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Tentativas de suicídio e suicídios na atenção pré-hospitalar

Suicide attempts and suicides in the pre-hospital care

RESUMO

Objetivo

Caracterizar as tentativas de suicídio e suicídios ocorridos em um município do noroeste do Estado do Paraná, atendidos em serviço pré-hospitalar.

Métodos

Estudo descritivo, transversal, dos registros de atendimentos pré-hospitalares de 257 vítimas de tentativa de suicídio e suicídio, no período de 2005 a 2012, por meio de análise bidimensional por qui-quadrado.

Resultados

Ocorreram 180 tentativas de suicídio e 76 suicídios. A idade variou de 13 a 93 anos, com média de 33,5 ± 15,1 anos e maior prevalência na população jovem do sexo masculino. As ocorrências se concentraram nos meses da primavera e verão, na zona urbana. O uso de objeto cortante foi o método mais empregado, seguido por intoxicação e precipitação de locais elevados.

Conclusão

Conhecer características, métodos e fatores agravantes fornecem subsídios para implementação de medidas de prevenção.

Tentativa de suicídio; suicídio; assistência pré-hospitalar; epidemiologia

ABSTRACT

Objective

To characterize suicide attempts and suicides in a city in Northwestern Paraná State, attended in the pre-hospital care.

Methods

Descriptive, cross-sectional study, performed with pre-hospital care records to 257 victims of suicide and suicide attempt, in the period in 2005 to 2012, through two-dimensional analysis by chi-square.

Results

There were 180 attempted suicides and 76 suicides. The age ranged 13-93 years, mean 33.5 ± 15.1 years and most prevalent in young male population. The events concentrated on the months of spring and summer, in the urban area. The use of biting object was the most used method, followed by poisoning and precipitation high places.

Conclusion

To know the characteristics, methods and aggravating factors provide subsidies for the implementation of prevention measures.

Suicide attempted; suicide; pre-hospital care; epidemiology

INTRODUÇÃO

O suicídio se tornou uma epidemia de proporções globais, com aumento de 60% da mortalidade por essa causa nos últimos 45 anos11. Carmona-Navarro MC, Pichardo-Martinez MC. Attitudes of nursing professionals towards suicidal behavior: influence of emotional intelligence. Rev Latino-Am Enfermagem. 2012;20(6):1161-8.

2. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.
-33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22.. Dentre as causas externas, as lesões autoprovocadas voluntariamente estão entre as três principais causas de morte no mundo para todas as idades, superadas apenas pelos homicídios, e 75% dos casos são registrados em países emergentes e pobres22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.,44. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil, Rio de Janeiro. Cad Saude Publica. 2009;25(12):2632-8..

Estudos afirmam que, mundialmente, 900 mil pessoas cometem suicídio por ano, com um óbito a cada 40 segundos e uma tentativa de suicídio a cada três segundos11. Carmona-Navarro MC, Pichardo-Martinez MC. Attitudes of nursing professionals towards suicidal behavior: influence of emotional intelligence. Rev Latino-Am Enfermagem. 2012;20(6):1161-8.,33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22.. O gasto com o suicídio, estimado em termos de DALYs – disability-adjusted-life-years (anos de vida ajustados por incapacidade), é equiparado ao valor destinado às guerras, com oneração dos cofres públicos em quase o dobro do valor gasto para o tratamento de algumas doenças crônicas22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000..

No Brasil, segundo o Mapa da Violência de 2014, foi observado importante incremento das taxas de suicídio, aumentando de 4,4 óbitos por 100 mil habitantes em 2002 para 5,3 em 2012. Destaca-se que, nesse período, o aumento percentual das taxas de suicídio mais acentuado foi constatado entre 2011 a 2012 (3,9%). A região Sul do país registrou 8,5 suicídios por 100 mil habitantes em 2012 e o Estado do Paraná ocupa o nono lugar em suicídios entre os Estados brasileiros – 6,0 óbitos por 100 mil habitantes em 2012, com crescimento de 5,7% de 2011 a 201244. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil, Rio de Janeiro. Cad Saude Publica. 2009;25(12):2632-8.,55. Waiselfisz JJ. Mapa da Violência 2014. Os Jovens do Brasil. Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2014/Mapa2014_JovensBrasil.pdf. Acesso em: 5 abr. 2015.
http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf201...
.

