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Antipsicóticos atípicos na depressão refratária

Atypical antipsychotics in treatment refractory depression

CONFERÊNCIA CLÍNICA

Antipsicóticos atípicos na depressão refratária

Atypical antipsychotics in treatment refractory depression

Luciana Maria Sarin; José Alberto Del Porto

Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola Paulista de Medicina, Departamento de Psiquiatria, Programa de Doenças Afetivas (Prodaf), Centro de Estimulação Cerebral (CEC)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Luciana Maria Sarin Rua Dr. Diogo de Faria, 1087, cj. 409 04037-003 - São Paulo, SP

A depressão resistente continua sendo um grande desafio para a psiquiatria. A literatura atual demonstra que 30% a 40% dos pacientes deprimidos não respondem ao tratamento com antidepressivos, mesmo em uso de doses e duração adequadas1,2, 60% a 70% não conseguem atingir remissão completa3, mais de 20% não se recuperam após dois tratamentos4 e 10% continuam deprimidos apesar de múltiplas intervenções5. Esses dados indicam a importância da busca de novas alternativas de tratamento, já que apenas pequeno número dos pacientes tratados atinge remissão.

Além disso, a remissão parcial de episódios depressivos está relacionada a um pior prognóstico. Os sintomas residuais estão associados a maior risco de recaída7, à presença de sintomas físicos6 e a prejuízo do funcionamento social4. Assim, a remissão deve ser a meta do tratamento, pois somente livre de sintomas o paciente conseguirá recuperar seu funcionamento pré-mórbido.

DEFINIÇÃO E CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS

A identificação de características comuns aos pacientes que não respondem aos tratamentos com antidepressivos é dificultada pela multiplicidade de definições de resistência. Da mesma forma, não há definição adequada em relação à dose, à titulação e à duração do tratamento. A ausência de um modelo de estadiamento universalmente aceito que descreva adequadamente a falha ao tratamento e grau de resistência leva a inúmeras variações nas definições de depressão refratária, com consequente dificuldade no estabelecimento de uma proposta de algoritmo para essa condição. Berlim e Turecki8, em revisão recente sobre definições e critérios de depressão refratária, demonstraram a falta de consenso na literatura no que diz respeito à definição da síndrome depressiva e à responsividade ao tratamento.

Até hoje mais de 15 definições de depressão refratária já foram propostas5. A literatura tende a ver a resistência ao tratamento ocorrer ao longo de um continuum, isto é, desde a ausência de resposta a uma classe de antidepressivo até a falha de resposta a diferentes classes e a eletroconvulsoterapia. Nierenberg et al.9 propuseram um modelo no qual a depressão resistente seria um episódio de depressão maior que persiste apesar de qualquer tratamento com antidepressivos, em dose e tempo de duração adequados; nesse modelo o número de tratamentos malsucedidos é usado para medir o grau de resistência do quadro. A classificação de Thase e Rush2 propõe um modelo hierárquico, com cinco estágios de resistência, que variam desde resistência a um único antidepressivo (estágio I) até resistência a diferentes classes de antidepressivos e a eletroconvulsoterapia bilateral (estágio V).

A classificação do Massachusetts General Hospital (MGH) é um modelo mais quantitativo quando comparado ao método de Thase e Rush, em que o grau de resistência ao tratamento é obtido por meio de um escore dado ao número de falhas nos tratamentos, que devem ter duração mínima de seis semanas. Aqui não é considerada a superioridade de uma classe de antidepressivos em relação à outra e são incluídas estratégias de potencialização e combinação na avaliação do grau de resistência10.

Outra classificação recente, publicada por Fekadu et al.11, o Maudsley Staging Method, propõe um modelo multidimensional de estadiamento da depressão resistente ao tratamento, baseado em três fatores: tratamento, severidade da doença (escore 1 a 5, desde depressão subsindrômica até depressão grave com sintomas psicóticos) e duração do episódio atual. O grau de resistência varia de resistência mínima (escore 3) até resistência severa (escore 15).

