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Tabagismo, consumo de bebidas alcoólicas e os fatores associados em estudantes de medicina

Smoking, alcohol consumption and associated factors in medical students

RESUMO

Objetivos

Descrever a prevalência e fatores associados ao uso de bebidas alcoólicas entre estudantes de Medicina. Estimar a prevalência de tabagismo.

Métodos

Corte transversal com questionário autoaplicado a todos os estudantes de Medicina de uma universidade pública na Bahia (n = 616), matriculados do primeiro ao oitavo semestre. Análise multivariada por meio de Regressão de Cox identificou os fatores associados ao uso de bebidas alcoólicas, por meio de três desfechos: presença e frequência de uso e o padrão de uso denominado binge drinking.

Resultados

Foram estudados 556 estudantes (90,2% de resposta), entre os quais 58,7% bebem, 21% consomem álcool com uma frequência de pelo menos uma vez por semana e 36% fazem binge drinking. O público masculino e os mais ativos fisicamente no lazer apresentaram maiores prevalências de uso de bebidas alcoólicas, seja pela maior frequência de uso ou uso de mais doses em uma ocasião. Variáveis escolares se associaram a uma ou outra modalidade de mensuração do uso de álcool. A prevalência de tabagismo foi de 4,8%.

Conclusão

O uso de bebidas alcoólicas e seu padrão de consumo foram altos na população estudada, consistente com outras populações de estudantes já investigadas. A baixa prevalência de tabagismo é consistente com a literatura, que admite o êxito de políticas públicas destinadas ao controle desse consumo no Brasil.

Estudantes de Medicina; bebidas alcoólicas; uso de tabaco; exercício; bebedeira

ABSTRACT

Objectives

To describe the prevalence and factors associated with the use of alcoholic beverages among medical students. Estimate the prevalence of smoking.

Methods

Cross-sectional study (census) with a self-administered questionnaire in medical students at a public university in Bahia (n = 616) enrolled from the first to the eighth semester. Multivariate analysis using Cox Regression identified the factors associated with the use of alcoholic beverages, through three outcomes: presence and frequency of use and the pattern of use called binge drinking.

Results

556 students were studied (90.2% response), among which, 58.7% drink, 21% consume alcohol at least once a week and 36% do binge drinking. The male population and those more physically active at leisure time showed a higher prevalence of alcohol use, either due to the higher frequency of use or the use of more doses on one occasion. School variables were associated with one or another method of measuring alcohol use. The prevalence of smoking was 4.8%.

Conclusion

The use of alcoholic beverages and their consumption pattern were high in the studied population, consistent with other student populations already investigated. The low prevalence of smoking is consistent with the literature that admits the success of public policies aimed at controlling this consumption in Brazil.

Medical student; alcohol drinking; tobacco use; exercise; binge drinking

INTRODUÇÃO

Com as mudanças vivenciadas desde meados do século passado pela população brasileira, as causas mais comuns de doença sofreram transformações. Nesse sentido, a grande parcela de mortes que era causada por doenças infectocontagiosas passou a ser relacionada aos hábitos e estilos de vida11. Prata PR. A transição epidemiológica no Brasil. Cad Saúde Pública. 1992;8(2):168-75.. Assim, hábitos como consumo de álcool e tabaco e a ausência da atividade física (AF) podem estar ligadas às bases de muitas doenças crônico-degenerativas.

Na população brasileira, a proporção de indivíduos abstêmios, ou seja, 20 meses ou mais sem consumir bebidas alcoólicas, é considerado alto, em torno de 50%. Contudo, entre aqueles que fazem a ingestão de bebidas alcoólicas, há um elevado nível de consumo de risco (abuso: 3%; dependência: 9%)22. Laranjeira R, Pinsky I, Sanches M, Zaleski M, Caetano R. Alcohol use patterns among Brazilian adults. Rev Bras Psiquiatr. 2009;32(3):231-41.. Nos cursos universitários na área da saúde é a droga mais consumida, em níveis preocupantes e com tendência ao aumento de consumo durante o curso33. Rabelo MO, Prates TEC, Sampaio CA. Consumo de álcool por estudantes da área de saúde: uma revisão da literatura. Rev Bras Pesqui Ciênc Saúde. 2017;4(1):1-8.

4. Paduani GF, Barbosa GA, Morais JCR, Pereira JCP Almeida MF, Prado MM, et al. Consumo de álcool e fumo entre os estudantes da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia. Rev Bras Educ Med. 2008;32(1):66-74.
-55. Ramis TR, Mielke GI, Habeyche EC, Oliz MM, Azevedo MR, Hallal PCi. Tabagismo e consumo de álcool em estudantes universitários: prevalência e fatores associados. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(2):376-85., parecendo ser mais consumido por homens no meio universitário44. Paduani GF, Barbosa GA, Morais JCR, Pereira JCP Almeida MF, Prado MM, et al. Consumo de álcool e fumo entre os estudantes da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia. Rev Bras Educ Med. 2008;32(1):66-74., entretanto, em estudantes de Medicina, há evidências de não haver diferenças entre os sexos66. Oliveira LG, Barroso LP, Wagner GA, Ponce JC, Malbergier A, Stempliuk VA, et al. Drug consumption among medical students in São Paulo, Brazil: influences of gender and academic year. Rev Bras Psiquiatr. 2009;31(3):227-39..

