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Conhecimentos, atitudes e prática do exame de Papanicolaou por mulheres, Nordeste do Brasil

Conocimientos, actitudes y práctica del examen de Papanicolaou en Noreste

Resumos

OBJETIVO: Analisar conhecimentos, atitudes e práticas das mulheres em relação ao exame citológico de Papanicolaou e a associação entre esses comportamentos e características sociodemográficas MÉTODOS: Inquérito domiciliar com abordagem quantitativa. Foram entrevistadas 267 mulheres com idade de 15 a 69 anos, selecionadas de forma estratificada aleatória, residentes no município de São José do Mipibu, RN, em 2007. Utilizou-se questionário com perguntas pré-codificadas e abertas, cujas respostas foram descritas e analisadas quanto à adequação dos conhecimentos, atitudes e prática das mulheres em relação ao exame preventivo de Papanicolaou. Foram realizados testes de associação entre as características sociodemográficas e os comportamentos estudados, com nível de significância de 5%. RESULTADOS: Apesar de 46,1% das mulheres entrevistadas terem mostrado conhecimento adequado, proporções de adequação significativamente maiores foram observadas em relação às atitudes e prática quanto ao exame: 63,3% e 64,4%, respectivamente. O maior grau de escolaridade apresentou associação com adequação dos conhecimentos, atitudes e prática, enquanto as principais barreiras para a realização do exame relatadas foram descuido, falta de solicitação do exame pelo médico e vergonha. CONCLUSÕES: O médico é a principal fonte de informação sobre o exame de Papanicolau. Entretanto, mulheres que vão a consultas com maior freqüência, embora apresentem prática mais adequada do exame, possuem baixa adequação de conhecimento e atitude frente ao procedimento, sugerindo que não estejam recebendo as informações adequadas sobre o objetivo do exame, suas vantagens e benefícios para sua saúde.

Prevenção de Câncer de Colo Uterino; Esfregaço Vaginal; Conhecimentos; Fatores Socioeconômicos; Saúde da Mulher; Estudos Transversais


OBJETIVO: Analizar conocimientos, actitudes y prácticas de las mujeres con relación al examen citológico de Papanicolaou y su asociación entre comportamientos y características sociodemográficas. MÉTODOS: Pesquisa domiciliar con abordaje cuantitativo. Fueron entrevistadas 267 mujeres con edad de 15 a 69 años, seleccionadas de forma estratificada aleatoria, residentes en el municipio de São José do Mipibu, Noreste de Brasil, en 2007. Se utilizó cuestionario con preguntas pre-codificadas y abiertas, cuyas respuestas fueron descritas y analizadas con relación a la adecuación de los conocimientos, actitudes y práctica de las mujeres con relación al examen preventivo de Papanicolaou. Fueron realizadas exámenes de asociación entre las características sociodemográficas y los comportamientos estudiados, con nivel de significancia de 5%. RESULTADOS: A pesar de 46,1% de las mujeres entrevistadas haber mostrado conocimiento adecuado, proporciones de adecuación significativamente mayores fueron observadas con relación a las actitudes y práctica con respecto al examen: 63,3% y 64,4%, respectivamente. El mayor grado de escolaridad presentó asociación con adecuación de los conocimientos, actitudes y práctica, con relación a las principales barreras para la realización del examen relatadas fueron descuido, falta de solicitud del examen por el médico y vergüenza. CONCLUSIONES: El médico es la principal fuente de información sobre el examen de Papanicolaou. Mientras tanto, mujeres que van a consultas con mayor frecuencia, a pesar de presentar práctica más adecuada del examen, poseen baja adecuación del conocimiento y actitud frente al procedimiento, sugiriendo que no están recibiendo las informaciones adecuadas sobre el objetivo del examen, sus ventajas y beneficios para su salud.

