro e fora dos limites do certame, esboçando o orgulho de quem vê a sua antiga colônia se transformando numa das nações mais ricas do mundo (PORTUGAL, 1922PORTUGAL: Honrosa visita de seu presidente. Sua participação no Centenário. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 09/1922, n. 3-4.).

Notamos, nesta imagética, que o âmbito arquitetônico e o estético enlaçam-se. Mesmo o esporte compõe com o quadro, nas “Olimpíadas latino-americanas”, que, ao realizarem o postulado eugênico da “mente sã num corpo são” então incensado no Brasil, trazem como referência a antiguidade grega. No entanto, se o estilo arquitetônico predominante nos edifícios da Exposição era o eclético, com destacada influência do classicismo e do Renascimento – materializando o intuito de equilíbrio clássico que era expresso no diploma de sócio efetivo da Sociedade Central de Arquitetos do Rio de Janeiro (Ruth Levy, 2013b, p. 20LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.), cuja ilustração apresentava um grupo de trabalhadores erigindo uma imponente construção clássica, bafejados pela musa que espera para lhes coroar de louros –, houve um esforço, por parte dos organizadores do certame, de se buscar um estilo que fosse tipicamente nacional. Elegeu-se, para tanto, como estilo vanguardista, o neocolonial, que tomava como fonte de inspiração os “elementos essenciais” (LEVY, 2013b, p. 25LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.) do estilo colonial:

Embora o ecletismo que predominava na produção arquitetônica da cidade desde a segunda metade do século XIX também estivesse fortemente presente entre os prédios da Exposição, o interesse pelo neocolonial ficaria indelevelmente associado ao evento e à figura de Carlos Sampaio, já que houve “entre as concepções artísticas dos referidos monumentos, grande empenho no aproveitamento dos nossos elementos coloniais, com a estilização da nossa flora e fauna, para a criação de um estilo nacional (ARCHITETURA NO BRASIL, 1921, p. 95ARCHITETURA NO BRASIL. Ano I, vol. I, n. 3, 12/1921, p. 95. apud LEVY, 2013b, p. 21LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.).

Considerando-se a vênia com que Portugal é tratado no evento, não é de se estranhar tal escolha. Segundo Levy, imprimira-se tal estilo a começar por uma das portas do evento: a Porta Norte, projeto de autoria de Raphael Galvão. Situada entre a Rua Clapp e a Rua D. Manuel, tal porta dava entrada à porção nacional do evento, situando-se o Pavilhão das Pequenas Indústrias e o das Indústrias Particulares à sua esquerda e o Palácio da Fiação à sua direita. O amplo Pavilhão das Indústrias Particulares, projeto de autoria de Nestor de Figueiredo e Armando de Oliveira, foi construído a partir da fachada de um edifício pré-existente, o Mercado Municipal, adotando-se ali o estilo “barroco da Boemia”, cujas características, segundo Levy, baseavam-se no “barroco jesuítico colonial” (LEVY, 2013b, p. 29LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.).

Figura 4
Mapa da Exposição publicado no 1º número de A Exposição de 1922

Tais influências presidiram também a construção do Palácio da Fiação – que, nas palavras de Morales de los Rios, combinava “o estilo colonial brasileiro propriamente dito com o barroco, não realizando, portanto, uma cópia do que se tem feito nesse sentido aqui e em Portugal, mas sim uma adaptação inteligente às modernas condições de vida” (LEVY, 2013b, p. 29LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.) – e do Pavilhão de Caça e Pesca, situado diante do Pavilhão das Indústrias Particulares, sobre estacas encravadas numa pequena enseada da Baía de Guanabara. Levy dá a palavra ao seu arquiteto, Armando de Oliveira, segundo o qual seu desejo fora o de incorporar o tema da caça e da pesca ao estilo colonial, criando um “aspecto cândido e pitoresco que convém a uma casinha de noivos à sombra de palmeiras onde canta o sabiá.” (LEVY, 2013b, pp. 29, 31LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.). Enfim, a influência do estilo neocolonial se percebia no Pavilhão de Pequenas Indústrias, de autoria de Nestor de Figueiredo e C. S. San Juan, cujo estilo colonial era “modernizado com decorações barrocas” (LEVY, 2013b, p. 31LEVY, Ruth. O Brasil celebra sua maioridade. In: LEVY, Ruth (org.). 1922-2012 – 90 anos da Exposição do Centenário. Rio de Janeiro: Casa Doze, 2013b.).