Ainda com relação ao uso de bebidas alcoólicas, o Instituto Nacional de Abuso de Álcool e Alcoolismo Externo (NIAAA) estimou o uso excessivo de álcool em uma única ocasião em cinco doses para homens e quatro doses para mulheres. Essa classificação, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (Center for Disease Control and Prevention – CDC), é o uso excessivo de álcool mais comum e com grande relação aos altos gastos em saúde e mortes nos Estados Unidos77. National Institute of Alcohol Abuse and Alcoholism. NIAAA council approves definition of binge drinking. NIAAA Newsletter. 2004;3:3.,88. Sacks JJ, Gonzales KR, Bouchery EE, Tomedi LE, Brewer RD. 2010 national and state costs of excessive alcohol consumption. Am J Prev Med. 2015;49(5):e73-9.. Esse uso excessivo recebe o nome de binge drinking sendo usado por autores brasileiros o sinônimo beber pesado episódico (BPE), apesar de essa última medida ser considerada após seis doses em uma única ocasião99. Kuntsche E, Rehm J, Gmel G. Characteristics of heavy episodic drinkers in Europe. Soc Sci Med. 2004;59:113-27.,1010. Abreu TT, Maurílio AO, Liguori CC, Tavares DVP, Terceiro DMG, Cunha LGM, et al. O consumo de bebida alcoólica e o binge drink entre os graduandos de Medicina de uma Universidade de Minas Gerais. J Bras Psiquiatr. 2018;67(2):87-93..

Entre as drogas lícitas e ilícitas, o tabaco e o álcool parecem ser as mais consumidas no meio universitário1111. Lemos KM, Neves NMBC, Kuwano AY, Tedesqui G, Bitencourt AGV, Neves FBCS, et al. Uso de substâncias psicoativas entre estudantes de Medicina de Salvador (BA). Rev Psiquiatr Clín. 2007;34(3):118-24.. Observou-se um consumo de tabaco entre estudantes de Medicina em Salvador (BA) em algum momento da vida em 38,6% da população e nos últimos 30 dias, de 5,7%1212. Nasser RL, Branco JC, Lara DR, Vecchio FBD, Wiener C, Mesquita P, et al. Atividade física de lazer e uso de substâncias lícitas em uma amostra populacional de adultos jovens. Ciênc Saúde Coletiva. 2016;21(1):63-70.. Já o hábito de não fumar diariamente foi um dos fatores com associação positiva para a prática de AF1313. Fiorini JE, Alves AL, Ferreira LR, Fiorini CM, Durães SW, Santos RLD, et al. Use of licit and illicit drugs at the university of Alfenas. Rev Hosp Clin. 2003;58(4):199-206..

Com relação à AF e o consumo de álcool, a literatura parece convergir para a associação positiva entre o uso dessa substância e estar ativo fisicamente1212. Nasser RL, Branco JC, Lara DR, Vecchio FBD, Wiener C, Mesquita P, et al. Atividade física de lazer e uso de substâncias lícitas em uma amostra populacional de adultos jovens. Ciênc Saúde Coletiva. 2016;21(1):63-70.,1414. Bezerra J, Lopes AS, Hardman CM, Tassitano RM, Tenório MCM, Barros MGV. Consumo de bebidas alcoólicas e tabagismo: associação com inatividade física no lazer e comportamento sedentário. Rev Andal Med Deporte. 2015;8(1):1-6.

15. Costa JSD, Silveira MF, Gazalle FK, Oliveira SS, Hallal PC, Menezes AMB, et al. Consumo abusivo de álcool e fatores associados: estudo de base populacional. Rev Saúde Pública. 2004;38(2):284-91.
-1616. Lima D, da Silva M, Júnior O, Lima L, Sampaio A, Luiz O. Associação da atividade física de lazer com o consumo de bebidas alcoólicas em adultos. Bras Ativ Fís Saúde. 2017;22(6):576-83., embora não existam trabalhos com essa temática com a população-alvo deste estudo.

