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Perfil lipídico de indivíduos sem cardiopatia com sobrepeso e obesidade

Resumos

OBJETIVO: Avaliar o perfil lipídico de indivíduos com sobrepeso e obesidade submetidos à avaliação cardiológica e que não mostraram evidências de cardiopatia. MÉTODOS: Amostra com 684 indivíduos, 389 (56,9%) mulheres e 295 (43,1%) homens, com idade de 14 a 74 (média 40,6) anos, sem evidências de cardiopatia após avaliação clínica e análise do eletrocardiograma, radiografia do tórax, teste ergométrico em esteira e ecocardiograma bidimensional com Doppler. Foi estudado o perfil sérico de lípides e glicose quanto ao sexo e faixas do índice de massa corpórea (IMC) - eutróficos até 24,9 Kg/m², sobrepeso 25-29,9 Kg/m² e obesos > 30 Kg/m². RESULTADOS: Apresentaram diferença estatisticamente significativa entre os sexos (médias): glicose (mg/dL) de mulheres 90,21±23,13 e homens 95,28±28,64 (p<0.001); triglicérides (mg/dL) de mulheres 97,27±55,24 e homens 141,47±57,06 (p<0,001) e HDL-C (mg/dL) de mulheres 52,63±13,92 e homens 43±10,88 (p<0,001). O IMC médio das mulheres foi 26,15 e dos homens 26,33 (p=ns). Na análise por faixas de IMC houve diferença significativa entre os sexos (p=0,037). Na faixa de sobrepeso e obesidade, apenas as médias de triglicérides das mulheres mostraram diferença estatisticamente significativa: mulheres com sobrepeso 102,25±60,68 mg/dL e obesas 121,64±63,57 mg/dL (p=0,034). CONCLUSÃO: Mulheres sem cardiopatia apresentaram níveis séricos de glicose, triglicérides e HDL-colesterol inferiores aos homens. Em ambos os sexos, as médias são menores na comparação entre eutróficos e com excesso de peso, e apenas as médias dos triglicérides das mulheres com sobrepeso e obesidade apresentou diferença significativamente estatística.

lípides, obesidade; sobrepeso; epidemiologia; índice de massa corpórea


OBJECTIVE: To assess the lipidic profile of overweight and obese individuals submitted to cardiologic assessment and who did not show evidences of cardiopathy. METHODS: Sample with 684 individuals, 389 (56.9%) women and 295 (43.1%) men, with age ranging from 14 to 74 (average of 40.6) years old, without evidences of cardiopathy after clinical assessment and analysis of electrocardiogram, thorax radiography, ergometric test on treadmill and two-dimensional Doppler echocardiogram. The serum profile of lipids and glucose regarding sex and ranges of body mass index (BMI) - eutrophic up to 24.9 Kg/m², overweight 25-29.9 Kg/m² and obese > 30 Kg/m², was studied. RESULTS: The following means showed a significant statistic difference between the sexes: glucose (mg/dL) in women 90.21±23.13 and men 95.28±28.64 (p<0.001); triglycerides (mg/dL) in women 97.27±55.24 and men 141.47±57.06 (p<0.001) and HDL-C (mg/dL) in women 52.63±13.92 and men 43±10.88 (p<0.001). The average BMI in women was 26.15 and in men 26.33 (p=ns). In the analysis through BMI ranges there was a significant difference between the sexes (p=0.037). In the categories of overweight and obesity, only the means of triglycerides in women showed a significant statistic difference: overweight women with 102.25±60.68 mg/dL and obese 121.64±63.57 mg/dL (p=0.034). CONCLUSION: Women without cardiopathy showed serum levels of glucose, triglycerides and HDL-cholesterol lower than men's. In both sexes, the means are lower in the comparison with eutrophic and overweight, and only the triglycerides average of women with overweight and obesity showed significant statistic difference.

lipids; obesity; overweight; epidemiology; body mass index


ARTIGO ORIGINAL

Perfil lipídico de indivíduos sem cardiopatia com sobrepeso e obesidade

Fernando Araújo; Alice T. Yamada; Marinalva V. M. Araújo; Maria do Rosário D. O. Latorre; Alfredo J. Mansur

São Paulo, SP

Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMUSP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Fernando Araújo InCor Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 05403-000 - São Paulo - SP E-mail: grafernando@incor.usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar o perfil lipídico de indivíduos com sobrepeso e obesidade submetidos à avaliação cardiológica e que não mostraram evidências de cardiopatia.

