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Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana: XVI - dispersão e ciclos anuais de colônias de Triatoma sordida e de Panstrongylus megistus espontaneamente desenvolvidas em ecótopos artificiais

Ecologial aspects of South American Trypanosomiasis: XVI - dispersal and annual cycles of Triatoma sordida and Panstrongylus megistus colonies spontaneously developed in artificial ecotopes

Resumos

São apresentados novos dados sobre os ciclos anuais de colônias de Triatoma sordida desenvolvidas espontaneamente em galinheiros experimentais. Os resultados das observações confirmaram os relatados em trabalho anterior relativos ao relacionamento com o tempo e à sobrevivência. Quanto à duração dos estádios ninfais obteve-se valor superior, provavelmente devido ao maior número de observações realizadas neste trabalho em comparação com as precedentes. Computando-se os resultados destas observações com os das anteriormente feitas, tanto para T. sordida como para Panstrongylus megistus, foi possível identificar com maior segurança as épocas de dispersão ativa, no período anual por parte das formas adultas. Para o primeiro desses triaiomíneos, o fenômeno atinge maior intensidade a partir de março podendo prolongar-se até maio. Para a outra espécie, a dispersão ocorre principalmente a partir de outubro prolongando-se até novembro. Tais aspectos permitem determinar as ocasiões mais propícias para a aplicação das medidas de vigilância, como sendo aquelas em que a composição das populações triatomínicas é predominantemente constituída de primeiras ninfas e adultos. Assim sendo, tais épocas correspondem aos meses de julho e agosto para o T. sordida e de novembro e dezembro para o P. megistus, pelo menos nesta região sudeste do Brasil.

Tripanossomíase americana; Triatoma sordida; Panstrongylus megistus; Triatomíneos; Triatomíneos; Ecologia


New data on stage-frequency analysis of Triatoma sordida in spontaneously developed colonies confirm those former by published concerning adult dispersal and survival rates. Average nymph stage period was longer than that previously observed; consequently the total length of first to fifth nymph stages reached nearly one year. This difference may be due to the greater number of colonies observed, which were developed in five experimental chicken coops, thus making the data more representative. The total period of the fifth nymph stage was 99 days. Annual period of adult dispersal was defined by computing data available from previous research on this species and Panstrongylus megistus. Distinct cycles were defined for both these triatominae bugs. T. sordida show clear dispersal activity starting in March and continuing until May. During the July-August period, T. sordida nymphs in the first stages start to increase and tend to become predominant. For P. megistus, adult dispersal begins in October and continues until November, and the first nymph predominance occurs during November-December period. Therefore, these two-month periods, that is, July-August for T. sordida and November-December- for P. megistus, seem to be the best dates for surveillance activities, at least in the southeastern region of Brazil.

Trypanosomiasis South American; Triatoma sordida; Panstrongylus megistus; Triatominae; Triatominae; Ecology


Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana. XVI — Dispersão e ciclos anuais de colônias de Triatoma sordida e de Panstrongylus megistus espontaneamente desenvolvidas em ecótopos artificiais* * Realizado com o auxílio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico — CNPq (Processo SIP/08-065)

Ecologial aspects of South American Trypanosomiasis. XVI — Dispersal and annual cycles of Triatoma sordida and Panstrongylus megistus colonies spontaneously developed in artificial ecotopes

Oswaldo Paulo ForattiniI; Jair Lício Ferreira SantosI; Octávio Alves FerreiraII; Eduardo Olavo da Rocha e SilvaII; Ernesto Xavier RabelloI

IDo Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP — Av. Dr. Arnaldo, 715 — 01255 — São Paulo, SP — Brasil

IIDa Superintendência de Controle de Endemias do Estado de São Paulo (SUCEN) — Rua Tamandaré, 693 — 01525 — São Paulo, SP — Brasil