Para se manter ativo, tem sido sugerido que um indivíduo pratique AF por, no mínimo, 150 minutos semanais com intensidade moderada1717. Haskell WL, Lee IM, Pate RR, Powell KE, Blair SN, Franklin BA, et al. Physical activity and public health: updated recommendation for adults from the American College of Sports Medicine and the American Heart Association. Med Sci Sports Exerc. 2007;39(8):1423-34.. Esses minutos podem ser preenchidos em quatro domínios ou “oportunidades” durante o dia, sendo esses: no trabalho (com maior importância se for feito manualmente), como meio de transporte ou deslocamento, nas tarefas domésticas e nos momentos de lazer1818. World Health Organization. Global Strategy to reduce the harmful use of alcohol 2010. Disponível em: http://www.who.int/substance_abuse/msbalcstragegy.pdf. Acesso em: 6 jun. 2019.
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. Alguns estudos apontam que o nível de AF entre estudantes da área da saúde como um todo ou apenas entre os estudantes de Medicina é considerado baixo, mas os resultados não são consistentes1919. Marcondelli P, Costa THM, Schmitz BAS. Nível de atividade física e hábitos alimentares de universitários do 3º ao 5º semestres da área da saúde. Rev Nutr. 2008;21(1):39-47.

20. Raddi LLO, Silva JPJ, Ferrari GLM, Oliveira LC, Matsudo VKR. Nível de atividade física e acúmulo de tempo sentado em estudantes de medicina. Rev Bras Med Esporte. 2014;20(2):101-4.

21. Castro JEF, Barreto LA, Oliveira LAA, Almeida PC, Leite JAD. Avaliação do nível de atividade física e fatores associados em estudantes de medicina de Fortaleza-CE. Rev Bras Ciênc Esporte. 2012;34(4):955-67.
-2222. Barbosa ASJ. Prevalência de transtornos mentais comuns e fatores associados em estudantes de Medicina da UFBA [Monografia]. Salvador: Curso de Medicina, Universidade Federal da Bahia; 2016.. Ademais, esses estudos têm em comum a limitação de investigar apenas a AF de lazer, que mais recentemente tem sido superada pela consideração dos quatros domínios aqui descritos1818. World Health Organization. Global Strategy to reduce the harmful use of alcohol 2010. Disponível em: http://www.who.int/substance_abuse/msbalcstragegy.pdf. Acesso em: 6 jun. 2019.
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.

Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais de Medicina, o aluno deverá concluir o curso com uma gama de competências, que incluem uma formação humanística, ética e com capacidade de promover reflexão e crítica (Brasil, 2015). Essas habilidades devem ser desenvolvidas ao longo de seis anos e com uma carga horária mínima de 7.200 horas2323. Brasil. Ministério da Educação. Resolução CNE/CES nº 3/2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União 23 jun. 2014; Seção 1.. Dessa forma, a alta carga horária a que o estudante é submetido pode ter repercussões em seus hábitos de vida, necessitando-se, assim, de estudos que evidenciem o sedentarismo, o consumo de drogas e outros fatores que podem resultar, no futuro, em doenças crônicas não transmissíveis.

Neste estudo, objetiva-se descrever a prevalência do uso de bebidas alcoólicas e os fatores associados a esse hábito, bem como descrever a prevalência do tabagismo, entre estudantes de Medicina.

MÉTODOS

População

Trata-se de estudo de corte transversal cuja população foi composta por todos os 616 estudantes de Medicina de uma universidade pública do estado da Bahia, Brasil, matriculados regularmente do primeiro ao oitavo semestre (ciclos básico e clínico), conforme lista oficial fornecida pelo Colegiado do Curso no ano de 2018. Não fazem parte da população definida para esse censo os alunos que se encontravam cursando o internato (9° ao 12° semestre). O internato implica a existência de múltiplos campos de prática, que exigem tempo e recurso para a coleta, não previstos no presente estudo que teve outro objetivo e foi realizada por três acadêmicos de Medicina (próprios pesquisadores) com a supervisão da orientadora do projeto. A coleta de dados ocorreu no período de julho a outubro de 2018. Embora o instrumento seja autoaplicado, os pesquisadores que acompanharam em campo a coleta foram treinados quanto à abordagem dos estudantes e aos esclarecimentos sobre o instrumento de pesquisa e para sanar eventuais dúvidas.

O instrumento de pesquisa utilizado é um questionário com seções sobre dados sociodemográficos, escolares e ocupacionais e inclui a seção de condutas de compensação do Vigilância de Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), para mensurar o uso de drogas lícitas, e o Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ), para a AF e seus domínios, validado no Brasil em 2001, por Matsudo2424. Matsudo S, Araújo T, Matsudo V, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC, et al. Questionário internacional de atividade física (IPAQ): Estudo de validade e reprodutibilidade no Brasil. Rev Bras Ativ Fís Saúde. 2012;6(2):5-18., em sua versão longa.

