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O impacto dos inibidores da HMG-CoA redutase na modificação da história natural da doença coronária

Atualização

O Impacto dos Inibidores da HMG-CoA Redutase na Modificação da História Natural da Doença Coronária

Sergio Emanuel Kaiser, Monica Luiza de Alcantara

Rio de Janeiro, RJ

No ultimo congresso da American Heart Association, em 1997, foram divulgados os resultados de dois estudos prospectivos multicêntricos de prevenção primária e secundária de eventos cardiovasculares através do uso a longo prazo de drogas inibidoras da HMG-CoA redutase, respectivamente, o estudo AF/Texcaps, comparando lovastatina e placebo em pacientes aparentemente saudáveis e o estudo LIPID, avaliando a eficácia da pravastatina frente ao placebo em pacientes com episódios anteriores de infarto do miocárdio (IM) ou angina instável.

As conclusões preliminares geradas por esses dois importantes estudos, somadas aos resultados amplamente conhecidos dos três ensaios clínicos precedentes 1-3, parecem completar as franjas de um amplo espectro de indicações para o emprego de um grupo de medicamentos que não somente mudou a história natural da doença coronária, como permitiu confirmar através de prova terapêutica, a importância dos conceitos recém adquiridos sobre a composição da placa aterosclerótica e seu papel na precipitação de acidentes coronários agudos. A partir da publicação desses novos resultados em periódicos, a comunidade médica disporá de numeroso banco de informações, abrangendo quase 150 mil pacientes/ano de acompanhamento prospectivo, constituindo-se em fonte para metanálises estatisticamente robustas em diversos subgrupos de risco.

Com base nas evidencias atualmente disponíveis, este artigo tem por objetivo: a) sumarizar os resultados dos cinco estudos de prevenção primária e secundária com inibidores da HMG-CoA redutase já completados; b) tecer considerações sobre os mecanismos de ação já conhecidos, aqueles ainda a explorar e as similaridades e diferenças entre as vastatinas existentes; c) redefinir, com base nestes resultados, as indicações e os subgrupos mais beneficiados pelo emprego das vastatinas na prevenção primária e secundária da doença coronária.

Todos os cinco grandes estudos foram prospectivos, placebo-controlados, aleatorizados, do tipo "intenção de tratar". A tabela I e a figura 1 sumarizam as principais características.


Estudos de prevenção primária com inibidores da HMG-CoA redutase

West of Scotland Coronary Prevention Study (WOSCOPS) - O fármaco empregado foi a pravastatina na dose de 40mg diários e o período de acompanhamento estendeu-se por quase cinco anos, findos os quais, observou-se uma redução altamente significativa no risco de ocorrência do desfecho primário, comparativamente ao grupo placebo (fig. 1). Reduções significativas foram observadas no risco relativo de infarto não fatal (p<0,001) e na mortalidade global. Outros desfechos secundários, como mortalidade cardiovascular em geral e procedimentos de revascularização, também foram expressivamente reduzidos. Os benefícios independeram de faixa etária, tabagismo ou níveis prévios de HDLc ou triglicerídeos. Não foram observadas quaisquer diferenças relativamente ao grupo placebo, na ocorrência de mortes violentas ou por câncer.

The Air Force/Texas Coronary Atherosclerosis Prevention Study (AF/TEXCAPS) - Os dados preliminares deste estudo foram apresentados na última reunião da American Heart Association e serão ainda objeto de publicação e análises mais detalhadas.

O objetivo primário desse projeto procurou responder a dúvida sobre a eficácia a longo prazo de um inibidor da HMG-CoA redutase, no caso a lovastatina, em reduzir a taxa de um 1º ataque cardíaco em indivíduos assintomáticos, com perfil lipídico mais representativo daquele encontrado na população geral.

Os níveis médios de lipídeos eram representados por um colesterol total de 225mg/dL, LDLc de 145mg/dL (130-190mg/dL) e HDLc <50mg/dL. A grande maioria dos pacientes exibia dois ou menos fatores de risco coronário. A lovastatina foi administrada, àqueles recrutados para seu emprego, na dose de 20 a 40mg, com valores médios em torno de 30mg. A redução do colesterol total foi de 18%, a do LDLc de 25% e a dos triglicerídeos de 15%, mantida ao longo do estudo. Após 4,8 anos, o comitê independente de análise dos resultados recomendou sua interrupção face às evidencias de benefício geradas pelo uso do fármaco (tab. I e fig. 1). A redução no risco de um desfecho primário em relação ao grupo placebo foi também expressiva nos subgrupos de fumantes (59%) hipertensos (43%) diabéticos (43%) mulheres (54%) homens (34%) e idosos >65 anos (29%). Com bases nesses resultados, os autores concluíram a apresentação deste estudo recomendando "o uso de 20 a 40mg de lovastatina, associadas a dieta e exercícios físicos em homens >45 anos e mulheres >55 anos com níveis de LDLc >130mg/dL e HDLc <50mg/dL".