Figura 5
Fotografia noturna do Pavilhão de Caça e Pesca

O esforço em direção ao “pitoresco” – ou a adaptação do colonial à modernidade – fica claro na explicitação de A Exposição de 1922 a respeito do funcionamento da iluminação nessa área. Diz ela que, enquanto se decidira, no recinto da Exposição, por uma iluminação difusa, a partir das fontes luminosas e da luz indireta e refratária, na porção colonial optou-se pelo uso de globos opacos que filtravam a luz (A LUZ DA FONTE OCULTA, 1922). Observa-se que a recriação do mundo colonial passava por sua reinvenção sob a égide da modernidade, substituindo-se, por exemplo, a luz das velas – que, no período colonial, iluminava parcamente as trevas – pela luz elétrica, fomentando no público um mergulho idílico no passado da nação, permeado pelo presente. Diante do Pavilhão de Caça e Pesca situava-se o Pavilhão das Grandes Indústrias. Adaptado do conjunto formado pelo antigo Arsenal de Guerra, pela Casa do Trem e pelo Forte do Calabouço, porção do espaço abriga o Museu Histórico Nacional, “destinado a guardar e expor as relíquias do nosso passado, cultuando as lembranças dos nossos grandes feitos e dos nossos grandes homens” (DUMAS, 1942, p. 344DUMAS, Adolfo. A ideia de Criação do Museu Histórico Nacional. In: Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 3, pp. 383-397, 1942. apud COSTA, 2011, p. 53). Assim, o clima histórico emerge entre a recriação do passado e a exposição empírica de suas “relíquias” (ARAUJO, 2013ARAUJO, Valdei Lopes de. História da historiografia como analítica da historicidade. In: História da Historiografia, Ouro Preto, n. 12, pp. 34-44, 2013. Disponível em: htps://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/620. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: 10.15848/hh.v0i12.620.
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) – não devemos passar ao largo do viés hagiográfico do vocábulo.

O Museu Histórico Nacional dialoga com o intuito da Exposição de apresentar uma história ligada à questão da identidade nacional, repercutindo o ideário dos intelectuais do período (COSTA, 2011; SANTOS, 2006SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. A escrita do passado em museus históricos. Rio de Janeiro: Garamond; MinC; IPHAN; DEMU, 2006.). Esse intuito atravessa também a escolha de uma porção não desprezível da produção artística exibida durante os festejos do centenário, dentro ou fora dos domínios do certame. A Exposição de 1922 afirma, no artigo “O nosso folclore: o beijo das três saudades”:

Com a aproximação do Centenário da Independência temos verificado um interesse crescente das cousas nacionais, como se a ideia de que é preciso a colaboração de todos os bons brasileiros na revista que se vai fazer dos fatos dos nossos progressos materiais, políticos e sociais, se espertasse o desejo do estudo dos tesouros da nossa nacionalidade (O NOSSO FOLCLORE, 1922O NOSSO FOLCLORE: o beijo das três saudades. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 08/1922, n. 2.)12 12 Em seu estudo do período, Sevcenko antecede tal interesse nalguns anos. Considera, a princípio, a Liga Nacionalista, organizada em São Paulo, em 1915, após uma conferência proferida por Olavo Bilac na Faculdade de Direito do Largo de S. Francisco – liga que elegera Os sertões, de Euclides da Cunha (2003 [1902]), como a raiz da tradição da cultura nacionalista militante (SEVCENKO, 1992, p. 37). Destaca igualmente a coletânea de contos Urupês, de Monteiro Lobato, que atinge cinco volumes apenas no ano de sua publicação, 1918, demonstrando a ebulição de tal campanha. E enfim, constata a relevância da obra de Afonso Arinos, autor que “se constituiria no vértice do movimento de ‘redescoberta’ do Brasil ‘popular’, ‘folclórico’ e ‘colonial’” (SEVCENKO, 1992, p. 238) – obra que, após a morte do autor, é tomada sob a proteção das elites paulistanas, cuja encenação de O contratador de diamantes, em 1919, primava, como vimos, pela preocupação com a realidade histórica. .

Vale a pena nos debruçarmos sobre este artigo, uma vez que ele, por não ser assinado, serve à linha editorial da revista. Trata-se de um longo texto, emoldurado por figuras do folclore nacional, que procura realizar uma exegese desses mencionados “estudos dos tesouros da nossa nacionalidade” a partir de Sílvio Romero. O artigo principia por destacar a obra dos “mestiços”, tomando como exemplo as quadras populares nordestinas. Mostra como a presença dos indígenas pode ser sentida nos romances dos vaqueiros, e a africana, nos reinados, reisadas, congos, etc. Num esforço de encontrar a gênese do povo brasileiro, considera que a psicologia do mestiço é formada a partir da atuação do negro e do índio, que lhe transmitem “crenças, alusões, lendas e fantasias”. O “mestiço brasileiro funde as três raças de que nos originamos através do folclore”, constata o cronista, reproduzindo in totum o soneto “Música brasileira”, de Olavo Bilac, impresso na obra Tarde (1919); poema que percorre o Brasil num corte horizontal, os “desertos”, as “matas” e o “oceano”, tecendo a música brasileira a partir dos fos da “bárbara poracé” (dança de origem tupi), do “banzo africano” e da “trova portuguesa”. “És samba e jongo, chiba e fado” (O NOSSO FOLCLORE, 1922O NOSSO FOLCLORE: o beijo das três saudades. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 08/1922, n. 2.).

Nossa leitura, aqui, se quer antes temática que poética. Os gêneros musicais citados pelo eu-poemático são populares, e todos, com a exceção do fado português, possuem descendência indígena ou africana – apenas a xiba também pode ter tido influências portuguesas (DICIONÁRIO ELETRÔNICO HOUAISS...DICIONÁRIO ELETRÔNICO HOUAISS da Língua Portuguesa. CD-ROM.). Ao incorporar o soneto de Bilac, o autor endossa a miscigenação por ele apregoada, embora a relativize, torcendo os fatos para comprovar que a raça indígena possuía relação com a amarela, um dia o brasileiro se tornaria o tipo humano por excelência, junção da tenacidade do amarelo, do sentimento do negro e da inteligência do branco.