O inquérito nacional Vigitel é de acesso público e irrestrito, e os procedimentos adotados são descritos na seção de métodos dos respectivos relatórios, com as perguntas e escalas de resposta feitas por telefone. A criação do questionário foi baseada em modelos de vigilância de fatores de risco para doenças crônicas2525. Remington PL, Smith MY, Williamson DF, Anda RF, Gentry EM, Hogelin GC. Design, characteristics, and usefulness of state-based behavioral risk factor surveillance: 1981-87. Public Health Rep. 1998;103(4):366-75.,2626. World Health Organization. Summary: surveillance of risk factors for noncommunicable diseases: the WHO STEP wise approach. Geneva: WHO; 2001. Disponível em: https://www.who.int/ncd_surveillance/media/en/269. Acesso em: 1º jul. 2020.
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, e os testes ocorreram em uma série de cidades brasileiras (São Paulo, Botucatu, Belém, Salvador, Florianópolis e Goiânia) até o início das atividades nas 26 capitais estaduais e no Distrito Federal, em 20062727. Monteiro CA, Moura EC, Jaime PC, Lucca A, Florindo AA, Figueiredo ICR, et al. Monitoramento de fatores de risco para as doenças crônicas por entrevistas telefônicas. Rev Saúde Pública. 2005;39(1):47-57.

28. Monteiro CA, et al. SIMTEL – Cinco Cidades: implantação, avaliação e resultados de um sistema municipal de monitoramento de fatores de risco nutricionais para doenças crônicas não transmissíveis a partir de entrevistas telefônicas em cinco municípios brasileiros. São Paulo: Nupens/USP; 2007. [Relatório técnico]
-2929. Carvalhaes MABL, Moura EC, Monteiro CA. Prevalência de fatores de risco para doenças crônicas: inquérito populacional mediante entrevistas telefônicas em Botucatu, São Paulo, 2004. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):4-23..

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Bahia, sob o Parecer nº 2.508.648. O questionário da pesquisa não trazia campo para registro de nome do participante. Todos os estudantes do primeiro ao oitavo semestre foram elegíveis para o estudo. Cada questionário tinha um código que foi mantido como controle no banco de dados processado, conforme procedimento-padrão em pesquisa.

Variáveis dependentes

Para mensurar o uso de bebidas alcoólicas, o questionário continha perguntas sobre a presença do hábito (SIM/NÃO), sobre a frequência de uso e sobre a quantidade de bebida ingerida em uma ocasião. A frequência do uso foi estratificada em uma ou mais vezes por semana e menos que uma vez por semana. Esses foram os desfechos, ou variáveis dependentes, do presente estudo.

Para definir caso de maior ingesta de álcool em uma ocasião nos últimos trinta dias, foi adotado o binge drinking, ou “beber pesado em uma ocasião”. Esse padrão de consumo, segundo o NIAAA77. National Institute of Alcohol Abuse and Alcoholism. NIAAA council approves definition of binge drinking. NIAAA Newsletter. 2004;3:3., é definido como a capacidade de elevar em 0,08% g/dL a concentração de álcool no sangue, sendo atingida após o consumo de quatro doses ou mais por mulheres ou cinco doses ou mais por homens em uma ocasião.

Variáveis independentes

As variáveis pesquisadas foram: idade, sexo, cor, graduação prévia, atividade remunerada ou não, semestre acadêmico em curso, coeficiente de rendimento (média total das notas ponderada pela carga horária das matérias), dessemestralização (situação de estudantes que cursam matérias de mais de um semestre ao mesmo tempo) e autopercepção de saúde. Para o nível de AF, foi utilizado o IPAQ (versão longa), mensurando a frequência e a intensidade em quatro domínios: trabalho, deslocamento ativo (pedalar ou caminhar, por pelo menos 10 minutos contínuos, para se deslocar para um local), em domicílio e no lazer.

Abordagem estatística dos dados

Inicialmente foram descritas as variáveis por meio da frequência simples e relativa, e na etapa analítica descreveram-se as prevalências e as razões de prevalência obtidas para cada uma das variáveis dependentes do estudo com as variáveis independentes, para verificação das associações. Portanto, conforme previsto para um estudo de corte transversal, investigaram-se as variáveis independentes quanto à sua associação ou não aos desfechos, variáveis dependentes. Os fatores associados foram obtidos por meio do cálculo da razão de prevalência, cujo resultado diferente de 1 representa a maior prevalência do desfecho entre expostos (RP > 1) ou entre não expostos (RP < 1), a cada variável independente.

A seleção das variáveis independentes do estudo foi realizada tendo como critério a plausibilidade fisiopatológica e epidemiológica, a partir das evidências mais consistentes encontradas na literatura. Cálculos das prevalências e razões de prevalência para cada um dos três desfechos, segundo as variáveis independentes, foram conduzidos, inicialmente, em análise univariada. Para análise multivariada, os autores optaram pela regressão de Cox, para a obtenção das razões de prevalência ajustadas, uma vez que a odds ratio fornecida pela regressão logística pode superestimar as associações encontradas, em especial quando os desfechos têm média a alta frequência3030. Coutinho LMS, Scazufca M, Menezes PR. Métodos para estimar razão de prevalência em estudos de corte transversal. Rev Saúde Pública. 2008;42(6):992-8.. Foram inseridas no modelo inicial todas as variáveis selecionadas e foram mantidas no modelo final as variáveis que determinaram excesso ou redução do risco maior ou igual a 10%.

