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Mortalidade de menores de um ano de idade na região Sudoeste do Estado de São Paulo

Mortality among children of less than one year of age in a region of Brazil

Resumos

OBJETIVOS: Descrever a mortalidade de crianças menores de um ano de idade, a partir de sistemas oficiais de informação. MÉTODOS: Os dados foram coletados a partir de dois sistemas oficiais de informação do Ministério da Saúde: de mortalidade e de nascidos vivos. As informações contidas nas declarações de óbito foram complementadas por visitas domiciliares e aos serviços de saúde. RESULTADOS: O coeficiente de mortalidade infantil foi de 49,7‰ nascidos vivos, mostrando-se mais elevado entre as crianças do sexo masculino, de baixo peso ao nascer, gemelares, nascidos por parto cesáreo, residentes na área periférica da zona urbana, ou ainda entre os recém-nascidos cujas mães tivessem menor escolaridade, maior paridade ou idade superior a 35 anos. Quanto ao preenchimento das declarações de óbito (DO) e de nascimento (DN), as informações contidas na DO tiveram um nível aquém do desejado e na DN mostraram-se adequadas. CONCLUSÃO: O uso contínuo dos sistemas de informação em saúde pelo nível municipal contribuiria para a redução da mortalidade infantil.

Mortalidade infantil; Sistemas de informação


OBJECTIVE: A description of infant mortality in children of less than one year of age on the basis of official systems of information. METHODS: The data were obtained from two official information systems of the Health Ministry: of mortality and live-births. Health service and home visits were carried out to complete the information on death certificates. RESULTS: Infant mortality was 49.7‰. It was higher among boys, low birthweight children, twin births, among those born by cesarian section, resident in the outskirts, among children of mothers of little schooling, greater number of children on above 35 years of age. The data on death certificates were poorly reported. Data on birth certificates were complete. CONCLUSION: The results suggested that a health information system should be implemented, with a view to reducing infant mortality.

Infant mortality; Information systems


Mortalidade de menores de um ano de idade na região Sudoeste do Estado de São Paulo* * Trabalho derivado da dissertação de mestrado, apresentada na Faculdade de Saúde Pública da USP, 1996.

Mortality among children of less than one year of age in a region of Brazil

Anna Klara Bohland e Maria Helena P de Mello Jorge

Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Tiradentes. Aracaju, SE - Brasil (AKB); Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP - Brasil (MHPMJ)

Descritores
Mortalidade infantil. Sistemas de informação. Resumo

Objetivos

Descrever a mortalidade de crianças menores de um ano de idade, a partir de sistemas oficiais de informação.

Métodos

Os dados foram coletados a partir de dois sistemas oficiais de informação do Ministério da Saúde: de mortalidade e de nascidos vivos. As informações contidas nas declarações de óbito foram complementadas por visitas domiciliares e aos serviços de saúde.

Resultados

O coeficiente de mortalidade infantil foi de 49,7‰ nascidos vivos, mostrando-se mais elevado entre as crianças do sexo masculino, de baixo peso ao nascer, gemelares, nascidos por parto cesáreo, residentes na área periférica da zona urbana, ou ainda entre os recém-nascidos cujas mães tivessem menor escolaridade, maior paridade ou idade superior a 35 anos. Quanto ao preenchimento das declarações de óbito (DO) e de nascimento (DN), as informações contidas na DO tiveram um nível aquém do desejado e na DN mostraram-se adequadas.

Conclusão

O uso contínuo dos sistemas de informação em saúde pelo nível municipal contribuiria para a redução da mortalidade infantil.

Keywords
Infant mortality. Information systems. Abstract

Objective

A description of infant mortality in children of less than one year of age on the basis of official systems of information.

Methods

The data were obtained from two official information systems of the Health Ministry: of mortality and live-births. Health service and home visits were carried out to complete the information on death certificates.

Results

Infant mortality was 49.7 ‰ . It was higher among boys, low birthweight children, twin births, among those born by cesarian section, resident in the outskirts, among children of mothers of little schooling, greater number of children on above 35 years of age. The data on death certificates were poorly reported. Data on birth certificates were complete.

Conclusion

The results suggested that a health information system should be implemented, with a view to reducing infant mortality.