Prevención de Cáncer de Cuello Uterino; Frotis Vaginal; Conocimientos; Factores Socioeconómicos; Salud de la Mujer; Estudios Transversales


OBJECTIVE: To assess the knowledge, attitudes and practices of women related to the Pap test and the association between these behaviors and sociodemographic characteristics. METHODS: A household survey with quantitative approach was conducted. A total of 267 women aged 15 to 69 years, randomly selected in a stratified manner, living in the city of São José de Mipibu, Northeastern Brazil, were interviewed in 2007. A questionnaire consisting of pre-coded open questions was administered and answers were described and analyzed, as for adequacy of knowledge, attitudes, and practices of women regarding the Pap test. Tests of association were carried out between sociodemographic characteristics and behaviors studied at a 5% significance level. RESULTS: Although 46.1% of the women interviewed showed adequate knowledge about the Pap test, a significantly higher proportion of adequacy was seen regarding attitudes and practices, 63.3% and 64.4%, respectively. Higher schooling was associated with adequacy of knowledge, attitudes, and practices. The main barriers to the Pap test were negligence, non-requesting by their physicians, and shame. CONCLUSIONS: The physician is the main source of information about the Pap test. However, women who more often attend medical visits, despite their good practice, show low adequacy of knowledge and attitudes related to the Pap test, which indicates that they are not receiving appropriate information on the test's purpose, advantages and benefits to women's health.

Cervix Neoplasms Prevention; Vaginal Smears; Health Knowledge; Socioeconomic Factors; Women's Health; Cross-Sectional Studies


ARTIGOS ORIGINAIS

Conhecimentos, atitudes e prática do exame de Papanicolaou por mulheres, Nordeste do Brasil

Conocimientos, actitudes y práctica del examen de Papanicolaou en Noreste

José Veríssimo FernandesI; Silvia Helena Lacerda RodriguesI; Yuri Guilherme Alexandre Silva da CostaI; Luiz Cláudio Moura da SilvaI; Alípio Maciel Lima de BritoI; Judson Welber Veríssimo de AzevedoI; Ermeton Duarte do NascimentoI; Paulo Roberto Medeiros de AzevedoII; Thales Allyrio Araújo de Medeiros FernandesIII

IDepartamento de Microbiologia e Parasitologia. Centro de Biociências. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Natal, RN, Brasil

IIDepartamento de Estatística. Centro de Ciências Exatas e da Terra. UFRN. Natal, RN, Brasil

IIIDepartamento de Ciências Biomédicas. Faculdade de Ciências da Saúde. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Mossoró, RN, Brasil

Correspondência | Correspondence Correspondência | Correspondence: José Veríssimo Fernandes Depto Microbiologia e Parasitologia - UFRN Av. Sen. Salgado Filho, S/N - Lagoa Nova 59072-970 Natal, RN, Brasil E-mail: veris@cb.ufrn.br

RESUMO

OBJETIVO: Analisar conhecimentos, atitudes e práticas das mulheres em relação ao exame citológico de Papanicolaou e a associação entre esses comportamentos e características sociodemográficas

MÉTODOS: Inquérito domiciliar com abordagem quantitativa. Foram entrevistadas 267 mulheres com idade de 15 a 69 anos, selecionadas de forma estratificada aleatória, residentes no município de São José do Mipibu, RN, em 2007. Utilizou-se questionário com perguntas pré-codificadas e abertas, cujas respostas foram descritas e analisadas quanto à adequação dos conhecimentos, atitudes e prática das mulheres em relação ao exame preventivo de Papanicolaou. Foram realizados testes de associação entre as características sociodemográficas e os comportamentos estudados, com nível de significância de 5%.

RESULTADOS: Apesar de 46,1% das mulheres entrevistadas terem mostrado conhecimento adequado, proporções de adequação significativamente maiores foram observadas em relação às atitudes e prática quanto ao exame: 63,3% e 64,4%, respectivamente. O maior grau de escolaridade apresentou associação com adequação dos conhecimentos, atitudes e prática, enquanto as principais barreiras para a realização do exame relatadas foram descuido, falta de solicitação do exame pelo médico e vergonha.

CONCLUSÕES: O médico é a principal fonte de informação sobre o exame de Papanicolau. Entretanto, mulheres que vão a consultas com maior freqüência, embora apresentem prática mais adequada do exame, possuem baixa adequação de conhecimento e atitude frente ao procedimento, sugerindo que não estejam recebendo as informações adequadas sobre o objetivo do exame, suas vantagens e benefícios para sua saúde.