RESUMO

São apresentados novos dados sobre os ciclos anuais de colônias de Triatoma sordida desenvolvidas espontaneamente em galinheiros experimentais. Os resultados das observações confirmaram os relatados em trabalho anterior relativos ao relacionamento com o tempo e à sobrevivência. Quanto à duração dos estádios ninfais obteve-se valor superior, provavelmente devido ao maior número de observações realizadas neste trabalho em comparação com as precedentes. Computando-se os resultados destas observações com os das anteriormente feitas, tanto para T. sordida como para Panstrongylus megistus, foi possível identificar com maior segurança as épocas de dispersão ativa, no período anual por parte das formas adultas. Para o primeiro desses triaiomíneos, o fenômeno atinge maior intensidade a partir de março podendo prolongar-se até maio. Para a outra espécie, a dispersão ocorre principalmente a partir de outubro prolongando-se até novembro. Tais aspectos permitem determinar as ocasiões mais propícias para a aplicação das medidas de vigilância, como sendo aquelas em que a composição das populações triatomínicas é predominantemente constituída de primeiras ninfas e adultos. Assim sendo, tais épocas correspondem aos meses de julho e agosto para o T. sordida e de novembro e dezembro para o P. megistus, pelo menos nesta região sudeste do Brasil.

Unitermos: Tripanossomíase americana. Triatoma sordida. Panstrongylus megistus. Triatomíneos, dispersão. Triatomíneos, dinâmica populacional. Ecologia.

ABSTRACT

New data on stage-frequency analysis of Triatoma sordida in spontaneously developed colonies confirm those former by published concerning adult dispersal and survival rates. Average nymph stage period was longer than that previously observed; consequently the total length of first to fifth nymph stages reached nearly one year. This difference may be due to the greater number of colonies observed, which were developed in five experimental chicken coops, thus making the data more representative. The total period of the fifth nymph stage was 99 days. Annual period of adult dispersal was defined by computing data available from previous research on this species and Panstrongylus megistus. Distinct cycles were defined for both these triatominae bugs. T. sordida show clear dispersal activity starting in March and continuing until May. During the July-August period, T. sordida nymphs in the first stages start to increase and tend to become predominant. For P. megistus, adult dispersal begins in October and continues until November, and the first nymph predominance occurs during November-December period. Therefore, these two-month periods, that is, July-August for T. sordida and November-December- for P. megistus, seem to be the best dates for surveillance activities, at least in the southeastern region of Brazil.

Uniterms: Trypanosomiasis South American. Triatoma sordida. Panstrongylus megistus. Triatominae, dispersal. Triatominae, population dynamics. Ecology.

INTRODUÇÃO

Nas atividades de vigilância epidemiológica da infestação domiciliar por Triatominae, reveste-se de apreciável importância a aquisição de conhecimentos sobre os mecanismos de dispersão ativa desses insetos. Nesse sentido, adquire especial significado a possibilidade de identificar a época de maior intensidade do fenômeno. E isso como decorrência do aumento de produção de formas adultas nas colônias desenvolvidas espontaneamente. Em publicação anterior, foram apresentados os resultados da análise dos dados obtidos com a observação de galinheiros experimentais (GE), onde Panstrongylus megistus e Triatoma sordida desenvolveram colonizações espontâneas (Forattini e col.2, 1977). Nessa oportunidade foi possível, como primeira tentativa, identificar os períodos de dispersão como situados de setembro a novembro e de janeiro a março, para essas duas espécies respectivamente. Igualmente, foram obtidos dados sobre a duração global dos estádios ninfais, bem como da sobrevivência que parece ser maior para T. sordida em comparação com a de P. megistus.