MÉTODOS: Amostra com 684 indivíduos, 389 (56,9%) mulheres e 295 (43,1%) homens, com idade de 14 a 74 (média 40,6) anos, sem evidências de cardiopatia após avaliação clínica e análise do eletrocardiograma, radiografia do tórax, teste ergométrico em esteira e ecocardiograma bidimensional com Doppler. Foi estudado o perfil sérico de lípides e glicose quanto ao sexo e faixas do índice de massa corpórea (IMC) - eutróficos até 24,9 Kg/m2, sobrepeso 25-29,9 Kg/m2 e obesos > 30 Kg/m2.

RESULTADOS: Apresentaram diferença estatisticamente significativa entre os sexos (médias): glicose (mg/dL) de mulheres 90,21±23,13 e homens 95,28±28,64 (p<0.001); triglicérides (mg/dL) de mulheres 97,27±55,24 e homens 141,47±57,06 (p<0,001) e HDL-C (mg/dL) de mulheres 52,63±13,92 e homens 43±10,88 (p<0,001). O IMC médio das mulheres foi 26,15 e dos homens 26,33 (p=ns). Na análise por faixas de IMC houve diferença significativa entre os sexos (p=0,037). Na faixa de sobrepeso e obesidade, apenas as médias de triglicérides das mulheres mostraram diferença estatisticamente significativa: mulheres com sobrepeso 102,25±60,68 mg/dL e obesas 121,64±63,57 mg/dL (p=0,034).

CONCLUSÃO: Mulheres sem cardiopatia apresentaram níveis séricos de glicose, triglicérides e HDL-colesterol inferiores aos homens. Em ambos os sexos, as médias são menores na comparação entre eutróficos e com excesso de peso, e apenas as médias dos triglicérides das mulheres com sobrepeso e obesidade apresentou diferença significativamente estatística.

Palavras-chave: lípides, obesidade, sobrepeso, epidemiologia, índice de massa corpórea

O excesso de peso e a dislipidemia aumentam o risco para doenças cardiovasculares ateroscleróticas1,2, que representam importante causa de morbidade e mortalidade no Brasil3. Intervenções para manutenção de peso saudável e valores normais de lípides fazem parte de medidas de prevenção primária para prevenção de doenças cardiovasculares, também em indivíduos sem evidências de cardiopatia4.

O conceito de excesso de peso reúne indivíduos com sobrepeso (índice de massa corpórea de 25 a 29,9 kg/m2) e obesidade (índice de massa corpórea > 30 kg/m2); admite-se correlação do aumento do índice de massa corpórea com o aumento do risco de doenças cardiovasculares5,6.

A associação entre excesso de peso e dislipidemia foi verificada em diferentes estudos1. Nos indivíduos com sobrepeso e obesidade, freqüentemente, encontramos elevações leves a moderadas dos níveis séricos de triglicérides, níveis séricos mais baixos de HDL-colesterol; contudo, os níveis séricos de LDL-colesterol podem ou não estar aumentados7.

Os estudos populacionais que identificaram a associação entre excesso de peso e dislipidemia basearam-se em portadores de doença aterosclerótica8-11. Esta associação foi menos estudada em indivíduos com estes fatores de risco, mas sem cardiopatia, e que, freqüentemente, procuram atendimento médico cardiológico com a finalidade preventiva ou de exame de saúde.

Os mecanismos pelos quais o aumento de peso contribui para o aumento da incidência de doenças cardiovasculares são múltiplos, entre eles, as alterações no metabolismo de glicose e lípides12-14. Formulamos a hipótese, que as taxas séricas de glicose e lípides, diferem entre os indivíduos sem cardiopatia classificados como em estado de sobrepeso e obesidade.

Realizamos este estudo para comparar as taxas séricas de glicose e lípides de indivíduos assintomáticos sem evidência de cardiopatia, quanto ao índice de massa corpórea categorizado como condição eutrófica, sobrepeso e obesidade.