É preciso também levar em consideração a relevância das tentativas de suicídio, pois, mesmo sendo considerada muitas vezes uma injúria com baixa intencionalidade de morte e com possibilidade de intervenção para diminuir e evitar as mortes por suicídio, esse evento causa um forte impacto social11. Carmona-Navarro MC, Pichardo-Martinez MC. Attitudes of nursing professionals towards suicidal behavior: influence of emotional intelligence. Rev Latino-Am Enfermagem. 2012;20(6):1161-8.,66. D’Oliveira CF, Botega NJ (org.) Prevenção do Suicídio – Manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde – Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio, 2006. p. 74. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_editoracao.pdf. Acesso em: 10 abr. 2015..

A associação entre o número de tentativas de suicídio e o curto intervalo entre uma tentativa e outra é responsável pelo aumento do risco de suicídio77. Vidal CEL, Gontijo ECDM, Lima LA. Tentativas de suicídio: fatores prognósticos e estimativa do excesso de mortalidade. Cad Saude Publica. 2013;29(1):175-87.. É preciso considerar que, após sobreviver a um ato suicida, as pessoas tornam-se mais vulneráveis a novas tentativas de suicídio88. Devries KM, Mak J, Bacchus LJ, Child JC, Falder G, Petzold M, et al. Intimate partner violence and incident depressive symptoms and suicide attempts: a systematic review of longitudinal studies. PLoS Med. 2013;10(5):e1001439.. Estima-se que 30% a 60% das pessoas atendidas em unidades de emergência por tentativa de suicídio haviam praticado tentativas anteriores, e comumente 10% a 25% farão novas tentativas em menos de um ano33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22.,77. Vidal CEL, Gontijo ECDM, Lima LA. Tentativas de suicídio: fatores prognósticos e estimativa do excesso de mortalidade. Cad Saude Publica. 2013;29(1):175-87..

A intenção suicida e o suicídio são problemas complexos que resultam da interação de fatores sociais, biológicos, genéticos, psiquiátricos, socioeconômicos e culturais11. Carmona-Navarro MC, Pichardo-Martinez MC. Attitudes of nursing professionals towards suicidal behavior: influence of emotional intelligence. Rev Latino-Am Enfermagem. 2012;20(6):1161-8.,33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22.. Desemprego, problemas legais ou trabalhistas, vulnerabilidade social, problemas familiares e conjugais, vivências traumáticas, violência intrafamiliar, alcoolismo e uso de outras drogas, transtornos mentais e psicológicos, e condições clínicas incapacitantes são relacionados como fatores associados à incapacidade psíquica de administrar os problemas22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.,66. D’Oliveira CF, Botega NJ (org.) Prevenção do Suicídio – Manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde – Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio, 2006. p. 74. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_editoracao.pdf. Acesso em: 10 abr. 2015..

Enquanto em países desenvolvidos o número de casos de suicídio começa a diminuir, o mesmo não acontece em nações em desenvolvimento, onde o aumento observado na frequência do comportamento suicida deveria indicar sinal de alerta22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.. No Brasil, embora se tenha conhecimento sobre as diretrizes nacionais para prevenção de suicídio elaborada pelo Ministério da Saúde, esse agravo recebe pouca atenção de políticas públicas de saúde, com ausência de estratégias nacionais que debatam o assunto e proponham ações efetivas no sistema de saúde pública55. Waiselfisz JJ. Mapa da Violência 2014. Os Jovens do Brasil. Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2014/Mapa2014_JovensBrasil.pdf. Acesso em: 5 abr. 2015.
http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf201...
-66. D’Oliveira CF, Botega NJ (org.) Prevenção do Suicídio – Manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde – Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio, 2006. p. 74. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_editoracao.pdf. Acesso em: 10 abr. 2015..

Considerando que o suicídio demanda ações multidisciplinares e intersetoriais de enfrentamento, registros locais confiáveis quanto às ocorrências de tentativas de suicídio e óbitos por suicídio são primordiais, pois o desconhecimento da situação e das características sociodemográficas dos sujeitos em nível local é um obstáculo ao planejamento efetivo de serviços de prevenção e assistência99. Bertolote JM, Santos CM, Botega NJ. Detecção do risco de suicídio nos serviços de emergência psiquiátrica. Rev Bras Psiquiatr. 2010;32(Supl II):S87-9..

A utilização de dados advindos dos serviços de atendimento pré-hospitalar, definidos como o atendimento que chega precocemente às vítimas, garantindo atendimento e/ou transporte adequado a um serviço integrado ao Sistema Único de Saúde99. Bertolote JM, Santos CM, Botega NJ. Detecção do risco de suicídio nos serviços de emergência psiquiátrica. Rev Bras Psiquiatr. 2010;32(Supl II):S87-9., pode contribuir para o conhecimento dessas características.