Em trabalho subseqüente, pôde-se obter novos dados sobre o desenvolvimento dessas colônias (Forattini e col.4, 1979). Em vista disso, tornou-se possível a repetição de nova análise, com o objetivo de verificar a possibilidade de confirmar os resultados publicados anteriormente. Assim sendo, procurou-se medir, de maneira análoga, a relação do chamado estádio mediano com o tempo, a duração média de cada estádio e a sobrevivência em cada uma dessas fases, além da sobrevivência diária e a sobrevivência diária média para todos os estádios. Numa segunda etapa, procedeu-se à apreciação conjunta destes resultados com os primeiros (Forattini e col.2, 1977), para a finalidade de melhor precisar os períodos de dispersão ativa. Assim procedendo procurou-se maior particularização das épocas nas quais se intensifica a produção de formas adultas e o conseqüente abandono das colônias, em virtude da atividade dispersiva de que são dotadas.

MATERIAL E MÉTODOS

Os dados utilizados são os obtidos nas colonizações que se processaram espontaneamente nos GE e que foram apresentados em publicações prévias (Forattini e col.1,2,5 1975, 1977, 1979). Para a análise da freqüência dos vários estádios, lançou-se mão do método de Kiritani e Nakasujii modificada por Manly6 (1976). Essa técnica caracteriza a população, em cada exame, pela mediana da distribuição dos indivíduos segundo os vários estádios e que se convencionou denominar de estádio mediano. Dessa maneira, a aplicação desse método pode levar à elaboração de curvas cíclicas desse estádio em relação ao tempo. Esse procedimento já foi descrito em trabalho anterior e com ele pôde-se evidenciar, para quatro colônias de P. megistus e duas de T. sordida, esse tipo cíclico de relação (Forattini e col.2, 1977). Seguindo a mesma orientação, não foram computados os dados referentes aos ovos, considerando-se os seis estádios, ou seja, os cinco ninfais e o correspondente aos adultos.

Na primeira parte deste trabalho foram utilizados os dados obtidos mediante os exames realizados, com periodicidade trimestral, nos galinheiros experimentais (GE) já descritos (Forattini e col.4,5 1979, 1979). Assim sendo, no período decorrido entre maio de 1975 e maio de 1978, levou-se a efeito o total variável de 10 a 13 inspecções em 7 GE que se revelaram positivos para o desenvolvimento espontâneo de colônias, sendo 5 para Triatoma sordida (a1 b1, b2, b3, c2) um para Panstrongylus megistus (c3) e um para Rhodnius neglectus (a3). Neste trabalho serão apresentados os dados individuais referentes àqueles onde se colonizaram os populações da primeira dessas espécies. Quanto à segunda, os resultados obtidos no correspondente GE — c3 serão incluídos na análise global que é apresentada na segunda parte deste trabalho. Em relação à colonização de R. neglectus no GE — a3 por se tratar de dado isolado até o momento, os resultados obtidos serão apresentados em publicação posterior, quando forem divulgadas outras observações sobre esse triatomíneo.

Em cada exame, correspondente a um censo da população do ecótopo, foram tabulados os números relativos aos 6 estádios, obtendo-se assim a distribuição de Xij Por outro lado, com a finalidade de calcular a duração desses estádios, selecionou-se um dos ciclos de cada curva obtida pelo mencionado relacionamento do estádio mediano com o tempo. Neles, escolheu-se o ramo que abrangesse o maior número de estádios medianos. Tal procedimento encontrou justificativa face ao maior período de observação empregado nestas pesquisas, em comparação com o gasto no trabalho anterior, fato esse que propiciou o cálculo de maior número de ciclos e, assim, a oportunidade de escolha para cada GE dos que incluissem desde o estádio mediano mais baixo até o mais alto.

Em relação às épocas de dispersão, como já se mencionou, foram reunidos os dados obtidos na primeira parte do presente trabalho, aos apresentados em publicação anterior (Forattini e col.3, 1977). Em decorrência disso, pôde-se dispor da distribuição dos totais correspondentes a 13.561 espécimens de P. megistus observados durante as várias inspecções em 5 GE, dos quais quatro relatados no mencionado trabalho anterior e um correspondente às pesquisas atuais. No que concerne a T. sordida, a mesma orientação permitiu o total de 6.192 exemplares, da mesma maneira obtidos em 7 GE, 2 dos quais relativos àquela publicação e 5 incluídos nas presentes investigações (Forattini e col.5, 1979).

