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Efeitos de níveis de privação alimentar sobre a oogênese de Panstrongylus megistus

Effects of food deprivation levels on the oogenesis of Panstrongylus megistus

Resumos

Os efeitos da privação alimentar sobre a oogênese de P. megistus foram estudados em laboratório. Imediatamente após a ecdise imaginária, foram formados seis grupos (GI a GVI) de 15 casais, que receberam alimentação da seguinte maneira: GI -- no 5º e no 25º dias de jejum; GII -- no 5º e 35º dias; GIII -- no 5º e no 45º dias; GIV -- no 20º dia; GV -- no 30º dia; GVI -- no 40º dia de jejum. Após esses períodos, todos os grupos receberam alimentação a cada 15 dias. O grupo de controle foi formado por 15 casais, alimentados no 5º dia após a ecdise imaginária e, subseqüentemente, a cada 15 dias. GI apresentou o maior número de acasalamentos, produziu mais ovos e maior fertilidade. GII teve maior vida média, maior fecundidade e maior número de eclosões. GIII apresentou o menor período de sobrevivência, baixas fecundidade, fertilidade e eclosões. GVI apresentou os resultados menos favoráveis em todos os parâmetros, exceto em relação ao período de pré-ovipostura. O grupo de controle apresentou os melhores resultados em todos os parâmetros.

Triatominae; Privação de alimentos; Reprodução; Insetos vetores; Doença de Chagas; Panstrongylus


The effects of various levels of food deprivation on the oogenesis of P. megistus was studied. Immediately after the imaginal ecdysis, six groups (GI to GVI) of 15 couples each were formed. Each group was fed as follows: GI -- on days 5 and 25; G-II -- on days 5 and 35; GIII -- on days 5 and 45; GIV -- on day 20; GV -- on day 30; GVI -- on day 40 after the imaginal ecdysis. After the established fasting period, all groups were fed fortnightly. Fifteen couples were in the control group (CG), which was fed on the day 5 after the imaginal ecdysis and subsequently fortnightly. GI produced more eggs, matings and fertile eggs. GII had longer life spans, higher fecundity and hatchings. GIII had a shorter life span, low fecundity, fertility and hatchings. GVI presented the least favorable results for all parameters, except for the pre-oviposition period. The CG had the best results in all parameters when compared with all experimental groups.

Triatominae; Food deprivation; Reproduction; Insect, vectors; Chagas, disease; Panstrongylus


Notas e Informações

Notes and informations

Efeitos de níveis de privação alimentar sobre a oogênese de Panstrongylus megistus

Effects of food deprivation levels on the oogenesis of Panstrongylus megistus

Marina Vianna Braga e Marli Maria Lima

Departamento de Biologia. Laboratório de Biologia e Controle de Insetos Vetores. Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

DESCRITORES
Triatominae, fisiologia.# Privação de alimentos.# Reprodução. Insetos vetores. Doença de Chagas, prevenção e controle. Panstrongylus. RESUMO
Os efeitos da privação alimentar sobre a oogênese de P. megistus foram estudados em laboratório. Imediatamente após a ecdise imaginária, foram formados seis grupos (GI a GVI) de 15 casais, que receberam alimentação da seguinte maneira: GI ¾ no 5º e no 25º dias de jejum; GII ¾ no 5º e 35º dias; GIII ¾ no 5º e no 45º dias; GIV ¾ no 20º dia; GV ¾ no 30º dia; GVI ¾ no 40º dia de jejum. Após esses períodos, todos os grupos receberam alimentação a cada 15 dias. O grupo de controle foi formado por 15 casais, alimentados no 5º dia após a ecdise imaginária e, subseqüentemente, a cada 15 dias. GI apresentou o maior número de acasalamentos, produziu mais ovos e maior fertilidade. GII teve maior vida média, maior fecundidade e maior número de eclosões. GIII apresentou o menor período de sobrevivência, baixas fecundidade, fertilidade e eclosões. GVI apresentou os resultados menos favoráveis em todos os parâmetros, exceto em relação ao período de pré-ovipostura. O grupo de controle apresentou os melhores resultados em todos os parâmetros. KEYWORDS
Triatominae, physiology.# Food deprivation.# Reproduction. Insect, vectors. Chagas, disease, prevention and control. Panstrongylus. ABSTRACT
The effects of various levels of food deprivation on the oogenesis of P. megistus was studied. Immediately after the imaginal ecdysis, six groups (GI to GVI) of 15 couples each were formed. Each group was fed as follows: GI ¾ on days 5 and 25; G-II ¾ on days 5 and 35; GIII ¾ on days 5 and 45; GIV ¾ on day 20; GV ¾ on day 30; GVI ¾ on day 40 after the imaginal ecdysis. After the established fasting period, all groups were fed fortnightly. Fifteen couples were in the control group (CG), which was fed on the day 5 after the imaginal ecdysis and subsequently fortnightly. GI produced more eggs, matings and fertile eggs. GII had longer life spans, higher fecundity and hatchings. GIII had a shorter life span, low fecundity, fertility and hatchings. GVI presented the least favorable results for all parameters, except for the pre-oviposition period. The CG had the best results in all parameters when compared with all experimental groups.