INTRODUÇÃO

A declaração de nascido vivo (DN) é gerada pelo serviço de saúde que atende o parto, ou que recebe o recém-nascido logo após o parto. Nos casos de partos extra-serviços de saúde, o documento deve ser emitido pelo Cartório de Registro Civil quando houver o registro do evento. Portanto, o sistema deixa de captar somente aqueles casos de partos ocorridos fora do serviço de saúde, sem atendimento posterior imediato nestes serviços, e que não são registrados em Cartório de Registro Civil8.

Diversos estudos têm sido desenvolvidos tendo como objeto a saúde materno-infantil4,6,11,12,13,14,16,17. Em nosso meio, a implantação do sistema de informação sobre nascidos vivos (SINASC) tornou possível, em nível populacional, a caracterização dos recém-nascidos do ponto de vista demográfico e epidemiológico, a partir de dados secundários2,8,15. Além disto, o uso simultâneo dos dois sistemas de informação permite estudos de mortalidade infantil segundo variáveis comuns à declaração de óbito (DO) e à DN. Almeida1 utilizou a técnica de linkage de um conjunto de nascidos vivos e seus respectivos óbitos, verificando a probabilidade de óbito, em coortes retrospectivas. Gomes5, utilizando os dois sistemas de informação, descreveu o coeficiente de mortalidade infantil (CMI) segundo algumas características contidas nos documentos.

Para o presente estudo foi escolhido o Município de Itararé por apresentar um dos mais altos CMI do Estado de São Paulo3, desde meados da década de 70, e por ter sido incluído em um estudo de avaliação dos dados gerados pelo SINASC8, tendo os seguintes objetivos:

• Descrever a mortalidade infantil de crianças residentes no Município de Itararé, em 1993, a partir dos sistemas oficiais de informação.

• Avaliar a qualidade do preenchimento das DN e das DO dos menores de um ano, com base no resgate de informação adicional.

MÉTODOS

Os Casos de Nascidos Vivos

Foram selecionadas as DN correspondentes aos nascimentos vivos ocorridos entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 1993, de residentes no Município de Itararé, SP. Os dados foram provenientes das seguintes fontes: Escritório Regional de Saúde - ERSA 38 (a DN foi emitida pelo serviço de saúde), cartório local (somente os casos de partos domiciliares, cuja DN foi emitida pelo cartório local) e Fundação SEADE (apenas para os partos domiciliares ou hospitalares de residentes em Itararé, ocorridos em outro município, que não o de residência, com registro em cartório). Os motivos para exclusão de casos foram: nascimentos ocorridos em Itararé cujas mães eram residentes em outros municípios (invasão de nascimentos), duplicação do documento, casos de registro atrasado de nascimento ou ainda por não estarem preenchidos o município de residência ou a data do nascimento.

Somadas as três fontes de captação foram selecionadas 1.205 DN. Após a revisão dos endereços anotados nas DN, com mapas do município, foram excluídos 17 casos em que se constatou invasão de nascimentos. Após a confrontação das DN com os casos de óbitos fetais, verificou-se que uma delas correspondia a caso de DN emitida para óbito fetal, sendo então excluída a DN correspondente. Portanto, o total de nascidos vivos foi de 1.187.

As demais informações geradas pelo SINASC foram aceitas como aproximação da realidade, com base nos resultados obtidos por um estudo realizado anteriormente na localidade8. Quanto à análise da qualidade do documento, foi considerado apenas o grau de preenchimento das DN, sendo adotados os critérios propostos por Mello Jorge et al.9

Os Casos de Óbitos

Foram selecionadas 61 DO correspondentes aos óbitos de residentes no município, ocorridos em 1993, e cuja idade da criança na data do óbito fosse menor que um ano. Os dados foram provenientes do cartório local e da Fundação SEADE (óbitos registrados em Cartório, ocorridos fora do município de residência). Foram realizadas visitas aos domicílios e aos serviços de saúde para coleta de informações adicionais, a exemplo de estudos que utilizaram metodologias semelhantes5,10,13. Após a visita domiciliar, constatou-se que 2 casos referiam-se a não residentes, sendo então excluídos. Passou-se a trabalhar com 59 casos.