São patentes os laivos que “O nosso folclore: o beijo das três saudades” apresentam das teorias pseudocientíficas em voga desde meados do século XIX, que procuravam hierarquizar as raças, da branca – considerada a mais civilizada – à negra. Tais teorias determinam a estruturação de várias Exposições organizadas nos Estados Unidos, de meados de 1870 a 1916, conforme Rydell (1985)RYDELL, Robert W. All the World’s a Fair: Visions of Empire at American International Expositions, 1876-1916. Chicago: The University of Chicago Press, 1985. demonstra em detalhes, e são responsáveis por excrescências como a encenação do modus vivendi dos habitantes das colônias negras da França, exibida na “Exposição Colonial” de Marselha, de 1922 e eternizadas em película (French Western Africa. Colonial Exhibition a Marseille in 1922, Gaumont, 1922).

Contudo, observamos que a Exposição do Centenário procura caminhar na contracorrente do que se realizava usualmente no âmbito desses certames. O reconhecimento de que o brasileiro é resultado da miscigenação determina essa leitura que busca louvá-la, ao invés de repudiá-la. Daí a diferença encontrada entre o caso brasileiro e os casos europeus e norte-americanos, nos quais se procurava estabelecer a separação estrita entre os “superiores” brancos e os não-brancos, sumariamente inferiorizados. Analisando os debates ocorridos nas conferências acadêmicas realizadas no contexto da Exposição, Schuster (2014)SCHUSTER, Sven. História, nação e raça no contexto da Exposição do Centenário em 1922. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 21, n. 1, pp. 121-134, 2014. Disponível em:htps://www.scielo.br/j/hcsm/a/kYWBKz589rJvC5cz69TYSVL/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S0104-59702013005000013.
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considera que o histórico ideal de branqueamento da população por meio da miscigenação com o elemento europeu passava a ser olhado com ceticismo por porção dos intelectuais e participantes desses eventos. De todo modo, ganhou primeiro plano a questão da higiene no intuito de se “cuidar da raça” – o estudioso reporta-se ao Dicionário histórico, geográfico e etnológico do Brasil oriundo dessas reflexões, volume publicado por iniciativa governamental, que defendia ações como o saneamento do país no intuito de livrarem os habitantes doentes do interior da “‘degeneração gradual’ daquela ‘raça de caboclos’”, corrigindo-se os “efeitos malignos da importação de escravos africanos”, que teriam trazido “muitas doenças novas ao Brasil” (IHGB, 1922, p. 457O NOSSO FOLCLORE: o beijo das três saudades. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 08/1922, n. 2., 418 apud SCHUSTER, 2014SCHUSTER, Sven. História, nação e raça no contexto da Exposição do Centenário em 1922. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 21, n. 1, pp. 121-134, 2014. Disponível em:htps://www.scielo.br/j/hcsm/a/kYWBKz589rJvC5cz69TYSVL/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S0104-59702013005000013.
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). Não por acaso, dentre as efígies presentes no pórtico ilustrado na capa da revista A Exposição de 1922 não há alusão às populações negras, o que patenteia o esforço de seu apagamento da história nacional por parte do certame13 13 Apagamento de que foi vítima o célebre escritor Machado de Assis, tanto que, na ocasião de seu centenário, em 1939, é exposta a sua certidão de nascimento, na qual se procurava explicitar a ascendência europeia de sua mãe (cf. Silva, 2014, p. 230). .

Dissonância e polifonia dos meandros do país ao palco da Exposição

A princípio, pode-se pensar na construção, nos limites da “Exposição do Centenário”, de uma versão classicizante de Brasil, dado o traçado retilíneo de suas ruas e a alvura clássica de seus edifícios – num parque de diversões no qual o público poderia desfrutar de uma súmula do mundo civilizado no interior de um espaço controlado, protegido por portas monumentais e adentrado apenas após o pagamento de ingressos, excluindo-se, assim, os seres indesejados.

No entanto, a revista A Exposição de 1922 e os periódicos que circulavam então na cidade sinalizam para convivência, junto dos traços europeus, de uma cultura popular pulsante, malgrado seja estigmatizada (SILVA, 2014SILVA, Terezinha V. Zimbrão da. Machado de Assis e o mulato de “alma grega”. Machado de Assis em linha, Rio de Janeiro, v. 7, pp. 229-239, 2014. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/mael/a/SQc68r9Y7WTFgDjbP7QzfRG/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S1983-68212014000200015.
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)14 14 Neste sentido, conferir o artigo de Silva (2014) acerca da presença desse sincretismo nas obras de Machado de Assis. , dando conta daquilo que escapa ao controle, da polifonia que se faz dissonância, enfim, dos choques ocorridos quando a vida “real” adentra a fantasia. Acontecimentos como a chegada dos jangadeiros nordestinos à Exposição, a bordo de suas frágeis embarcações (e as suas poses canhestras diante das objetivas que os procuram registrar, cf. A EPOPEIA DOS JANGADEIROS, 1922A EPOPEIA DOS JANGADEIROS. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, 11/1922, n. 8-9.); como as “tardes regionais” ocorridas no Trianon (a exemplo daquela anunciada a 15 de setembro, da qual participariam o cosmopolita ator Leopoldo Fróes, o artista do Municipal, Mario Pinheiro, além do poeta e folclorista Catullo da Paixão Cearense e dos Turunas Pernambucanos, cf. TRIANON, 1922a, p. 8TRIANON. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 15/09/1922a, p. 8.); e, enfim, como a performance da “Orchestra Typica” mexicana, regida pelo maestro Torrebianca, cuja excelência os jornais do período anunciam surpresos, operam, supomos, inusitado deslocamento na recepção crítica, que vê crescer em relevância aquilo que era historicamente conhecido como “típico”, “regionalista” ou “popular”; noutras palavras, “menor”15 15 Conferir, por exemplo, A ESPLÊNDIDA HOMENAGEM DO MÉXICO..., 1922 e “As duas exposições”, In: COSTALLAT, 1923. .