Considerando a natureza desse estudo cuja população é um censo, e não uma amostra probabilística, não foram utilizados procedimentos de inferência estatística (valor de p ou intervalos de confiança)3131. Hahn GJ, Meeker WQ. Assumptions for Statistical Inference. Am Stat. 1993;47(1):1-11.

32. Rothman KJ. Six persistent research misconceptions. J Gen Intern Med. 2014;29:1060-4.
-3333. Greenland S. Randomization, Statistics, and Causal Inference. Epidemiology. 1990;6(1):421-9..

Os dados coletados foram processados e analisados por meio do software SPSS, versão 23.

RESULTADOS

Dos 616 alunos matriculados regularmente do primeiro ao oitavo semestre do curso de Medicina durante a coleta, um total de 556 participou do censo, com uma proporção de resposta de 90,2%. Nessa população, foram encontrados 289 (51,8%) estudantes do sexo feminino e 267 (48,1%) do sexo masculino.

Entre os 556 estudantes, 321 (58,7%) registraram o uso de bebidas alcoólicas, com predomínio entre os homens (63%). Com relação ao binge drinking, a maior prevalência também foi encontrada entre os homens (39%), embora as mulheres tenham apresentado maior prevalência para a estratificação maior que quatro vezes por semana. Outro dado relevante foi a baixa prevalência do uso de fumo (4,8%), sendo o público masculino o maior consumidor (6%) (Tabela 1).

Tabela 1
Uso de álcool, frequência e intensidade desse uso e tabagismo entre estudantes de Medicina na Bahia, segundo o sexo

Em um modelo ajustado, os homens aparecem com um consumo referido de bebidas alcoólicas 43% maior que as mulheres. Quando questionados sobre o uso de álcool, nota-se uma associação positiva (28% a mais) entre esse hábito e estar dessemestralizado com a turma de origem. Para indivíduos ativos no lazer, quando comparados com indivíduos inativos nesse domínio, houve aumento de 27% na referência ao uso de álcool. Contudo, estar ativo no deslocamento parece ser um fator protetor para o uso de bebidas alcoólicas (Tabela 2).

Tabela 2
Fatores associados ao uso de álcool, mensurado pela presença do hábito entre estudantes de Medicina, na Bahia

O uso de bebidas alcoólicas com frequência maior ou igual a uma vez por semana associou-se com ser homem (76% a mais), ter mais de 23 anos (18%), autodeclarar-se branco ou amarelo (21% a mais quando comparados com pardos que tiveram 10% a mais de alta de frequência comparados com pretos), ser dessemestralizado (RP 1,42), ter menor coeficiente de rendimento (CR) (RP 1,37). Os solteiros apresentaram menor frequência de uso de bebidas, e verifica-se um aumento na frequência do uso de álcool com o passar dos anos de curso, sendo maior no terceiro e no quarto anos, quando comparados com o primeiro (34%). Nota-se também o aumento em 51% para esse hábito em indivíduos ativos no lazer, quando comparados com aqueles inativos nesse domínio. Entretanto, como na resposta para o uso de bebidas (sim/não), ativos no deslocamento bebem menos que os inativos para esse domínio. (Tabela 3).

Tabela 3
Fatores associados ao uso de álcool, mensurado pela frequência de uso, entre estudantes de Medicina, na Bahia

Quanto à variável dependente binge drinking (Tabela 4), há maior prevalência desse comportamento entre os homens (21%), entre os solteiros, dessemestralizados, em indivíduos com menor CR (RP ajustada de 1,19). Quanto aos anos de curso, existe um crescimento desse hábito conforme o avanço do curso. Com relação à AF, ser ativo no trabalho e no deslocamento pareceu ser um fator protetor para binge drinking. Já ser ativo em casa e no lazer apresentou associação positiva para esse consumo pesado, com 27% e 37% a mais entre os ativos fisicamente nesses domínios.

Tabela 4
Fatores associados ao uso de álcool, mensurado pela ocorrência do binge drinking, entre estudantes de Medicina, na Bahia

DISCUSSÃO

Neste estudo, descrevemos a prevalência do consumo de álcool e tabaco. Investigamos os fatores associados ao uso de álcool, por meio de três diferentes modalidades de mensuração desse hábito.

A prevalência de 4,8% para o uso de tabaco na população do presente estudo foi comparada com os achados do Vigitel nas seguintes categorias: população de Salvador, população nacional, mesma faixa etária e escolaridade maior que 12 anos.

