Acessibilidade / Reportar erro

Principais características clínicas de pacientes que sobrevivem 24 meses ou mais após uma hospitalização devido a descompensação cardíaca

Resumos

OBJETIVO: Estudar as principais características clínicas dos pacientes com insuficiência cardíaca sobreviventes há mais de 24 meses após hospitalização para compensação. MÉTODOS: Estudados 126 pacientes com insuficiência cardíaca, em classe funcional III ou IV, com idade média de 51,7 anos, a maioria homens (73%), com fração de ejeção (FE) média de 0,36 e diâmetro diastólico (DD) do VE de 7,13 cm. Avaliaram-se as principais características clínicas e laboratoriais e no seguimento identificaram-se 25 (19.8%) pacientes que sobreviveram mais de 24 meses após a alta hospitalar. Compararam-se os dados dos sobreviventes (G1) aos dos que faleceram (G2) antes de 24 meses. RESULTADOS: No G1 encontraram-se níveis mais elevados do sódio sérico (138,3±3,4 vs 134,5±5,8 mEq/l; p=0,001), da pressão arterial (120,0 vs 96,7 mmHg; p=0,003) e da FE do VE (0,40±0,08 vs 0,34±0,09; p=0,004) e valores menores da uréia (59,8 vs 76,3 mg/dl; p=0,007), do tempo de protrombina (12,9 vs 14,8s; p=0,001), do DDVE (6,78±0,55 vs 7,22±0,91; p=0,003) e do diâmetro do AE (4,77 vs 4,99cm; p=0,0003). Houve mais sobreviventes entre os portadores de cardiomiopatia idiopática e hipertensiva do que entre os chagásicos e doença coronariana. Na análise multivariada permaneceram como variáveis preditoras independentes da mortalidade o DDVE > 7,8 cm (HR 1,95), o Na < 132 mEq/l (HR 2,30) e o tempo de protrombina > 14 seg (HR 1,69). CONCLUSÃO: O estudo permite predizer quais os pacientes com insuficiência cardíaca que poderão apresentar uma boa sobrevida após a alta e os com maior possibilidade de longa sobrevivência após a alta.

insuficiência cardíaca avançada; disfunção sistólica ventricular; sobrevida; hiponatremia e choque


OBJECTIVE: To study the major clinical characteristics of patients with heart failure who survived more than 24 months after hospitalization for compensation. METHODS: The study comprised 126 patients with heart failure in functional class III or IV, with a mean age of 51.7 years. Most patients were men (73%), had a mean ejection fraction (EF) of 0.36 and left ventricular diastolic diameter (DD) of 7.13 cm. The major clinical and laboratory characteristics were assessed, and, on follow-up, 25 (19.8%) patients, who survived more than 24 months after hospital discharge, were identified. Data of survivors (G1) were compared with those of patients who died (G2) before 24 months. RESULTS: In G1, the following levels were greater: serum sodium (138.3±3.4 vs 134.5±5.8 mEq/L; P=0.001); blood pressure levels (120.0 vs 96.7 mm Hg; P=0.003); and LVEF levels (0.40±0.08 vs 0.34±0.09; P=0.004); and the following levels were lower: urea (59.8 vs 76.3 mg/dL; P=0.007); prothrombin time (12.9 vs 14.8 seconds; P=0.001); LVDD (6.78±0.55 vs 7.22±0.91; P=0.003); and LA diameter (4.77 vs 4.99cm; P=0.0003). More survivors were found among patients with idiopathic cardiomyopathy and arterial hypertension than among patients with Chagas' disease and coronary artery disease. In multivariate analysis, the following variables remained as independent predictors of mortality: LVDD > 7.8 cm (HR 1.95); Na < 132 mEq/L (HR 2.30); and prothrombin time > 14 seconds (HR 1.69). CONCLUSION: The study allowed predicting which patients with heart failure will have a good survival after hospital discharge and those with a greater chance of a long survival after discharge.

advanced heart failure; ventricular systolic dysfunction; survival; hyponatremia; shock


ARTIGO ORIGINAL

Principais características clínicas de pacientes que sobrevivem 24 meses ou mais após uma hospitalização devido a descompensação cardíaca

Mucio Tavares de Oliveira Jr; Manoel Fernandes Canesin; Robson Tadeu Munhoz; Carlos Henrique Del Carlo; Airton Scipioni; José Antonio Franchini Ramires; Antonio Carlos Pereira Barretto

São Paulo, SP

Instituto do Coração - HC FMUSP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Mucio Tavares de Oliveira Jr Av. Enéas Carvalho Aguiar, 44 Cep 05403-000 - São Paulo - SP E-mail: mucio@incor.usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Estudar as principais características clínicas dos pacientes com insuficiência cardíaca sobreviventes há mais de 24 meses após hospitalização para compensação.