Métodos

Realizamos um estudo de corte transversal numa coorte de indivíduos assintomáticos e sem evidências de cardiopatia da Unidade Clínica de Ambulatório Geral do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Esta Unidade oferece atendimento médico em diferentes níveis de complexidade - primário, secundário e terciário. A coorte foi desenvolvida a partir de pacientes submetidos à avaliação médica (check up) no âmbito do projeto Avaliação Cardiológica.

Os indivíduos assintomáticos elegíveis para o protocolo, de acordo com os critérios de inclusão e exclusão descritos abaixo foram convidados a participar do protocolo, e os que concordaram, assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.

Foram critérios de inclusão: a) indivíduos de ambos os sexos, qualquer raça, e com idade > 14 anos, assintomáticos e sem antecedentes de cardiopatia; b) exames físico geral e especial normais realizados pelo médico; c) eletrocardiograma normal; d) radiografia do tórax com área cardíaca e campos pleuro-pulmonares normais; e critérios de exclusão: a) história pregressa ou atual de doença cardiovascular ou sintomas cardiológicos; b) antecedentes de: hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, doença de Chagas, hipertireoidismo, hipotireoidismo, doença pulmonar obstrutiva crônica, asma, insuficiência renal, doenças inflamatórias crônicas, anemia, neoplasias e doenças osteoarticulares, uma vez que estas afecções podem desencadear cardiopatias ou impossibilitar a correta avaliação cardiológica; c) exames laboratoriais compatíveis com diabetes mellitus, tireopatias, anemia, doença de Chagas e insuficiência renal; d) teste ergométrico compatível com isquemia miocárdica ou comportamento hipertensivo da pressão arterial; e) ecocardiograma bidimensional com Doppler com dilatação das camâras cardíacas, disfunção sistólica ou diastólica e valvopatias.

Foram estudados 684 indivíduos, 389 (56,9%) mulheres e 295 (43,1%) homens, com idades variando de 14 a 74 (média 40,6) anos; a média de idade das mulheres foi 40,85±11,61 anos e a dos homens 40,29±11,37 anos. A distribuição da etnia dos participantes foi: 516 (75%) brancos, 117 (17,1%) mulatos, 32 (4,7%) amarelos e 22 (3,2%) negros.

Foram estudadas as correlações dos níveis séricos de glicose, triglicérides, colesterol total, HDL-colesterol, LDL-colesterol, VLDL-colesterol, relação colesterol total/HDL-colesterol e relação LDL-colesterol/HDL-colesterol com o índice de massa corpórea de mulheres e homens assim categorizado: > 24,9 Kg/m2 indivíduo eutrófico, 25 a 29,9 Kg/m2 indivíduo com sobrepeso e > 30 Kg/m2 indivíduo obeso.

A análise descritiva foi feita por meio de porcentagens, médias, desvios-padrão e valores mínimos e máximos. A normalidade da distribuição foi avaliada pelo teste de Komolgorov-Smirnov. A comparação das médias dos índices de massa corpórea, de tabagistas e não tabagistas, segundo sexo foi feita pelo teste de Mann-Whitney. As comparações das médias das variáveis laboratoriais (glicose e lípides) quanto ao sexo e quanto ao índice de massa corpórea foram feitas pelo teste de Tukey Honest Significant Differences (Tukey-HSD). Foram considerados significantes valores de p<5%. Foi utilizado programa estatístico SPSS para Windows (versão 10.0).

O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do Hospital. Todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

Cento e sessenta participantes (23,4%) eram fumantes e 524 (76,6%) não fumantes. Os índices de massa corpórea de mulheres e homens não diferiram significativamente quanto ao tabagismo (tab. I).

As médias de colesterol total e de LDL-colesterol não diferiram significativamente quanto ao sexo, mas as médias das razões colesterol total/HDL-colesterol e de LDL-colesterol/HDL-colesterol apresentaram uma diferença estatisticamente significativa entre os sexos. A distribuição de outras variáveis quanto ao sexo (tab. II).

A média do índice de massa corpórea das mulheres (média 26,15±4,72) Kg/m2 e dos homens (média 26,33±4,04) Kg/m2 não apresentou diferença estatisticamente significante. Para o prosseguimento da análise 9 mulheres com índice de massa corpórea inferior a 18,5 kg/m2, e que não apresentavam evidências de anormalidade clínica, foram agrupadas juntamente com os indivíduos eutróficos (IMC até 24,9 kg/m2). A distribuição dos participantes da casuística quanto ao sexo e quanto a categorias do índice de massa corpórea mostrou diferença (p=0,037) (tab. III).