No Brasil, o Vigitel, desde 2006, investiga doenças crônicas e fatores de risco na população do país, sendo atualizado a cada ano. Em uma série histórica construída com os dados do Vigitel, para fins de comparação com os resultados do presente estudo, verifica-se nos anos de 2006 a 2018, para estratos da população com semelhanças com a população de estudantes de Medicina do presente estudo, um declínio da prevalência do tabagismo entre residentes em Salvador-BA, indivíduos com idade entre 18-24 anos, e 25-34 anos, da população brasileira e ainda naqueles com escolaridade maior que 12 anos (Figura 1). Para o último ano da série, observa-se que a prevalência de tabagismo está entre 5% e 10%, portanto é compatível com os nossos achados. Essa queda do tabagismo tem sido considerada pelo Ministério da Saúde como uma grande conquista do ponto de vista da saúde da população brasileira.

Figura 1
Série histórica do uso de tabaco entre indivíduos brasileiros, segundo faixa etária, escolaridade e para Salvador

Ainda com o Vigitel, pode-se observar que Salvador é a capital com a menor prevalência de uso de tabaco, quando comparada a outras capitais brasileiras. Esse dado é acompanhado por grande parte das capitais do Nordeste e do Norte, que fumam menos, quando comparadas com outras regiões do país3434. Vigitel Brasil 2006-2018: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: Ministério da Saúde; 2006-2018..

Estudo conduzido em 2007 com população de estudantes de Medicina da mesma faculdade deste trabalho apontou que o uso de tabaco nos últimos 30 dias foi de 5,7%. Transcorrida mais de uma década, a prevalência encontrada neste estudo é ainda um pouco mais baixa1212. Nasser RL, Branco JC, Lara DR, Vecchio FBD, Wiener C, Mesquita P, et al. Atividade física de lazer e uso de substâncias lícitas em uma amostra populacional de adultos jovens. Ciênc Saúde Coletiva. 2016;21(1):63-70..

Prevalências mais altas de tabagismo entre estudantes de Medicina têm sido relatadas na literatura. Estudo italiano identificou 16,6% desse uso em 641 estudantes de Medicina3535. Lamberti M, Napolitano F, Napolitano P, Arnese A, Crispinp V, Panariello G, et al. Prevalence of alcohol use disorders among under- and post-graduate healthcare students in Italy. PLoS One. 2017;12(4):e0175719.. Prevalência similar foi vista (18,6%) com alunos do quarto ano provenientes do Mediterrâneo, Escandinávia, Israel, Irã e Hungria3636. Terebessy A, Czegléd E, Balla BC, Horváth F, Baláz P. Medical students’ health behaviour and self-reported mental health status by their country of origin: a cross-sectional study. BMC Psychiatry. 2016;16:171.. Resultado parecido com esses estudos foi encontrado em um corte transversal com estudantes de Medicina na Universidade Autónoma de Barcelona3737. Roncero C, Cintas LR, Egido A, Barral C, Pazos JP, Collazos F, et al. The Influence of Medical Student Gender and Drug Use on the Detection of Addiction in Patients. J Addict Dis. 2014;33(4)277-88., com 19,5% de tabagistas. Por outro lado, compatível com nossos achados na Bahia, Brasil, em recente estudo em uma universidade em Maringá (cidade do Paraná, Sul do Brasil), 2% dos estudantes referiram fumar mais de dez cigarros por dia e 7%, de um a dez3838. Bührer BE, Tomiyoshi AC, Furtado MD, Nishida FS. Análise da Qualidade e Estilo de Vida entre Acadêmicos de Medicina de uma Instituição do Norte do Paraná. Rev Bras Educ Méd. 2019;43(1):39-46..

Outro dado substancial vem de um artigo que reúne a prevalência de uso de tabaco e seus fatores associados em 16 países, entre eles países em desenvolvimento e desenvolvidos. Nota-se que o Brasil possui uma das menores prevalências entre as nações estudadas, somando-se, entre nós, uma das maiores taxas de abandono de fumo3939. Giovino GA, Mirza SA, Samet JM, Gupta PC, Jarvis MJ, Bhala N, et al. Tobacco use in 3 billion individuals from 16 countries: an analysis of nationally representative cross-sectional household surveys. Lancet. 2012;380(9842):668-79..

Para explicar esse fenômeno, as ações brasileiras, já reconhecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU), devem ser citadas como exitosas. O aumento dos impostos vem sendo feito desde 1990 com a primeira taxação específica para esse produto e medidas complementares em 2003 e 2006. Outra ação governamental é a proibição do fumo em lugares públicos (Lei nº 12.546/2011)4040. Brasil. Lei nº 9.294, Brasília, de 15 de julho de 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9294.htm. Acesso em: 26 mar. 2020.
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. Soma-se a essas o uso de alertas em embalagens, proibição da propaganda, o tratamento para deixar de fumar e a lei sobre a restrição ao acesso de jovens menores de 18 anos ao cigarro (n° 9.294/1998)4141. Brasil. Lei nº 12.546, Brasília, de 14 de dezembro de 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12546.htm. Acesso em: 26 mar. 2020.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...