Estudos de prevenção secundária com inibidores da HMG-CoA redutase

Scandinavian Simvastatin Survival Study (4S) - Um dos mais conhecidos, primeiro no gênero a ser publicado, em 1994, este estudo recrutou prospectivamente, pacientes entre 35 a 70 anos com níveis elevados de colesterol total, sobreviventes de IM ou angina instável (tab. I). O desfecho primário pré-especificado foi a mortalidade total. "Eventos coronários maiores", definidos como morte coronária, infarto agudo miocárdio (IAM) não fatal certo ou provável, e parada cardíaca ressuscitada, responderam pelo desfecho secundário. Inicialmente administrada na dose de 20mg, a sinvastatina foi posteriormente fornecida a 37% dos pacientes na dose de 40mg/dia. A redução média dos níveis de colesterol, LDLc e triglicerídeos, mantida ao longo do estudo, foi de, respectivamente, 25%, 35% e 10%, ao passo que o HDLc elevou-se cerca de 8%.

Após 5,4 anos de acompanhamento, observavam-se benefícios significativos para ambos os sexos e naqueles > e <60 anos. Análise posterior revelou benefício semelhante gerado pelo uso de sinvastatina independentemente dos níveis basais de HDLc e triglicerídeos, assim como ao longo de quatro diferentes categorias de indivíduos estratificados segundo níveis crescentes de LDLc 4.

Cholesterol and Recurrent Events (CARE) Study - Os integrantes deste estudo eram homens e mulheres com idade média de 59 anos, sobreviventes de um IM três a 20 meses antes do ingresso no estudo. O nível plasmático de colesterol total era <240mg/dL, os triglicerídeos <350mg/dL e os níveis de LDLc situaram-se entre 115 e 174mg/dL. As concentrações médias basais de colesterol total e LDLc eram de, respectivamente, 209 e 139mg/dL.

Na dose de 40mg diários, a pravastatina modificou favoravelmente o risco de um desfecho primário em 24% ao fim de cinco anos de acompanhamento (tab. I e fig. 1). Ao longo do estudo, a pravastatina reduziu os níveis de colesterol total, LDLc e triglicerídeos em, respectivamente, 20%, 28% e 14%, tendo elevado o HDLc em cerca de 5%.

Os desfechos secundários experimentaram uma redução significativa de risco: o de infarto não fatal foi reduzido em 23%, a necessidade de revascularização miocárdica em 27% e o risco de acidente vascular cerebral (AVC) em 31%, dado particularmente importante, por se tratar do 1º estudo do gênero em que este desfecho foi pré-especificado. Não se observaram diferenças significativas na mortalidade global ou não cardiovascular. Os resultados favoráveis à pravastatina foram consistentes ao longo de vários subgrupos, como fumantes, hipertensos, diabéticos, pacientes previamente revascularizados, indivíduos com disfunção ventricular esquerda, idosos entre 60 e 75 anos, homens e mulheres. Nestas, a redução de risco foi da ordem de 46%, contrastando com um valor de 20% para os homens.

Long-term Intervention with Pravastatin in Ischemic Disease (LIPID) Study - Os resultados preliminares deste estudo prospectivo, aleatório, placebo-controlado, foram apresentados na última reunião da American Heart Association. Desenhado de forma semelhante ao estudo CARE, diferiu deste essencialmente em função do maior número de pacientes recrutados e pela inclusão de pessoas com episódios prévios de angina instável, sem infarto prévio. A população alvo, deveria ter níveis de colesterol total dentro da média encontrada nas sociedades industrializadas, entre 155 e 251mg% e níveis de triglicerídeos <455mg/dL.

Os sobreviventes de IAM compunham 2/3 do total. O desfecho primário pré-especificado foi a mortalidade por doença isquêmica e os desfechos secundários principais foram a incidência de doença isquêmica fatal e infarto não fatal, revascularização miocárdica e AVC (fig. 1, tab. I).

No decorrer do estudo, a pravastatina na dose de 40mg diários reduziu os níveis de colesterol total, LDL e triglicerídeos em, respectivamente, 18%, 25% e 12% ao passo que o HDLc elevou-se em 6%.

O comitê de segurança recomendou, em 1997, a suspensão do estudo face aos benefícios evidentes conferidos pelo emprego do medicamento. Relativamente ao grupo placebo, o risco de um desfecho primário foi significativamente reduzido em 24%. As mortes coronárias mais infarto não fatal e o AVC foram reduzidos pela pravastatina em, respectivamente, 24% e 20%. Reduções estatisticamente significantes de 18%, 16% e 24% foram observadas para a necessidade de revascularização cirúrgica, angioplastia e mortalidade total. A incidência de câncer, por sua vez, foi semelhante nos dois grupos.

