Acessibilidade / Reportar erro

Novas diretrizes de reanimação cardiorrespiratória cerebral da sociedade americana de cardiologia (2005 - 2006)

ATUALIZAÇÃO CLÍNICA

Novas diretrizes de reanimação cardiorrespiratória cerebral da sociedade americana de cardiologia (2005 - 2006)

John Cook Lane

Universidade Estadual de Campinas, Fundação Centro Médico de Campinas - Campinas, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: John Cook Lane Rua Cajá, 230 13094-334 - Campinas, SP - Brasil E-mail: vanlane@uol.com.br

Palavras-chave: Ressuscitação cardiopulmonar, diretrizes.

Introdução

Este autor foi um dos introdutores da reanimação cardiorrespiratória moderna no Brasil no início da década de 19601-7, e desde então tem seguido as diretrizes da Sociedade Americana de Cardiologia (American Heart Association – AHA).

A cada cinco anos, essa sociedade se reúne em Dallas, Texas, Estados Unidos, para atualizar as diretrizes em relação à reanimação cardiorrespiratória8,9. No último encontro de 281 especialistas (141 dos Estados Unidos e 17 de outros países) em 2004, seguido de nova reunião em 2005 com 380 participantes, o resultado foi um novo documento de consenso internacional, publicado no Circulation8,9.

Essa atualização clínica tem por objetivo apontar as novas diretrizes de 2005-2006, em relação às diretrizes do ano 20008,9.

Compressões e ventilações

• Para oferecer compressões torácicas efetivas, deve-se "comprimir com força e velocidade". O tórax deve ser comprimido por cerca de 100 vezes por minuto em todas as vítimas, com exceção dos recém-natos.

• Deve-se permitir que o tórax recue à sua posição normal após cada compressão, usando igual tempo para compressão e descompressão.

• Limitar ao máximo as interrupções das compressões, pois toda vez que se param as compressões, o fluxo de sangue cessa.

• Recomendam-se duas ventilações para cada 30 compressões, quando se trata de um socorrista leigo ou profissional, ou de dois leigos.

• Quando existem dois profissionais, a freqüência deve ser 15:2. Após a obtenção de uma via aérea segura, deixa de existir sincronização entre compressões (cerca de 100 por minuto) e ventilações (8 a 10 por minuto).

• A cada cinco ciclos de compressões-ventilações (cerca de dois minutos) os profissionais devem trocar de posição entre si em razão do cansaço.

• A ênfase é oferecer ao paciente reanimação básica, isto é, abrir as vias aéreas, ventilar e circular, (ABC) de alta qualidade. Tal não tem sido praticado nos Estados Unidos e no Canadá, onde a sobrevida de paradas cardíacas tratadas fora do hospital tem sido de 6,4%8,9.

• Programas de ensino do ABC de alta qualidade associados ao uso de desfibriladores automáticos (Automatic External Defibrilators) usando para-médicos e/ou policiais localizados em aeroportos e cassinos resultaram no aumento da sobrevida entre 40% e 70% das vezes8,9.

• Embora as pesquisas ainda não tenham identificado a proporção ideal entre compressões e ventilações, sabe-se que quanto melhor forem realizadas as compressões, melhor será o aporte de sangue para o coração e o cérebro.

• Recomenda-se que cada ventilação dure um segundo e que seja suficiente para visivelmente expandir o tórax. No entanto, como o fluxo de sangue durante o ABC é bem abaixo do normal, a necessidade de ventilação também é menor que a normal.

• Uma ventilação com alta pressão aumenta a pressão intratorácica, que, por sua vez, reduz o fluxo de sangue que passa pelo tórax8,9.

• Assim, a hiperventilação não é necessária e poderá ser danosa. Ainda, tanto a ventilação boca a boca como a mecânica com pressão elevada podem causar dilatação gástrica e potencial refluxo8,9.

Desfibrilação

• Acredita-se que boa parte de pacientes em parada cardíaca passa pelo estado de fibrilação ventricular (FV)8,9.

• Presentemente, os desfibriladores mais efetivos são bifásicos com uma curva elétrica truncada. O primeiro choque elimina a FV em 85% das vezes. Em média, no entanto, após a eliminação da FV, vários minutos são necessários para um coração voltar ao seu ritmo normal; portanto, recomenda-se não perder tempo em verificar se existe pulso palpável, e sim aplicar o ABC da reanimação por cinco ciclos (cerca de dois minutos) antes de verificar a presença de pulso8,9.

