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Avaliação preliminar de um programa comunitário de assistência à infância

Preliminary evaluation of a communitary program of childhood assistance

Resumos

Apresenta-se a avaliação preliminar de um programa de assistência à infância em comunidade urbana. Êste estudo foi feito no Centro Comunitário Médico Social de Vila Lobato em um período de 8 meses de trabalho. O grupo etário de 0 |- 2 anos teve prioridade. Foram analisados os dados referentes a: tipos de consultas, número de consultas, faltas e alguns diagnósticos, principalmente desnutrição, diarréia, êrro alimentar e infecção das vias aéreas superiores. Foram consideradas satisfatórias as variáveis estudadas. Sugere-se uma definição mais precisa de objetivos.

Assistência; Infância; Comunidade; Avaliação; Pediatria


The preliminary evaluation of a program of childhood assistance in an urban community is presented. This problem was studied at the Communitary Medical-Social of Vila Lobato - Ribeirão Prêto, S. Paulo (Brazil) during a period of 8 months. The group of children between 0|-2 years had priority. The kind and number of consultations, absences and some diagnostics specially denutrition, diarrhea, feeding error, and upper respiratory tract infection, were analysed. The studies variations are considered good, but a more precise definition is required.

Childhood assistance; Communitary program; Evaluation; Pediatrics


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação preliminar de um programa comunitário de assistência à infância

Preliminary evaluation of a communitary program of childhood assistance

Marco A. BarbieriI; Luci Moreira da SilvaII; J. Renato WoiskiI; José Romero TeruelIII; Júlio Cesar DaneluzziI; Oldemar WeberI

IDo Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Prêto da USP – Ribeirão Prêto, SP – Brasil

IIDo Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP – Av. Dr. Arnaldo, 455 – São Paulo, SP – Brasil

IIIDo Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Prêto da USP. – Ribeirão Prêto, SP – Brasil

RESUMO

Apresenta-se a avaliação preliminar de um programa de assistência à infância em comunidade urbana. Êste estudo foi feito no Centro Comunitário Médico Social de Vila Lobato em um período de 8 meses de trabalho. O grupo etário de 0 |– 2 anos teve prioridade. Foram analisados os dados referentes a: tipos de consultas, número de consultas, faltas e alguns diagnósticos, principalmente desnutrição, diarréia, êrro alimentar e infecção das vias aéreas superiores. Foram consideradas satisfatórias as variáveis estudadas. Sugere-se uma definição mais precisa de objetivos.

Unitermos: Assistência*; Infância*; Comunidade*; Avaliação; Pediatria.

SUMMARY

The preliminary evaluation of a program of childhood assistance in an urban community is presented. This problem was studied at the Communitary Medical-Social of Vila Lobato – Ribeirão Prêto, S. Paulo (Brazil) during a period of 8 months. The group of children between 0|–2 years had priority. The kind and number of consultations, absences and some diagnostics specially denutrition, diarrhea, feeding error, and upper respiratory tract infection, were analysed. The studies variations are considered good, but a more precise definition is required.

Uniterms: Childhood assistance *; Communitary program*; Evaluation*; Pediatrics.

1. INTRODUÇÃO

Um programa comunitário necessita de avaliações periódicas a fim de medir o seu rendimento-custo, bem como melhor adaptar o seu funcionamento, após as fases de planejamento e início de execução. Foi avaliado o funcionamento do ambulatório de Puericultura e Pediatria do Centro Médico Social Comunitário de Vila Lobato (CMSCVL), situado em bairro periférico de Ribeirão Prêto, Estado de São Paulo. Êste Centro, além do atendimento à infância, presta serviço médico global a tôda população da área com ambulatório de clínica geral, ginecologia e obstetrícia.