A falha na resposta ao tratamento é sem dúvida o elemento nuclear da depressão refratária. Entretanto, devem ser levados em conta também fatores que estão envolvidos no desenvolvimento da resistência ao tratamento, como duração e gravidade da doença, tipo de depressão, assim como o papel dos estressores psicossociais, para que seja possível melhor entendimento dessa condição complexa.

USO DE ANTIPSICÓTICOS ATÍPICOS COMO ESTRATÉGIA DE POTENCIALIZAÇÃO NA DEPRESSÃO REFRATÁRIA

Na tentativa de melhorar a eficácia dos antidepressivos, várias estratégias farmacológicas são comumente usadas, apesar das poucas evidências na literatura, tais como a substituição de antidepressivos ou a associação de dois antidepressivos. A potencialização é outra estratégia para aumentar a eficácia do tratamento, na qual se associa uma medicação que não seja um antidepressivo para intensificar o efeito do medicamento antidepressivo. Sua utilização se aplica às situações em que houve uma resposta parcial ao antidepressivo e tem como vantagens o início de ação mais rápido, a ausência de sintomas de descontinuação e a manutenção do efeito terapêutico da medicação inicial. As desvantagens residem na interação entre as drogas e na redução da aderência ao tratamento, em virtude da adição de mais um medicamento12. Os agentes mais comumente usados na potencialização dos antidepressivos são o lítio e os hormônios tireoidianos, porém as crescentes evidências na literatura da eficácia dos antipsicóticos atípicos fazem com que essa classe seja cada vez mais considerada no tratamento da depressão refratária13.

MECANISMO DE AÇÃO

Os antipsicóticos típicos (haloperidol, por exemplo) exercem predominantemente um bloqueio do receptor dopaminérgico. Por outro lado, os antipsicóticos atípicos são relativamente fracos antagonistas D2. Os benefícios nos transtornos do humor devem estar relacionados aos seus efeitos nos receptores serotoninérgicos (5HT). Todos bloqueiam os receptores 5HT2A e 5HT2C. O bloqueio do receptor 5HT2A produz uma série de efeitos complexos que são relevantes em termos da ação antidepressiva. O bloqueio desses receptores tem ação nos sintomas residuais de depressão e ansiedade.

A olanzapina é um modesto antagonista D2 (Ki = 11 nmol⁄l) e exerce um bloqueio mais potente em 5HT2A (Ki = 2,5). Além disso, faz também uma inibição significativa em 5HT2C e 5HT3, assim como nos receptores de norepinefrina (NE) alpha1, receptores colinérgicos muscarínicos e receptores histaminérgicos-1. Esse perfil de bloqueio D2 relativamente fraco e um antagonismo mais potente em 5HT2A é a característica essencial dos atípicos. O bloqueio de ambos os receptores 5HT2A e 5HT6, ante o bloqueio D2 fraco, aumenta a liberação de dopamina e, além disso, tanto a liberação de norepinefrina como a de dopamina também são aumentadas pelo bloqueio de 5HT2C e ativação do receptor 5HT1A (como é observado no aripiprazol e na ziprasidona, que também são potentes agonistas parciais dos receptores 5HT1A). O aumento da liberação de norepinefrina e de dopamina no córtex frontal e no núcleo accumbens melhora a motivação e a atenção, sintomas comuns na depressão. O efeito dos antipsicóticos atípicos nas catecolaminas deve também contrabalançar a supressão que os ISRS exercem na atividade do locus ceruleus (principal fonte de norepinefrina) e na área tegumento-ventral (dopamina extraestriatal)14.