MÉTODOS: Estudados 126 pacientes com insuficiência cardíaca, em classe funcional III ou IV, com idade média de 51,7 anos, a maioria homens (73%), com fração de ejeção (FE) média de 0,36 e diâmetro diastólico (DD) do VE de 7,13 cm. Avaliaram-se as principais características clínicas e laboratoriais e no seguimento identificaram-se 25 (19.8%) pacientes que sobreviveram mais de 24 meses após a alta hospitalar. Compararam-se os dados dos sobreviventes (G1) aos dos que faleceram (G2) antes de 24 meses.

RESULTADOS: No G1 encontraram-se níveis mais elevados do sódio sérico (138,3±3,4 vs 134,5±5,8 mEq/l; p=0,001), da pressão arterial (120,0 vs 96,7 mmHg; p=0,003) e da FE do VE (0,40±0,08 vs 0,34±0,09; p=0,004) e valores menores da uréia (59,8 vs 76,3 mg/dl; p=0,007), do tempo de protrombina (12,9 vs 14,8s; p=0,001), do DDVE (6,78±0,55 vs 7,22±0,91; p=0,003) e do diâmetro do AE (4,77 vs 4,99cm; p=0,0003). Houve mais sobreviventes entre os portadores de cardiomiopatia idiopática e hipertensiva do que entre os chagásicos e doença coronariana. Na análise multivariada permaneceram como variáveis preditoras independentes da mortalidade o DDVE > 7,8 cm (HR 1,95), o Na < 132 mEq/l (HR 2,30) e o tempo de protrombina > 14 seg (HR 1,69).

CONCLUSÃO: O estudo permite predizer quais os pacientes com insuficiência cardíaca que poderão apresentar uma boa sobrevida após a alta e os com maior possibilidade de longa sobrevivência após a alta.

Palavras-chave: insuficiência cardíaca avançada, disfunção sistólica ventricular, sobrevida, hiponatremia e choque

A insuficiência cardíaca é, atualmente, reconhecida como doença de mau prognóstico1-5. A doença evolui, no início, de maneira insidiosa, mas à medida que os pacientes tornam-se sintomáticos, o prognóstico torna-se reservado. Sua forma avançada tem características de malignidade, e seus portadores com sobrevida menor do que aqueles com muitos tipos de câncer6.

Na história natural da insuficiência cardíaca, a necessidade de hospitalização para compensação está associada a maior comprometimento cardíaco e falência dos mecanismos de compensação. Os pacientes que são inernados, têm pior evolução, apresentando mortalidade 2 a 3 vezes maior do que os que não necessitaram de hospitalização3,7-10. Em nossa Instituição, atendemos pacientes com insuficiência cardíaca que necessitaram ser hospitalizados para compensação, grupo de maior gravidade e pior prognóstico.

Temos observado, que a sobrevida desses pacientes, mesmo com os novos esquemas terapêuticos, continua pequena, com menos de 50% de sobrevivência ao primeiro ano após a alta11,12. Entretanto, há pacientes que parecem desafiar estes resultados, sobrevivendo vários anos após a hospitalização.

Neste estudo procuramos avaliar as características dos pacientes com insuficiência cardíaca avançada, hospitalizados para compensação, e que tiveram longa sobrevida (mais de 2 anos).

Métodos

Foram estudados 126 pacientes com insuficiência cardíaca em classe funcional IV (NYHA), não consecutivos, atendidos no Serviço de Emergência do InCor e internados para compensação no Hospital Auxiliar de Cotoxó no período de 12/12/1993 a 25/09/1995. Os pacientes tinham disfunção ventricular esquerda, sinais de congestão pulmonar e hepática, edema de membros inferiores e haviam sido medicados no Pronto Socorro e como não conseguiram ter seus sintomas controlados com a terapêutica administrada, foram hospitalizados.