Analisamos a glicemia e a taxa séria de lípides quanto às categorias do índice de massa corpórea (eutrofia, sobrepeso, obesidade) e quanto ao sexo (mulheres na tabela IV e homens na tabela V).

As médias de glicose apresentaram diferença estatisticamente significativa entre mulheres eutróficas e com sobrepeso e obesidade, nos homens não se verificou diferença estatisticamente significativa. Os valores lipídicos apresentaram diferença estatisticamente significativa tanto em mulheres quanto em homens eutroficos em comparação com sobrepeso e obeso. Na análise comparativa entre o grupo com sobrepeso e obesidade, apenas nas mulheres as médias de triglicérides apresentaram diferença estatisticamente significativa.

Discussão

A amostra constitutiu-se de 56,1% de indivíduos com excesso de peso (IMC > 25Kg/m2), dos quais 60,2% homens e 43% mulheres. Num estudo de prevalência de indivíduos com sobrepeso e obesidade na região nordeste e sudeste do Brasil15, com idade média dos indivíduos de 29 anos e 5 meses, a prevalência de sobrepeso foi de 30% para homens e 26,6% para mulheres, e a prevalência de obesidade foi 6,7% para homens e 12,7 para mulheres. Nosso estudo apresentou maior prevalência de obesidade e sobrepeso, provavelmente devido à maior média de idade dos indivíduos envolvidos no estudo (40,6 anos). Para 2005, a previsão é de 57,5% de homens e 44,9% de mulheres com algum grau de sobrepeso ou obesidade16. Nossos resultados já sugerem este crescente aumento de indivíduos com excesso de peso.

Na análise da obesidade (IMC > 30Kg/m2), verificamos maior percentual de mulheres (17% de homens e 19,4% das mulheres). No estudo de Gigante e cols.17, a prevalência de obesidade foi de 21%, sendo de 25% entre as mulheres e 15% entre os homens. No estudo de Schieri e cols.18, a obesidade também foi mais prevalente nas mulheres que homens. Esses achados não diferiram quando foi analisada população da região nordeste do Brasil19. Os resultados do nosso estudo reproduzem a tendência de diferença quanto ao excesso de peso entre os sexos (p=0,037), com predominância no sexo feminino na categoria obesidade e do sexo masculino na categoria sobrepeso.

Quando analisamos apenas hipercolesterolemia (colesterolemia > 200 mg/dL) observamos freqüência de 46% da população em nosso estudo; e não verificamos diferença significativa entre os sexos. Outros estudos, com idêntico valor de corte, mostraram prevalência de hipercolesterolemia de 37%, em funcionários de uma indústria metalúrgica de São Bernardo do Campo, (SP)20 e de 35% em estudo com adultos do município de Cotia21. Estudo para determinação do colesterol envolvendo 81.262 indivíduos de outras cidades brasileiras, além de São Paulo22, mostrou que 40% deles apresentavam colesterol acima de 200 mg/dL, e como no achado do nosso estudo, também não houve diferença estatisticamente significativa entre os sexos.

Os valores da colesterolemia mostraram diferença estatisticamente significativa entre indivíduos eutróficos e com sobrepeso, curiosamente esse achado não ocorreu na comparação de eutróficos e com obesidade. O estudo de Souza e cols.23 que avaliou a prevalência de dislipidemia em outra região do Brasil revelou diferença estatisticamente significativa na prevalência de dislipidemia entre indivíduos com e sem sobrepeso, o mesmo não tendo sido verificado em relação à obesidade.

