Acessibilidade / Reportar erro

Evolução da cardiopatia chagásica crônica humana no sertão do Estado da Paraíba, Brasil, no período de 4,5 anos

Resumos

Foram desenvolvidos dois estudos seccionais sobre a doença de Chagas crônica, com intervalo de 4,5 anos, envolvendo as populações urbanas dos municípios de Água Branca, Catingueira, Emas, Imaculada, Mãe D'Àgua, Olho D'Àgua, Piancó e São José de Caiana, situados na região do Sertão do Estado da Paraíba. A evolução da cardiopatia foi avaliada em um grupo de 125 pares de pacientes chagásicos crônicos e não-chagásicos do mesmo sexo, idade e município de origem, através do exame eletrocardiográfico (ECG) de repouso. Foram considerados os seguintes tipos de evolução: inalterada - quando não havia mudança no padrão inicial do ECG; progressiva - quando havia mudança no padrão do ECG de normal para alterado ou pelo agravamento das alterações e normalização do ECG. No grupo de chagásicos a evolução inalterada ocorreu em 101 (80,8%)pacientes, progressiva em 13 (10,4%) e normalização do ECG em 11 (8,8%), enquanto no grupo de não-chagásicos foram observadas as mencionadas evoluções respectivamente em 117 (93,6%), 6 (4,8%) e 2 (1,6%) pacientes. Com esses dados podemos afirmar que a proporção de participação do componente etiológico exclusivamente chagásico na progressão da cardiopatia chagásica crônica foi de 5,9%, estimando-se uma média anual de 1,3%. Não houve diferença significativa nas freqüências de evolução progressiva em relação ao sexo dos pacientes, tanto no grupo de chagásicos como no de não-chagásicos. Por outro lado, a progressão da cardiopatia ocorreu mais precocemente nos chagásicos. A letalidade por cardiopatia foi 1,6% (2 casos) no grupo de chagásicos e de zero no de não chagásicos, no período considerado. Esses dados sobre a morbimortalidade podem ser considerados significativamente inferiores aos encontrados em áreas endêmicas como Virgem da Lapa e Pains-Iguatama, em Minas Gerais, provavelmente expressando o menor poder patogênico da infecção humana pelo Trypanosoma cruzi no Sertão da Paraíba.

Doença de Chagas; Estudo longitudinal; Cardiopatia chagásica crônica; Estado da Paraíba


Two sectional studies about chronic Chagas' disease were performed at a 4.5 year interval, involving the urban populations of Água Branca, Catingueira, Emas, Imaculada, Mãe D'Água, Olho D'Água, Piancó and São José de Caiana counties in the Sertão region of the State of Paraíba. The evolution of heart disease was evaluated in 125 matched pairs of chronic chagasic and non-chagasic patients of the same sex, age and county of origin through electrocardiograms (ECG) at rest. The following evaluation criteria were considered: unchanged - no change in the original ECG pattern; progressive-changes in ECG pattern from normal to abnormal or deterioration of ECG abnormalities; and ECG normalization. In chagasic patients evolution of the disease was unchanged in 101 (80.8%), progressive in 13 (10.4%) and ECG normalization in 11 (8.8%), while those observed in non-chagasic patients were respectively values 117 (93.6%), 6 (4.8%) and 2 %) patients. Findings indicate that the share of Chagas-linked etiological component affecting the development of chronic Chagas cardiopathy was 5.9% with an estimated annual average of 1.3%. There was no significant difference in the frequency of progressive disease between the sexes either in the chagasic or in the non-chagasic group. On the other hand, progression of heart disease occurred earlier among chagasic patients. Lethality caused by heart disease was 1.6% (2 cases) in the chagasic group and zero in the non- chagasic group during the period under survey. These morbidity and mortality rates were significantly lower than those found in endemic areas such as Virgem daLapa and Pains-Iguatama in the State of Minas Gerais and can probably be attibuted to the weaker pathogenic it of human infection by Trypanosoma cruzi in the Paraiba hinterland.