Foi critério de inclusão, a presença de disfunção ventricular sistólica de qualquer etiologia identificada por valores abaixo de 55% (método do cubo) e excluídos os pacientes que faleceram durante as primeiras 24h e aqueles com síndrome coronariana aguda, valvopatias com indicação cirúrgica, cardiopatias congênitas, insuficiência renal crônica ou creatinina sérica > 2,5 mg/dl e doenças fatais não cardíacas. Todos os pacientes foram avaliados clinicamente no dia da internação e submetidos à avaliação laboratorial e estudo ecocardiográfico.

As principais características clínicas da população estudada encontram-se na tabela I.

A maioria dos pacientes era do sexo masculino (73%), com idade média de 51,1±14,2 anos. A doença de Chagas foi a principal etiologia de disfunção ventricular (44,4%). Choque esteve presente em 31,7% dos pacientes. Ao ecocardiograma, o diâmetro médio do ventrículo esquerdo foi de 7,14±0,9cm, a fração de ejeção de 0,36±0,09 e 80,9% dos pacientes apresentaram insuficiência mitral moderada ou importante.

Na tabela II encontram-se os resultados dos exames laboratoriais do primeiro dia de internação.

A função renal esteve reduzida na maioria, com os pacientes apresentando níveis médios de uréia de 73,1±29,4 mg/dl e de creatinina de 1,48±0,39 mg/dl.

Os pacientes foram acompanhados no ambulatório do InCor após a alta. Todos aqueles que não mantiveram seguimento no InCor, foram contactados (ou seus familiares) no final de 1998, para verificar sua situação clínica ou obito. O tempo de seguimento médio foi de 15,3 ±13,8 meses.

Como o objetivo do estudo foi verificar as características clínicas basais dos pacientes que sobreviveram por mais de dois anos, dividimos a casuística em dois grupos: grupo 1 constituído por aqueles que continuavam vivos após 2 anos e o grupo 2 constituído por aqueles que morreram antes de completar dois anos de seguimento.

A análise estatística constituiu do cálculo da média e desvio-padrão, valor mínimo e máximo das variáveis contínuas. As variáveis categóricas foram apresentadas através de freqüência e porcentagem.

Os dois grupos foram comparados e para verificar se diferiam aplicou-se o teste t de Student para as variáveis contínuas e o teste do qui-quadrado para as variáveis categóricas. Para determinação dos preditores de mortalidade durante o período de seguimento, foi utilizada a análise de regressão múltipla pelo modelo dos riscos proporcionais de Cox. O modelo foi ajustado segundo as características clínicas e laboratoriais desta população. O critério utilizado para seleção das variáveis no modelo múltiplo foi o valor de p<0,200 na análise univariada. O modelo final foi construído pela técnica de Stepwise Forward e as variáveis foram mantidas no modelo final quando o valor de p fosse <0,050. O método de Kaplan-Meier foi utilizado para descrever as taxas de sobrevida para as variáveis relevantes determinadas pela análise de regressão. A diferença de sobrevida entre os grupos foi determinada pelo teste de log-rank. Em todas as etapas da análise foi adotado o nível de significância de 5%.

Resultados

No seguimento, identificaram-se 25 (19,8%) pacientes que sobreviveram por mais de 24 meses após a alta hospitalar. As principais características dos dois grupos encontram-se na tabela III.

Não houve diferença entre os grupos em relação à idade e sexo. Na análise univariada foram identificadas como preditoras de mortalidade ser chagásico, ter pressão arterial sistólica reduzida, pressão arterial média reduzida, presença de choque, diâmetro diastólico do ventrículo esquerdo superior a 7,8 cm, diâmetro do átrio esquerdo superior a 5,7 cm, a fração de ejeção inferior a 0,30, sódio plasmático inferior a 132 mEq/l, o nível de uréia superior a 55 mg/dl e tempo de protrombina superior a 14 segundos (tab. IV).

Nenhum paciente com diâmetro ventricular superior a 7,80 cm, com diâmetro do átrio esquerdo maior que 5,70 cm, fração de ejeção inferior a 0,30, e com sódio abaixo de 132 mEq/l sobreviveu após 24 meses de sua hospitalização (fig. 1, 2 e 3).




