Resumos
Foi realizado um levantamento sobre a prevalência de xeroftalmia em todos os Estados do Brasil, através de questionários enviados a oftalmologistas. Os resultados revelaram baixa prevalência daquelas lesões consideradas mais significativas de xeroftalmia. Sendo o trabalho retrospectivo, não foi possível calcular coeficientes relacionados à população exposta ao risco. Entretanto, os dados sugerem que a xeroftalmia não é problema de Saúde Pública em nosso meio.
Xeroftalmia; Vitamina A; Cegueira
A study on prevalence of xerophthalmia was carried out in all States of Brazil, with the use of questionnaires forwarded to ophthalmologists. Results showed low prevalence of lesions considered more significant regarding xerophthalmia. As the study was retrospective in nature rates regarding population at risk could not be computed. However, data suggest that xerophthalmia is not a Public Health problem among us.
Xerophthalmia; Vitamin A; Blindness
ARTIGO ORIGINAL
Investigação sobre a prevalência de xeroftalmia, através de inquérito realizado junto a oftalmologistas brasileiros
Investigation on prevalence of xerophthalmia among patients of Brazilian ophthalmologists
Maria José RoncadaI; Donald WilsonI; Adamo Lui NettoII; Olderigo Berretta NettoIII; Aldonia C. KalilIV
IDo Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo Av. Dr. Arnaldo, 715 01255 São Paulo, SP Brasil
IIDo Departamento de Oftalmologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo Rua Cesário Mota Jr., 112 01221 São Paulo, SP Brasil
IIIDo Hospital Infantil da Cruz Vermelha de São Paulo Av. Moreira Guimarães, 699 04074 São Paulo, SP Brasil
IVDa Seção de Nutrição do Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 188 05403 São Paulo, SP Brasil
RESUMO
Foi realizado um levantamento sobre a prevalência de xeroftalmia em todos os Estados do Brasil, através de questionários enviados a oftalmologistas. Os resultados revelaram baixa prevalência daquelas lesões consideradas mais significativas de xeroftalmia. Sendo o trabalho retrospectivo, não foi possível calcular coeficientes relacionados à população exposta ao risco. Entretanto, os dados sugerem que a xeroftalmia não é problema de Saúde Pública em nosso meio.
Unitermos: Xeroftalmia, Brasil. Vitamina A, deficiência. Cegueira.
ABSTRACT
A study on prevalence of xerophthalmia was carried out in all States of Brazil, with the use of questionnaires forwarded to ophthalmologists. Results showed low prevalence of lesions considered more significant regarding xerophthalmia. As the study was retrospective in nature rates regarding population at risk could not be computed. However, data suggest that xerophthalmia is not a Public Health problem among us.
Uniterms: Xerophthalmia, Brazil. Vitamin A, deficiency. Blindness.
INTRODUÇÃO
Foi verificado, através de inquéritos bioquímico e alimentar, que existe deficiência de vitamina A em algumas regiões brasileiras 1,3,4,6, chegando, em muitas delas, a constituir um problema de Saúde Pública. Sabe-se que a hipovitaminose A é uma importante causa de cegueira em certos países do mundo, principalmente no Oriente. Entretanto, os inquéritos clínicos nutricionais realizados simultaneamente com os dois anteriores não apontaram esse problema, embora tenham sido constatados sinais ou sintomas oculares atribuíveis à hipovitaminose A.
Por outro lado, Simmons5, em investigação retrospectiva realizada no Nordeste brasileiro, refere ter encontrado cerca de mil casos anuais de cegueira em pré-escolares, causada por deficiência de vitamina A. Entretanto, o autor não informa como foi feito o diagnóstico, o que seria importante, visto ser um trabalho restrospectivo.
Em vista dos resultados discordantes encontrados pelos vários autores, resolvemos realizar um levantamento preliminar sobre o assunto, em nível nacional.
METODOLOGIA
Foi elaborado questionário com o objetivo de inquerir oftalmologistas sobre os vários aspectos da cegueira e da hipovitaminose A, observados no período compreendido entre 1.° de maio de 1975 a 30 de abril de 1976.
Foram distribuídos cerca de 900 questionários à maioria dos oftalmologistas do país. Devido à omissão e demora das respostas, o questionário foi distribuído uma segunda vez. Apesar disso, o retorno foi de apenas 81 respostas.
RESULTADOS
Apresentação e discussão
Apenas 81 questionários foram respondidos; dezenove deles, entretanto, não puderam ser utilizados, em virtude das respostas não terem sido coerentes.
Dos questionários respondidos, predominaram largamente os do Estado de São Paulo, principalmente os da Capital. Em virtude disso, esses resultados serão apresentados separadamente, constando da Tabela 1.
Da mesma maneira, a Tabela 2 foi construída com os dados do Estado do Rio de Janeiro (capital e interior), com destaque para os dados referentes ao Instituto Benjamin Constant.
Os resultados pertencentes aos demais Estados encontram-se na Tabela 3, devido ao reduzido número de respostas enviadas.