Nesse contexto, este artigo objetivou caracterizar as tentativas de suicídio e suicídios atendidos por um serviço pré-hospitalar ocorridos em um município do noroeste do Estado do Paraná, Brasil.

MÉTODOS

Trata-se de estudo descritivo, de corte transversal, utilizando dados da fase pré-hospitalar dos atendimentos às vítimas de tentativa de suicídio e suicídio no município de Maringá, Paraná, Brasil. Os dados referentes à amostra estudada foram obtidos apenas dos registros do Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência (Siate), entre o período de 2005 a 2012.

O Siate é um serviço do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Paraná, que atua em parceria mista de atendimento com o Serviço Móvel de Urgência (Samu), constituído por bombeiros socorristas, capacitados para prestar suporte básico de vida no primeiro atendimento às vítimas de trauma, ocorridos em vias públicas, ambientes laborais, domiciliares, além de realizarem transporte ou transferência inter-hospitalar de pacientes com risco de morte1010. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria Nº 1.600 de 7 de julho de 2011. Reformula a Política Nacional de Atenção às Urgências e institui a Rede de Atenção às Urgências no Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 2011; Seção 1. p. 69.. O 5º Grupamento de Bombeiros do Paraná, além de Maringá, presta assistência pré-hospitalar à população residente em outros 21 municípios do Estado.

Todas as informações geradas em uma ocorrência são compiladas no Registro de Atendimento do Socorrista (RAS), que é o documento básico utilizado para gerar relatórios no Registro Geral de Ocorrência – RGO. O sistema RGO incorpora todas as informações coletadas durante o atendimento à vítima de trauma, que são incluídas no banco de dados do sítio eletrônico da Corporação de Bombeiros do Paraná. Os dados referentes à identificação das vítimas, gravidade clínica dos casos, internação hospitalar e óbitos são de acesso restrito1111. Golias ARC, Caetano R, Vianna CMM. Caracterização e custos de acidentes de motocicleta com vítimas atendidas em regime de hospitalização no município de Paranavaí-PR no ano de 2007. Physis. 2013;23(4):1123-46..

Para o presente estudo, foram selecionados os RAS de tentativa de suicídio (TS) ou suicídio, independentemente da idade da vítima e do local do atendimento pré-hospitalar. Os dados compilados foram: ano e período da ocorrência do evento (primavera/verão, outono, inverno); regiões do corpo afetadas (múltiplos órgãos, cabeça/face, pescoço, tórax/dorso, abdome, membros superiores, membros inferiores); desfecho do caso (óbito ou encaminhamento ao serviço hospitalar); idade (categorizada por faixa etária); sexo da vítima (masculino e feminino); método utilizado (intoxicação, enforcamento, uso de arma branca, arma de fogo, precipitação de lugar elevado e outros – inalação de gases e vapores, lesão autoprovocada pelo fogo e chamas e outros métodos especificados); fator agravante à ocorrência (hálito etílico, uso de drogas ilícitas, distúrbio neurológico/psicológico, e problemas pessoais/familiares). Em todas as variáveis elegidas para a análise, excluíram-se os dados ignorados. Acresça-se que, para evitar a duplicidade de dados, todos os RAS referentes às vítimas de tentativas de suicídio e suicídio foram coletados em dois períodos diferentes e, para garantir a fidedignidade desses dados, utilizou-se o software Microsoft Office Excel 2013 para armazenar, organizar e fazer a conferência sistematizada de todos os registros.

De posse aos dados elegíveis em planilha eletrônica, estes foram processados com o uso do programa Epi Info 3.5.2 e analisados por meio de estatística bidimensional pelo Teste qui-quadrado/χ22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000., considerando p-valor significativo quando menor ou igual a 0,05.

Foi obtida autorização para a coleta de dados junto ao 5o Grupamento do Corpo de Bombeiros do Paraná, e o projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (Parecer 410.881/2013).

RESULTADOS

Foram encontrados 257 registros de tentativas de suicídio e suicídio nos oito anos estudados, o que correspondeu a um registro de atendimento pré-hospitalar em um intervalo médio de 11,4 dias.

A área urbana foi a zona com maior demanda de atendimentos (99,3٪). A maioria dos atendimentos ocorreu nos meses da primavera e verão 72,7%, sendo 34% e 38,7%, respectivamente. Em relação às regiões do corpo mais afetadas, destacam-se o pescoço (26,1%), membros superiores (15,2%), e em vários atendimentos a vítima apresentava lesões de múltiplos órgãos (37,8٪). Como desfecho do total dos atendimentos prestados às vítimas de tentativas de suicídio e suicídio, grande parte das vítimas foi encaminhada a hospitais públicos e privados (62,9%), cerca de 29,3% tinham evoluído a óbito no cenário da própria ocorrência, 6,3% recusaram atendimento e 1,6% receberam atendimento por terceiros (dados descritos de forma textual, os quais não constam em gráficos ou tabelas).