Na análise de regressão múltipla pelo modelo de riscos proporcionais permaneceram no modelo como variáveis independentes o diâmetro diastólico do ventrículo esquerdo supeior a 7,8 cm (HR 1,95; p=0,009), o nível de sódio plasmático inferior a 132 mEq/l (HR 2,30; p<0,001) e o tempo de protrombina superior a 14 segundos (HR 1,69; p=0,014) (fig. 4).


Discussão

Os pacientes com insuficiência cardíaca que necessitam de hospitalização para compensação, são em geral, portadores da forma avançada da doença, e evoluem com mortalidade mais alta do que os mantidos compensados, somente com a orientação do consultório1-5, 7-10.

Nos estudos populacionais, 10 a 20% dos portadores de insuficiência cardíaca morrem no 1º ano de evolução e as cifras atingem 50% aos 5 anos de seguimento1-5. Quando se analisa a sobrevida dos pacientes com insuficiência cardíaca hospitalizados, os números são mais sombrios, com mortalidade de 30 a 40% no 1º ano de evolução7-10.

Os pacientes deste estudo eram provenientes do Pronto Socorro, transferidos para a enfermaria quando não compensados após medicação de urgência. A não resposta a diuréticos, no pronto atendimento, selecionou os pacientes mais graves. Neste estudo pudemos observar que 60% desses pacientes faleceram no 1º ano de evolução, documentando população portadora de doença grave. Nossos achados são concordes com a literatura que sinaliza que a insuficiência cardíaca na forma avançada é doença com características malignas6.

A população de nosso estudo, parece ser mais grave do que as usualmente descritas nos estudos epidemiológicos, ou mesmo nos grandes ensaios, pois em nenhum estudo foi relatada mortalidade superior a 50%1-5,7-10,13,14.

Apesar de uma população com grande comprometimento cardíaco, encontramos 19,8% de pacientes que sobreviveram por mais de 2 anos. Os sobreviventes diferiram dos que morreram por apresentarem, ao exame clínico e laboratorial da admissão, maior pressão arterial, menor incidência de choque ou hipotensão, menor dilatação ventricular esquerda e atrial esquerda e maior fração de ejeção do ventrículo esquerdo, níveis de sódio normais, função renal pouco comprometida, bem como tempo de protrombina normal.

Os fatores preditores da boa ou má evolução estão relacionados com a fisiopatologia da insuficiência cardíaca e com os mecanismos descritos de progressão da doença15-18.

O resultado deste estudo é relevante, pois nos mostrou que, através da avaliação clínica e com exames laboratoriais corriqueiros, foi possível estratificar a população e identificar quais os pacientes com melhor potencial evolutivo. Esta informação tem grande conotação prática, pois, assim como identificamos os pacientes com bom potencial de evolução, também identificamos os de má evolução, aqueles que deveriam ser acompanhados atentamente e que seriam os principais candidatos a um transplante cardíaco ou procedimentos mais agressivos, necessários para tentar mudar a evolução da doença.

A presença de hipotensão ou choque foi um importante preditor de má evolução. Os pacientes que conseguem manter a pressão arterial sinalizam maior reserva cardíaca, fato associado à melhor prognóstico. Também na literatura a redução da pressão arterial é identificada como fator prognóstico independente nos estudos com população de pacientes hospitalizados devido a insuficiência cardíaca3,7,19. Valores da pressão arterial < 100 mmHg estão associados à maior mortalidade3,7,19.

A função cardíaca é outro importante determinante prognóstico5,10,15,16. Nossos dados documentaram que os pacientes com menor comprometimento cardíaco, menor dilatação cardíaca e maior fração de ejeção sobrevivem mais, mostrando que, para a população de pacientes, com insuficiência cardíaca avançada, a remodelação cardíaca, cada vez mais identificada como mecanismo de progressão da doença, tem papel indiscutível na história natural da doença5,10,15,16,20. Os pacientes com diametro diastólico do ventrículo esquerdo > 7,8 cm tiveram um risco de morte de quase duas vezes maior do que os com dilatação menor (HR 1,95) (fig. 1).