Foi realizada uma avaliação dos casos de óbitos fetais (provenientes do cartório local e da Fundação SEADE), na tentativa de identificar eventuais trocas de definição entre nascido morto e nascido vivo7, fato que não foi verificado para nascimentos hospitalares. O conjunto dos óbitos fetais foi confrontado com o conjunto de DN na busca de possíveis emissões para casos de óbitos fetais. A verificação se deu pela data do nascimento registrada na DO oficial e a busca pelo nome da mãe. Como referido anteriormente, foi constatada a emissão de uma DN para caso de óbito fetal, sendo esta excluída.

Variáveis do Estudo

Para a consecução do primeiro objetivo - descrição da mortalidade infantil - foram estudadas variáveis presentes apenas na DO (idade ao morrer, local e município de ocorrência do óbito) e outras comuns às DO e às DN (sexo, peso ao nascer, tipo de gravidez, tipo de parto, zona e área de residência, bem como a escolaridade, idade e paridade anterior maternas). Para a avaliação da qualidade do preenchimento das DO e DN foram consideradas todas as variáveis presentes nos documentos originais.

Cabe lembrar que o uso simultâneo dos sistemas de informação sistema de informação de mortalidade (SIM) e SINASC possibilita a construção do CMI segundo um grande número de variáveis, o que requer, entretanto, cautela na análise do resultados, especialmente quando se trata de pequeno número de casos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Características dos Casos de Óbitos

Dos 59 casos de óbitos, 44,1% foram do sexo feminino e 55,9% do sexo masculino. Quanto à idade, 33,9% dos casos ocorreram no período neonatal: destes, 65,0% nas primeiras 24 h de vida, e 75,0% nos primeiros sete dias de vida, percentuais mais baixos do que aqueles encontrados em outros municípios brasileiros do Sul e Sudeste1,14. No período pós-neonatal ocorreram 66,1% dos óbitos, sendo que 82,1% deles concentraram-se na idade de 28 dias a seis meses. A concentração de óbitos infantis nos primeiros seis meses de vida, também foi descrita por Victora et al.17, no Município de Pelotas, no Rio Grande do Sul.

O CMI foi de 49,7 NV, sendo o coeficiente de mortalidade neonatal (CMN) de 16,8 NV e o pós-neonatal (CMPN) de 32,9 NV. O componente neonatal mostrou valores semelhantes aos encontrados em outras localidades do País1,14,17. Entretanto o coeficiente de mortalidade pós-neonatal foi quase o dobro do encontrado em Pelotas17, cerca de três vezes o do Estado de São Paulo em 19933, e seis vezes maior que o de Maringá, no Paraná14.

Quanto ao local de ocorrência do óbito, 79,6% foram em ambiente hospitalar, 6,8% em trânsito e 13,6% no domicílio. Em 1,7% dos casos de óbito, o responsável pelo menor não procurou assistência médica no decurso da doença que levou ao óbito. Dos casos, 94,9% dos óbitos ocorreram no município de residência, e os demais corresponderam a encaminhamentos para locais com recursos técnicos de maior complexidade.

Características Comuns aos Casos de Nascidos Vivos e Óbitos

Dos 1.187 nascidos vivos, 51,5% foram do sexo masculino e 48,5% do sexo feminino. O CMI foi maior entre as crianças do sexo masculino, principalmente no período neonatal (Tabela 1).

Entre os nascidos vivos, o peso médio ao nascer foi de 3.097,6 g, sendo o mediano de 3.120,0 g. O baixo peso ao nascer** ** Peso ao nascer entre 2.500 g e 2.999 g. 17 esteve presente em 10,5% dos casos (Tabela 2), incidência superior à encontrada em diversas localidades brasileiras1,5,14,17. O Fundo das Nações Unidas para a Infância4, comparando as proporções de baixo peso ao nascer em 129 países, no período de 1980 a 1988, mostrou variações de 4% (Suécia) a 39% (Laos), sendo que nas localidades onde esta proporção foi maior, também foi maior a mortalidade infantil.

A freqüência de baixo peso ao nascer, somada à de peso denominado insuficiente*, foi de 37,2%, revelando-se elevada14,17. A distribuição dos nascidos vivos segundo o peso ao nascer e o local de residência mostrou que o percentual de baixo peso ao nascer e peso insuficiente foram, respectivamente, de 8,4% e 32,2% entre residentes na área central, de 13,3% e 45,7% entre os da área periférica e de 12,6% e 36,1% para residentes na zona rural. Segundo a Organização Pan-americana de Saúde12, a proporção de crianças com baixo peso ao nascer reflete a capacidade reprodutiva materna (isto é, condições de saúde pré-natais), além de influenciar o prognóstico de sobrevivência e desenvolvimento do recém-nascido.