No ano de 1922, um acontecimento marca o ponto de virada na forma como os representantes da cultura “popular” são tomados pela oficialidade: a chegada a Paris dos Oito Batutas. Há que se ressaltar, aqui, o papel simbólico desempenhado por esses artistas, que perfaziam o caminho inverso ao usual, levando a sua arte burilada nos arrabaldes do Rio modernizado à metrópole cultural europeia, cuja seiva a cultura erudita brasileira historicamente bebera. A bem da verdade, esse caminho não se deu sem fricção, e sobre isso quem fala é a prolífica cronista Chrysanthème, pseudônimo de Maria Cecília Vasconcellos, num longo e delicado texto no qual sai em defesa do grupo de artistas acusados de, devido à sua cor, vilipendiar a imagem do Brasil no estrangeiro. A cronista – o texto data de março de 1922, meio ano antes da inauguração da Exposição do Centenário, e é publicado no Correio Paulistano – esmiúça o patriotismo do grupo que procurava apresentar a música brasileira “real”, para além da clássica ou da imitativa.

Chrysanthème questiona os que criticam que sejam enviados à França, como exemplares do Brasil, um conjunto de “morenos”, e procura deslindar a arte que eles produzem. A defesa do caráter eminentemente nacional da música dos Batutas – ela destaca, sobretudo, a “flauta de um dos mais artistas da banda”, nosso eterno Pixinguinha – ressoa um elemento que é primordial para a defesa que Chrysanthème faria, mais tarde, no recinto da Exposição: o patriotismo.

[Os Oito Batutas] provam, pelo sucesso que têm obtido na terra de Saint-Saens, que a música do Brasil é luminosa, cadente, vermelha como o nosso céu vespertino, impressionante como a nossa maneira de amar, harmoniosa no acompanhamento ao balançar dos quadris femininos e langorosa, muitas vezes, como a voz da mulher brasileira em horas de melancolia ou de volúpia cismadora.

[...]

Eles, serenos e impassíveis, só tocam músicas brasileiras, fados de uma melodia suave ou ardente, como atmosfera da nossa terra, melodia que é como um veneno a um só tempo doce e chamejante, que nos entra pelos ouvidos e se espraia ao nosso organismo, causando-nos uma espécie de embriaguez deliciosa.

[...]

Há nas nossas músicas, como em nenhuma outra, a alma do seu povo, a quentura do seu solo, o brilho do seu céu. [...]. O violão de um matuto será sempre o próprio matuto e, à medida que ele vai mudando de mão, a civilização vai também pesando sobre ele com o seu cunho e estragando-lhe as cordas, que não mais cantarão o que sentem, mas, sim, o que os outros sentem. Essa propaganda do Brasil feita pelos oito batutas, por meio de notas e de cadências melodiosas, será mais útil ao nosso país do que muitas outras que nos têm custado grossas somas e grossos desgostos (CHRYSANTHÈME, 1922a, p. 3CHRYSANTHÈME. A música brasileira. In: Correio Paulistano, São Paulo, 29/03/1922a, p. 3.)16 16 A localização desta crônica deve-se ao trabalho de Pinto (2006). No que diz respeito à reação negativa de parte dos homens de letras do período frente ao envio dos Oito Batutas a Paris, conferir também Conde e Shaw (2022). .

A sua maneira de pensar a arte, considerando-a mais nacional à maneira que ela reflete as cores, os aromas e a temperatura do país, deixando de lado a imitação do estrangeiro, determina um ponto de virada conceitual – que está longe de ser unânime, e prova disso é a necessidade que a cronista tem de defender os artistas brasileiros – no que concerne às características que deveriam ser valoradas na avaliação da obra de arte. Seis meses mais tarde, a terra que envia ao coração do Velho Mundo os artistas oriundos dos arrabaldes cariocas optaria por acolher, no Teatro Municipal, uma companhia lírica estrangeira, escolhendo para a comemoração da data pátria uma ópera em italiano sobre um indígena que abre mão de sua cultura em prol da europeia – metaforizando o que a cultura erudita nascida nessas plagas se esforçara historicamente para fazer. Também os Batutas, a princípio olhados de forma enviesada pela crítica, acabam acolhidos no recinto da Exposição, no entanto, apenas após receberem tanto a pátina da civilização europeia quanto a sua chancela, conforme bem lembram Conde e Shaw (2022)CONDE, Maite; SHAW, Lisa. Towards an Alternative 1922: Popular Culture and Rio de Janeiro’s Vernacular Modernisms. In: Revista Brasileira de História, v. 42, n. 90, pp. 97-123, 2022. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/rbh/a/3J9qgqTNjzycpFy3jMVn6HQ/. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/1806-93472022v42n90-07.
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17 17 Comparando imagens do grupo antes e depois de seu embarque à Europa, as autoras destacam a substituição de seus trajes típicos pelo fraque, assim como de seu repertório, suas poses e seus instrumentos. A presença de instrumentos de jazz (a exemplo do saxofone e do trombone), bem como a orientação dos Batutas a estilos musicais urbanos e modernos, em detrimento dos folclóricos e rurais que então apresentavam no Brasil, assinala para a sua aproximação das cosmopolitas jazz-bands, notabilizadas ao redor do mundo (cf. CONDE, SHAW, 2022). .