Na Tabela 1, são apresentados os dados relativos à distribuição das ocorrências dos casos de tentativas de suicídio e suicídio atendidas pelo Siate durante o período estudado. Do total dos registros de lesão autoinfligida, 170 (66,4%) eram do sexo masculino e 86 (33,59%), feminino. Ao comparar os eventos por sexo, houve predominância do sexo masculino tanto nas tentativas como para o suicídio (107 tentativas, 62,9%; e 63 óbitos, 82,9%, respectivamente). O sexo masculino apresentou oscilação na frequência e percentual de tentativas de suicídio e suicídio, porém com redução considerável dos registros no final do período. Para o sexo feminino, observou-se um decréscimo na frequência e percentual de tentativas de suicídio, no período de 2005 a 2012, de 19,2% para 6,8% nos dois últimos anos estudados.

Tabela 1
Distribuição dos casos de tentativas de suicídio e suicídio, segundo sexo e ano de ocorrência. Maringá, Paraná, Brasil, 2005 a 2012

Na análise dos registros de tentativas de suicídio e suicídio, a idade mínima encontrada foi 13 anos e a máxima, 93 anos, com média de idade 33,5 ± 15,1 anos, com predomínio da faixa etária de 20 a 39 anos, tanto para o sexo masculino (56,9%) como para o feminino (64,0%), sendo este último estatisticamente significativo (Tabelas 2 e 3).

Os métodos utilizados nas tentativas de suicídio mais prevalentes foram uso de objeto cortante (34,8%), intoxicação (25,1%) e precipitação de lugar elevado (21,1%); para o suicídio, destacam-se o enforcamento (70,8%) e a precipitação de lugar elevado (19,4%). Entretanto, os resultados mostram diferenças nos métodos utilizados para as tentativas de suicídio entre os sexos. Entre os homens, o ferimento por objeto cortante foi o método mais utilizado nas tentativas de suicídio (36,0%), seguido de precipitação de lugar elevado (22,0%) (Tabela 3). Para o sexo feminino, a intoxicação (33,3%) e o uso de objeto cortante (33,3%) foram os métodos mais prevalentes (Tabela 2). Vale destacar que, nas tentativas de suicídio, para ambos os sexos, apenas a intoxicação e o enforcamento foram métodos estatisticamente significativos. No que concerne ao método mais utilizado para o suicídio, o enforcamento predominou tanto para as mulheres (50,0%), quanto para os homens (74,2%) (Tabelas 2 e 3).

Tabela 3
Distribuição dos casos de tentativas de suicídio e suicídio, no sexo masculino, segundo faixa etária e método utilizado. Maringá, Paraná, Brasil, 2005 a 2012
Tabela 2
Distribuição dos casos de tentativas de suicídio e suicídio no sexo feminino, segundo faixa etária e método utilizado. Maringá, Paraná, Brasil, 2005 a 2012

Neste estudo, encontrou-se que os possíveis fatores agravantes para a ocorrência das tentativas de suicídio e suicídio foram distúrbios neurológicos e psicológicos em 48,9% e hálito etílico/uso de drogas ilícitas em 41,9% das ocorrências. A presença de distúrbios neurológicos/psicológicos foi o fator agravante com maior percentual de ocorrência entre as mulheres (64,3%) e o hálito etílico/uso de drogas ilícitas, o mais encontrado no sexo masculino (61,8%) (Tabela 4).

Tabela 4
Distribuição dos casos de tentativas de suicídio e suicídio, segundo fatores agravantes e sexo. Maringá, Paraná, Brasil, 2005 a 2012

DISCUSSÃO

O suicídio ainda é um assunto permeado por um estigma social à pessoa que o realiza e seus familiares, o que normalmente ocasiona dificuldades no acesso aos dados, comprometimento na fidedignidade das informações e, consequentemente, aumento no número de subnotificações dos casos. Dessa forma, pesquisas voltadas para esse assunto são escassas na literatura. Até onde se sabe, esta é uma das primeiras pesquisas realizadas no âmbito de atendimento regional pré-hospitalar que aborda exclusivamente esse tema.