Possíveis mecanismos responsáveis pela ação benéfica dos inibidores da HMG-CoA redutase

Em 1993, o National Cholesterol Education Program, ao rever as recomendações referentes aos níveis ideais de LDL-colesterol (LDLc) a serem atingidos através de terapia orientada para a prevenção secundária da doença coronária, reduziu de 130 para 100mg/dL o limite considerado aceitável para impedir a progressão da aterosclerose 5. Este novo limiar, endossado pelo 2º Consenso Brasileiro sobre Dislipidemias 6 foi estabelecido com base numa série de estudos com desfechos angiográficos especificados, onde se constatou a necessidade de reduzir agressivamente os níveis plasmáticos desta lipoproteína, a fim de não só deter a evolução do processo, como também de promover algum grau de regressão das lesões já formadas 7. Uma série de evidências indiretamente obtidas por de cintigrafia miocárdica 8,9, ou métodos de investigação da função endotelial 10,11 porém, já evidenciava a melhora de vários indicadores clínicos e funcionais, muito antes de se detectar qualquer sinal de regressão nas lesões ateroscleróticas. Documentava-se também a pronta restauração da função vasodilatadora do endotélio vascular tanto na circulação coronária 12,13 como na periférica 14, através do uso de vastatinas isoladamente ou em associação com terapia antioxidante 15. Não surpreende, portanto, a atribuição da rápida melhora clínica dos pacientes coronários a uma melhora global da capacidade de vasodilatação arterial e arteriolar. Estas evidências, no entanto, pareciam quando muito, reforçar o vínculo entre a ação favorável do medicamento e sua capacidade de reduzir os lipídeos plasmáticos, antecipando alguns benefícios agregados ao mais desejado e ambicioso - a redução da morbimortalidade coronária - cuja possibilidade já se fazia sentir através de análises post-hoc dos estudos de desfecho angiográfico 7. Recentemente, no entanto, O' Driscoll e col notaram a ausência de correlação entre a melhora da função endotelial, obtida em apenas quatro semanas após o início de terapia com sinvastatina e a queda dos níveis séricos de LDLc, acenando com a possibilidade de efeitos desvinculados da redução do LDLc 16.

Uma das mais intrigantes sugestões de possíveis benefícios não ligados à redução do colesterol proporcionado pela terapia com vastatinas, foi aventada somente após a publicação dos primeiros estudos prospectivos, que documentavam a redução de eventos cardiovasculares, num período de seis a 18 meses, após o início do tratamento: o estudo POSCH 17 valendo-se de cirurgia de bypass ileal como forma de obter controle dos níveis de LDLc, oferecia uma rara oportunidade de documentar efeitos de intensidade similar à obtida com vastatinas, com a vantagem de independer de aderência a qualquer medicação. No entanto, foram necessários nove anos de acompanhamento até que algum benefício na redução de morbimortalidade fosse observado!

Uma análise subseqüente do estudo WOSCOPS trouxe à luz mais alguns interessantes dados, sugerindo fortemente a existência de benefícios adicionais conferidos pelo emprego de vastatinas, além dos resultantes unicamente do restabelecimento de níveis "normais" de LDLc. Os participantes deste estudo recrutados para o grupo "pravastatina" foram subdivididos em cinco categorias ou percentis, de acordo com a intensidade da redução do LDLc obtida através do uso do fármaco. A análise da relação entre os níveis de lipoproteína atingidos com o tratamento e a morbimortalidade cardiovascular, não revelou nenhum benefício adicional conferido pela redução do LDLc a mais de 20% dos valores basais 18,19. Nesse mesmo estudo, os autores compararam o percentual de eventos nos grupos "placebo" e "pravastatina" com os níveis equivalentes de colesterol derivados do modelo de previsão de risco do estudo de Framingham 20. No grupo placebo, a ocorrência de eventos correlacionou-se aos diferentes percentis de LDLc de forma superponível à curva derivada do modelo de Framingham, ao passo que no grupo pravastatina, os mesmos percentis de LDLc correlacionavam-se a uma ocorrência de eventos sistematicamente menor. Em outras palavras, enquanto a redução de risco relativo prevista pela alteração dos níveis plasmáticos no modelo era de 22%, a redução de risco obtida nos pacientes do grupo pravastatina era de 46%. Ainda nesta comunicação foi apresentado o resultado de uma análise de superposição que consistia em examinar a incidência de eventos durante o período do estudo, numa faixa de pacientes com nível semelhante de LDLc, entre 150 e 170mg/dL, já em uso do fármaco ou placebo correspondente. Foram desta forma identificados 466 pacientes do grupo pravastatina com LDLc médio de 159mg/dL e 446 do grupo placebo com LDLc médio de 159mg/dL (p=NS). Ao fim do estudo, após correção para fatores de risco basais, os pacientes recrutados para o uso de pravastatina neste subgrupo exibiam uma taxa de eventos 47% inferior (p<0,041) àquela observada para os indivíduos do outro grupo, apesar da equivalência entre os níveis de LDLc atingido.

Efeito sobre o metabolismo das IDL e outras funções celulares - Ao bloquear no hepatócito a conversão da HMG-CoA em mevalonato, as vastatinas limitam numerosas etapas subsequentes na cadeia de biossíntese do colesterol, incluindo a síntese das IDL, remanescentes altamente aterogênicos das VLDL, ricas em apo B-100 21,22. Tal atributo é exclusivo desta classe de redutores do colesterol.

A atividade das vastatinas limita a velocidade de síntese não somente do colesterol, mas também de uma gama de moléculas envolvidas em funções como respiração celular e transdução de sinais. Portanto, estes fármacos poderiam modificar outros constituintes do meio vascular, com repercussões ainda não totalmente esclarecidas sobre o processo aterosclerótico 23.