Entre os casos de óbito com peso ao nascer conhecido, o peso médio foi de 2.416,4 g e o mediano de 2.515,0 g. Desses, 69,5% apresentaram peso inferior a 3.000 g. O baixo peso ao nascer esteve presente em 75,0% dos óbitos neonatais e em 30,7% dos óbitos pós-neonatais.

Considerando apenas as gestações únicas (97,6%), o baixo peso ao nascer incidiu em 9,2% dos casos e a mortalidade foi maior entre crianças que nasceram com peso inferior a 2.500 g. Entre as crianças nascidas com 2.500 g e mais, a mortalidade concentrou-se no período pós-neonatal. Dentre as gestações múltiplas (2,4%), a incidência de baixo peso ao nascer foi de 67,8% e o CMI de 71,4 NV.

Com relação ao tipo de parto, 66,8% deles foram espontâneos, 32,9% operatórios e 0,3% fórceps. Estudos internacionais descrevem taxas de cesárea bastante inferiores, tais como 22,7% nos Estados Unidos e 11,6% na Suécia11. O advento da cesárea, como intervenção médica, propiciou melhores condições de sobrevivência às mães e aos recém-nascidos. Porém, taxas crescentes deste procedimento vêm sendo observadas nas últimas décadas, e muitos autores6,8,11,14,17 sugerem que a indicação deste tipo de parto inclui fatores que extrapolam aqueles estritamente clínicos. Diversos autores têm relacionado maiores taxas de cesárea em mulheres com maior renda6,17, com convênio assistêncial privado14 ou maior escolaridade6. Entre os NV residentes em Itararé, pôde-se observar que entre os filhos de mulheres não alfabetizadas a taxa de cesárea foi de 18,2%, e entre os de universitárias este percentual elevou-se para 84,6%.

Das crianças que morreram no primeiro ano de vida, 74,1% nasceram de parto espontâneo e 25,9% de parto cesáreo. A freqüência de partos operatórios foi maior entre os casos de óbitos neonatais (40,0%) do que entre os óbitos pós-neonatais (18,4%). A mortalidade neonatal foi superior entre as crianças nascidas por cesárea (20,5 NV) do que entre aquelas nascidas de parto normal (15,2 NV), o que coincide com nascimentos de maior risco gestacional17.

Quanto à zona de residência, 89,8% dos nascidos vivos residiam na zona urbana (isto é, na sede do município) e 10,2% na zona rural. Entre os nascidos vivos residentes na zona urbana, 61,2% pertenciam a área central e 38,8% a área periférica. O CMI foi praticamente o dobro entre residentes da zona urbana (53,3 NV) do que entre os residentes na zona rural (25,2 NV). Entre os residentes na sede do município o CMI na área periférica (95,8 NV) foi 2,6 vezes maior que o da área central (26,6 NV).

O menor CMI na zona rural poderia ser explicado pelo pequeno número de casos, tanto de nascimentos e óbitos ocorridos. Outra hipótese que poderia explicar a menor mortalidade, é o fato de que possivelmente a população que reside na zona rural teria condições de vida menos precárias do que aquela residente na área periférica da sede do município, entretanto este fato não pode ser verificado a partir das variáveis utilizadas no presente estudo.

Diversos estudos têm verificado diferenciais intra-urbanos na mortalidade infantil5,16, sugerindo que o município deveria adotar o método epidemiológico para diagnosticar populações de maior risco de morbimortalidade, a exemplo do que já vem sendo implantado em algumas localidades15. Independente do local de residência, foi encontrada a mesma proporção de óbitos em cada um dos componentes do CMI. Em Itararé, a estrutura da mortalidade que prevaleceu foi aquela relacionada às causas exógenas, uma vez que a mortalidade concentrou-se no período pós-neonatal7.

A distribuição dos nascidos vivos segundo escolaridade materna mostrou que 80,2% das mães não havia completado o primeiro grau. Entre os casos de óbito, este percentual elevou-se para 92,4% (Tabela 3). Camargo & Ortiz2 verificaram que as localidades do Estado de São Paulo, onde as mães possuíam menor escolaridade, foram aquelas que apresentavam as maiores taxas de mortalidade infantil.