Embora chamada de Vila Lobato, a área delimitada abrange também parte do Jardim Conceição, Vila Manoel Junqueira, Vila Monte Alegre e Jardim Antártica. A sede está localizada na área do Jardim Antártica. Esta área foi assim delimitada devido ao fato de não possuir nenhum serviço de atendimento médico para sua população. Pelo grande número de construções recentes e terrenos baldios, pôde-se concluir que se trata de bairros relativamente novos.

O ambulatório de Puericultura e Pediatria do CMSCVL começou a funcionar em 30 de junho de 1969. Inicialmente, eram registradas e atendidas tôdas as crianças da área, de 0 |– 11 anos, que procuravam o Centro. Como a demanda de assistência médica foi progressivamente aumentando, a capacidade do Centro em pessoal tornou-se insuficiente havendo necessidade de estabelecer prioridade para registro.

A partir de setembro de 1969, estabeleceu-se prioridade para registro de tôdas as crianças de 0 |– 2 anos e para crianças de 2 |– 11 anos com alteração patológica. As demais não registradas eram atendidas em triagem feita por médico residente.

O atendimento no Centro, nêsse período, foi feito geralmente por dois médicos pediatras e dois doutorandos (em estágio no serviço), auxiliados por uma enfermeira de saúde pública, uma assistente social, uma funcionária responsável pelo registro, uma atendente e uma serviçal.

A enfermeira de saúde pública e a assistente social colaboraram tanto no serviço do Centro como também em visitas domiciliares.

Avaliação semelhante a que vai ser descrita foi feita também em relação aos outros setores de atividade do Centro.

2. AVALIAÇÃO

Esta avaliação teve por objetivo verificar o rendimento do ambulatório de puericultura e pediatria bem como caracterizá-lo sob alguns aspectos relacionados à saúde e à doença. Foram analisadas tôdas as pastas de crianças de 0 |– 2 anos registradas no Centro, no período de 30/6/69 a 20/12/69 (73 ambulatórios). O período de seguimento considerado para êste trabalho foi de aproximadamente 8 meses (30/6/69 a 13/3/70), sendo 103 o número de ambulatórios realizados nêsse período, com funcionamento às segundas, quartas e sextas feiras à tarde.

As variáveis estudadas neste levantamento, para cada criança, foram as seguintes: idade, sexo, tempo de seguimento, número de consultas, número de faltas, imunização anterior à primeira consulta e diagnóstico em cada consulta.

Além destas variáveis estudadas para crianças de 0 |– 2 anos utilizamos também dados do Arquivo de Documentação Médica e Estatística do Centro.

Os dados de população são do levantamento inicial de tôda a área, realizado em abril de 1969.

O movimento de consultas, no período estudado, das crianças matriculadas entre 30/6 e 20/12/69 é mostrado na Tabela 1.

Verifica-se que o grupo etário de 0|– 2 teve predominância, pois foi o prioritário para o trabalho de atenção à infância no Centro.

A relação entre as crianças de 0 |– 2 anos atendidas (casos novos) e na população é mostrada nas Figuras 1 e 2. Verifica-se que o número de crianças de 0 |– 1 ano matriculadas no serviço foi maior que o número de crianças dêste grupo etário na população. Isto pode ser devido ao crescimento populacional ou ao registro de crianças de fora da área ou ambos. Pela Tabela 2, pode-se verificar o número de crianças atendidas por grupo etário e por sexo. A Tabela 3 mostra a população de 0 |– 2 anos da área.



O movimento de consultas e faltas por ambulatório do serviço de Puericultura e Pediatria no Centro é mostrado na Tabela 4.

A Figura 3 mostra a distribuição das consultas de 0 |– 2 anos em relação ao total de crianças (0 |– 11 anos) atendidas em cada tipo de consulta no Centro.


Os motivos da procura de assistência no CMSCVL das crianças matriculadas de 0 |– 2 anos, foram:

O estudo das faltas no ambulatório mostrou que 30 crianças de 0 |– 2 anos (25,2% do total deste grupo etário) não compareceram aos retornos marcados.