A fase pré-hospitalar é considerada o primeiro serviço a entrar em contato com a vítima que necessita de atendimento imediato e cuja assistência pode influenciar diretamente no prognóstico do paciente, em especial às vítimas de tentativa de suicídio e suicídio. Portanto, conhecer a caracterização dessas vítimas oferece contribuições para implementação de políticas públicas que visem à redução desse evento.

No entanto, este estudo deve ser analisado levando-se em consideração algumas limitações. O número de dados ignorados (retirados das estatísticas), com sub-registro de informações, dificulta a avaliação dos episódios, favorece falhas na identificação e classificação da causa de morte, podendo prejudicar a precisão da ocorrência desse fenômeno.

É notório que o atendimento a lesões autoinfligidas não seja um evento esporádico. Apesar disso, apenas uma em cada três pessoas que tentam o suicídio é atendida por um serviço médico de urgência44. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil, Rio de Janeiro. Cad Saude Publica. 2009;25(12):2632-8., e é provável que esse número seja ainda maior. Contudo, para oferecer assistência de qualidade às emergências psiquiátricas, esses profissionais devem dispor tanto de embasamento científico sobre os inúmeros fatores sociais, culturais, ambientais, biológicos e psicológicos que acercam esse fenômeno, quanto de técnicas de abordagem e atendimento correto às vítimas com alto risco de suicídio33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22..

Com vistas a reduzir a morbimortalidade e aumentar a sobrevida desses indivíduos, os profissionais do serviço de atenção pré-hospitalar realizam primeiramente o atendimento inicial, estabilização da vítima e, posteriormente, o encaminhamento adequado das vítimas às instituições hospitalares44. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil, Rio de Janeiro. Cad Saude Publica. 2009;25(12):2632-8..

Estudos epidemiológicos sugerem forte relação entre o comportamento suicida e o ambiente33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22.,1212. Salmeron D, Cirera L, Ballesta M, Navarro-Mateu F. Time trends and geographical variations in mortality dueto suicide and causes of undetermined intent in Spain, 1991-2008. J Public Health (Oxf). 2013;35(2):237-45.,1313. Souza VS, Alves MS, Silva LA, Lino DCSF, Nery AA, Casotti CA. Tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio em um município no interior da Bahia. J Bras Psiquiatr. 2011;60(4):294-300.. A área urbana e os meses “quentes” (primavera e verão) foram predominantes em relação aos casos estudados nesta pesquisa. Autores descrevem que a violência nas grandes cidades induz o indivíduo ao confinamento em seus lares e, além desse fator, uma vida solitária associada a temperaturas extremas, com grandes amplitudes térmicas, independentemente do país, são fatores extrinsecamente associados a esse agravo1212. Salmeron D, Cirera L, Ballesta M, Navarro-Mateu F. Time trends and geographical variations in mortality dueto suicide and causes of undetermined intent in Spain, 1991-2008. J Public Health (Oxf). 2013;35(2):237-45.. Outros estados do país apresentaram resultados semelhantes, como, por exemplo, um estudo do interior da Bahia, em que os maiores percentuais de tentativas de suicídio foram observados nos meses mais quentes do ano (26,9%)1313. Souza VS, Alves MS, Silva LA, Lino DCSF, Nery AA, Casotti CA. Tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio em um município no interior da Bahia. J Bras Psiquiatr. 2011;60(4):294-300., assim como em Arapiraca, cidade de Alagoas, onde o maior número de agravos ocorreu no verão (18,2%)33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22..

Além da influência climática, a idade e o sexo permeiam a caracterização das tentativas de suicídio e suicídios em todo o mundo. Nesta pesquisa, o sexo masculino apresentou os maiores percentuais tanto nas tentativas como nos casos de suicídios, com predomínio na faixa etária de 20 a 39 anos, correspondendo a uma população de adultos jovens ativos no mercado de trabalho.

A vulnerabilidade do sexo masculino ao ato suicida já é bastante documentada na literatura mundial1414. World Health Organization (WHO). Mental health action plan 2013-2020. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/89966/1/9789241506021_eng.pdf?ua=1. Acesso em: 10 abr. 2015.
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
,1515. Norheim AB, Grenholt TK, Ekeberg O. Attitudes towards suicidal behaviour in outpatient clinics among mental health professionals in Oslo. BMC Psychiatry. 2013;13(90):1-10., bem como a maior prevalência de suicídios1616. Clifford AC, Doram CM, Tsey K. A systematic review of suicide prevention interventions targeting indigenous peoples in Australia, United States, Canada and New Zealand. BMC Public Health. 2013;13(463):1-11.,1717. Kaplan MS, McFarland BH, Huguet N, Conner K, Caetano R, Giesbrecht N, et al. Acute alcohol intoxication and suicide: a gender-stratified analysis of the National Violent Death Reporting System. Injury Prevention. 2013;19(1):38-43.. No Brasil, também tem sido observado predomínio da ocorrência de suicídio para o sexo masculino nos últimos anos1818. Pacheco JS, Damasceno AKC, Souza AMA, Brito MEM. Tentativa de suicídio em mulheres por queimaduras. Rev Rene. 2010;11(2):152-60.