Os triatomíneos são hematófagos vorazes em todas as fases de desenvolvimento, mas são capazes de suportar longos períodos de jejum. De acordo com Wigglesworth (1936),5 o estado nutricional tem pouco efeito sobre a atividade reprodutiva do macho, porém a deficiência de importantes fatores nutricionais do sangue pode influenciar na produção de ovos pelas fêmeas. Esse citado autor afirma que o número de acasalamentos tem importância menor na reprodução desses insetos.

Panstrongylus megistus é um dos principais vetores da doença de Chagas no Brasil, e as informações sobre a sua resistência à privação alimentar têm importância nas campanhas de controle. O presente estudo avaliou a influência de diferentes níveis de privação alimentar sobre a fecundidade e a fertilidade dessa espécie em laboratório. Os testes foram desenvolvidos com exemplares provenientes de uma colônia mantida há mais de 40 anos no Laboratório Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos, do Departamento de Entomologia, Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz.

Seis grupos de 15 casais cada, separados em frascos individuais, foram formados imediatamente após atingir a fase adulta, permanecendo nesse estado até a morte. Após a ecdise imaginal, cada grupo recebeu alimentação nos seguintes intervalos de tempo, determinados aleatoriamente:

a) Grupo I (GI) = no 5o e 25o dia;

b) Grupo II (GII) = no 5o e 35o dia;

c) Grupo III (GIII) = no 5o e 45o dia;

d) Grupo IV (GIV) = no 20o dia;

e) Grupo V (GV) = no 30º dia;

f) Grupo VI (GVI) = no 40º dia.

Só foram utilizados os exemplares que apresentassem distensão abdominal, indicando que haviam se alimentado.

Após esses períodos, todos os grupos foram alimentados a cada 15 dias. O grupo de controle foi formado por 15 casais alimentados no quinto dia após a ecdise imaginal e, depois, a cada 15 dias; todos os grupos receberam alimentação em pombo. Os frascos contendo os casais eram mantidos em câmara climatizada a 28±1 oC, 80±10o de URA e 14h de fotofase.

Os seguintes parâmetros foram observados: tempo de vida, período de pré-ovipostura, fecundidade, fertilidade, número de ovos férteis que eclodiram, e número de acasalamentos confirmado pelo encontro de espermatóforos nos frascos, onde os casais eram mantidos. Os dados foram analisados estatisticamente pelo teste de Kruskal-Wallis.

As fêmeas do GI apresentaram maior número de ovos e de acasalamentos. Somente 26,7% delas copularam três vezes ou mais, e 33,3% puseram mais de 50% de ovos férteis. As do GII apresentaram o maior tempo de vida, bem como maior fecundidade e eclosões; 40% copularam somente uma vez, e 46,7% puseram mais de 50% de ovos férteis. As fêmeas do GIII tiveram um período de vida mais curto, baixas fecundidade, fertilidade e eclosões; mais de 90% delas copularam uma única vez ou não copularam. O GVI apresentou os menores resultados em todos os parâmetros estudados, exceto quanto ao período de pré-ovipostura; mais de 70% não copularam, e apenas 6,7% delas puseram mais de 50% de ovos férteis. Os resultados do GC foram mais altos do que os de todos os grupos experimentais. Todos os resultados foram estatisticamente diferentes (P<0,05) (Tabelas 1 e 2).