EFEITOS CLÍNICOS DOS ANTIPSICÓTICOS ATÍPICOS NA DEPRESSÃO REFRATÁRIA

O uso dos antipsicóticos atípicos em baixas doses aumenta de forma significativa a resposta aos antidepressivos nas depressões resistentes, não apenas nas depressões bipolares ou naquelas com características psicóticas. Cada um desses agentes foi estudado e apresentou eficácia como estratégia de potencialização. Papakostas et al.15 publicaram uma metanálise de dez estudos duplo-cegos, randomizados e placebo-controlados de olanzapina, quetiapina e risperidona em associação com antidepressivos para o tratamento de depressão resistente. Foram encontradas taxas de resposta e remissão 25% maiores nos grupos que usaram antipsicóticos em associação com antidepressivos quando comparados àqueles que usaram placebo. Por outro lado, a taxa de abandono do tratamento causado por efeitos colaterais foi três vezes maior nos grupos que usaram antipsicóticos.

Olanzapina

Shelton et al.16 demonstraram em 2001, num estudo controlado com placebo, a eficácia e superioridade da combinação olanzapina/fluoxetina quando comparada a olanzapina e fluoxetina em monoterapia. Inicialmente os pacientes foram tratados com fluoxetina 60 mg/dia, e aqueles que atingiram melhora caracterizada por redução mínima de 30% dos sintomas depressivos foram excluídos da segunda fase do estudo. Os pacientes foram randomizados para olanzapina e placebo (n = 8), continuando com fluoxetina e placebo (n = 10), ou olanzapina e fluoxetina (n = 10). O tratamento combinado resultou em melhora significante desde a primeira semana até a oitava e última semana do estudo.

Thase et al.17, em dois estudos duplos-cegos, compararam a combinação olanzapina/fluoxetina com olanzapina ou fluoxetina em monoterapia, em pacientes com depressão resistente. Foram selecionados 1.313 pacientes que não responderam previamente aos seguintes antidepressivos: paroxetina (40 mg/dia), venlafaxina (150 mg/dia), bupropion (300 mg/dia) e trazodona (450 mg/dia), durante pelo me-nos seis semanas no episódio atual. Na fase prospectiva do estudo os pacientes foram tratados com fluoxetina de 25 a 50 mg/dia durante oito semanas, para estabelecer a resistência a essa medicação. Na fase duplo-cega 605 pacientes foram randomizados em três grupos: olanzapina 6 mg com fluoxetina 50 mg (n = 200), fluoxetina 50 mg (n = 205), olanzapina 6 mg (n = 199). A cada duas semanas de tratamento a dose de olanzapina poderia ser aumentada para 12 ou 18 mg, na ausência de resposta, e 441 pacientes completaram essa etapa. O grupo da combinação olanzapina/fluoxetina apresentou melhora significativamente maior do que aqueles pacientes em monoterapia de fluoxetina ou olanzapina ao longo de todo estudo, com taxas de resposta de 40% e taxas de remissão de 27% e início de ação mais rápido (seis dias). Os pacientes foram divididos em dois grupos, os que não responderam aos ISRS e um grupo que não respondeu a outras classes de antidepressivos. A combinação olanzapina/fluoxetina mostrou-se mais efetiva no grupo dos pacientes que não responderam aos ISRS. Os efeitos adversos secundários a essa combinação, tais como ganho de peso e síndrome metabólica, sempre devem ser considerados, levando-se em conta também a resposta prévia a outras drogas, severidade da doença, risco de suicídio e necessidade de rápido alívio dos sintomas.