Descritores: Prevenção de Câncer de Colo Uterino. Esfregaço Vaginal. Conhecimentos, Atitudes e Prática em Saúde. Fatores Socioeconômicos. Saúde da Mulher. Estudos Transversais.

RESUMEN

OBJETIVO: Analizar conocimientos, actitudes y prácticas de las mujeres con relación al examen citológico de Papanicolaou y su asociación entre comportamientos y características sociodemográficas.

MÉTODOS: Pesquisa domiciliar con abordaje cuantitativo. Fueron entrevistadas 267 mujeres con edad de 15 a 69 años, seleccionadas de forma estratificada aleatoria, residentes en el municipio de São José do Mipibu, Noreste de Brasil, en 2007. Se utilizó cuestionario con preguntas pre-codificadas y abiertas, cuyas respuestas fueron descritas y analizadas con relación a la adecuación de los conocimientos, actitudes y práctica de las mujeres con relación al examen preventivo de Papanicolaou. Fueron realizadas exámenes de asociación entre las características sociodemográficas y los comportamientos estudiados, con nivel de significancia de 5%.

RESULTADOS: A pesar de 46,1% de las mujeres entrevistadas haber mostrado conocimiento adecuado, proporciones de adecuación significativamente mayores fueron observadas con relación a las actitudes y práctica con respecto al examen: 63,3% y 64,4%, respectivamente. El mayor grado de escolaridad presentó asociación con adecuación de los conocimientos, actitudes y práctica, con relación a las principales barreras para la realización del examen relatadas fueron descuido, falta de solicitud del examen por el médico y vergüenza.

CONCLUSIONES: El médico es la principal fuente de información sobre el examen de Papanicolaou. Mientras tanto, mujeres que van a consultas con mayor frecuencia, a pesar de presentar práctica más adecuada del examen, poseen baja adecuación del conocimiento y actitud frente al procedimiento, sugiriendo que no están recibiendo las informaciones adecuadas sobre el objetivo del examen, sus ventajas y beneficios para su salud.

Descriptores: Prevención de Cáncer de Cuello Uterino. Frotis Vaginal. Conocimientos, Actitudes y Práctica en Salud. Factores Socioeconómicos. Salud de la Mujer. Estudios Transversales.

INTRODUÇÃO

O câncer de colo uterino (CCU) é a segunda causa de morte por câncer entre mulheres no mundo, com maior incidência nos países em desenvolvimento.11,21 No Brasil, representa o terceiro mais comum tipo de neoplasia maligna que acomete mulheres, depois do câncer de pele não-melanoma e do câncer de mama, 10,a As taxas brutas de incidência, por 100.000 mulheres, estimada para o ano de 2008, foi de 19,18 para o País, 17,58 para a Região Nordeste e de 15,8 para o estado do Rio Grande do Norte.ª a Ministério da Saúde. Secretaria de Administração a Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. Estimativas 2008: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro; 2007.

A etiologia do CCU está diretamente associada à infecção persistente por papilomavírus humano (HPV) com alto potencial oncogênico. A infecção por HPV é considerada causa necessária, embora não suficiente para desenvolvimento dessa neoplasia, tendo em vista a presença do DNA viral em 99,7% dos casos da doença.14,20,21

A história natural do CCU revela que esta neoplasia maligna apresenta maior potencial de prevenção e cura em virtude de sua lenta evolução, passando por vários estágios de lesões intra-epiteliais pré-cancerosas, antes de chegar a forma invasiva.7,18 Essa característica, associada à relativa facilidade de diagnóstico, permite que a doença seja detectada ainda nos estágios iniciais, quando o tratamento apresenta altas taxas de cura.3 Além disso, o caráter infeccioso de sua etiologia possibilita a adoção de medidas preventivas, inclusive vacinação contra os dois tipos de HPV com maior potencial oncogênico.3,14, 22