A proporção dos componentes do CMI, segundo educação materna, evidenciou que entre os NV de mães que possuíam maior escolaridade, a mortalidade infantil foi composta principalmente pelo componente neonatal, enquanto que nas demais categorias o principal componente foi o pós-neonatal. Embora o número absoluto de casos de óbitos tenha sido pequeno nas categorias analisadas, observou-se que o CMI foi 8,3 vezes maior entre as mães não alfabetizadas do que entre aquelas com escolaridade maior ou igual ao primeiro grau completo.

A idade materna variou de 12 a 45 anos, sendo a idade mediana de 22,5 anos e a média igual a 24,6 anos. Em 34,4% dos casos, as mães pertenceram às faixas etárias extremas (menores de 20 anos ou 35 anos e mais), sendo que 25,1% corresponderam a mães adolescentes, as quais diversos autores relacionam à maior freqüência de baixo peso ao nascer e à maior mortalidade infantil13,17. Entre os casos de óbitos de menores de um ano, a idade materna variou de 14 a 42 anos, sendo a idade mediana de 23,0 anos e a média de 24,7 anos. A freqüência de baixo peso ao nascer foi maior entre os nascidos vivos de mães com idade de 35 anos e mais (14,8%), seguidos pelos de mães menores de 20 anos (11,3%) e pelos de mulheres na faixa dos 20 aos 34 anos (9,7%). O CMI foi mais elevado entre os nascidos vivos de mães com 35 anos e mais, principalmente no período neonatal (Tabela 4).

Do total de casos de nascidos vivos, o número médio de filhos tidos anteriormente pela mãe foi 1,7, com amplitude de variação de 0 a 13 filhos, sendo o valor mediano igual a um filho. Entre os nascidos vivos de mães com 35 anos e mais apenas 0,9% foram de primíparas, enquanto que 58,3% ocuparam o quinto ou mais posto na ordem de nascimento.

O número médio de filhos tidos anteriormente, quando estratificado segundo o local de residência ou a escolaridade materna, aumentou quando comparadas a área central (1,5 filhos por mulher) com a periférica (1,9 filhos por mulher), ou ainda, a zona urbana (1,8) com a rural (2,0), e diminuiu com o aumento da escolaridade (3,1 filhos por NV de mulheres não alfabetizadas e 0,5 por NV de mães universitárias). Entre as não alfabetizadas, 43,2% delas já haviam tido anteriormente pelo menos três filhos. Este percentual foi igual a zero para as mães com escolaridade maior ou igual a primeiro grau completo.

Dos óbitos em menores de um ano, 25,9% foram crianças primogênitas, 46,5% correspondiam do segundo até o quarto filho e 27,5% foram o quinto e mais filho. Em 26,8% dos casos, as mães haviam tido mais de um filho que foi a óbito. Entre os casos de óbito, a paridade materna anterior média foi de 3,2 filhos. O maior CMI segundo paridade anterior materna foi no grupo de crianças cujas mães tiveram anteriormente quatro ou mais filhos (Tabela 5). Resultados semelhantes foram obtidos pela Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância13 que verificou que o CMI e seus componentes foram crescentes com o aumento da paridade materna.

A Qualidade das Informações das DO e DN

A análise do preenchimento da DO mostrou que as informações referentes às partes I e II do documento estavam sempre preenchidas, com exceção da residência habitual do falecido, que apresentou apenas 57,6% de endereços completos e o nome do pai declarado em 79,4% dos casos.

Na parte III, cujo preenchimento é exclusivo para os casos de óbitos de menores de um ano, algumas variáveis tiveram preenchimento ainda menos freqüente, como o total de filhos tidos (11,9%), a duração da gestação (5,1%), o tipo de gravidez (8,5%) e o tipo de parto (13,6%). O peso ao nascer, de preenchimento exclusivo para óbitos em menores de 28 dias, foi preenchido em 30,0% dos casos.

Dos campos da parte IV do documento, excetuando-se os relativos às causas de morte, 42,4% deles estavam completamente preenchidos. Outros estudos que avaliaram o preenchimento da DO obtiveram resultados semelhantes5, 10.