42. World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2010. Geneva: World Health Organization; 2011.

43. Malta DC, Stopa RS, Santos MAS, Andrade SSCA, Oliveira TP, Cristo EB, et al. Evolução de indicadores do tabagismo segundo inquéritos de telefone, 2006-2014. Cad Saúde Pública. 2017;33(3):e00134915.
-4444. Observatório da Política Nacional de Controle de Tabaco. Inca, 2019. Disponível em: https://www.inca.gov.br/observatorio-da-politica-nacional-de-controle-do-tabaco/dados-e-numeros-prevalencia-tabagismo. Acesso em: 14 fev. 2020.
https://www.inca.gov.br/observatorio-da-...
. Portanto, a diminuição do número de fumantes pode ser atribuída a ações governamentais em múltiplas frentes em um esforço contínuo de décadas.

No presente estudo, encontramos a prevalência de 58,7% para o uso de álcool entre os estudantes. Entre as mulheres, 53% consomem bebidas alcoólicas contra 63% entre os homens. Uma associação positiva de 22%.

Em estudo conduzido com 332 estudantes de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais do primeiro ao sexto ano, encontrou-se uma prevalência de uso de álcool de 85,2%, e 37,7% bebiam com frequência de pelo menos uma vez por semana, achados esses maiores que os encontrados no presente estudo. Não houve diferença entre os sexos e entre os anos de curso para o consumo4545. Petroianu A, Reis DCF, Cunha BDS, Souza DM. Prevalência do consumo de álcool, tabaco e entorpecentes por estudantes de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Rev Assoc Med Bras. 2010;56(5):568-71.. Dados provenientes de estudo na Universidade Federal do Maranhão indicam 338 (63%) estudantes do primeiro ao décimo semestre. Desses, 64,2% bebem (58% dos homens e 51% das mulheres). Ainda nesse estudo, o semestre com maior prevalência do uso de álcool foi o nono, ressaltando a associação entre o maior consumo de bebidas alcoólicas e o avanço do curso, achado similar ao do presente estudo4646. Barbosa FL, Barbosa Rl, Barbosa MCL, Aguiar DL, Figueiredo IA, Ribeiro AC, et al. Uso de álcool entre estudantes de medicina da Universidade Federal do Maranhão. Rev Bras Educ Med. 2017;37(1):89-95.,4747. Carneiro EB, Braga RT, Silva LFD, Nogueira MC. Fatores associados a beber pesado episódico entre estudantes de medicina. Rev Bras Educ Med. 2012;36(4):524-30..

Nos estudos realizados com estudantes de Medicina provenientes da Itália e da Espanha, já citados, sobre os achados do tabagismo, foram encontradas prevalências de 85% e 69%, respectivamente, para o uso de álcool3535. Lamberti M, Napolitano F, Napolitano P, Arnese A, Crispinp V, Panariello G, et al. Prevalence of alcohol use disorders among under- and post-graduate healthcare students in Italy. PLoS One. 2017;12(4):e0175719.,3737. Roncero C, Cintas LR, Egido A, Barral C, Pazos JP, Collazos F, et al. The Influence of Medical Student Gender and Drug Use on the Detection of Addiction in Patients. J Addict Dis. 2014;33(4)277-88.. Em ambos, a população masculina foi a que mais bebe, indo ao encontro dos nossos resultados.

No presente estudo, encontrou-se associação de consumo de bebidas alcoólicas, maior frequência de uso por semana e binge drinking com estar ativo fisicamente no domínio do lazer. Há uma lacuna na literatura sobre esse tema entre estudantes de Medicina. Na população brasileira, em estudos com bases de dados populacionais de jovens e adultos, foi encontrada a associação inversamente proporcional entre estar sedentário e a exposição ao consumo de álcool e associação positiva entre o consumo de álcool e estar fisicamente ativo no domínio lazer1313. Fiorini JE, Alves AL, Ferreira LR, Fiorini CM, Durães SW, Santos RLD, et al. Use of licit and illicit drugs at the university of Alfenas. Rev Hosp Clin. 2003;58(4):199-206.

14. Bezerra J, Lopes AS, Hardman CM, Tassitano RM, Tenório MCM, Barros MGV. Consumo de bebidas alcoólicas e tabagismo: associação com inatividade física no lazer e comportamento sedentário. Rev Andal Med Deporte. 2015;8(1):1-6.

15. Costa JSD, Silveira MF, Gazalle FK, Oliveira SS, Hallal PC, Menezes AMB, et al. Consumo abusivo de álcool e fatores associados: estudo de base populacional. Rev Saúde Pública. 2004;38(2):284-91.
-1616. Lima D, da Silva M, Júnior O, Lima L, Sampaio A, Luiz O. Associação da atividade física de lazer com o consumo de bebidas alcoólicas em adultos. Bras Ativ Fís Saúde. 2017;22(6):576-83.. Pode-se considerar a possibilidade de o lazer ativo ser também uma porta de entrada para outras formas de socialização, que em geral estão vinculadas ao consumo de álcool. Ademais, uma contribuição desse estudo foi ter feito uso de um instrumento validado, que inclui a mensuração de AF em diferentes domínios. Com essa abordagem, considerada mais válida, permanece o achado de associação entre o uso de bebida alcoólica e ser ativo no domínio do lazer.