Ação estabilizadora da placa - Uma série de processos de natureza hemostática e inflamatória, profundamente ligados à instabilização da placa aterosclerótica, parecem ser afetados pelos inibidores da HMG-CoA redutase. Estudo em modelos ex-vivo empregando a pravastatina por 2 a 3 meses indicaram redução da formação de trombo plaquetário, possivelmente secundária à limitação da síntese de tromboxane A2 induzida pela droga 24. Algumas vastatinas parecem inibir a interação entre plaquetas e fibrinogênio sérico 25 e reduzir a expressão de vários agentes envolvidos na cascata de coagulação 26.

Crescentes evidências apóiam a existência de efeito antiinflamatório possivelmente mediado por a) ação antiproliferativa 27, b) bloqueio da ativação de macrófagos e formação de células espumosas 28,29 e c) inibição da atividade do fator de crescimento derivado de plaquetas 30, um poderoso estimulante da proliferação de células musculares lisas 31. Em doses habituais in vitro, as vastatinas também modulariam a função imune, alterando a regulação da transcrição do DNA, a atividade citotóxica de células killer e inibindo a citotoxicidade celular dependente de anticorpos 32.

Também tem sido documentada a modificação do potencial oxidativo das LDL induzida por vastatinas, sinalizando, pois, a participação de efeito antioxidante 33,34,35.

As diferenças entre os inibidores da HMG-CoA redutase revestem-se de relevância clínica? - Existem atualmente seis compostos em uso clínico, todos disponíveis no Brasil ou com lançamento previsto para breve.

A literatura está repleta de estudos comparativos diretos e indiretos entre os principais compostos, sumarizados em parte por pelo menos uma metanálise de porte, reunindo as diversas informações recolhidas de 52 estudos duplo-cegos 36. Relativamente à potência, observa-se em todos os compostos uma relação dose-efeito 36,37, tornando possível, ainda que a custos diferentes, reduções comparáveis do LDLc mediante ajuste da equivalência de doses quase sem comprometimento da tolerabilidade. A atorvastatina exibe as reduções mais expressivas do LDLc a doses equivalentes, baixando também significativamente os triglicerídeos, motivo pelo qual representa a escolha ideal para tratamento de hipercolesterolemia familiar 38. Pelo menos dois estudos independentes 39,40 evidenciaram uma interessante propriedade da fluvastatina, cuja potência aumentaria em cerca de 13% para cada incremento de 100mg/dL na concentração basal de LDLc, propriedade capaz de favorecer também a escolha deste fármaco em pacientes com hipercolesterolemia mais grave.

Tentativas de comparação entre os diversos agentes exibem considerável heterogeneidade relativamente às ações das vastatinas sobre influências trombóticas e hemostáticas, cuja relevância clínica parece sedimentada. Metodologias diversas, diferentes critérios de aferições, diferentes perfis clínicos de pacientes, número de casos insuficientes e trabalhos institucionais sem confirmação multicêntrica criam um terreno bastante movediço, especialmente vulnerável a pressões da indústria farmacêutica, preocupada, admissivelmente, em valorizar seus respectivos produtos na busca pela maior fatia possível de um gigantesco mercado consumidor.

Considerações mercadológicas à parte, é fato que até o presente momento, somente três destes fármacos foram testados em estudos prospectivos, aleatorizados e placebo-controlados, dentre os quais responde a pravastatina por cerca de dois terços dos 150 mil pacientes/ano de observação. Muito embora as seis vastatinas disponíveis pareçam compartilhar propriedades comuns, seria preferível reservar o uso dos fármacos ainda não amplamente testados a situações mais específicas, como por exemplo, prescrever a fluvastatina àqueles menos providos de recursos em função do mais baixo custo ou recomendar o uso de atorvastatina a pacientes com hipertrigliceridemia associada.

Deve-se buscar a redução absoluta ou percentual do LDL-colesterol? - Há cerca de oito anos, anteriormente à era das vastatinas, Holme 41 concluía através de metanálise abrangendo os 15 estudos de intervenção existentes, que, para cada redução percentual do colesterol, a correspondente redução de eventos era menor em populações com níveis basais de colesterol mais baixos, aumentando exponencialmente com o aumento de suas concentrações plasmáticas. Conseqüentemente, o benefício clínico advindo da redução do LDLc seria desigual, concentrando-se na margem superior da curva de distribuição dos níveis lipídicos basais, em concordância com a morfologia curvilínea entre concentração de colesterol e risco cardiovascular definida pelo estudo MRFIT 42.

Semelhante conclusão pareceu emergir de uma análise dos estudos com desfecho angiográfico, onde o benefício resultante de grandes reduções do LDLc era bem mais nítido em pacientes com elevados níveis séricos basais de lipídeos, ao contrário daqueles com colesterol apenas moderadamente ou pouco elevado, onde não se fazia notar regressão substancial da aterosclerose com o tratamento 43.