19. Ponce JC, Andreuccetti G, Jesus MGS, Leyton V, Muñoz DR. Álcool em vítimas de suicídio em São Paulo. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(supl 1):13-6.
-2020. Lovisi GM, Santos SA, Legay L, Abelha L, Valencia E. Epidemiological analysis of suicide in Brazil from 1980 to 2006. Rev Bras Psiquiatr. 2009;31(supl. 2):S86-93.. No entanto, os dados das tentativas de suicídio, normalmente associadas ao sexo feminino1616. Clifford AC, Doram CM, Tsey K. A systematic review of suicide prevention interventions targeting indigenous peoples in Australia, United States, Canada and New Zealand. BMC Public Health. 2013;13(463):1-11.,1717. Kaplan MS, McFarland BH, Huguet N, Conner K, Caetano R, Giesbrecht N, et al. Acute alcohol intoxication and suicide: a gender-stratified analysis of the National Violent Death Reporting System. Injury Prevention. 2013;19(1):38-43., foram divergentes aos da presente pesquisa, pois os homens também apresentaram os maiores percentuais.

O elevado percentual de suicídio entre os homens pode ser explicado pelos métodos utilizados para sua execução, por consistirem em agentes mais violentos e letais, tais como o enforcamento, a precipitação de locais elevados e o uso de arma de fogo1919. Ponce JC, Andreuccetti G, Jesus MGS, Leyton V, Muñoz DR. Álcool em vítimas de suicídio em São Paulo. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(supl 1):13-6..

Outro fator preocupante para a saúde pública mundial refere-se à transição da faixa etária mais idosa para faixas etárias mais jovens, em relação às tentativas de suicídio e suicídio22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.,44. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil, Rio de Janeiro. Cad Saude Publica. 2009;25(12):2632-8.. Nos países desenvolvidos, o suicídio está entre as três principais causas de morte entre os jovens de 15 a 35 anos e é a principal causa de mortalidade na faixa etária de 15 a 19 anos2121. Mendes-Bustos P, Lopez-Castroman J, Baca-García E, Ceverino A. Life cycle and suicidal behavior among women. ScientificWorldJournal. 2013;2013:485851. Disponível em: http://www.hindawi.com/journals/tswj/2013/485851/. Acesso em: 10 abr. 2015.
http://www.hindawi.com/journals/tswj/201...
. Tendência crescente na faixa etária jovem também foi descrita nos Estados Unidos2222. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Suicide among adults aged 35-64 years--United States, 1999-2010. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2013;62(17):321-5..

No Brasil, resultado semelhante foi encontrado em pesquisa realizada com 84 unidades de urgência e emergência vinculadas ao Sistema de Vigilância de Acidentes e Violência-Viva, em que a maioria das vítimas atendidas tinha idade de 20 a 29 anos (35%)1313. Souza VS, Alves MS, Silva LA, Lino DCSF, Nery AA, Casotti CA. Tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio em um município no interior da Bahia. J Bras Psiquiatr. 2011;60(4):294-300..

Um fato que merece atenção neste estudo refere-se ao registro de tentativa de suicídio de duas adolescentes com apenas 13 anos de idade. Óbitos por suicídio nessa faixa etária são pouco estudados em nosso meio, sendo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) o desenvolvimento de estratégias de prevenção do suicídio em escolas22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.,66. D’Oliveira CF, Botega NJ (org.) Prevenção do Suicídio – Manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde – Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio, 2006. p. 74. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_editoracao.pdf. Acesso em: 10 abr. 2015.. Um estudo realizado no Canadá com jovens entre 12 e 17 anos e sem diagnóstico de patologia psiquiátrica encontrou que 18% dos investigados apresentaram ideação suicida e 12,5% tentaram suicídio após um colega de escola ter morrido por suicídio2323. Swanson AS, Colman I. Association between exposure to suicide and suicidality outcomes in youth. CMAJ. 2013;185(10):870-7.. Em um centro de referência em assistência toxicológica do município de Maringá, Paraná, identificaram-se 122 casos de tentativa de suicídio e suicídio entre crianças e adolescentes (de 7 a 14 anos), entre os anos de 2006 a 2010, com predomínio do sexo feminino2424. Rosa NM, Campos APS, Guedes MRJ, Sales CCF, Mathias TAF, Oliveira MLF. Intoxicações associadas às tentativas de suicídio e suicídio em crianças e adolescentes. Rev Enferm UFPE. 2015;9(2):661-8..