O exame citopatológico de Papanicolaou é um método simples que permite detectar alterações da cérvice uterina, a partir de células descamadas do epitélio e se constitui até hoje, o método mais indicado para o rastreamento do CCU por ser um exame rápido e indolor, de fácil execução, realizado em nível ambulatorial, que tem se mostrado efetivo e eficiente para aplicação coletiva, além de ser de baixo custo.7,13 A avaliação da efetividade do Papanicolaou em reduzir as taxas de mortalidade pelo CCU, feita por estudos comparativos de tendências temporais, mostrou uma redução significativa dessas taxas em alguns países após a introdução de programas de rastreamento. Estudos epidemiológicos do tipo caso-controle realizados, inclusive no Brasil, revelaram risco mais elevado de CCU entre mulheres que nunca fizeram o Papanicolaou, além de aumento do risco proporcional ao tempo decorrido desde a realização do último exame.5,9

No Brasil, o Ministério da Saúde adotou em 1988 a norma da Organização Mundial da Saúde23 que propõe o controle do CCU nas mulheres com idade entre 25 e 60 anos, a cada três anos, após dois resultados negativos com intervalo anual. Contudo, estimativas indicam que cerca de 40% das mulheres brasileiras (de todas as idades) nunca fizeram o exame.17,b b Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Conhecendo o Viva Mulher. Programa nacional de controle de câncer do colo do útero e da mama. Rio de Janeiro; 2007. Dentre as razões para esta baixa adesão estão: a dificuldade em acessar os serviços de saúde, a natureza do exame que envolve a exposição da genitália, motivo de desconforto emocional para algumas mulheres, em virtude de pudores e tabus, além das condições socioeconômicas e da falta de conhecimento sobre o câncer ginecológico.1

A realização do exame citopatológico tem se confrontado, na prática, com algumas barreiras presentes nos mais diversos aspectos da vida da mulher, dificultando o alcance da cobertura desejada. As informações a respeito da cobertura e de fatores associados à não realização do exame por mulheres do Nordeste do Brasil ainda são escassas.

O presente estudo teve como objetivo analisar conhecimentos, atitudes e prática das mulheres em relação ao exame citopatológico de Papanicolaou e sua associação com comportamentos e características sociodemográficas, de atividade sexual e reprodutiva, além de outros fatores que se constituam em possíveis barreiras para a realização do exame.

MÉTODOS

Estudo transversal baseado em inquérito domiciliar e desenvolvido no município de São José de Mipibu, RN, de março a setembro de 2007. O município situa-se a 37 km da capital, possui uma população estimada de 39.148 habitantes, sendo 21.649 residentes na zona rural e 17.499 na área urbana, e 19.692 são do sexo feminino. Da população total, 70,5% são alfabetizados, mas a maioria não chegou a completar o ensino fundamental.c c Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mapa base dos municípios do estado do Rio Grande do Norte. Brasília; 2005. As principais atividades econômicas são: agricultura, pecuária, extrativismo e comércio e a maioria da população é de baixa renda. O sistema público de saúde dispõe de dois hospitais, num total de 66 leitos, 20 unidades básicas de saúde e conta com 15 equipes do Programa Saúde da Família.

A população-alvo da pesquisa foram mulheres das áreas rural e urbana do município, com idade variando de 15 a 69 anos, selecionadas por meio de amostragem aleatória estratificada. A inclusão de adolescentes se deveu ao fato de ter sido detectado, pelo Ministério da Saúde (Programa Sistema de Informação do Câncer do Colo do Útero - Siscolo), que várias mulheres com idade inferior a 25 anos apresentavam alterações no exame citológico.

O tamanho da amostra foi calculado com base no número estimado de mulheres residentes naquele município, dentro da faixa etária estabelecida. Na definição do plano amostral a população foi dividida em dois estratos, correspondentes às áreas rural e urbana. Em seguida, a população urbana foi subdividida em dois estratos de classe socioeconômica média e baixa. Para verificar a existência de associação entre as características estudadas e os conhecimentos, atitudes e práticas do exame foi utilizado o teste χ2 de associação. O teste foi considerado significativo quando p< 0,05.

Os critérios de inclusão foram: mulheres residentes no município dentro da faixa etária estabelecida, que já tinham iniciado a atividade sexual, que concordaram em participar da pesquisa e se dispuseram a responder a uma entrevista por meio de questionário estruturado,4,7 aplicado por entrevistadores treinados.