O número elevado de crianças que não voltaram ao Centro, nos levou a solicitar da Assistente Social, visita a casa para estudo dos motivos das faltas. Segue-se o resultado:

O número de crianças imunizadas, anteriormente à primeira consulta (crianças de 6 meses a 2 anos), foi:

Foram consideradas imunizadas as crianças que haviam recebido, até a data do registro no Centro, pelo menos 3 doses de vacina tríplice.

A Tabela 5 mostra o número médio de consultas por criança e por grupo etário.

A Tabela 6, mostra quantas consultas foram dadas a cada criança por mês.

Como rotina no nosso ambulatório de Puericultura ficou estabelecido que cada criança receberia uma consulta mensal no primeiro semestre de vida; uma consulta cada dois meses no segundo semestre; uma consulta cada três meses no segundo ano; uma consulta cada seis meses no terceiro e quarto ano de vida. A partir daí uma consulta anual por criança.

Portanto, a criança que viesse para a primeira consulta no primeiro mês de vida receberia até os dois anos um total de 13 consultas, o que equivaleria a uma média de 0,54 consultas por mês nos primeiros dois anos de vida. No nosso ambulatório, êste valor foi superado de quase três vezes ( = 1,51). Êste fato pode ser explicado porque na realidade as crianças estão tendo problemas de doença o que força um retôrno mais próximo.

Isto é mostrado na Figura 4, onde se vê a situação de 98 crianças em relação ao número de consultas e tempo de seguimento. A curva (linha cheia) representa uma criança teórica que, tendo sido registrada no primeiro mês de vida, foi seguida segundo a rotina proposta até o segundo ano de vida. A faixa (limitada pelas linhas finas) representa o desvio arbitrário de ± uma consulta em relação à curva teórica. Crianças que cairam dentro desta faixa foram, para nós, as que seguiram a rotina proposta.


Para melhor compreensão da Figura 4, imaginemos uma criança de 6 meses de idade que veio ao Centro pela primeira vez para registro. Deveria estar fazendo a sua sexta consulta, mas na realidade está fazendo a primeira. Ela vai entrar no gráfico (Figura 4), como se tivesse até então seguido a rotina do Centro: sexta consulta no sexto mês. Se ela foi seguida 4 meses e se nêstes ela teve 4 consultas, quando deveria ter tido 2, ela será marcada no ponto que corresponde a 10 na ordenada (seguimento) e 10 na abcissa (número de consultas). Cairá fora da faixa preconizada pelo Centro. Dessa forma foram marcados todos os pontos do gráfico. Verificamos que um grande número de crianças (60) está tendo consultas a mais que o proposto; 34 crianças estão tendo o número de consultas dentro da faixa proposta. Apenas 4 tiveram um número menor de consultas que o proposto.

Uma das variáveis que nos propusemos estudar foi o diagnóstico das crianças em tôdas as consultas. Estabelecemos 13 grupos diagnósticos e em cada consulta todos os diagnósticos foram computados dentro dos grupos. Tendo sido manual a tabulação dos dados coletados não foi possível ainda estudar o comportamento de todos os diagnósticos nas diferentes consultas.

Como uma das prioridades propostas para o Centro foi a puericultura de crianças de 0 |– 2 anos, tivemos interêsse em observar o problema da desnutrição na população de atendidos.

A Tabela 7 mostra o número médio de consultas por criança registrada no Centro em bom estado nutricional, tendo assim permanecido até a última consulta. A média de consulta por criança de 0 |– 2 anos que permaneceu eutrófica em todo o período de seguimento foi de 4,08, enquanto a mesma média para tôdas as crianças de 0 |– 2 anos (incluindo aquelas que em algum período do seguimento esteve desnutrida) foi de 4,49. (Ver Tabela 4).

A Tabela 8, mostra uma média de 5,7 consultas por criança que em algum período do seguimento estêve desnutrida, contra uma média de 4,08 das crianças eutróficas em todo o período de seguimento.