No que concerne aos métodos utilizados para as tentativas de suicídio/suicídios apresentados nesta pesquisa, valores expressivos e estatisticamente significativos foram observados nas intoxicações e nos enforcamentos. Ao comparar por sexo, os métodos suicidas de escolha das mulheres foram a intoxicação e o ferimento por objeto cortante, e dos homens foi o ferimento por objeto cortante, seguido por precipitação de local elevado.

Vários autores descrevem a intoxicação2323. Swanson AS, Colman I. Association between exposure to suicide and suicidality outcomes in youth. CMAJ. 2013;185(10):870-7.,1919. Ponce JC, Andreuccetti G, Jesus MGS, Leyton V, Muñoz DR. Álcool em vítimas de suicídio em São Paulo. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(supl 1):13-6., normalmente associada a altas doses de medicamentos, como método de escolha entre as mulheres88. Devries KM, Mak J, Bacchus LJ, Child JC, Falder G, Petzold M, et al. Intimate partner violence and incident depressive symptoms and suicide attempts: a systematic review of longitudinal studies. PLoS Med. 2013;10(5):e1001439.,1818. Pacheco JS, Damasceno AKC, Souza AMA, Brito MEM. Tentativa de suicídio em mulheres por queimaduras. Rev Rene. 2010;11(2):152-60.,2323. Swanson AS, Colman I. Association between exposure to suicide and suicidality outcomes in youth. CMAJ. 2013;185(10):870-7.,2525. Trevisan EPT, Oliveira MLF. Medicamentos psicoactivos: estudio de mujeres con intento de suicídio em um município del sur de Brasil. Index de Enfermería. 2012;21(1-2):33-7.. Já os homens optam por métodos mais violentos e letais. A exemplo disso, precipitação de lugar elevado foi descrita em 12% dos casos de suicídio entre homens residentes em São Paulo, usuários de bebida alcoólica1919. Ponce JC, Andreuccetti G, Jesus MGS, Leyton V, Muñoz DR. Álcool em vítimas de suicídio em São Paulo. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(supl 1):13-6..

A escolha de métodos mais violentos para o suicídio, em sua maioria, acarreta a morte, enquanto os métodos de menor grau de letalidade possibilitam que o resgate pelos profissionais do serviço de atendimento pré-hospitalar seja realizado, aumentando as chances de sobrevivência da vítima por esse evento33. Magalhães APN, Alves VM, Comassetto I, Lima PC, Mancussi-Faro AC, Nardi AE. Atendimento a tentativas de suicídio por serviço de atenção pré-hospitalar. J Bras Psiquiatr. 2014;63(1):16-22.. No entanto, é importante considerar que a utilização de outros métodos não fatais não indica necessariamente que a intenção do indivíduo era menos séria2626. Minayo MCS, Cavalcante FG, Mangas RMN, Souza JRA. Autópsias psicológicas sobre suicídio de idosos no Rio de Janeiro. Cienc Saude Colet. 2012;17(10):2773-81..

Alguns fatores são descritos na literatura como agravantes aos atos suicidas. Transtornos mentais, distúrbios neurológicos e tentativas de suicídio anteriores22. Bertolote JM (org). Prevenção do Suicídio: um manual para médicos clínicos gerais. Organização Mundial da Saúde (OMS) Genebra; 2000.,66. D’Oliveira CF, Botega NJ (org.) Prevenção do Suicídio – Manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde – Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio, 2006. p. 74. Disponível em: bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_editoracao.pdf. Acesso em: 10 abr. 2015. são considerados os principais fatores de risco para o suicídio.