Se a influência europeia e seu crivo valorativo eram, então, seguidos historicamente pela elite econômica brasileira, isso encontrou, no entanto, entre o recinto da Exposição do Centenário e as suas cercanias, vozes dissonantes como os jangadeiros nordestinos, Catullo, os Turunas Pernambucanos e mesmo os Oito Batutas – cujas recentes influências europeias não apagavam de suas criações as influências pregressas (o maxixe, o samba, a embolada e o cateretê) –, cujas artes se construíam a partir de modelos outros, nem por isso menos sofisticados. A Exposição, e os eventos que ela irradia, nos dão a ver um efervescente cadinho cultural, apontando-nos para a existência de diversos Brasis, para além daquele que a oficialidade procurava monumentalizar.

Tal cadinho se observa numa série de eventos ocorridos durante os festejos do Centenário, a exemplo da “3ª Tarde Regional Nortista”, ocorrida no teatro Trianon, que apresenta como programa:

1ª parte – Viriato Corrêa, descreverá, com o auxílio dos Turunas Pernambucanos, as FESTAS DO NORTE.

2ª parte – SERTANEJA (choro), O PINTO PINICA O VEIO (samba), SOLO DE SAXOFONE, A ESPINGARDA (embolada), NÃO FICO AQUI NÃO FICO, NÃO (embolada) e GRAÚNA por CATULLO CEARENSE. – Modinhas por VICENTE CELESTINO. COISAS CAIPIRAS, por MANÉ PIQUENO (TRIANON, 1922b, p. 8TRIANON. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 29/09/1922b, p. 8.).

Destaquemos os gêneros musicais eminentemente populares apresentados no evento, que, embora aluda geograficamente ao norte, incorpora desde produções oriundas do Nordeste até o choro carioca e o cancioneiro caipira. Esta terceira tarde traz como destaque os “Turunas Pernambucanos” – ou “Turunas da Mauriceia”, que nos anos seguintes fariam sucesso nas rádios do Rio de Janeiro e excursionariam pelas cidades de São Paulo18 18 Quando não iam fisicamente, estavam presentes por meio da indústria fonográfica. Veja-se, por exemplo, a personagem de Dico (de “A Apaixonada Elena”, conto da obra Laranja da China, de Alcântara Machado), que, na capital paulistana, entoa uma embolada que foi sucesso dos Turunas Pernambucanos em 1927, “Pinião”: “O Dico pegou o chapéu, beijou o rosto da mãe, curvou-se diante da irmã, fez umas piruetas e saiu cantando o Pinião.” (ALCÂNTARA MACHADO, 2013 [1928], p. 114). , demonstrando o espraiamento da cultura popular nordestina para além dos festejos do Centenário. Os ensinamentos sobre os usos e costumes brasileiros eram ministrados, ora por meio de uma conferência ilustrada, como a que se realiza no Trianon, por Viriato Corrêa e pelos Turunas Pernambucanos, ora por meio das encenações teatrais.

Figura 6
O Teatro Trianon anuncia a “3ª Tarde Regional Nortista”

Entre fins da década de 1910 e os primeiros anos da década de 1920 ingressam nos repertórios dos teatros paulistanos e, sobretudo, cariocas, comédias de costumes que dão de ombros às grandes cidades, embebendo-se das tradições regionais (mesmo que se situassem nos subúrbios das capitais). Peças que saíram das penas de homens como o próprio Viriato Corrêa, elencado pela Gazeta de Notícias entre os artistas envolvidos na tarde nortista. Corrêa escreve, a 1919, “Jurity”, que denomina “peça de costumes sertanejos em 3 atos”. A obra se passa entre a “casa rústica” do Major Fulgêncio e o largo da “Igreja da Vila”. Jurity é a moça mestiça, “cantadeira de viola”, faceira, alegre e pura, que rejeita tanto o filho doutor do Major quanto o noivo vaqueiro, que desacreditara de sua pureza, para se casar com seu apaixonado “Corcundinha”, o único homem que a defende quando a cidade lhe volta as costas (CORRÊA, 1947 [1919]CORRÊA, Viriato. Juriti. Peça de costumes sertanejos em 3 atos, com música de Francisca Gonzaga. Representada pela primeira vez no Teatro São Pedro de Alcântara do Rio de Janeiro, em 16 de julho de 1919. In: Boletim da SBAT, Rio de Janeiro, n. 237, ano XXVII, jul. 1947.). A obra, representada pela primeira vez no S. Pedro de Alcântara em meados de 1919, fazia uso de um elenco numeroso, representando, sobretudo, matutas e matutos. Apresentava, à maneira do que fizera Arinos em seu Contratador de Diamantes, uma cena típica, o “Bumba meu boi”, com todos os seus elementos, segundo a rubrica da peça, e ainda fazia uso de “músicos da Filarmônica Lira de Prata, soldados do Destacamento do Cabo, Capangas, Tocadores de violas, Cavaquinhos, Gansas, Requeques, Homens e mulheres do povo, boiadeiros, etc.” – súmulas de instrumentos musicais e formações de cunho popular.