Entre a clientela dos oftalmologistas inquiridos, 0,4% da Capital do Estado de São Paulo constituiu-se de cegos, enquanto no interior o coeficiente foi três vezes maior (1,2%). Na Capital do Estado do Rio de Janeiro o percentual foi mais elevado que em São Paulo (0,7%). Dados fornecidos pelo Instituto Benjamin Constant, Seção de Medicina e Pesquisa sobre a Cegueira, mostraram uma prevalência de 6,9% nessa instituição, o que não é surpreendente, dada sua natureza. Nos outros Estados a prevalência de cegueira variou entre 1 e 3%, excetuando-se os Estados de Goiás (0,5%), Minas Gerais (12,5%) e Rio Grande do Sul, em que não foi constatado nenhum caso de cegueira pelo oftalmologista informante.
Do total de casos de cegueira observados, referiram-se a pré-escolares de 6 meses a 5 anos de idade: no Estado de São Paulo, 15,8% na Capital e 6,1% no interior. Chamamos a atenção para a discrepância entre estes percentuais e os coeficientes referentes a cegueira. No Estado do Rio de Janeiro, 10% dos cegos eram pré-escolares, enquanto no Instituto Benjamin Constant apenas 6,3%. Nos outros Estados a variabilidade foi enorme, indo de 0 (GO e RS) a 25% (PR).
Apenas quatro oftalmologistas referiram ter constatado cegueira seguramente atribuída à hipovitaminose A. São eles dos Estados de: PA, MA, SP e PR. Dada a natureza do questionário, não foi possível apurar de que maneira foi feito o diagnóstico.
As causas de cegueira mencionadas variaram, e as mais freqüentemente incriminadas foram: glaucoma, acidentes, diabetes e atrofia do nervo óptico.
De acordo com critérios estabelecidos em Reunião Conjunta de Técnicos da Organização Mundial de Saúde (OMS) e Agência para o Desenvolvimento Internacional (AID), realizada na Indonésia, em 19742, existem coeficientes de prevalência críticos, os quais servem para inferir, quando ultrapassados na amostra estudada, a existência ou não de um problema de Saúde Pública no que concerne à xeroftalmia. Entretanto, tais coeficientes críticos são aplicáveis somente a amostras representativas da população, não sendo válido aplicá-los aos nossos dados, uma vez que estes representam uma amostra viciada. Por outro lado, foi concluído também na mesma Reunião que "informações valiosas podem ser obtidas através de observações qualitativas freqüentemente pouco onerosas e que são úteis na definição das áreas onde a carência de vitamina A possa existir". Entre as observações mencionadas estão questionários ou entrevistas com pessoal de saúde, pediatras e oftalmologistas. Acrescentam ainda que tais informações devem ser usadas exclusivamente como avaliação preliminar. Tal é o caso dos nossos dados.
Em vista das baixas prevalências apresentadas, cremos ser lícito supor que a xeroftalmia, em nosso meio, não chega por ora a representar um problema de Saúde Pública, discordando frontalmente dos dados apresentados por Simmons 5.
CONCLUSÕES
1. A xeroftalmia não parece ser problema de Saúde Pública em nosso meio.
2. Não nos parece justificável realizar estudos prospectivos visando exclusivamente a xeroftalmia.
AGRADECIMENTOS
Aos oftalmologistas de todo o país, que gentilmente aquiesceram em preencher nossos questionários.
À Alcon Laboratórios do Brasil Ltda., que se encarregou da distribuição e recolhimento dos questionários.
Recebido para publicação em 06/09/1977
Aprovado para publicação em 25/10/1977
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1INTERDEPARTMENTAL COMMITTEE ON NUTRITION FOR NATIONAL DEVELOPMENT. Northeast Brazil: a nutrition Survey. Washington, D. C., U. S. Govt. Printing Office, 1965.
- 2. REUNION CONJUNTA OMS/AID (Estados Unidos) SOBRE CARENCIA DE VITAMINA A Y XEROFTALMIA. Yakarta, 1974. Informe. Ginebra, Organizacion Mundial de la Salud, 1976. (OMS Ser. Inf. tecn., 590).
- 3. RONCADA, M. J. Hipovitaminose "A". Níveis séricos de vitamina "A" e caroteno em populações litorâneas do Estado de São Paulo, Brasil. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 6:3-18, 1972.
- 4. RONCADA, M. J. Inquérito entre migrantes atendidos pela Central de Triagem e Encaminhamento, na Capital do Estado de São Paulo, Brasil. II: Aspectos bioquímicos da hipovitaminose A. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 9:313-29, 1975.
- 5. SIMMONS, W. K. Xerophthalmia and blindness in Northeast Brazil. Amer. J. clin. Nutr., 29:116-22, 1976.
- 6. VARELA, R. M. et al. Hypovitaminosis A in the sugar cane zone of Southern Pernambuco State, Northeast Brazil. Amer. J. clin. Nutr., 25:800-4, 1972.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
20 Abr 2006 -
Data do Fascículo
Jun 1978
Histórico
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Aceito
25 Out 1977 -
Recebido
06 Set 1977