Dessa maneira, com esses dados e objetivando identificar com maior precisão a época do ano em que ocorre a dispersão ativa por parte das formas adultas, procedeu-se à tabulação do número de espécimens capturados de acordo com o estádio e os meses do ano. Pretendeu-se, assim, conseguir, para cada mês em que se tenha levado a efeito exames dos GE, informações sobre o número relativo de formas ninfais e adultas no montante global das colônias observadas. Escolhendo-se os dois estádios extremos, ou seja, as ninfas de primeiro estádio e os adultos, pareceu óbvio supor que o período situado entre ambas as predominâncias desses estádios deva corresponder àquele em que ocorre a dispersão com maior intensidade.

RESULTADOS

Os estádios medianos, determinados para cada ecótopo (GE) e referentes às colonizações já mencionadas para Triatoma sordida, estão apresentados na Tabela 1. Os valores correspondentes à soma de todos os 5 GE, onde se colonizou a primeira dessas espécies, são confrontados com o tempo no gráfico representado na Figura 1. Pode-se assim observar o comportamento cíclico do que podemos considerar o animal "mediano" o qual, após passar dos primeiros estádios para a forma adulta (estádio 6), abandona a colônia daí resultando o "rejuvenescimento" dessa população, onde voltam a predominar animais "medianos" de estádios iniciais. Repetiu-se pois, de maneira mais evidente, esse comportamento do T. sordida, já entrevisto em trabalho anterior (Forattini e col.3, 1977). Pode-se verificar que, quando se aproxima da fase adulta, ocorre rápida passagem do estádio mediano para as fases iniciais, indicando pois elevada proporção de adultos que abandonam a colônia, seja por mecanismo de dispersão ativa seja como decorrência de mortalidade. Ressalvadas as variações individuais que se observaram para cada ecótopo, esse fenômeno mostrou-se mais acentuado em fevereiro, incluindo período que pode se estender até o mês de maio

Para o cálculo da duração média de cada estádio, a seleção dos ciclos recaiu sobre alguns conjuntos de inspecções, para cada GE que, como foi referido, resultaram em ramo da respectiva curva representativo de ciclo com maior número de estádios medianos. Estes estão incluídos na Tabela 2, calculados por médias móveis (Em). Em lugar do tempo foram colocadas diretamente as inspecções correspondentes face à regularidade trimestral obedecida em sua execução. Da mesma forma que no referido trabalho anterior, para os cálculos levados a efeito a partir dos gráficos daí resultantes, atribuiu-seo valor zero ao estádio mediano correspondente à inspecção imediatamente anterior ao Em mais baixo. Consequentemente, o estádio mediano 6 foi atribuído ao imediatamente posterior ao mais alto. Seguindo-se a técnica já descrita, obteve-se para cada GE, as informações de sobrevivência e duração dos estádios constantes das Tabelas 3 a 8.


Incluindo junto aos presentes, os dados obtidos de colonizações espontâneas descritas em publicações anteriores e já citadas, pôde-se conseguir aspecto geral da possível atividade de dispersão ativa. Para tanto, dos totais de espécimens de T. sordida e P. megistus observados por ocasião das diversas inspecções, foram calculadas as percentagens mensais correspondentes aos vários estádios. Com isso, foi possível conseguir quadro geral do comportamento durante o período anual e que se encontra representado nas Tabelas 9 e 10. Houve alguns meses que não figuraram nas inspecções realizadas. Para T. sordida nenhum exame foi levado a efeito em abril, junho, outubro e dezembro, ao passo que para P. megistus deixou de figurar apenas o mês de abril. Tal fato não impede, a nosso ver, que possam ser consideradas como válidas as interpolações correspondentes. Eis que seria altamente improvável que, em espaço intercalado equivalente ao de um mês, pudesse ocorrer variações consideráveis que modificassem sensivelmente a tendência da curva. De qualquer maneira, a observação do comportamento das ninfas de primeiro estádio comparado com o dos adultos mostrou-se bastante sugestiva. É o que se verifica nos gráficos das Figuras 2 e 3, mostrando, de maneira evidente os períodos de dispersão situados no primeiro e no segundo semestre. Naquele, iniciando-se em fevereiro e correspondendo ao T. sordita e neste, a partir de setembro e referente a P. megistus.