O estudo CARE, por sua vez, analisando desfechos clínicos, não evidenciou benefícios significativos naqueles indivíduos com concentrações basais de LDLc <125mg/dL 44. Neste caso, diferenças significativas em favor da vastatina talvez até existam, mas para documentá-las, teria sido necessário tratar um maior número de pacientes, uma vez que o benefício absoluto em indivíduos com níveis mais baixos de LDLc seria necessariamente menor.

Com relação ao objetivo ideal a ser atingido com a terapêutica, recente metanálise abrangendo 34 estudos de prevenção secundária não encontrou evidência de um nível limiar para redução do LDLc - em outras palavras - em coronariopatas, quanto menor o LDLc, melhor 45. Em apoio a esta tese, um estudo envolvendo pacientes revascularizados com pontes de safena só demonstrou interrupção do processo aterosclerótico nos enxertos, naqueles cujos níveis de LDLc foram agressivamente reduzidos a menos de 100mg/dL 46.

A fim de determinar a correlação entre a magnitude dos níveis atingidos durante o tratamento e a intensidade do benefício obtido, os autores do estudo 4S dividiram os integrantes do ensaio em três categorias de redução percentual de LDLc produzida por sinvastatina: abaixo de 34%, entre 34 e 44% e entre 44 e 70%. As respectivas reduções no risco de um desfecho primário foram 10%, 13,3% e 18,9% 47. Por outro lado, como já comentado anteriormente, os investigadores do WOSCOPS e, segundo publicação recentemente divulgada, também os responsáveis pelo estudo CARE não observaram benefícios comparavelmente maiores mediante reduções percentuais do LDLc superiores a 20% dos valores basais 19,48.

Vale ressaltar, este gênero de análise de subgrupos oriundos de estudos prospectivos funciona como boa fonte geradora de hipóteses, especialmente quando biologicamente plausíveis, mas carece de poder para determinar mudanças de conduta. Por este motivo, deve prevalecer entre nós a recomendação do Consenso Brasileiro 6, ao menos até o surgimento de novos estudos prospectivos desenhados para responder especificamente a esta questão. Ou seja, em prevenção primária, buscar um LDLc <130mg/dL e em prevenção secundária <100mg/dL.

O elevado custo para nós, brasileiros, das doses de pravastatina empregadas nos grandes estudos nos impele necessariamente a perguntar se doses menores não exerceriam efeito similar. Infelizmente não há resposta concreta a esta indagação, especialmente se for levada em conta a participação dos efeitos não ligados à redução dos lipídeos. Traduzindo favoravelmente a eficácia de doses menores, mencione-se recente estudo prospectivo aleatorizado de 665 pacientes com idade média de 73 anos, onde um grupo foi tratado com 10 a 20mg de pravastatina e outro com doses ainda menores, de 5mg. A redução média de eventos cardiovasculares foi de 33,5% para um decréscimo de 20mg/dL no LDLc e chegou a 27% naqueles >de 75 anos 49.

Terapia hipolipemiante embasada em evidência - Os estudos prospectivos aleatorizados placebo-controlados representam a forma mais confiável para validação de uma proposta terapêutica, mas a aplicação de seus resultados no dia-a-dia requer certos cuidados, pois a estimativa do benefício absoluto e o custo-eficácia da terapia estudada podem tornar sua aplicabilidade bastante restrita. Ensaios clínicos deste porte requerem critérios de seleção muito restritivos, excluindo freqüentemente os pacientes mais idosos, mais enfermos ou aqueles portadores de comorbidades, donde resulta por fim, uma amostra nem sempre representativa da população encontrada no dia-a-dia do médico.

Como seria esperado, as vastatinas exercem sua ação preventiva máxima nos grupos de maior risco de eventos, como os hipercolesterolêmicos sobreviventes de um episódio coronário 50, cujo risco de eventos é três a seis vezes superior ao de uma população saudável com níveis semelhantes de lipídeos séricos 51,52. Portanto, como demonstra o exemplo da figura 2, o NNT *, ou seja, o número de pacientes necessários para tratar com sinvastatina por um período equivalente à duração do estudo 4S para impedir a ocorrência de um desfecho primário, foi equivalente a quase a 6ª parte do NNT para a pravastatina num subgrupo de pacientes "saudáveis" do WOSCOPS, entre 45-54 anos, cujo único fator de risco era a hipercolesterolemia.


Há de se tomar, também, cautela ao tentar estabelecer comparações entre a eficácia relativa dos diversos fármacos, tomando por base os ensaios clínicos prospectivos já publicados. As populações estudadas podem ser diferentes, assim como seus riscos relativos e absolutos, critérios de inclusão e exclusão e desfechos primários e secundários pré-especificados. Em relação aos grandes ensaios com vastatinas, somente os estudos CARE e LIPID, pela semelhança no desenho, permitem algumas comparações diretas. Diferentes desfechos pré-especificados e a concomitância de outras terapias de ação cardiovascular (tab. I) também dificultam as comparações diretas.