Quetiapina

O primeiro estudo duplo-cego controlado com placebo com quetiapina como coadjuvante no tratamento da depressão refratária foi realizado por McIntyre et al.18, que avaliaram 58 pacientes que não apresentaram remissão dos sintomas depressivos após tratamento com ISRS ou venlafaxina. Os pacientes foram randomizados de modo duplocego para receber associação com quetiapina ou placebo durante oito semanas. A dose inicial de 50 mg/dia foi aumentada após sete dias para 100 mg/dia e a partir do 14º dia do estudo, para 200 mg/dia; a dose média foi de 189 mg/dia. A partir de então a dose foi aumentada a critério do investigador, até um máximo de 600 mg/dia. Dezoito dos 29 pacientes tratados com quetiapina e 16 dos 29 pacientes tratados com placebo completaram o estudo. A adição de quetiapina resultou em redução rápida nos sintomas de depressão, ansiedade e sintomas residuais. As taxas de resposta e remissão foram duas vezes maiores no grupo da quetiapina quando comparado ao placebo. Na escala de Hamilton para depressão as taxas de resposta foram de 48% e 24%, respectivamente, enquanto as taxas de remissão foram de 31% e 17%. Na escala de Hamilton para ansiedade as taxas de resposta foram de 62% e 28%, respectivamente, enquanto as taxas de remissão foram de 41% e 17%. O início de ação rápido alcançou significância estatística em relação ao placebo já na primeira semana de tratamento.

Esses resultados são compatíveis com estudos anteriores que sugeriram que a quetiapina tem um espectro amplo de ação, tendo utilidade tanto no tratamento da depressão bipolar em monoterapia19,20 como na depressão unipolar, como coadjuvante de ISRS/venlafaxina21-23 .

Doree et al. 24 realizaram um estudo aberto com duração de oito semanas, em que a potencialização com quetiapina (dose média = 400 mg/dia) foi comparada com a potencialização com lítio (litemia média = 0,78 mol/l) em 20 pacientes que responderam parcialmente aos antidepressivos. O grupo da quetiapina apresentou melhora significativamente maior em relação ao grupo do lítio após a primeira semana de tratamento, e essa diferença foi mantida até o final do estudo.

Aripiprazol

O aripiprazol é o único antipsicótico atípico aprovado até o momento pelo FDA (Food and Drug Administration) como agente de potencialização de antidepressivos no tratamento da depressão resistente.

Papakostas et al. 25 realizaram um estudo prospectivo aberto durante 8 semanas, no qual avaliaram 12 pacientes que apresentaram resposta parcial aos ISRS. Aqueles que estavam em uso de citalopram, escitalopram ou sertralina receberam aripiprazol 15 mg/dia, enquanto aqueles que estavam com fluoxetina ou paroxetina receberam aripiprazol 10 mg/dia. As doses de aripiprazol foram aumentadas até 30 mg/dia a critério clínico. A associação do aripiprazol atingiu taxas de 53% de resposta e 33% de remissão.

Berman et al.26 demonstraram, num estudo multicêntrico controlado com placebo, a eficácia do aripiprazol na potencialização de antidepressivos. O estudo avaliou 1.044 pacientes que não responderam a pelo menos um e no máximo três antidepressivos no episódio atual e apresentaram um escore na escala de Hamilton > 18. Foram selecionados para a fase prospectiva do estudo 781 pacientes que durante 8 semanas foram tratados com escitalopram (10 a 20 mg/dia), fluoxetina (20 a 40 mg/dia), sertralina (100 a 150 mg/dia), paroxetina CR (37,5 a 50 mg/dia), venlafaxina XR (150 a 225 mg/dia). A escolha do antidepressivo usado foi do investigador, com base na história de tratamentos anteriores e na tolerabilidade do paciente. Terminaram a fase prospectiva 622 pacientes e desses apenas 42% apresentaram resposta, caracterizada pela redução mínima de 50% dos escores da escala de Hamilton. Entraram na fase cega do estudo 362 pacientes que atingiram apenas melhora < 50% na escala de Hamilton ao final da fase prospectiva e apresentaram um escore na escala de Hamilton > 14 e escore de na escala CGI > 3. Esses pacientes foram randomizados para associação de placebo (n = 178) ou aripiprazol (n = 184), com doses de 2 a 15 mg/dia com fluoxetina ou paroxetina e 2 a 20 mg/dia com os demais antidepressivos, durante 6 semanas. A partir da segunda semana de tratamento houve separação dos 2 grupos, com significância estatística, demonstrando o rápido início de ação dessa estratégia de potencialização. Aproximadamente metade dos pacientes que completaram o estudo e responderam à associação com aripiprazol usaram doses < 10 mg/dia, sugerindo que a dose necessária na depressão resistente é menor do que as doses usadas no tratamento da esquizofrenia e do transtorno bipolar. A taxa de remissão alcançada foi de 26%, isto é, um quarto dos pacientes resistentes a até quatro tratamentos com antidepressivos responderam à potencialização com aripiprazol. Se for considerado que cada tratamento malsucedido diminui a chance de alcançar remissão do episódio depressivo, a taxa de 26% é bastante favorável, pois os pacientes do estudo foram submetidos a pelo menos dois tratamentos antes do uso da associação, que corresponderia ao grau 3 de resistência do estudo STAR*D, em que a taxa de remissão atingida foi de 14% (Rush et al., 2006). Não foi possível analisar as diferenças entre os antidepressivos, por causa do tamanho pequeno das amostras de cada antidepressivo e, portanto, não foi possível alcançar uma significância estatística.