COMENTÁRIOS

Os resultados apresentados neste trabalho confirmam os relatados anteriormente (Forattini e col.3, 1977). Da mesma maneira que foi considerado nessa oportunidade, as colônias de T. sordida e P. megistus apresentam desenvolvimento obedecendo a ciclos que se repetem anualmente. A produção de adultos coincide com a atividade de dispersão ativa a cargo dessas formas. Nesta região do Brasil, tais fenômenos ocorrem: no primeiro semestre tornando-se particularmente acentuada a partir de fevereiro para aquele triatomíneo; e no segundo semestre, apresentando-se mais marcante a partir de setembro para o último desses heterópteros.

No que concerne ao T. sordida, a análise dos dados da Tabela 9 mostra que no mês de fevereiro aparecem com predominância as ninfas de V estádio, correspondendo a 56,0% das formas observadas em tal época. Por sua vez, as de I estádio, nessa mesma oportunidade, estão reduzidas a 3,6%. Já no subseqüente mês de março, passam a predominar os adultos (48,4%) vindo em segundo lugar as primeiras ninfas (26,1%) como conseqüência imediata da eclosão resultante das oviposições realizadas por aqueles. Os dados relativos aos meses seguintes confirmam a tendência dispersiva pela diminuição e desaparecimento das formas adultas. Como se pode observar na Figura 2, a percentagem desses indivíduos ainda é elevada em maio, decrescendo nos meses que se seguem enquanto tende a subir a referente às ninfas de I estádio. No segundo semestre torna-se nítida a predominância de estádios ninfais, chegando a novembro com poucos adultos e primeiras ninfas. Fechando o ciclo, em janeiro do período anual seguinte passam a predominar as ninfas de V estádio. Mesmo tendo-se obtido números bastante diferentes de espécimens em cada mês, parece lícito afirmar que a dispersão ativa de adultos de T. sordida ocorre no primeiro semestre, crescendo em intensidade a partir de março. Face a tais fenômenos é de se admitir que a aplicação das medidas de vigilância, se concentradas no período de julho e agosto, atingiriam população constituída predominantemente por adultos e ninfas dos primeiros estádios. Em tais condições, a atuação dos inseticidas, por ser mais eficaz nessas fases resultaria na interrupção do processo de ulterior desenvolvimento das colônias, prevenindo-se assim a infestação domiciliar. É o que se deve esperar, pelo menos nesta região sudeste do Brasil.

Em relação ao P. megistus, o fenômeno de dispersão ocorre em época distinta. Para esta espécie os dados obtidos mostram feições ainda mais marcantes, como se pode verificar pela análise da Tabela 10 e da Figura 3. O aspecto que para o T. sordida ocorre entre novembro e janeiro, ou seja, a produção maior de estádios ninfais além do I, e culminando como o predomínio do V, para este triatomíneo dá-se entre junho e agosto. Com efeito, neste último mês observa-se a predominância dessas formas (55,9%) e, nos meses de outubro, novembro e dezembro passam a dominar as adultas. A esse quadro segue-se imediatamente o aumento conseqüente das ninfas de 1 estádio. A diminuição dos adultos culmina em janeiro (1,9%). Tudo indica, pois, que a dispersão ativa deste triatomíneo se dá no segundo semestre, com intensidade maior a partir de outubro. Contudo, diferentemente do que parece ocorrer com T. sordida, onde esse movimento dispersivo tende a se prolongar por cerca de cinco meses, ou seja, de março a agosto, em P. megistus esse fenômeno é bem mais curto. Eis que, iniciando-se de maneira significativa em outubro tende a findar em dezembro, dispendendo pois cerca de apenas dois meses. Raciocinando de maneira análoga, a época recomendável para concentração das atividade de vigilância será a que inclui os meses de novembro e dezembro. Em tais condições seria, à semelhança da espécie anterior, atingida população formada predominantemente por adultos e ninfas de 1 estádio, vulneráveis à ação dos inseticidas empregados. Da mesma maneira, tais conclusões aplicam-se, em princípio, às regiões situadas nesta parte do sudeste do Brasil.