Como referido, foram encontrados 36% de binge drinking para os últimos 30 dias, com 32% de prevalência entre mulheres e 39% entre homens. Na literatura nacional, entre os estudantes universitários, o tema binge drinking ainda é escasso. Nesse sentido, o presente estudo traz uma contribuição ao conhecimento, ao tempo em que fornece evidências sobre possíveis fatores de risco para esse comportamento.

Estudo em uma universidade em Minas Gerais com 202 estudantes mostrou prevalência do BPE de 53%1010. Abreu TT, Maurílio AO, Liguori CC, Tavares DVP, Terceiro DMG, Cunha LGM, et al. O consumo de bebida alcoólica e o binge drink entre os graduandos de Medicina de uma Universidade de Minas Gerais. J Bras Psiquiatr. 2018;67(2):87-93., já um inquérito em outra faculdade mineira encontrou uma prevalência de 25%4747. Carneiro EB, Braga RT, Silva LFD, Nogueira MC. Fatores associados a beber pesado episódico entre estudantes de medicina. Rev Bras Educ Med. 2012;36(4):524-30.. Ambos os estudos usaram o AUDIT-C, instrumento de avaliação para o beber pesado episodicamente. Os autores encontraram em seus respectivos estudos associação positiva para esse desfecho com o sexo masculino, assim como no presente estudo, que encontrou 21% a mais de binge drinking entre os homens. O estudo, que encontrou prevalência de BPE de 25%, apresentou prevalência de 91% para o uso de álcool4747. Carneiro EB, Braga RT, Silva LFD, Nogueira MC. Fatores associados a beber pesado episódico entre estudantes de medicina. Rev Bras Educ Med. 2012;36(4):524-30..

Em coleta on-line e população-alvo não descrita, estudo de corte transversal com 2.408 estudantes da área de saúde encontrou associação positiva para o público masculino e o binge drinking4848. Bedendo A, Andrade ALM, Opaleye ES, Noto AR. Binge drinking: padrão associado ao risco de problemas do uso de álcool entre universitários. Rev Latino-Am Enfermagem. 2017;25:e2925.. No estudo com 485 estudantes de Medicina de uma Universidade Jesuíta nos Estados Unidos, foi encontrada uma prevalência desse hábito de 53%. Analisando os anos de curso, o quarto ano é o que apresentou maior prevalência, quando comparado com os outros, assim como em nosso estudo. Com relação à etnia, a branca foi apontada com 10% a mais sobre o outro grupo de risco (não brancos) para o binge drinking, como em nossa população4949. Trostler M, Li Y, Plankey MW. Prevalence of binge drinking and associated co-factors among medical students in a US Jesuit University. Am J Drug Alcohol Abuse. 2014;40(4);336-41..

Em geral, os homens fazem mais binge drinking, achado consistente com a literatura. Houve um achado de maior prevalência entre as mulheres, no estrato de binge drinking, com frequência de quatro vezes por semana, diferindo da tendência observada nos demais estratos.

A estratificação dos casos de binge drinking, segundo a frequência desse comportamento, resultou em pequeno número de indivíduos em cada estrato. Ademais, futuros estudos poderão contribuir com a investigação acerca das diferenças da frequência de padrão de consumo entre homens e mulheres.

Segundo dados do Vigitel (2018), o percentual do consumo abusivo de álcool (binge drinking) nos últimos 30 dias ficou entre 13,8% e 23,5% (maior) entre as capitais brasileiras, sendo essa última prevalência proveniente de Salvador, Bahia. Assim, o consumo da nossa população foi maior do que todas as capitais estudadas.

CONCLUSÃO

O uso de bebidas alcóolicas e seu padrão de consumo foram altos na população estudada. Os achados condizem com dados de outros estudos. Assim, medidas para a redução desse desfecho podem ser direcionadas a partir dos achados, que evidenciam os diferentes fatores sociodemográficos, escolares e ocupacionais associados aos desfechos. O uso de distintas modalidades de mensuração do hábito de beber permitiu ampliar o conhecimento. Além disso, adotar os diferentes domínios de AF para descrição da sua associação com os desfechos representou uma superação relevante da medida da AF apenas no domínio do lazer.

O estudo evidenciou a baixa prevalência de tabagistas nessa população. Esse achado condiz com os achados para a população onde a faculdade está inserida, mas diverge com relação ao mesmo público (estudantes de Medicina) de algumas regiões do mundo, nas quais o tabagismo é mais prevalente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2021

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2020
  • Aceito
    20 Ago 2020
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