Chagas' disease; Longitudinal study; Chronic Chagas cardiopathy; State of Paraiba


ARTIGOS

Evolução da cardiopatia chagásica crônica humana no sertão do Estado da Paraíba, Brasil, no período de 4,5 anos

José Borges Pereira; Rivaldo Venâncio da Cunha; Henry P. Faraco Willcox; José Rodrigues Coura

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. José Borges Pereira. Depto. de Medicina Tropical/FIOCRUZ. CR 926 21040 Riode Janeiro, RJ.

RESUMO

Foram desenvolvidos dois estudos seccionais sobre a doença de Chagas crônica, com intervalo de 4,5 anos, envolvendo as populações urbanas dos municípios de Água Branca, Catingueira, Emas, Imaculada, Mãe D'Àgua, Olho D'Àgua, Piancó e São José de Caiana, situados na região do Sertão do Estado da Paraíba. A evolução da cardiopatia foi avaliada em um grupo de 125 pares de pacientes chagásicos crônicos e não-chagásicos do mesmo sexo, idade e município de origem, através do exame eletrocardiográfico (ECG) de repouso. Foram considerados os seguintes tipos de evolução: inalterada - quando não havia mudança no padrão inicial do ECG; progressiva - quando havia mudança no padrão do ECG de normal para alterado ou pelo agravamento das alterações e normalização do ECG. No grupo de chagásicos a evolução inalterada ocorreu em 101 (80,8%)pacientes, progressiva em 13 (10,4%) e normalização do ECG em 11 (8,8%), enquanto no grupo de não-chagásicos foram observadas as mencionadas evoluções respectivamente em 117 (93,6%), 6 (4,8%) e 2 (1,6%) pacientes. Com esses dados podemos afirmar que a proporção de participação do componente etiológico exclusivamente chagásico na progressão da cardiopatia chagásica crônica foi de 5,9%, estimando-se uma média anual de 1,3%. Não houve diferença significativa nas freqüências de evolução progressiva em relação ao sexo dos pacientes, tanto no grupo de chagásicos como no de não-chagásicos. Por outro lado, a progressão da cardiopatia ocorreu mais precocemente nos chagásicos. A letalidade por cardiopatia foi 1,6% (2 casos) no grupo de chagásicos e de zero no de não chagásicos, no período considerado. Esses dados sobre a morbimortalidade podem ser considerados significativamente inferiores aos encontrados em áreas endêmicas como Virgem da Lapa e Pains-Iguatama, em Minas Gerais, provavelmente expressando o menor poder patogênico da infecção humana pelo Trypanosoma cruzi no Sertão da Paraíba.

Palavras-chave: Doença de Chagas. Estudo longitudinal. Cardiopatia chagásica crônica. Estado da Paraíba.

ABSTRACT

Two sectional studies about chronic Chagas' disease were performed at a 4.5 year interval, involving the urban populations of Água Branca, Catingueira, Emas, Imaculada, Mãe D'Água, Olho D'Água, Piancó and São José de Caiana counties in the Sertão region of the State of Paraíba. The evolution of heart disease was evaluated in 125 matched pairs of chronic chagasic and non-chagasic patients of the same sex, age and county of origin through electrocardiograms (ECG) at rest. The following evaluation criteria were considered: unchanged — no change in the original ECG pattern; progressive-changes in ECG pattern from normal to abnormal or deterioration of ECG abnormalities; and ECG normalization. In chagasic patients evolution of the disease was unchanged in 101 (80.8%), progressive in 13 (10.4%) and ECG normalization in 11 (8.8%), while those observed in non-chagasic patients were respectively values 117 (93.6%), 6 (4.8%) and 2 %) patients. Findings indicate that the share of Chagas-linked etiological component affecting the development of chronic Chagas cardiopathy was 5.9% with an estimated annual average of 1.3%. There was no significant difference in the frequency of progressive disease between the sexes either in the chagasic or in the non-chagasic group. On the other hand, progression of heart disease occurred earlier among chagasic patients. Lethality caused by heart disease was 1.6% (2 cases) in the chagasic group and zero in the non- chagasic group during the period under survey. These morbidity and mortality rates were significantly lower than those found in endemic areas such as Virgem daLapa and Pains-Iguatama in the State of Minas Gerais and can probably be attibuted to the weaker pathogenic it of human infection by Trypanosoma cruzi in the Paraiba hinterland.