No que concerne à duração dos estádios, tal como se observou no trabalho anterior, mostrou-se bastante variável. E isso, quer quanto à duração de cada um, quer quanto ao tempo gasto desde a eclosão dos ovos até o atingir da fase adulta, ou seja, a duração global das cinco etapas ninfais. Para T. sordida, o menor período total observado foi de 208,5 e o maior de 375 dias, nos GE-b3 e GE-bi respectivamente. Considerando o ecótopo hipotético representado pelo conjunto das observações dos 5 GE, a duração total foi de aproximadamente um ano, sendo 99 dias gastos somente no V estádio. Nas observações anteriores, este último aspecto foi semelhante, embora os períodos tivessem sido menores. Eis que, nessa oportunidade, a última fase ninfal também foi a mais prolongada, gastando porém 72 dias e sendo de 250 o correspondente ao ciclo total , o que representa redução de 31,5% em relação ao registrado no presente trabalho. Tais diferenças provavelmente devam correr por conta do maior número de observações levadas a efeito nesta série do que naquela, possibilitando assim informação global mais próxima do aspecto geral.

Quanto à sobrevivência, embora também se tenha verificado certa variabilidade nas colônias de T. sordida, os resultados aqui obtidos são bastante semelhantes aos conseguidos anteriormente. No total dos GE, observou-se sobrevivência de 17,0% dos que iniciaram o 1 estádio para chegar à fase adulta. Tal resultado é bem próximo do de 18,0% observado no trabalho anterior. Na presente série de observações a sobrevivência diária mínima, que se verificou em GE-a1, foi de 0,9890 enquanto naquele foi de 0,9862. Quanto à máxima, também houve semelhança, com o valor de 0,9965 obtido em GE-b1 comparado a 0,9930 conseguido anteriormente.

Em resumo, os resultados alcançados nas presentes observações vêm, além de acrescentar novos dados, confirmar os obtidos anteriormente. Com eles pôde-se caracterizar o comportamento destes triatomíneos nas colonizações espontaneamente desenvolvidas em ecótopos artificiais. Tais informações indicam mais precisamente as épocas de dispersão ativa, bem como a duração dos estádios e a sobrevivência. A aplicação desses conhecimentos será pois da maior utilidade para a vigilância epidemiológica. O conhecimento da época de maior risco de infestação domiciliar, propiciará maior eficácia às medidas preventivas que forem tomadas. Ao lado disso, conhecendo-se o tempo provavelmente necessário para a evolução dos estádios ninfais e a respectiva sobrevivência, será possível estimar a duração do período de vigilância e prognosticar os resultados a serem obtidos. Nesse particular, como se viu pelos dados apresentados neste trabalho e no anterior, a sobrevivência de T. sordida tem-se mostrado maior do que a de P. megistus. Isso faz supor ser a capacidade de dispersão, e conseqüente infestação domiciliar, maior naquele do que neste. As conseqüências daí decorrentes terão que ser necessariamente levadas em conta nos programas de controle a serem postos em prática.