Para análise dos dados sobre conhecimentos, atitudes e prática das mulheres em relação ao exame citopatológico de Papanicolaou, foram adotadas as definições utilizadas por Gamarra et al,6 conforme apresentadas a seguir:

  • conhecimento adequado: quando as mulheres responderam que já tinham ouvido falar do exame, e sabiam que era para prevenir câncer, seja de forma geral ou, especificamente, o de colo uterino;

  • conhecimento inadequado: quando as mulheres disseram já ter ouvido falar do exame, mas não souberam dizer a sua finalidade;

  • atitude adequada: quando as mulheres consideraram necessária a realização do exame periodicamente, apontando corretamente as razões para fazê-lo;

  • atitude inadequada: quando as mulheres consideraram pouco necessário, desnecessário ou não tinham opinião a respeito da realização do exame;

  • prática adequada: quando as mulheres afirmaram ter realizado o último exame, havia no máximo três anos;

  • prática inadequada: quando as mulheres disseram ter realizado o último exame, havia mais de três anos, uma única vez na vida, ou nunca fizeram.

Foi utilizado o software SPSS 13.0 para construção do banco de dados e análises estatísticas.

Após receberem todos os esclarecimentos sobre a pesquisa, seus objetivos e a garantia de sigilo das informações prestadas, as mulheres selecionadas foram indagadas se desejavam ou não participar do estudo. Aquelas que, voluntariamente, concordaram em participar, assinaram o termo de consentimento livre esclarecido e responderam as perguntas do questionário.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 267 mulheres com idade entre 15 e 69 anos, média de 37,8 (DP= 14,85) anos, que já haviam iniciado a atividade sexual. Dessas, 34,8% viviam na zona rural e 65,2% na área urbana do município, em diferentes bairros. A maioria (58,4%) correspondia a mulheres com: menos de 40 anos, vida sexual ativa, de religião católica, casada ou em união estável com o companheiro, com um e seis filhos, escolaridade até o ensino fundamental incompleto, não trabalhava fora de casa e tinha renda familiar de até um salário mínimo.

No que se refere ao grau de conhecimento sobre o exame de Papanicolaou, 98,1% das mulheres tinha ouvido falar do procedimento, mas somente 46,1% apresentaram conhecimento adequado. A principal fonte de informação sobre o exame foi o médico, mencionado por 40,1% das entrevistadas, seguido de amigas ou parentes (20,2%), agentes comunitários de saúde (19,8%), rádio e TV (8,4%) e demais profissionais das unidades básicas de saúde (6,5%) (Tabela 1). A maioria das mulheres entrevistadas (96,2%) considerou necessária a realização do exame. Porém, apenas 63,3% delas apresentaram atitude adequada, expressando de forma consciente o reconhecimento de suas vantagens e benefícios, justificando corretamente a importância de fazê-lo periodicamente. Dentre aquelas que apresentaram atitude adequada, 66,9% justificaram a necessidade da realização do exame como forma de se prevenir do câncer de colo do útero e 33,1% de se prevenir de câncer, de forma geral (Tabela 2).

Quanto à prática do exame, 85,0% das mulheres entrevistadas afirmaram ter realizado o procedimento alguma vez, ao longo da vida, 15,0% nunca fizeram e 64,4% o realizaram pelo menos uma vez, a cada três anos, conforme recomendação do Ministério da Saúde considerado como prática adequada. Dentre estas, a maioria (54,6%) procurou os serviços de saúde de forma espontânea para realizar o exame tendo como motivação principal a prevenção do CCU. Outras razões foram apontadas tais como: toda mulher precisa fazer esse exame periodicamente (14,5%), o exame não incomoda (4,1%), o exame é gratuito (2,3%). O outro grupo de mulheres que também apresentaram prática adequada afirmou ter feito o exame por recomendação médica (22,7%), de amigas ou familiares (1,7%) (Tabela 3).

Em relação às barreiras para a prática do exame, constatou-se que as principais razões alegadas para não fazê-lo com a freqüência recomendada, foram: descuido (22,1%), não solicitação do médico (7,4%) e sentir vergonha (6,3%) (Tabela 3).