O custo aproximado do tratamento de 40 pacientes assintomáticos, hipercolesterolêmicos de meia idade, com 40mg de pravastatina por cinco anos para impedir uma morte coronária ou infarto não fatal é de aproximadamente 190 mil reais ou cerca de 38 mil reais por ano. Nos EUA, o custo correspondente para prevenção de uma morte cardíaca com a pravastatina seria equivalente a aproximadamente 686 mil dólares em cinco anos 53. Os resultados recentemente divulgados do estudo AF/TEXCAPS pareceram estender a abrangência dos efeitos benéficos das vastatinas a um contingente significativamente maior de pessoas, donde sérias implicações de ordem econômica podem resultar. A rigor, a fim de maximizar sua custo-eficácia, a decisão de tratar um indivíduo assintomático com drogas hipolipemiantes deve se basear nos resultados dos ensaios clínicos prospectivos referentes a populações com características próximas às do indivíduo em questão e procurar definir previamente o risco absoluto de um evento cardíaco, em cada caso particular, num determinado período de tempo. O benefício obtido deverá ser tanto maior quanto maior o risco absoluto daquele indivíduo. Para esta última finalidade, desnecessária em pacientes previamente coronariopatas, e portanto de alto risco, dispõem-se de tabelas já elaboradas, como as do consenso europeu para tratamento de dislipidemia 54 ou as tabelas de risco de Sheffield 55, tomando por base os modelos de Framingham. O benefício individual absoluto obtido com o tratamento seria equivalente ao produto entre a redução no risco relativo de um desfecho primário, conforme descrito no ensaio clínico prospectivo, e a estimativa do risco absoluto pré-tratamento determinada pela tabela escolhida. Ainda que relativamente alto, o NNT assim estimado para estudos de prevenção primária, como o WOSCOPS, compara-se favoravelmente com o de estudos consagrados 56, como o MRC para o tratamento de hipertensão arterial (fig. 2) tanto em idosos 57 como em indivíduos mais jovens 58.

É possível que métodos não invasivos como a medida da espessura íntima-média carotídea 52 e a detecção de calcificações coronárias por tomografia computadorizada ultra-rápida 59 venham a se converter em instrumentos custo-eficazes para refinar a indicação do uso de vastatinas mediante a detecção de graus mais sutis de agressão vascular em indivíduos mais jovens, com perspectivas de uso da medicação a longo prazo e naqueles com níveis limítrofes de lipídeos plasmáticos ou comorbidades indicativas de maior risco.

Os efeitos favoráveis das vastatinas são consistentes ao longo de todas as categorias de risco? - Diversos subgrupos de pacientes foram pré-especificados nos grandes ensaios clínicos e se justifica uma discussão mais detalhada ao longo dessas categorias, de modo a extrair o máximo de conclusões sobre as condutas mais custo-eficazes.

Pacientes diabéticos - Uma análise post-hoc do estudo 4S, ocupando-se apenas desta categoria de pacientes, revelou reduções no risco relativo de um desfecho primário similares às do restante do grupo, mas com benefício absoluto bem superior: a cada 100 pacientes hipercolesterolêmicos sobreviventes de um infarto tratados por seis anos com sinvastatina, nove eventos cardiovasculares maiores foram evitados em cada 29 pacientes não diabéticos, contrastando com 24 eventos evitados em cada 46 diabéticos 60. Cerca de 14% da população do estudo CARE era composta de diabéticos e para estes, a redução no risco relativo foi similar à observada no restante do grupo. Nos pacientes aparentemente saudáveis, com níveis medianos de LDLc integrantes do estudo AF/TEXCAPS, a redução de 43% no risco de um desfecho primário foi bem superior à encontrada no restante dos pacientes, mas somente 143 dentre os 6605 integrantes eram diabéticos, deixando margem, portanto, a especulações sobre a insuficiência de casos para uma análise estatística segura.

Com base nos dados disponíveis é possível, com boa margem de segurança, concluir pela possibilidade concreta de se obter extensão aos diabéticos do mesmo benefício conferido pelas vastatinas aos não diabéticos.

Pacientes do sexo feminino - Os níveis de colesterol total e LDLc elevam-se nas mulheres a partir da menopausa, onde valores médios de, respectivamente, 260mg/dL e 155mg/dL são atingidos por volta dos 65-69 anos. A partir dos 65 anos, a prevalência de hipercolesterolemia nas mulheres é superior à dos homens e, somado este fato à maior expectativa de vida no sexo feminino, pode haver mais mulheres que homens em risco a partir desta faixa etária 61. A tendência observada de queda dos níveis de LDLc em idades mais avançadas, infelizmente, não contribui para reduzir a incidência dos casos de coronariopatia, neutralizada que é pela contribuição do envelhecimento como fator de risco independente e devastador. Portanto, a terapia redutora de colesterol nas mulheres pós-menopausa seria, em tese, altamente custo-eficaz em função da possibilidade de gerar expressivas reduções de risco absoluto.

As evidências fornecidas pelos grandes ensaios clínicos para se avaliar o efeito das vastatinas sobre a redução de risco nas mulheres são ainda incompletas. Não obstante as tentativas de se recrutar um contingente significativo, capaz de responder às questões formuladas, as mulheres representam ainda, menos de 20 mil pacientes/ano de observação, pouco mais que a décima parte do sexo masculino, a grande maioria das quais, em estudos de prevenção secundária.