Jurity é interpretada, na primeira montagem, por Abigail Maia, célebre atriz e cantora da cena teatral carioca da época, que faz pródigo uso, nela, de seus dotes de cantora, já que a peça é musicada por Chiquinha Gonzaga. O “Corcundinha” com quem ela se casaria é desempenhado por outro cantor de envergadura do período, Vicente Celestino – outro dos artistas que figura na “Tarde Regional Nortista”. “Jurity” testemunha o consórcio entre artistas importantes da cena carioca visando à consecução de um teatro sertanejo, embora burilado na capital.

Precisamos ainda destacar “Onde canta o sabiá”, comédia de Gastão Tojeiro representada pela 1ª vez no Trianon em meados de 1921, obra que situa a ação na residência do Major Justino, localizada num arrabalde carioca. Embora se ouça, da casa, os ruídos da estação de trem das proximidades, sobressai-se ali o som do sabiá que canta no alpendre do velho senhor (TOJEIRO, 1921TOJEIRO, Gastão. Onde canta o sabiá. Comédia em três atos representada pela 1ª vez no Teatro Trianon, do Rio de Janeiro, em 8 de junho de 1921. In: Cadernos da Coletânea Teatral, n. 1, s.d.). O pássaro que dá título à peça, de propriedade da jovem Nair, é central ao seu enredo, sendo o responsável por uni-la ao afrancesado Elvídio, que troca de bom grado a cidade-luz por um pacato casamento interiorano. Os subúrbios dos circos de cavalinhos, dos flautistas enamorados e das pitorescas casinhas de noivos à sombra das “palmeiras onde canta o sabiá” – para parafrasearmos tanto Gonçalves Dias quanto homens do século XX, como Gastão Tojeiro e o arquiteto Armando de Oliveira, autor do projeto do Pavilhão de Caça e Pesca da Exposição do Centenário – tornam-se presença constante na dramaturgia da época.

Considerações finais

Procuramos, neste artigo, abordar uma variedade de produções artísticas ora elaboradas ao longo da “Exposição Internacional do Centenário da Independência” – dentro ou fora de seus portões –, ora elaboradas anos antes e ali repercutidas. Buscamos demonstrar o ímpeto de monumentalização de signos da nação, recrudescido a partir de meados da década de 1910. Tal ímpeto encontra um bem-acabado palco no certame inaugurado na capital carioca a Sete de Setembro de 1922.

Embora deixe transparecer as suas incontornáveis raízes europeias, mimetizando as características dos eventos que nasceram naquele solo, a Exposição Internacional do Centenário de Independência comporta características próprias. Assim, embora as influências clássicas de porção não desprezível de seus pavilhões – mormente os situados na Avenida das Nações – repercuta a estruturação dos certames estrangeiros, observa-se igualmente o esforço da elaboração de uma arquitetura nacional. Daí a inclinação ao neocolonial, atravessando-se as influências portuguesas por uma inventividade nacional.

O âmbito arquitetural estabelece, como vimos, um diálogo profundo com a produção artística da dobra da década de 1910, oriunda tanto dos altos estamentos da sociedade quanto de suas camadas populares. Espetáculos como “O contratador de diamantes”, encenado pela aristocracia paulistana no palco do elitizante Theatro Municipal ou “Jurity”, exibido no popular teatro carioca São Pedro de Alcântara, ambos em 1919, refugiam-se, ora num passado heroicizante, ora no arrabalde/nos sertões, tentando depreender daí as raízes nacionais.

A “Exposição do Centenário”, ao transformar o neocolonial num estilo nacional, dialogava com cenários criados pela arte de dramaturgos como Viriato Corrêa ou Gastão Tojeiro, de poetas como Catullo da Paixão Cearense e de cantadores como os Turunas Pernambucanos ou Vicente Celestino. Sublinhando tal intento, a revista A Exposição de 1922 exalta a figura do mestiço, transformando-o no elemento nacional por excelência, na contracorrente do que se dá nas exposições norte-americanas, ou num certame que ocorria concomitantemente ao brasileiro: a Exposição Colonial de Marselha.

O certame brasileiro repercutia a mudança de aragem simbolizada pelo envio de um grupo como os Batutas à Europa, como representantes da música brasileira. Neste sentido, constatamos que, embora o evento tenha sido inaugurado com a faustosa encenação da ópera Il Guarany, de Carlos Gomes, igualmente ensaiava-se, naqueles anos que antecederam a efeméride pátria, a construção de alternativas de nação que se afastavam do europeizado idílio romântico, mergulhando na inventividade do Brasil profundo. Alternativas que eram oriundas, muitas vezes, de próprios grupos sociais historicamente espoliados – para além, portanto, da intelligentsia ou do Estado, cujo intuito de se construir uma unidade nacional não escondia nem o seu caráter impositivo (cf. Dantas, 2009DANTAS, Carolina Vianna. O Brasil café com leite: debates intelectuais sobre mestiçagem e preconceito de cor na primeira república. In: Tempo, v. 13, n. 26, pp. 56-79, 2009. Disponível em:htps://www.scielo.br/j/tem/a/gVZtKfXnY8LwjzStFgXLMjg/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S1413-77042009000100004.
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), tampouco os seus vieses racistas –, daí a necessidade de as considerarmos com vagar.

