IMAGEM
Fístula aorta-ventrículo direito. Uma complicação inesperada da endocardite bacteriana
Gustavo Carvalho; Reinaldo B. Bestetti; Moacir Godoy; Patrícia Cury; Antônio C. Leme Neto
Hospital de Base Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - São José do Rio Preto, SP
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Gustavo Carvalho Rua T 36, 3857 Ed. Monte Sinai ap. 704B Setor Bueno 74223-050 - Goiânia, GO E-mail: gustavocarvalho@cardiol.br
Homem, 22 anos de idade, branco, admitido com queixa de tosse seca, dispnéia aos esforços, palpitações e febre diária, com evolução de dois meses. Portador de cardiopatia e catarata congênita. Sua mãe foi vítima de rubéola no segundo mês de gestação.
PA = 160/90 mmHg nos membros superiores, não havia pulsos palpáveis nos membros inferiores. Impulsão sistólica constatada no 5° espaço intercostal esquerdo para-esternal, onde um frêmito irradiava-se até o 2° espaço intercostal direito para-esternal. Um sopro rude meso-telessistólico audível nesta região, irradiando para regiões cervical, subclavicular esquerda e interescapular. A hipótese diagnóstica foi endocardite infecciosa, estenose valvar aórtica e coarctação de aorta. Ao eletrocardiograma, ritmo sinusal e sobrecarga ventricular esquerda; a radiografia de tórax foi normal. Ao hemograma, anemia e leucocitose. Foi tratado, empiricamente, com ceftriaxona 3 g por dia.
À hemocultura, Streptococus viridans sensível ao antibiótico utilizado.
Com o tratamento, estava afebril e sem queixas. Houve instalação súbita de dispnéia, diaforese e palidez cutâneo-mucosa. Crepitações audíveis nas bases. Novo sopro contínuo no precórdio. O ecocardiograma demonstrou fístula aorta-ventrículo direito, valva aórtica bivalvular com imagens sugestivas de vegetações e coarctação de aorta (fig. 1). O paciente foi a óbito enquanto aguardava cirurgia cardíaca de emergência.
Os achados da necropsia: fístula aorta-ventrículo direito, além de confirmar os demais achados do ecocardiograma (figs. 2 e 3).
A endocardite permanece freqüente nos dias de hoje, principalmente em países em desenvolvimento, onde é elevada a prevalência da doença valvar reumática. Além disso, é uma complicação factível de cardio- patias congênitas1-3.
Um sopro rude no 2° espaço intercostal direito para-esternal, com irradiação para as regiões cervical, subclavicular esquerda e interescapular, leva-nos a suspeitar de estenose aórtica, associada a possível coarctação de aorta, que foi confirmada, clinicamente, pela ausência de pulsos nos membros inferiores. Hemoculturas positivas, associadas à cardiopatia estrutural com vegetações confirmadas pelo ecocardiograma, diagnosticaram endocardite, hipótese essa ratificada pelos achados de necropsia.
Na endocardite infecciosa, o reconhecimento de um novo sopro na região para-esternal esquerda, associada à insuficiência cardíaca aguda, sugere o diagnóstico de uma complicação mecânica grave, a qual necessita ser confirmada por um método de imagem, como o ecocardiograma ou o cateterismo cardíaco.
A fístula aorta-ventrículo direito na endocardite é um desafio e deveria ser pesquisada na deterioração clínica desta patologia, reconhecida e tratada em caráter de emergência. Um novo sopro contínuo indica esta condição. Mesmo com reconhecimento e tratamento cirúrgico rápido, na maioria das vezes, não poderíamos mudar o desfecho fatal deste caso.
REFERÊNCIAS
1. Karchmer AW. In: Braunwald E, editor. Heart Disease A Textbook of Cardiovascular Medicine. Philadelphia: Saunders. 1997: 1077-1104.
2. Ramos MC. Bacterial endocarditis: pathogenesis. Rev Soc Cardiol Est São Paulo 1995; 4: 371-5.
3. Steckelberg D. Endocarditis: Changing trends in epidemiology, clinical and microbiological spectrum. Postgrad Med 1993; 93: 235-8.
Recebido em 31/03/05
Aceito em 06/04/05
Endereço para correspondência
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
07 Dez 2005 -
Data do Fascículo
Nov 2005