Com respeito às médias de LDL-colesterol, homens e mulheres não apresentaram diferença estatisticamente significativa (128 e 123 mg/dL respectivamente). Curiosamente, homens eutróficos não apresentaram médias de LDL-colesterol com diferença estatisticamente significativa em relação aos obesos, mas houve diferença na relação de eutróficos com sobrepeso. Obesos e indivíduos com sobrepeso não apresentaram médias estatisticamente diferentes. Nas mulheres, as médias de LDL-colesterol entre eutróficas e sobrepeso foram diferentes, bem como entre eutrófico e obeso. Observamos que 44% da população do presente estudo, apresentou níveis séricos desta lipoproteína > 130mg/dL, acima dos níveis recomendados pela III Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemia1. Estudos que utilizaram o ponto de corte > 130mg/dL observaram prevalências inferiores à encontrada em nosso estudo, como o realizado por Bertolami e cols.20 com metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SP), que encontraram 37% de indivíduos com níveis elevados de LDL-colesterol, e o de Cardoso e cols.24, em Cotia, observou uma prevalência de 34% desta dislipidemia. O estudo de Cercato e cols.25 não revelou nenhuma associação entre elevalação dos níveis de colesterol total e LDL-colesterol e obesidade.

Observamos na presente casuística que 14% de mulheres e 19% de homens apresentaram níveis de HDL-colesterol < 40 mg/dL. Os valores médios de HDL-colesterol foram mais elevados para mulheres, o que também foi observado em outros estudos brasileiros21,26. A diferença estatisticamente significativa entre as médias de HDL-colesterol de mulheres e homens provavelmente explica o achado das diferentes médias das razões colesterol total/HDL-colesterol e LDL-colesterol/HDL-colesterol, uma vez que colesterol total e LDL-colesterol não mostraram significativa diferença entre os sexos.

Os valores de triglicérides diferiram quanto ao sexo (p<0,001), os níveis de triglicérides foram superiores nos homens. Nas mulheres, as médias de triglicérides diferiram entre eutróficas, com sobrepeso e obesas. Nos homens com sobrepeso e obesidade não se verificou diferença significativa das médias das taxas de lípides séricos. Outros estudos brasileiros também encontraram prevalências superiores dos níveis de triglicérides séricos em indivíduos do sexo masculino27,28. Nesta casuística observamos 6% de mulheres e 22% de homens com níveis de triglicérides maiores que 150mg/dL, ponto de corte a partir do qual as medidas preventivas devem ser instituídas.

Nossos resultados quanto ao HDL-colesterol e triglicérides estão de acordo com os achados de outros estudos, ou seja, com o incremento do índice de massa corpórea há discreto a moderado aumento de triglicérides e redução do HDL-colesterol29-31, contudo, comparando indivíduos com sobrepeso e obesidade, as diferenças estatisticamente significativas ocorreram apenas nas médias séricas de triglicérides de mulheres.

As médias de glicose diferiram entre os sexos, e foram mais elevada nos homens. A prevalência de hiperglicemia em nossa população foi bem inferior do que as relatadas por Gus e cols.32. O fato de que os indivíduos com diagnóstico de diabetes mellitus foram excluídos do presente estudo, estaria contribuindo para a redução da prevalência de hiperglicemia em nossa população do estudo.

A casuística estudada foi composta por 684 indivíduos adultos selecionados a partir da clientela que demandava a Unidade Clínica de Ambulatório Geral do Instituto do Coração para avaliação cardiológica limitando o estudo. Uma amostra populacional aleatória e ponderada da cidade de São Paulo necessitaria da inclusão de indivíduos das mais variadas regiões da cidade, e de acordo com a representatividade populacional desta região, contudo esta informação não foi possível, impossibilitando este tipo de análise. Além disso outros fatores de risco como sedentarismo, história familiar de cardiopatia não foram quantificados.

O índice de massa corpórea possui a limitação de ser pouco descritivo quanto à distribuição de tecido adiposo muscular de um paciente individual. Os métodos de avaliação da distribuição de gordura corporal, embora eficazes, não foram suficientemente avaliados como indicadores de risco cardiovascular, não sendo utilizados na prática clínica7.

Em conclusão, na casuística da amostra populacional em estudo, sem evidências de cardiopatia, as mulheres apresentaram médias dos níveis séricos de glicose, HDL-colesterol e triglicérides menores que homens. Em ambos os sexos, estas médias são menores na comparação entre eutróficos e com excesso de peso, e apenas as médias de triglicérides das mulheres com sobrepeso e obesidade apresentou diferença estatisticamente significativa.

Enviado em 05/09/2004 - Aceito em 16/12/2004

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  • Endereço para correspondência

    Fernando Araújo
    InCor
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Maio 2005
    • Data do Fascículo
      Maio 2005

    Histórico

    • Aceito
      16 Dez 2004
    • Recebido
      05 Set 2004
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