  • 3
    No que diz respeito aos climas históricos, Valdei Araujo teoriza a partir de Gumbrecht, segundo o qual o “desejo por atmosfera e clima é um desejo por presença” (GUMBRECHT, 2012GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosphere, Mood, Stimmung: On a Hidden Potential of Literature. Stanford, Ca: Stanford University Press, 2012., posição 352 apud ARAÚJO, 2013, p. 42ARAUJO, Valdei Lopes de. História da historiografia como analítica da historicidade. In: História da Historiografia, Ouro Preto, n. 12, pp. 34-44, 2013. Disponível em: htps://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/620. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: 10.15848/hh.v0i12.620.
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    ). Assim, a utilização de objetos ou textos oriundos do passado corporifica tais climas. Eles servem, a um só tempo, como “documento[s] de um passado morto” e “fonte[s] de efeitos de imediaticidade desses mundos” (ARAÚJO, 2013, p. 42).
  • 4
    Outro texto presente no programa, de autoria de Arthur Azevedo, dá detalhes sobre a sua composição: “Os dois últimos [atos da peça] ainda não estavam escritos [quando Arinos a lera aos colegas literatos]. O autor partia no dia seguinte para Minas, e era lá, sob o incomparável céu da sua província, rodeado de todos os encantos daquela maravilhosa paisagem, que pretendia concluir a peça.” (ARINOS, 1919, n.p. [p. 1]ARINOS, Afonso. Programa completo da encenação de “O Contratador de Diamantes”. Drama em 3 atos e 1 quadro. Representado no Teatro Municipal de São Paulo em Benefício do Asilo dos Inválidos e da Sociedade de Cultura Artística, aos 12 e 14 de maio de 1919. Acervo particular de Sérgio Arruda.).
  • 5
    Conferir, por exemplo, OS PREPARATIVOS DO CENTENÁRIO, 1922, n. 2OS PREPARATIVOS DO CENTENÁRIO – A futura exposição. Fon-Fon, Rio de Janeiro, 14/01/1922, ano XVI, n. 2., que apresenta fotografias de diversos trechos da praia de Santa Luzia, aterrados com o arrasamento do Morro do Castelo, onde se levantariam os pavilhões da Exposição.
  • 6
    Certo cronista anônimo lamenta: “num futuro não muito longe, a paisagem carioca enfeada pelo modernismo.”. Cf. OS PREPARATIVOS PARA O CENTENÁRIO, 1922, n. 24OS PREPARATIVOS PARA O CENTENÁRIO. Fon-Fon. Rio de Janeiro, 17/06/1922, ano XVI, n. 24..
  • 7
    No original: “In the Midway it’s some dirty and all barbaric. It deafens you with noise; the worst folks in there are avaricious and bad; and the best are just children in their ignorance, and when you’re feelin’ bewildered with the smells and sounds and sights, always changin’ like one o’ these kaleidoscopes, and when you come out o’ that mile-long babel where you’ve been elbowed and cheated, you pass under a bridge – and all of a sudden you are in a great, beautiful silence. The angels on the woman’s Buildin’ smile down and bless you, and you know that in what seemed like one step, you’ve passed out o’ darkness and into light.”
  • 8
    A este respeito, conferir também Sant’ana (2008)SANT’ANA, Thaís Rezende da Silva de. A Exposição Internacional do Centenário da Independência: modernidade e política no Rio de Janeiro do início dos anos 1920. Dissertação de mestrado, História. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, 2008..
  • 9
    Observar, a esse respeito, a reportagem fotográfica voltada à abertura das Olimpíadas, que ocorrera no “stadium” do Fluminense, palco das competições, a qual apresenta duas fotografias em que se veem a arena e o público que acompanha as competições, em planos gerais, detalhando-se, nas páginas seguintes, os “sportsmen” norte-americanos, japoneses e ingleses que dela participavam – como se observa, o evento não congregava apenas a América Latina. Cf. AS GRANDES COMEMORAÇÕES, 1922AS GRANDES COMEMORAÇÕES. Fon-Fon, Rio de Janeiro, 21/09/1922, ano XVI, n. 38..
  • 10
    Teriam sido, segundo a mitologia grega, inventadas por Hércules em homenagem ao pai, Zeus.
  • 11
    Dois Pavilhões do evento pertenciam a Portugal: o de Honra e o de Comércio e Indústria.
  • 12
    Em seu estudo do período, Sevcenko antecede tal interesse nalguns anos. Considera, a princípio, a Liga Nacionalista, organizada em São Paulo, em 1915, após uma conferência proferida por Olavo Bilac na Faculdade de Direito do Largo de S. Francisco – liga que elegera Os sertões, de Euclides da Cunha (2003 [1902])CUNHA, Euclides da. Os Sertões. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003 [1902]., como a raiz da tradição da cultura nacionalista militante (SEVCENKO, 1992, p. 37SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.). Destaca igualmente a coletânea de contos Urupês, de Monteiro Lobato, que atinge cinco volumes apenas no ano de sua publicação, 1918, demonstrando a ebulição de tal campanha. E enfim, constata a relevância da obra de Afonso Arinos, autor que “se constituiria no vértice do movimento de ‘redescoberta’ do Brasil ‘popular’, ‘folclórico’ e ‘colonial’” (SEVCENKO, 1992, p. 238SEVCENKO, Nicolau. Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.) – obra que, após a morte do autor, é tomada sob a proteção das elites paulistanas, cuja encenação de O contratador de diamantes, em 1919, primava, como vimos, pela preocupação com a realidade histórica.