Marcus et al.27 replicaram os achados positivos do estudo de Berman descrito anteriormente e também demonstraram que o aripiprazol é superior ao placebo na remissão de sintomas depressivos em pacientes que não responderam à monoterapia com antidepressivos. A amostra inicial foi de 1.151 pacientes, dos quais 830 foram incluídos na fase prospectiva e 651 terminaram essa etapa do estudo. Na fase duplo-cego foram incluídos 381 pacientes, randomizados para associação de placebo (n = 190) ou aripiprazol (n = 191). As taxas de remissão foram significativamente maiores com a associação de aripiprazol quando comparado ao placebo (25,4% versus 15,2%; p = 0,016), assim como as taxas de resposta (32,4% versus 17,4%; p < 0,001).

Esses dois estudos demonstraram a eficácia e a segurança do aripiprazol como estratégia de potencialização no tratamento da depressão refratária aos antidepressivos em pacientes sem características psicóticas.

Risperidona

O primeiro relato da efetividade dos antipsicóticos atípicos na depressão refratária foi realizado com a risperidona por Ostroff e Nelson28 em 1999, que relataram uma série de oito casos que não responderam a ISRS e receberam risperidona, apresentando rápida melhora.

Estudos abertos de curta duração demonstraram a eficácia da risperidona em associação com citalopram, mas a prevenção de recaída não apresentou diferenças significativas em relação ao placebo. Rapaport et al.29 avaliaram, num estudo aberto prospectivo, pacientes com melhora inferior a 50% dos sintomas após quatro semanas de tratamento com ISRS. Foi feita potencialização com risperidona e os pacientes atingiram 63% de remissão dos sintomas (HAM-D < 7) após seis semanas. Na fase duplo-cego do estudo, com duração de 24 semanas, foi avaliada a prevenção de recaída nos pacientes em remissão, com uso contínuo de risperidona. Não houve nesse grupo aumento do tempo de recaída quando comparado ao placebo.

Mahmoud et al.30 realizaram um estudo multicêntrico, duplo-cego, randomizado e controlado com placebo para avaliar se a potencialização com risperidona reduziria os sintomas e aumentaria a resposta ao antidepressivo. Foram avaliados 274 pacientes ambulatoriais com transtorno depressivo maior que apresentaram resposta parcial ao antidepressivo (citalopram, escitalopram, fluoxetina, paroxetina, sertralina, mirtazapina, venlafaxina, bupropiona, trazodona) após quatro semanas. Esses pacientes foram randomizados para a associação com placebo ou com risperidona 1 mg/dia. Após quatro semanas a risperidona foi aumentada para 2 mg/dia em alguns casos. As taxas de remissão com risperidona foram duas vezes mais altas do que aquelas observadas com placebo (24,5% versus 10,7%; P _ 0,004), assim como em relação à resposta (46,2% versus 29,5%; P _ 0,004). Houve redução da incapacitação e melhora da qualidade de vida, o que sugere que tenha havido um benefício na vida profissional, familiar e social. A rapidez do início da resposta também foi um fator relevante, pois já na primeira semana de tratamento houve melhora com significância estatística em várias medidas, que se mostrou contínua ao longo do estudo. Farabaugh et al. (2005) relataram que a melhora precoce (na primeira semana) pode ser um fator preditivo em termos de remissão, que é meta do tratamento.