Keywords: Chagas' disease. Longitudinal study. Chronic Chagas cardiopathy. State of Paraiba.

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

Recebido para publicação em 10/01/90.

Instituto Oswaldo Cruz/FIOCRUZ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

  • 1. Alcantara A, Baruffa G, Aquino Neto JO, Olhinto A, Salvodi T, Lassen C. Epidemiologia da doença de Chagas no RS - Revisão de pacientes após 10 anos de evolução. I - Metodologia. II - Grupo chagásico. III - Grupo controle. Anais do XIX Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Rio de Janeiro, p 35-37, 1983.
  • 2. Brasil A. A mutabilidade electrocardiográficana cardiopatia crônica chagásica. Revista da Associação Médica de Minas Gerais 4: 149-152, 1953.
  • 3. Castro CN. Influência da parasitemia no quadro clínico da doença de Chagas. Revista de Patologia Tropical 9: 73-136, 1980.
  • 4. Coura JR, Abreu LL, Pereira JB, Willcox HP. Morbidade da doença de Chagas. IV Estudo longitudinal de dez anos em Pains e Iguatama, Minas Gerais, Brasil. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 80: 73-80, 1985.
  • 5. Dias JCP. Doença de Chagas em Bambu!, Minas Gerais, Brasil. Estudo clínico-epidemiológico a partir da fase aguda, entre 1940 e 1982. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1982.
  • 6. Dias JCP, Kloetzel K. The prognostic value of the electrocardiographic features of chronic Chagas' disease. Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo 10: 158-162, 1968.
  • 7. Macedo VO. Influência da exposição à reinfecção na evolução da doença de Chagas (estudo longitudinal de cinco anos). Revista de Patologia Tropical 5: 33-116, 1976.
  • 8. Maguire JH, Mott KE, Hoff R, Guimarães A, Franca JT, Souza JAA, Ramos NB, Sherlock IA. A three-year follow-up study of infection with Trypanosoma cruzi and electrocardiographic abnormalities in a rural community in Northeast Brazil. The American Journal of Tropical Medicine and Hygiene 31: 42-47, 1982.
  • 9. Moleiro F, Pifano CF, Anselmi A, Ruesta V. La dinâmica epidemiológica de la enfermedad de Chagas en el Valle de los Naranjos, Estado Carabobo, Venezuela. Archivos Venezoelanos de Medicina Tropical y Parasitología Médica V: 47-83, 1973.
  • 10. NYHA (New York Heart Association). Nomenclature and criteria for diagnosis of disease of the heart and great vessels. 7th Ed. Little and Brow Company, Boston, 1973.
  • 11. Pereira JB, Coura JR. Morbidade da doença de Chagas em populações urbanas do Sertão da Paraíba. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 20:101-107, 1987.
  • 12. Pereira JB, Willcox HP, Coura JR. Morbidade da doença de Chagas. III - Estudo longitudinal de seis anos em Virgem da Lapa, MG, Brasil. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 80: 63:71, 1985.
  • 13. Prata A. Prognóstico e complicações da doença de Chagas. Revista Goiana de Medicina 5: 87-96, 1959.
  • 14. Puigbó JJ, Rhode JRN, Barrios HG, Yépez CG. Cuatro anos de estúdio longitudinal de una comunidad rural con endemicidad chagásica. Boletín de La Oficina Sanitaria Panamericana 66: 112-120, 1969.
  • 15. Sheps MC. An examination of some methods of comparing several rates of proportions. Biometrics 15:87-97, 1959.
  • Endereço para correspondência:

    Dr. José Borges Pereira.
    Depto. de Medicina Tropical/FIOCRUZ.
    CR 926
    21040
    Riode Janeiro, RJ.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Set 1990

    Histórico

    • Aceito
      10 Jan 1990
    • Recebido
      10 Jan 1990
    Sociedade Brasileira de Medicina Tropical - SBMT Caixa Postal 118, 38001-970 Uberaba MG Brazil, Tel.: +55 34 3318-5255 / +55 34 3318-5636/ +55 34 3318-5287, http://rsbmt.org.br/ - Uberaba - MG - Brazil
    E-mail: rsbmt@uftm.edu.br