CONCLUSÕES

Dos resultados e considerações apresentados, decorrem as conclusões seguintes:

1. O desenvolvimento espontâneo em condições naturais das colônias de T. sordida e de P. megistus obedece a ritmo que compreende ciclos anuais bem determinados. Pelo menos nesta região sudeste do Brasil e correspondente ao nordeste do Estado de São Paulo, a formação de adultos dá-se no primeiro semestre para aquele triatomíneo, e no segundo para este.

2. À formação de adultos segue-se atividade de dispersão que para T. sordida se torna mais evidente a partir de março podendo prolongar-se até o restante do semestre. Com P. megistus esse fenômeno tende a ocorrer com maior intensidade a partir de outubro, prolongando-se porém por menos tempo, não ultrapassando os dois meses seguintes.

3. Ao movimento dispersivo dos adultos segue-se, como decorrência imediatamente subsequente, o desenvolvimento de ninfas de primeiro estádio. Dessa maneira, a análise dos ciclos permite evidenciar as épocas provavelmente mais propícias para a aplicação dos meios de vigilância. Em tais ocasiões, as colônias apresentam predomínio daquelas formas tornando-se, assim, mais vulneráveis. As épocas correspondem aos meses de julho e agosto para T. sordida e de novembro e dezembro para P. megistus.

4. A duração do período imaturo de T. sordida, compreendendo todos os estádios ninfais, foi 31,5% mais longo do que o observado em trabalho anterior. Tal fato deve-se provavelmente a variações locais e, como nas presentes observações o número de ecótopos observados foi maior, concluiu-se que a duração de todo o ciclo é de aproximadamente um ano, com cerca de 100 dias gastos no V estádio.

5. A sobrevivência de T. sordida foi confirmada como sendo maior do que a de P. megistus. Isso implica maior produção de adultos por parte daquele em relação a este. Tal fato leva à suposição de que a resposta às medidas de controle e vigilância devam ser mais prontas no caso do segundo desses triatomíneos.

6. As informações obtidas, confirmando e ampliando as anteriormente publicadas, poderão ser aplicadas na programação das atividades de vigilâncias, destinadas a prevenir a infestação domiciliar por esses insetos, pelo menos nesta região do Brasil.

Recebido para publicação em 27/07/1979

Aprovado para publicação em 30/01/1979

  • 1. FORATTINI, O. P. et al. Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana. VII Permanência e mobilidade do Triatoma sordida em relação aos ecótopos artificiais. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 9:467-76, 1975.
  • 2. FORATTINI, O. P. et al. Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana. IX Variação e mobilidade de Panstrongylus megistus em ecótopos artificiais. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 11:199-213, 1977.
  • 3. FORATTINI, O. P. et al. Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana. X Dados populacionais das colônias de Panstrongylus megistus e de Triatoma sordida espontaneamente desenvolvidas em ecótopos artificiáis. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 11:362-74, 1977.
  • 4. FORATTINI, O. P. et al. Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana. XIV Persistência e potencial de domiciliação de populações triatomínicas silvestres em região de intensa atividade agropecuária. Rev. Saúde públ, S. Paulo, 13:123-46, 1979.
  • 5. FORATTINI, O. P. et al. Aspectos ecológicos da tripanossomíase americana. XV Desenvolvimento, variação e permanência de Triatoma sordida, Panstrongylus megistus e Rhodnius neglectus em ecótopos artificiais. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 13:220-34, 1979.
  • 6. MANLY, B. F. J. Extension to Kiritani and Nakasuji's method for analysing insect stage-frequency data. Res. Pop. Ecol., 17:191-9, 1976.
  • *
    Realizado com o auxílio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico — CNPq (Processo SIP/08-065)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Fev 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 1979

    Histórico

    • Aceito
      30 Jan 1979
    • Recebido
      27 Jul 1979
    Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo Avenida Dr. Arnaldo, 715, 01246-904 São Paulo SP Brazil, Tel./Fax: +55 11 3061-7985 - São Paulo - SP - Brazil
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