Analisando-se as características sociodemográficas, observou-se associação do grau de escolaridade com conhecimentos, atitudes e práticas frente ao exame. O trabalho fora de casa, a freqüência com que a mulher vai ao ginecologista, paridade e vida sexual ativa, influenciam apenas na prática do exame. O local de moradia e a situação conjugal influenciam conhecimentos e atitudes, enquanto que o uso de métodos contraceptivos exerceu influência sobre os conhecimentos e a prática do exame. Com relação à renda familiar, encontrou-se um p-valor muito próximo do nível de significância estatística considerado no que se refere à adequação da atitude das mulheres com maior renda familiar frente ao exame. Quando se analisou a adequação dos comportamentos estudados em função dos estratos socioeconômicos considerados, observou-se uma proporção significativamente maior de mulheres com conhecimentos e atitudes adequados no estrato de classe média. No que se refere à prática do exame, não foi constatada qualquer associação com a condição socioeconômica das participantes (Tabela 4).

DISCUSSÃO

Constatou-se que 85,0% das mulheres entrevistadas afirmaram ter realizado o exame citológico preventivo pelo menos uma vez na vida, proporção semelhante à observada em São Luiz (MA)4 e na cidade de São Paulo.15 Contudo, quando se toma como parâmetro a recomendação do Ministério da Saúde, de realização do exame pelo menos uma vez a cada três anos, o índice de cobertura observado foi de apenas 64,4%, semelhante ao encontrado para mulheres do Brasil como um todo (66%),19 mas abaixo dos índices de São Paulo (77,3%)15 e Pelotas (68,9%).8 Observou-se, ainda, que 35,6% das mulheres não realizaram o exame com a freqüência preconizada, das quais 15% declararam nunca ter realizado o procedimento, índice similar ao encontrado em mulheres de São Luiz (17,6%),4 São Paulo (13,9%)15 e Campinas (SP) (11,2%).1

As mulheres da área urbana, de classe média, aquelas com maior escolaridade, as solteiras, e as que usam algum método contraceptivo, apresentaram maior adequação do conhecimento sobre o exame. Isso poderia ser explicado pelo maior acesso às informações sobre o exame e mais oportunidades para fazê-lo. No caso das solteiras e as que utilizam algum método contraceptivo, o maior conhecimento adequado pode ser devido ao fato de elas procurarem mais por orientação médica no sentido de evitar gravidez não-planejada.

Apenas 63,3% das mulheres apresentaram atitude adequada frente ao exame de Papanicolaou, fazendo referência às vantagens e benefícios deste procedimento para a sua saúde, informando corretamente a motivação para sua realização periódica. Este índice é semelhante ao relatado para mulheres da África do Sul12 (60,6%) e situa-se acima do observado em mulheres brasileiras16 (45,6%), mas abaixo do relatado para as argentinas6 (80,5%). Dentre as mulheres que apresentaram atitude adequada, 66,9% consideraram necessária a realização periódica do exame para se prevenir do CCU e 33,1% para se prevenir de câncer em geral. Uma parcela significativa das mulheres (36,7%), apesar de considerar necessária a realização do exame, não sabia dos benefícios que ele representa para sua saúde. Isso sugere que, ao serem informadas sobre o exame, elas não foram esclarecidas sobre sua importância, enquanto método de triagem que permite o diagnóstico e tratamento precoce de lesões antes de sua progressão para formas malignas, sendo um recurso indispensável na prevenção do CCU.

As mulheres da área urbana, de classe média, as solteiras, com maior escolaridade e maior renda familiar apresentam atitude mais adequada em relação ao exame. Este achado é semelhante ao relatado para mulheres argentinas6 em relação à escolaridade; para as brasileiras,16 no que se refere à escolaridade e situação conjugal; no que tange à escolaridade e renda familiar.1 Isso se deve, provavelmente, à maior conscientização sobre as vantagens e benefícios da realização periódica do exame, maior acesso às informações e aos serviços de saúde por parte destas mulheres.

A análise do relato feito pelas próprias mulheres em relação à realização do exame apresenta algumas limitações. É possível que algumas delas não saibam fazer a distinção apropriada entre o exame ginecológico e o procedimento de coleta de material para o Papanicolaou. Além disso, o exame pode não ter sido realizado com a finalidade preventiva, mas por motivo de queixas ginecológicas em consulta realizada com finalidade curativa, o que poderia levar a uma estimativa de adesão acima da real. Contudo, em estudo realizado por Kahn et al11 baseado em relatos feitos pelas próprias mulheres, ficou demonstrada a existência de alto grau de validade desta análise.