Nos exames de laboratório, a hiponatremia, a elevação da uréia e o tempo de protrombina mais prolongado estiveram associados a pior prognóstico. Os pacientes sobreviventes não apresentaram alterações de expressão nesses exames. Na literatura, a hiponatremia e a insuficiência renal, são freqüentemente identificados como preditores independentes da evolução dos pacientes com insuficiência cardíaca3,5,7,10,18-22. A hiponatremia é decorrente da estimulação neurohormonal aumentada e se mostra sempre um importante fator na estratificação prognóstica e é, freqüentemente, sinalizada como o fator de maior poder de identificação daqueles com pior prognóstico5,7,10,18-20. Nesta população estudada, considerando o nível de p e o resultado da análise multivariada, foi o sódio aquele de maior expressão estatítisca, valorizando a estimulação neurohormonal aumentada como importante determinante prognóstico. Os pacientes com hiponatremia tiveram um risco 2,3 vezes maior de morte do que os com sódio normal (fig. 2).

A presença de insuficiência renal é, com freqüência, identificada como importante fator prognóstico nos pacientes com insuficiência cardíaca, induzindo aumento da mortalidade diretamente proporcional ao grau de disfunção renal3,5,7,10,20-22.

Tanto a elevação da uréia como o prolongamento do tempo de protrombina são decorrentes do baixo débito cardíaco e congestão hepática, associadas à disfunção cardíaca característica da insuficiência cardíaca3,5,7,10,19,20. Na análise multivariada, o tempo de protrombina superior a 14s identificou pacientes com risco 1,69 vezes maior de morrer do que com tempo não tão prolongado (fig. 4).

Quando comparamos os valores encontrados nos dois grupos de pacientes (sobreviventes e não) pudemos notar que algumas dessas variáveis apresentavam valores que não são superponíveis, o que permitiu selecionar valores que identificaram pacientes de grande gravidade, uma vez que os valores não foram encontrados em nenhum sobrevivente. Assim, a dilatação do ventrículo esquerdo acima de 7,8 cm, identificou pacientes que faleceram sem completar 2 anos de sobrevida, o mesmo para fração de ejeção inferior a 0,30 e para o sódio plasmático abaixo de 132 mEq/l (fig. 1, 2 e 3).

Dois estudos que acompanharam a evolução de pacientes atendidos em unidade de emergência, um brasileiro e outro canadense, também identificaram a hiponatremia como importante preditora independente de má evolução19, 20. A hipotensão, a função renal deprimida e a dilatação ventricular também foram identificadas como preditoras de má evolução, sugerindo que as variáveis que identificamos são fortes preditores de evolução dos portadores de insuficiência cardíaca descompensada e que devem merecer atenção dos clínicos que atendem os pacientes nesta fase da doença.

Este estudo apresenta limitações, sendo uma delas que a maioria dos pacientes, embora medicada com os inibidores da ECA, não estava sendo medicada com betabloqueadores. É possível que, com sua prescrição, um maior número de pacientes tivesse sobrevivido mais de 24 meses e que as variáveis identificadas como prognósticas tivessem outros valores.

O reconhecimento da importância da participação da remodelação cardíaca, das alterações neurohormonais, da congestão venosa e da insuficiência renal na determinação prognóstica, reforça o papel do tratamento da insuficiência cardíaca com os bloqueadores neurohormonais (inibidores da enzima conversora da angiotensina, bloqueadores dos receptores da angiotensina e os bloqueadores da aldosterona) e dos betabloqueadores, que, reconhecidamente, modificam esses fatores identificados, modificando a evolução da doença.

Conclui-se que 19,8% dos pacientes com insuficiência cardíaca avançada sobrevive mais de 24 meses após uma hospitalização para compensação. Os parâmetros da remodelação cardíaca, os níveis de sódio, uréia e o tempo de protrombina, permitem identificar, dentre os pacientes hospitalizados para compensação, quais os com maiores possibilidades de sobreviverem mais longamente após a alta. A avaliação pela clínica e através de exames laboratoriais simples permite estratificar os portadores de insuficiência cardíaca e reconhecer quais os que terão melhor evolução.