O estudo 4S demonstrou que a mulher hipercolesterolêmica sobrevivente de um IM beneficia-se das vastatinas tanto quanto os homens, ao menos em relação à prevenção da totalidade de eventos ou cirurgias de revascularização. Neste estudo, para o qual foram recrutadas 827 mulheres, não se observou redução das mortalidades total e coronária, possivelmente devido ao pequeno número de mortes registrado 62. No estudo CARE, a redução no risco relativo de um desfecho primário foi bem mais expressiva que nos homens, apesar dos níveis medianos de LDLc bem inferiores ao das pacientes do 4S.

Os resultados do estudo LIPID não demonstraram diferenças estatisticamente significativas na incidência de eventos entre as mulheres dos grupos tratado e placebo. Resta saber se a análise de subgrupos ainda a divulgar poderá revelar benefícios para alguma categoria de mulheres, como por exemplo, as hipercolesterolêmicas.

Existem até o momento, apenas 997 mulheres avaliadas num único estudo de prevenção primária, o AF/TEXCAPS, onde a redução em 25% dos níveis médios de LDLc em torno de 145mg/dL produziu uma expressiva redução de 46% no risco de um evento coronário, superior àquela observada nos homens. Estima-se neste tipo de paciente do sexo feminino, um risco de eventos coronários futuros em torno de cinco a 15% em 10 anos 63. Portanto, um resultado tão positivo, só pode ser interpretado aceitando-se a possibilidade de efeitos não ligados à redução do colesterol ou admitindo-se alguma inconsistência estatística nos achados. Esta última hipótese não pode ser levada em conta sem o exame detalhado do estudo, o que deverá ocorrer em 1998 por ocasião de sua publicação.

Quaisquer discussões sobre medidas de prevenção primária ou secundária de eventos coronários em mulheres não podem prescindir de considerações sobre uma alternativa terapêutica exclusiva do sexo feminino, representada pela terapia de reposição hormonal (TRH). Presentemente, há dois estudos prospectivos placebo-controlados em andamento com o objetivo de definir o real papel preventivo da TRH, com resultados previstos para o próximo século. Até o momento, dispõe-se apenas de evidências oriundas de estudos observacionais, sujeitas a interpretações subjetivas, mas fortemente indicativas de uma redução de até 45% na incidência de eventos coronários em mulheres tratadas com TRH 64-66.

Dois estudos duplo-cegos recentes compararam diretamente vastatinas e TRH isoladamente ou em combinação 67,68. As conclusões destes dois estudos levantam a possibilidade de benefícios equivalentes sobre o perfil lipídico, desde que consideradas conjuntamente as ações sobre HDLc e LDLc. A possibilidade de combinar-se as duas terapias em doses menores possibilitaria, segundo um desses estudos, efeitos sinérgicos com amplo potencial na prevenção de eventos cardiovasculares.

Conclui-se, portanto, pela necessidade de estudar mais a fundo, nas pacientes do sexo feminino, o significado clínico da administração de vastatinas, seja como única medida farmacológica redutora do colesterol, ou comparada e até mesmo associada em doses menores, a terapias alternativas e mais econômicas, especialmente na prevenção primária. Até o presente momento, podem ser considerados altamente promissores, mas não inequívocos os benefícios derivados da administração de vastatinas em mulheres normocolesterolêmicas, tanto em prevenção primária como secundária.

Pacientes idosos - Parece hoje fora de qualquer dúvida, a necessidade de se obter redução dos níveis de LDLc na população idosa. Todos os grandes ensaios clínicos demonstram a utilidade das vastatinas e sua maior custo-eficácia nos pacientes de até 75 anos, nos quais o benefício absoluto pode superar aquele obtido em pacientes mais jovens 2,3,61. Pacientes acima deste limite, entretanto, não foram estudados em número suficiente para permitir conclusões. No estudo CARE, cerca de 1116 pacientes entre 65 e 75 anos chegaram ao final da fase de acompanhamento com idades entre 70 e 80 anos. Nestes, a redução no risco de um desfecho primário foi de 32%, comparada a uma redução de 19% entre os pacientes mais jovens (diferença não-significativa). Entretanto, como a proporção de eventos nos idosos era bem maior, a redução absoluta de 5,2% no risco de eventos comparou-se muito favoravelmente com a redução absoluta de 2,1% nos mais jovens 69. Estes dados sugerem a possibilidade de extensão do benefício absoluto aos indivíduos >80 anos, embora somente um ensaio clínico controlado possa oferecer a resposta.

O desafio da aderência à terapia redutora do colesterol - A perspectiva de redução no risco de acidentes cardiovasculares oferecida pelo uso de inibidores da HMG-CoA redutase não se compatibiliza com uso ocasional, irregular ou intermitente. Entretanto, parece faltar até mesmo aos médicos, o grau de informação necessária para persuadir o paciente da necessidade de uso contínuo da medicação. Malgrado, por exemplo, a ampla divulgação na Escócia dos resultados do estudo WOSCOPS, um significativo percentual de indivíduos era aconselhado por seus médicos assistentes a interromper o consumo de pravastatina, por já se encontrarem normalizados os níveis de colesterol (Shepherd J, comunicação pessoal).