A oferta do exame de Papanicolaou vista de forma isolada, enquanto medida preventiva do CCU, não é suficiente para garantir a redução do índice de mortalidade entre mulheres por essa patologia. O efeito benéfico esperado do exame depende dos graus de conscientização e adesão à prática deste procedimento, com a periodicidade recomendada pelo Ministério da Saúde. No presente estudo, observou-se que, apesar de 85,0% das entrevistadas terem realizado o exame alguma vez na vida, apenas 64,4% o fizeram com a regularidade desejada. Portanto, apenas essa parcela das mulheres apresentou prática adequada do exame. Esse índice foi o dobro do encontrado na Argentina,6 um pouco acima do relatado na população rural da África do Sul12 e semelhante ao descrito para mulheres de Pelotas.16

Dentre as mulheres que tiveram a prática adequada, a maioria (54,6%) procurou os serviços de saúde de forma espontânea para realizar o exame, tendo como motivação principal a prevenção do CCU. As barreiras mais citadas para a prática do exame foram: descuido (22,1%), não solicitação do médico (7,4%), vergonha (6,3%) o exame incomoda (3,2%) e outros (3,2%), semelhantes às apontadas pelas mulheres argentinas.6

Os melhores índices de adequação da prática do exame foram observados entre as mulheres com maior escolaridade, as que trabalham fora de casa, as que consultam ao médico com maior freqüência, as que tinham vida sexual ativa, as que tiveram entre um e três filhos, e aquelas que utilizam algum método contraceptivo. Isso pode ser devido a maior facilidade de acesso às informações sobre o exame. Por outro lado, as mulheres com vida sexual ativa freqüentam mais os serviços de saúde à procura de métodos para planejamento familiar, ou para fazer os exames do pré-natal e acompanhamento da gestação, no caso das grávidas, sendo, portanto, melhor orientadas a fazerem o exame preventivo do CCU. Resultados semelhantes foram relatados para mulheres argentinas6 no que se refere à maior freqüência de consulta e paridade, e para as de Campinas,1 no que tange a escolaridade.

Diante disso, fica evidente que o médico exerce um papel importante sobre a prática e, conseqüentemente sobre a cobertura do exame de Papanicolaou nas mulheres da comunidade pesquisada. Contudo, parece que a linguagem e/ou metodologia de orientação sobre os objetivos e vantagens da realização periódica deste procedimento, utilizada por estes profissionais, pode não estar sendo suficientemente clara ou adequada para as mulheres que os procuram. No entanto, não podemos descartar que a quantidade de consultas pode ter sido insuficiente para esclarecer todas estas questões, ou que as mulheres entrevistadas não utilizavam adequadamente os serviços de saúde. Tal fato merece atenção dos gestores da saúde do município no sentido de tentar aprimorar a metodologia de trabalho, de modo a permitir um melhor entendimento pelo público sobre o exame, suas vantagens e benefícios para a saúde da mulher, visando a melhorar a adesão, de forma a atender

às recomendações do Ministério da Saúde.

Recebido: 24/6/2008

Revisado: 11/1/2009

Aprovado: 11/2/2009

Pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Ministério da Saúde (Proc. Nº 401060/05-5).

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  • Correspondência | Correspondence:
    José Veríssimo Fernandes
    Depto Microbiologia e Parasitologia - UFRN
    Av. Sen. Salgado Filho, S/N - Lagoa Nova
    59072-970 Natal, RN, Brasil
    E-mail:
  • a
    Ministério da Saúde. Secretaria de Administração a Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. Estimativas 2008: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro; 2007.
  • b
    Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Conhecendo o Viva Mulher. Programa nacional de controle de câncer do colo do útero e da mama. Rio de Janeiro; 2007.
  • c
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mapa base dos municípios do estado do Rio Grande do Norte. Brasília; 2005.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Set 2009
    • Data do Fascículo
      Out 2009

    Histórico

    • Revisado
      11 Jan 2009
    • Recebido
      24 Jun 2008
    • Aceito
      11 Fev 2009
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