Nota-se que 5% das crianças eram eutróficas por ocasião da matrícula no Centro e se desnutriram durante o seguimento e, 5% das crianças eram desnutridas e se recuperaram. Crianças eutróficas que se desnutriram foram, provàvelmente, aquelas que inicialmente recebiam leite materno e que, com a diminuição dêste, não tiveram complementação adequada.

Como não foi possível fazer todos os cruzamentos de diagnósticos em todo o período de seguimento, procuramos fazê-lo na primeira consulta de cada criança. A Tabela 9 mostra o diagnóstico nutricional na primeira consulta.

Procuramos também ver a associação entre o diagnóstico nutricional e alguns diagnósticos mais freqüentes.

Esperávamos encontrar associação positiva entre erro alimentar e desnutrição em aproximadamente 100% das crianças, o que ocorreu em apenas 40% delas. Isto, atribuímos a dois possíveis fatores: a não referência por parte de quem fêz o atendimento de êrro alimentar entre os diagnósticos da criança e a possibilidade de maior incidência de diarréia infecciosa entre os desnutridos (Tabela 10).

Na Tabela 11, pode-se verificar que 55% das crianças desnutridas apresentaram diarréia contra 18,55% das crianças eutróficas.

Houve, como mostra a Tabela 12, 45% de associação entre os diagnósticos de crianças com desnutrição e diarréia mas que não apresentavam êrro alimentar, e 30% de associação entre desnutrição e êrro alimentar mas sem diarréia. Das crianças eutróficas, 63,9% não apresentaram diarréia nem êrro alimentar.

Na Tabela 13, verifica-se que houve 45% de associação entre desnutrição e infecção de vias aéreas superiores e 32,98% entre eutrofia e infecção de vias aéreas superiores.

3. COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES

No setor de assistência à infância na comunidade estudada estabeleceram-se prioridade com a finalidade de desenvolver mais a puericultura, principalmente no grupo etário de 0 |– 2 anos, propondo um esquema de seguimento na atenção médica e de enfermagem.

A avaliação apresentada mostrou que houve maior atendimento no grupo etário de 0 |– 2 anos – um dos objetivos prioritários (Tabelas 1 e 2).

As faltas foram menores no grupo etário 0 |– 2 anos (33,3%), o que estava de acôrdo com a prioridade estabelecida (Tabelas 1 e 2).

No grupo etário de 1 |– 2 anos ocorreu diferença percentual entre os sexos, tanto na população (53% de fem. e 47% de masc.) quanto no atendimento no Centro (61,8% de fem. e 38,2% de masc.), a favor do sexo feminino (Figura 3).

O motivo da procura de assistência no Centro ocorreu, na grande maioria, por doença (80,68). Isto veio constatar, na prática, que o atendimento seria primeiramente dos casos de doenças que procuravam o serviço e, numa segunda fase, tentar fazer puericultura pois, a população da área, na sua grande maioria, mostrou que estava acostumada a procurar assistência médica sòmente por doenças e não preventivamente.

Prevíamos maior número de consultas cujo motivo fôsse puericultura. Todavia, houve maior número do que o previsto mas principalmente por doença. Mesmo assim entendemos que êsse fato foi favorável, o que veio mostrar o interêsse da população pelo serviço (Tabelas 5, 6, 7 e Figura 4).

Notamos que os diagnósticos de estado nutritivo e de êrro alimentar, não estão sendo estabelecidos com rigor. Isso nos levou a estudar melhor êstes fatos para estabelecer maior homogeneidade no atendimento médico.

Tratando-se de uma avaliação preliminar de um programa de assistência à infância em comunidade urbana, consideramos satisfatórias as variáveis estudadas. No entanto, sugerimos uma definição mais precisa de objetivos e a análise de outras variáveis relacionadas à família para melhor contrôle do programa.

Recebido para publicação em 22-3-1971

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Set 2006
  • Data do Fascículo
    Jun 1971

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 1971
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