Em prevenção secundária, o quadro não é menos desanimador: O estudo HERS, atualmente em andamento, tem por objetivo primário estudar o efeito da terapia de reposição hormonal em mulheres pós-menopausa sobreviventes de um episódio coronário agudo. A fase de recrutamento, já concluída, possibilitou a publicação de um estudo visando avaliar que proporção de mulheres enquadrava-se nas recomendações propostas pelos ATP I e II do NCEP, respectivamente, LDLc<130mg/dL e LDL<100mg/dL 70-72. Nesta amostra de 2763 mulheres, vale ressaltar, 47% das pacientes consumiam um redutor de colesterol, representado, em 36% dos casos, por um inibidor da redutase. Entretanto, 63% delas não alcançavam sequer os objetivos propostos pelo ATP I, quanto mais os do ATP II, somente cumpridos por 9% das mulheres. Tais metas, por menos realistas que possam parecer, sugerem, na pior das hipóteses, uma atitude por demais complacente em relação à consciência do risco envolvido na manutenção de níveis elevados de LDLc após um insulto isquêmico agudo.

O estudo ASPIRE apresentou uma pesquisa sobre prevenção secundária de eventos coronários, realizada no Reino Unido, em 2.583 sobreviventes de um episódio agudo, igualmente distribuídos entre ambos os sexos 73. Após a alta hospitalar, somente cerca de 10% dos pacientes tomavam algum redutor de colesterol (não está comprovada a eficácia das vastatinas nos primeiros três meses após um episódio agudo), mas após seis meses, dentre as pessoas em uso de terapia hipolipemiante, cerca de 57% dos homens e 69% das mulheres exibiam colesterol total >220mg/dL. Em outro expressivo exemplo, mais da metade dos pacientes aos quais foram prescritos inibidores da redutase, já os haviam suspenso ao fim do 1º ano de uso 74.

Certamente, o alto custo individual da terapia representa fator de desestímulo à continuidade do tratamento, mas não justifica isoladamente tão elevado índice de abandono, tampouco compreensível por qualquer perfil individual desfavorável de tolerância clínica. Afinal, no berço do estudo WOSCOPS, a pravastatina era fornecida gratuitamente e mesmo assim, a taxa de abandono foi elevada.

Conclusão

Segundo a American Heart Association, a doença coronária terá representado, em 1997, um custo de 90,9 bilhões de dólares, divididos entre 47,5 bilhões em custos diretos e 43,4 bilhões em perda de produtividade. Deste montante, o gasto com medicação responderia por apenas 2,7 bilhões de dólares, o equivalente a 6% dos custos diretos e 3% dos custos totais 75.

Faz-se imperativo, portanto, um esforço educacional dirigido à população médica, particularmente não cardiologista, sobre a importância da prevenção primária e secundária da doença isquêmica com inibidores da HMG-CoA redutase. São os clínicos gerais, endocrinologistas, geriatras, médicos de família e médicos de atendimento primário, os principais responsáveis pelo atendimento ao maior número de pacientes em risco. Pelo lado da indústria farmacêutica, à semelhança do ocorrido com os inibidores da enzima conversora da angiotensina, espera-se uma redução do preço final dos medicamentos, por conta do aumento da concorrência entre as diversas empresas e do vencimento dos prazos de vigência das patentes de fabricação.

A participação fundamental dos órgãos governamentais e representativos da classe médica em campanhas visando motivar os indivíduos a promover radicais modificações em seus hábitos de vida, parece ter obtido resultado em países com elevada prevalência da enfermidade coronária e pode, igualmente, entre nós, gerar bons frutos. Assistimos preocupados à escalada de hábitos, como tabagismo e consumo exagerado de sódio e gorduras saturadas entre as classes mais desfavorecidas, justamente as maiores consumidoras dos cronicamente escassos recursos previdenciários. Os números amplamente divulgados na imprensa comprovam o aumento na expectativa de vida da nossa população e, seguramente, tal não ocorre às custas do envelhecimento de nossa minguada classe média. Sem um esforço de conscientização da classe médica e a devida atenção a medidas preventivas para este que constitui o maior segmento da população brasileira, jamais haverá recursos para melhorar, mesmo em alguns poucos pontos percentuais, a saúde de nosso povo.

Em escala planetária, apesar de muitos percalços, a ciência parece tornar mais próximo o sonho de se resgatar, com menos revascularizações e, esperançosamente, a baixo custo, um expressivo contingente de pessoas para uma vida produtiva dentro dos limites - ainda mutáveis - impostos por nossa finitude.

Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Clinex

Correspondência: Sergio Emanuel Kaiser - Rua Visconde Silva, 52 - S/705 - 22271-090 - Rio de Janeiro, RJ

Recebido para publicação em 20/2/98

Aceito em 13/5/98

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2002
  • Data do Fascículo
    Ago 1998

Histórico

  • Aceito
    13 Maio 1998
  • Recebido
    20 Fev 1998
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