Os achados desses estudos sugerem o benefício do uso em curto prazo (seis semanas) da potencialização com risperidona para pacientes deprimidos com resposta parcial a antidepressivos. Os benefícios do tratamento contínuo de longo prazo para os pacientes que atingiram remissão ainda são incertos, assim como a dose e a duração adequadas, havendo, portanto, necessidade de novas pesquisas para maior esclarecimento sobre esse tipo de conduta nos pacientes refratários.

Ziprasidona

A ziprasidona, por causa de sua ação agonista do receptor 5-HT1A (além do antagonismo em D2, 5HT2A e 5HT2C), tem efeito contra a ansiedade, de forma semelhante à buspirona.

Papakostas et al.31 avaliaram, num estudo aberto com duração de 6 semanas, 20 pacientes com transtorno depressivo maior que não responderam ao tratamento com ISRS. Eles foram tratados com ziprasidona em doses que variaram de 40 mg a 80 mg duas vezes ao dia. Dez pacientes (50%) obtiveram resposta (50% de melhora na escala HAMD-17) e 5 remitiram (25%).

Dunner et al.32 realizaram um estudo randomizado, aberto, em pacientes que não responderam a antidepressivos, tratados prospectivamente com sertralina, em doses de 100-200 mg/dia durante seis semanas. Aqueles que não atingiram 30% ou mais de mudança na escala MADRS foram randomizados para continuar com sertralina, sertralina em associação com ziprasidona 80 mg/dia ou sertralina em associação com ziprasidona 160 mg/dia, durante oito semanas. A melhora foi maior nos dois grupos de potencialização com ziprasidona (80 e 160 mg/dia) do que no grupo de monoterapia com sertralina, porém não foi atingida uma significância estatística. As taxas de resposta foram de 19%, 32% e 10%, e as de remissão foram de 5%, 21% e 5%, respectivamente. Apesar de os dados serem sugestivos de um possível benefício, os resultados não são conclusivos em relação à ziprasidona como agente de potencialização na depressão refratária.

CONCLUSÃO

Após séries positivas de relatos de casos com amostras pequenas, foram realizados alguns estudos com resultados conflitantes. Mais recentemente, no entanto, estudos realizados com grandes amostras comprovaram a eficácia de pelo menos alguns dos antipsicóticos atípicos no tratamento da depressão refratária.

Essa revisão resumiu os principais dados existentes na literatura atual que demonstram a eficácia dos antipsicóticos atípicos em pacientes com depressão resistente.

A grande questão em relação a esses agentes são os sérios efeitos colaterais em longo prazo, como síndrome metabólica e ganho de peso, que são associados principalmente à olanzapina, à quetiapina e à risperidona. Além disso, há a discinesia tardia, que deve ser levada em consideração, apesar do menor risco associado aos antipsicóticos atípicos33. A hiperprolactinemia também é um problema potencial com a risperidona, altas doses de olanzapina e pelo menos transitória com a ziprasidona34.

São necessários novos estudos prospectivos, de longa duração, que comparem os diferentes antipsicóticos entre si e com os agentes clássicos de potencialização (lítio, hormônios tireoidianos), em relação à eficácia desses agentes no tratamento da depressão resistente ante os seus efeitos colaterais a médio e longo prazo.

Recebido em 2/3/2009

Aprovado em 10/3/2009

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  • Endereço para correspondência:
    Luciana Maria Sarin
    Rua Dr. Diogo de Faria, 1087, cj. 409
    04037-003 - São Paulo, SP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Ago 2009
    • Data do Fascículo
      2009
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