  • 13
    Apagamento de que foi vítima o célebre escritor Machado de Assis, tanto que, na ocasião de seu centenário, em 1939, é exposta a sua certidão de nascimento, na qual se procurava explicitar a ascendência europeia de sua mãe (cf. Silva, 2014, p. 230SILVA, Terezinha V. Zimbrão da. Machado de Assis e o mulato de “alma grega”. Machado de Assis em linha, Rio de Janeiro, v. 7, pp. 229-239, 2014. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/mael/a/SQc68r9Y7WTFgDjbP7QzfRG/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S1983-68212014000200015.
    htps://www.scielo.br/j/mael/a/SQc68r9Y7W...
    ).
  • 14
    Neste sentido, conferir o artigo de Silva (2014)SILVA, Terezinha V. Zimbrão da. Machado de Assis e o mulato de “alma grega”. Machado de Assis em linha, Rio de Janeiro, v. 7, pp. 229-239, 2014. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/mael/a/SQc68r9Y7WTFgDjbP7QzfRG/abstract/?lang=pt. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/S1983-68212014000200015.
    htps://www.scielo.br/j/mael/a/SQc68r9Y7W...
    acerca da presença desse sincretismo nas obras de Machado de Assis.
  • 15
    Conferir, por exemplo, A ESPLÊNDIDA HOMENAGEM DO MÉXICO..., 1922A ESPLÊNDIDA HOMENAGEM DO MÉXICO cavalheiresco e legendário no primeiro centenário da nossa Independência. A Exposição de 1922, Rio de Janeiro, n. 6-7, 10/1922. e “As duas exposições”, In: COSTALLAT, 1923COSTALLAT, Benjamin. Cock-Tail (continuação das crônicas de “Mut, Jef & C.”). 5 Milheiros. Rio de Janeiro: Grande Livraria Leite Ribeiro, 1923..
  • 16
    A localização desta crônica deve-se ao trabalho de Pinto (2006)PINTO, Maria de Lourdes de Melo. Memória de autoria feminina nas primeiras décadas do século XX: a emergência da obra periodística de Chrysanthème. Tese de doutorado, Letras, Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2006.. No que diz respeito à reação negativa de parte dos homens de letras do período frente ao envio dos Oito Batutas a Paris, conferir também Conde e Shaw (2022)CONDE, Maite; SHAW, Lisa. Towards an Alternative 1922: Popular Culture and Rio de Janeiro’s Vernacular Modernisms. In: Revista Brasileira de História, v. 42, n. 90, pp. 97-123, 2022. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/rbh/a/3J9qgqTNjzycpFy3jMVn6HQ/. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/1806-93472022v42n90-07.
    htps://www.scielo.br/j/rbh/a/3J9qgqTNjzy...
    .
  • 17
    Comparando imagens do grupo antes e depois de seu embarque à Europa, as autoras destacam a substituição de seus trajes típicos pelo fraque, assim como de seu repertório, suas poses e seus instrumentos. A presença de instrumentos de jazz (a exemplo do saxofone e do trombone), bem como a orientação dos Batutas a estilos musicais urbanos e modernos, em detrimento dos folclóricos e rurais que então apresentavam no Brasil, assinala para a sua aproximação das cosmopolitas jazz-bands, notabilizadas ao redor do mundo (cf. CONDE, SHAW, 2022CONDE, Maite; SHAW, Lisa. Towards an Alternative 1922: Popular Culture and Rio de Janeiro’s Vernacular Modernisms. In: Revista Brasileira de História, v. 42, n. 90, pp. 97-123, 2022. Disponível em: htps://www.scielo.br/j/rbh/a/3J9qgqTNjzycpFy3jMVn6HQ/. Acesso em: 5 ago. 2022. DOI: htps://doi.org/10.1590/1806-93472022v42n90-07.
    htps://www.scielo.br/j/rbh/a/3J9qgqTNjzy...
    ).
  • 18
    Quando não iam fisicamente, estavam presentes por meio da indústria fonográfica. Veja-se, por exemplo, a personagem de Dico (de “A Apaixonada Elena”, conto da obra Laranja da China, de Alcântara Machado), que, na capital paulistana, entoa uma embolada que foi sucesso dos Turunas Pernambucanos em 1927, “Pinião”: “O Dico pegou o chapéu, beijou o rosto da mãe, curvou-se diante da irmã, fez umas piruetas e saiu cantando o Pinião.” (ALCÂNTARA MACHADO, 2013 [1928], p. 114).
  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografia utilizadas são referenciadas no artigo. Meus sinceros agradecimentos aos pareceristas anônimos da Revista de História, pelas leituras argutas e a delicadeza dos comentários, que muito me auxiliaram na revisão deste artigo. Este texto é oriundo do projeto de pesquisa “O teatro da modernidade: o papel das artes na Exposição do Centenário da Independência (1922-3) a partir do acervo da Biblioteca Nacional”, apoiado pela Fundação Biblioteca Nacional (Edital PNAP-2020).

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Filmografia

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Editado por

Editores Responsáveis
Miriam Dolhnikoff e Miguel Palmeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    13 Set 2021
  • Aceito
    03 Jun 2022
Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História Av. Prof. Lineu Prestes, 338, 01305-000 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (55 11) 3091-3701 - São Paulo - SP - Brazil
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