Na presente pesquisa, os distúrbios mentais/neurológicos foram os mais prevalentes no sexo feminino e o hálito etílico/drogas ilícitas, no sexo masculino. Associação estatisticamente significativa foi encontrada com os mesmos possíveis fatores agravantes. A OMS presume que, mundialmente, a prevalência de transtornos mentais em eventos suicidas varie de 80% a 100%44. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P. Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil, Rio de Janeiro. Cad Saude Publica. 2009;25(12):2632-8.. A depressão é um dos transtornos mentais que podem estar associados à violência psicológica sofrida pela mulher, no âmbito das interações sociais, por parceiros íntimos, colegas de trabalho e membros da família, porém normalmente ela recorre à ajuda psiquiátrica com maior frequência, facilitando o diagnóstico precoce da doença e evitando o suicídio88. Devries KM, Mak J, Bacchus LJ, Child JC, Falder G, Petzold M, et al. Intimate partner violence and incident depressive symptoms and suicide attempts: a systematic review of longitudinal studies. PLoS Med. 2013;10(5):e1001439.,1919. Ponce JC, Andreuccetti G, Jesus MGS, Leyton V, Muñoz DR. Álcool em vítimas de suicídio em São Paulo. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(supl 1):13-6., o que pode também justificar os menores percentuais de suicídio no sexo feminino.

O uso abusivo de bebida alcoólica reflete os padrões de consumo de álcool na população em geral, pois os homens são mais propensos à ingesta alcoólica do que as mulheres2323. Swanson AS, Colman I. Association between exposure to suicide and suicidality outcomes in youth. CMAJ. 2013;185(10):870-7.. Estudos descrevem que grande parte das tentativas de suicídio e suicídios é antecedida pela ingestão de álcool77. Vidal CEL, Gontijo ECDM, Lima LA. Tentativas de suicídio: fatores prognósticos e estimativa do excesso de mortalidade. Cad Saude Publica. 2013;29(1):175-87.,2525. Trevisan EPT, Oliveira MLF. Medicamentos psicoactivos: estudio de mujeres con intento de suicídio em um município del sur de Brasil. Index de Enfermería. 2012;21(1-2):33-7.. Os alcoólatras têm 60 a 120 vezes mais chances de atentarem contra a própria vida, visto que o álcool aumenta a agressividade1919. Ponce JC, Andreuccetti G, Jesus MGS, Leyton V, Muñoz DR. Álcool em vítimas de suicídio em São Paulo. Rev Psiquiatr Clin. 2008;35(supl 1):13-6..

Diante desses fatos, diversas pesquisas2727. Rajapakse T, Griffiths KM, Christensen H, Cotton S. A comparison of non-fatal self-poisoning among males and females, in Sri Lanka. BMC Psychiatry. 2014;14(221):1-13.,2828. Pompili M, Gonda X, Serafini G, Innamorati M, Sher L, Amore M, et al. Epidemiology of suicide in bipolar disorders: a systematic review of the literature. Bipolar Disord. 2013;5(15):457-90. afirmam que a relação entre as mudanças psicossociais vividas pela população, principalmente voltadas ao aumento dos transtornos mentais2929. National Alliance on Mental Illness (NAMI). New Hampshire’s 2011 suicide prevention annual report: suicide prevention across the Lifespan. 2011. Disponível em: www.TheConnectProgram.org/annual-reports. Acesso em: 19 fev. 2015.
www.TheConnectProgram.org/annual-reports...
, deve ser estudada e levada em consideração como medidas essenciais na redução das perdas com o suicídio3030. Waidman MAP, Marcon SS, Pandini A, Bessa JB, Paiano M. Nursing care for people with mental disorders, and their families, in Primary Care. Acta Paul Enferm. 2012;25(3):346-51., o que torna urgente a implementação de estratégias de prevenção para reduzir esse agravo de saúde pública2929. National Alliance on Mental Illness (NAMI). New Hampshire’s 2011 suicide prevention annual report: suicide prevention across the Lifespan. 2011. Disponível em: www.TheConnectProgram.org/annual-reports. Acesso em: 19 fev. 2015.
www.TheConnectProgram.org/annual-reports...
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CONCLUSÕES

Informações relevantes foram encontradas neste estudo, permitindo a caracterização das tentativas de suicídio (maior ocorrência no sexo masculino; pelo uso de objeto cortante e intoxicação na mulher e enforcamento no homem); e suicídios (maior ocorrência no sexo masculino, tendo como método principal o enforcamento em ambos os sexos), e a identificação dos distúrbios mentais e neurológicos como possíveis fatores agravantes. Em posse desses resultados, medidas preventivas voltadas prioritariamente ao adulto jovem podem contribuir para a redução das tentativas de suicídio e suicídio.

Além desse fator, o conhecimento do grupo de maior ocorrência de tentativas de suicídio e suicídio fornece dados aos profissionais da saúde, os quais podem facilitar a identificação precoce de potenciais suicidas e, numa rápida e efetiva atuação, contribuir preventivamente para sua redução, diminuindo, ainda, o número de perdas evitáveis pelo suicídio de uma população economicamente ativa, que fora identificada neste estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Dez 2015
  • Aceito
    23 Jun 2016
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