P. megistus, como os triatomíneos em geral, apresenta um alto potencial reprodutivo, o qual é dependente do acasalamento e do estado nutricional da fêmea.

De acordo com Wigglesworth5 (1936), as fêmeas submetidas a jejum reabsorvem parcialmente seus ovos e, conseqüentemente, contraem e inativam o corpus allatum, órgão responsável pela secreção de hormônio juvenil. Davey1 (1974) observou que a alimentação estimula o corpus allatum. Este atua sobre o corpo gorduroso, produzindo vitelogenina. O corpus allatum também atua sobre os ovários, promovendo a transferência de vitelogenina da hemolinfa para a célula-ovo. Durante a privação alimentar, as fêmeas utilizam suas reservas nutritivas, inclusive das proteínas do ovário, as quais estimulam o sistema endócrino, produzindo ovos.

Lima et al3 (1987) estudaram a influência do número de acasalamentos de P. megistus sobre a fecundidade e a fertilidade de fêmeas alimentadas quinzenalmente em pombo. Observaram que uma única cópula é capaz de manter a fertilidade dos ovos por toda a vida da fêmea, embora ela possa diminuir à medida que a idade aumenta.

Perlowagora-Szumlewicz4 (1979) estudou oito espécies de triatomíneos, sendo três delas, inclusive P. megistus, na primeira geração em laboratório. Essas espécies eram alimentadas em aves (galinhas), observando que as fêmeas que copularam uma única vez apresentaram a mesma taxa de fertilidade das que copularam duas ou mais vezes. Essa diferença em relação aos resultados do presente trabalho pode ter ocorrido porque os exemplares usados apresentavam prolongada endogamia, conseqüente de várias gerações na mesma colônia de laboratório.

Segundo Fontenelle2 (1989/1981), a endogamia forçada provoca, em P. megistus, não só um retardamento no desenvolvimento com maior duração dos estádios ninfais, como também redução da fase adulta das fêmeas, do número de posturas, do número de ovos por postura e do potencial de ovos viáveis.

Conclui-se que os presentes resultados sugerem que quando P. megistus é submetido à privação alimentar, seu potencial reprodutivo é diminuído, mas ainda é capaz de manter a colonização. Esse comportamento é muito importante na epidemiologia da doença de Chagas, pois, após a borrifação das casas, esses insetos podem permanecer escondidos até passar o efeito do inseticida, repovoando o ambiente.

AGRADECIMENTOS

Ao corpo editorial e ao editor da Revista de Saúde Pública, pelas construtivas críticas ao trabalho.

Correspondência para/Correspondence to:

Marli Maria Lima

Av. Brasil, 4365

21045-900 Manguinhos, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

E-mail: mmlima@ioc.fiocruz.br

Recebido em 21/8/2000. Reapresentado em 17/1/2001. Aprovado em 9/2/2001.

  • 1. Davey KJ. Symposium of reproduction of arthropods of medical and veterinary importance. IV. Reproduction in the females of some hematophagous insects. J Med Entomol 1974;1:40-5.
  • 2. Fontenelle TJH. Bionomia dos triatomíneos. O surgimento de adultos nas colônia de Panstrongylus megistus (Burm., 1835) (Hemiptera, Reduviidae). Mem Inst Butantan 1980/1981;(44/45):343-53.
  • 3. Lima MM, Jurberg P, Almeida JR. Behavior of triatomines (Hemiptera, Reduviidae) vectors of Chagas disease. III. Influence of the number of matings on the fecundity and fertility of Panstrongylus megistus (Burm., 1835) in the laboratory. Mem Inst Oswaldo Cruz 1987;82:37-41.
  • 4. Perlowagora-Szumlewicz A. Laboratory colonies of Triatominae, biology and population dynamics. Sci Pub Pan-Amer Health Org 1976;318:173-234.
  • 5. Wigglesworth VB. The function of corpus allatum in the growth and reproduction of Rhodnius prolixus A F Microsc Sci 1936;79:91-120.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Ago 2001
  • Data do Fascículo
    Jun 2001

Histórico

  • Aceito
    09 Fev 2001
  • Recebido
    21 Ago 2000
  • Revisado
    17 Jan 2001
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