Enviado em 26/01/2004

Aceito em 16/06/2004

  • 1. McKee PA, Castelli WP, McNamara PM, Kannel WB. The natural history of congestive heart failure: the framingham study. N Engl J Med 1971; 285: 1441-6.
  • 2. Levy D, Kenchaiah FS, Larson MG, et al. Long-term trends in the incidence of and survival with heart failure. N Engl J Med 2002; 347: 1397-402.
  • 3. Muntwylwe J, Abetel G, Gruner C, Follath F. One-year mortality among unselected outpatients with heart failure. Eur Heart J 2002; 23: 1861-6.
  • 4. Cowie MR, Mosterd A, Wood DA, et al. The epidemiology of heart failure. Eur Heart J 1997; 18: 208-25.
  • 5. Kearney MT, Fox KAA, Lee AJ, et al. Predicting death due to progressive heart failure in patients with mild-to-moderate chronic heart failure. J Am Coll Cardiol 2002; 40: 1801-8.
  • 6. McMurray JJV, Stewart S. The burden of heart failure. Eur Heart J 2002; 4 (suppl D): 50-8.
  • 7. Wong PS, Davidsson GK, Timeyin J, et al. Heart failure in patients admitted to hospital mortality is still high. Eur J Intern Med 2002; 13: 304-10.
  • 8. Jong P, Vowinckel E, Liu PP et al. Prognosis and determinants of survival in patients newly hospitalized for heart failure. A Population-Based Study. Arch Intern Med 2002; 162: 1689-94.
  • 9. Blackledge HM, Tomlinson J, Squire IB. Prognosis for patients newly admitted to hospital with heart failure: survival trends in 12220 index admissions in leicestershire 1993-2001. Heart 2003; 89: 615-20.
  • 10. Baker DW, Einstadter D, Thomas C, Cebul RD. Mortality trends for 23505 medicare patients hospitalized with heart failure in northeast ohio, 1991 to 1997. Am Heart J 2003; 146: 258-64.
  • 11. Canesin MF, Giorgi D, Oliveira Jr MT, et al. ambulatory blood pressure monitoring of patients with heart failure. A new prognosis marker. Arq Bras Cardiol 2002; 78: 83-9.
  • 12. Del Carlo CH, Pereira-Barretto Ac, Cassaro-Strunz C, et al. Serial measure of cardiac troponin t levels for prediction of clinical events in decompensated heart failure. J Cardiac Fail 2004; 10: 43-8.
  • 13. Pitt B, Zannad F, Remme WJ et al. The effect of spironolactone on morbidity and mortality in patients with severe heart failure. N Engl J Med 999; 341: 709-17.
  • 14. Packer M, Coats AJJ, Fowler MB, et al. Effect of carvedilol on survival in severe chronic heart failure. N Engl J Med 2001; 344: 1651-8.
  • 15. Mann DL. Heart failure as a progressive disease. In. Mann DL, ed. Heart Failure. A companion to Braunwald's Heart Disease. Philadelphia, Saunders, 2004: 123-8.
  • 16. Cohn JN, Ferrari R, Sharpe N, et al. Cardiac remodeling-concepts and clinical implications: consensus paper from an international forum on cardiac remodeling. J Am Coll Cardiol 2000; 35: 569-82.
  • 17. Böhm M, Kilter H, Kindermam M. Mechanism contributing to the progression of left ventricular dysfunction to the end-stage heart failure. Eur Heart J 2003; 5 (suppl I): 114-21.
  • 18. Packer M, Lee WH, Kessler PD, et al. Role of neurohormonal mechanisms in determining survival in patients with severe chronic heart failure. Circulation 1987; 75 (suppl IV): IV 80-IV 92.
  • 19. Brophy JM, Deslauriers G, Rouleau JL. Long-term prognosis of patients presenting to the emergency room with decompensated congestive heart failure. Can J cardiol 1994; 10: 543-7.
  • 20. Vila Corta H, Mesquita ET, Cardoso R, et al. Emergency department predictors of survival in decompensated heart failure patients. Rev Port Cardiol 2003; 4: 495-507.
  • 21. Al-Ahmad A, Rand WM, Manjunath G, et al. Reduced kidney function and anemia as risk factors for mortality in patients with left ventricular dysfunction. J Am Coll Cardiol 2001; 38: 955-62.
  • 22. Smith GL, Vaccarino V, Kosoborod M et al. Worsening renal function: what is a clinically meaningful change in creatinine during hospitalization with heart failure? J Cardiac Fail 2003; 9: 13- 25.
  • Endereço para correspondência

    Mucio Tavares de Oliveira Jr
    Av. Enéas Carvalho Aguiar, 44
    Cep 05403-000 - São Paulo - SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Mar 2005
    • Data do Fascículo
      Fev 2005

    Histórico

    • Aceito
      16 Jun 2004
    • Recebido
      26 Jan 2004
    Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@cardiol.br