Entre os casos de óbitos, foram localizados 98,6% dos domicílios e realizadas entrevistas em 90% deles. Quanto à coleta nos serviços de saúde, foi possível recuperar informações adicionais referentes às características do recém-nascido, da gestação, do parto e da mãe. Somadas as fontes de informação, estas foram recuperadas em percentuais superiores a 98%, sendo igual a 89,8% apenas para a escolaridade materna. Gomes5 salientou que a falta de preenchimento da DO não está relacionada ao desconhecimento da informação, e sim à não-valorização do documento como base de informação para as estatísticas de saúde, por parte dos serviços de saúde.

Quanto ao preenchimento da DN, foram verificados percentuais superiores a 99,0%, na maioria dos campos analisados, com exceção da idade materna (98,2%) e endereço de residência (93,7%). Este resultado, quando comparado aos parâmetros de qualidade propostos por Mello Jorge et al. 9, pode ser considerado muito bom.

Entre as DN, deve ser ressaltada a anotação incompleta do endereço: para os residentes na zona urbana em 53,8% não estava preenchido o bairro e em 6,9% constava a rua, mas não o número do domicílio. Cabe lembrar que alguns domicílios da sede do município estão localizados em áreas de ocupação irregular, sendo que os mesmos não possuem número. Entretanto o endereço de residência poderia ter sido melhor preenchido, pois é no município que a DN pode ser utilizada na vigilância à saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a implantação do Sinasc, tornou-se possível descrever, em nível populacional, os nascidos vivos segundo características epidemiológicas contidas na DN. O serviço de saúde, como principal fonte de captação de casos, mostrou-se adequado. A metodologia de coleta de nascidos vivos permitiu um acréscimo de 4,7% de casos, quando comparados aos dados do Registro Civil de 19933. O uso destas informações pelo nível municipal permitiria maior agilidade nas decisões para os planejadores de saúde, bem como o desenvolvimento de atividades de vigilância à saúde.

Entre os casos de óbitos de menores de um ano a coleta de informações adicionais possibilitou contornar algumas dificuldades decorrentes da baixa qualidade das informações contidas na DO, bem como a compatibilização de variáveis comuns aos dois sistemas (SIM e SINASC), como a duração da gestação, a escolaridade materna e o peso ao nascer.

O uso de dois sistemas de informação para a construção de medidas de saúde pelo nível local mostrou-se viável. Entretanto, para municípios muito pequenos, este uso pode implicar alguns problemas operacionais, pois o número de casos pode apresentar-se eventualmente muito reduzido, podendo gerar grandes flutuações quando se analisam séries históricas, o que causaria dificuldades para a tomada de decisões no setor saúde. Uma alternativa seria eleger, a partir de estudos prévios, algumas variáveis importantes do ponto de vista epidemiológico e viáveis do ponto de vista operacional e, a partir delas, implementar o planejamento e a vigilância em saúde. No caso de Itararé, o baixo peso ao nascer e a localização da residência foram importantes variáveis para a determinação do diferencial da mortalidade infantil e poderiam ser utilizadas como parâmetros de vigilância.

O preenchimento dos documentos, no caso da DO, esteve aquém do desejado, especialmente nos campos de preenchimento exclusivo para menores de um ano. Entre as DN observou-se falta de precisão no preenchimento da variável endereço de residência. Para aumentar a qualidade da informação presente nos documentos seria necessário que o município se instrumentalizasse no sentido de estabelecer um fluxo de coleta, correção e análise contínua dos dados, uma vez que são informações possíveis de serem coletadas, complementadas ou corrigidas a partir de dados existentes no serviço de saúde, utilizando assim os sistemas de informação disponíveis, na construção de um sistema local de vigilância à saúde infantil.

Correspondência para/Correspondence to:

Anna Klara Bohland Rua Lagarto, 264 49010-390 Aracaju, SE - Brasil

Edição subvencionada pela FAPESP (Processo n 98/13915-5).

Recebido em 13.7.1998. Reapresentado em 28.1.1999. Aprovado em 5.4.1999.

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  • *
    Trabalho derivado da dissertação de mestrado, apresentada na Faculdade de Saúde Pública da USP, 1996.
  • **
    Peso ao nascer entre 2.500 g e 2.999 g.
    17
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Ago 2001
    • Data do Fascículo
      Ago 1999

    Histórico

    • Aceito
      05 Abr 1999
    • Revisado
      28 Jan 1999
    • Recebido
      13 Jul 1998
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