• Com um desfibrilador bifásico recomenda-se um choque de 150 joules (J) a 200 J. Em se tratando de desfibriladores de onda monofásica (antigos), recomenda-se um choque inicial de 360 J. A ênfase é a aplicação do desfibrilador o mais brevemente possível. A probabilidade de sobrevivência diminui entre 7% e 10% para cada minuto sem o ABC e a desfibrilação8,9.

Vias de administração de agentes

• Se a obtenção de uma via endovenosa (EV) for demorada, recomenda-se a via intra-óssea (IO) em adultos e crianças. A via é considerada segura e efetiva para a administração de líquidos, agentes e retirada de sangue para exames laboratoriais, para todas as idades. Os locais de punção óssea incluem região pretibial, maléolo interno e crista ilíaca. As dosagens dos agentes por via IO e EV são equivalentes8,9.

• Quanto à via endotraqueal, não se sabe ao certo qual seja a dosagem ideal de agentes. Menor concentração sangüínea de agentes é obtida por essa via. Se for utilizada, a dosagem recomendada é 2 a 2,5 vezes a dosagem EV ou IO7,8.

• A melhor via para administrar agentes continua a ser uma linha venosa central, principalmente para acesso prolongado. No entanto, essa via não resulta em níveis mais altos dos agentes ou em maior rapidez de ação quando comparada com a administração EV periférica8,9.

• Todo agente injetado deve ser seguido da administração rápida de soro fisiológico (5cc), seguida de cinco ventilações manuais8,9.

• Em resumo, deve-se limitar o tempo gasto na obtenção de uma via endovenosa ao máximo de três tentativas, e alternar rapidamente para a via IO8,9.

Líquidos e agentes

Os líquidos de preferência, quando indicados, são soro fisiológico ou Ringer. Solução glicosada só deve ser administrada quando se tratar de hipoglicemia comprovada8.

Serão abordados os agentes usados durante a parada cardíaca:

• Adrenalina - Esse agente causa vasoconstrição e aumenta a pressão diastólica aórtica, e, portanto, a perfusão coronariana; fator crítico para a reanimação com sucesso. A dose é de 0,01 mg/kg EV ou IO cada 3 a 5 minutos. Não existe evidência de que altas doses de adrenalina são indicadas8.

• Atropina - Sua ação parassimpática acelera o seio sinusal e a condução atrioventricular. A dose usual é de 0,02 mg/kg EV ou IO até a dose máxima de 1 mg no adolescente e 0,5 mg na criança8.

• Cloreto de cálcio - A administração de cálcio não resulta em melhores resultados do tratamento da parada cardíaca8.

• Bicarbonato de sódio. Seu uso não tem resultado em melhora dos índices de sobrevivência de parada cardíaca. Uma quantidade maior desse agente poderá causar hipocalemia, hipocalcemia, hipernatremia, hiperosmolaridade, e diminuir o limiar para a FV8.

Conclusão

As diretrizes atuais enfatizam sua simplicidade, para torná-las mais fáceis de serem lembradas.

A ênfase é oferecer ao paciente em parada cardíaca a reanimação básica (via aérea, ventilações e compressões) com grande perfeição. O desfibrilador deve estar presente no local da ocorrência com maior brevemente possível.

A ciência da reanimação continua evoluindo rapidamente. A AHA continuará informando aos profissionais da saúde modificações de suas diretrizes, mesmo antes do ano 20108.

Referências

1. Lane JC. Ressuscitação cardiopulmonar I: respiração boca a boca. Rev Paul Med. 1963; 63: 256-62.

2. Lane JC. Ressuscitação cardiopulmonar II: massagem cardíaca externa. Rev Paul Med. 1963; 64: 326-9.

3. Lane JC, Frazatto C, Geronymo W, Zynger A, Boleiger S. Tratamento da parada cardíaca em fibrilação ventricular sem abertura to tórax. Rev Paul Med. 1966; 68: 99-106.

4. Lane JC. Reanimação cardiorrespiratória externa na comunidade: ensino, erros, complicações e resultados. [Tese Livre-Docência]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 1974.

5. Lane JC. O início da reanimação cardiorrespiratória cerebral moderna no Brasil. Rev Bras Terap Intens. 2005; 17: 282-4.

6. Lane JC (ed.). Reanimação. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1981. 252 p.

7. Lane JC, Albarran-Sotelo R (eds.). Reanimação cardiorrespiratória cerebral. Rio de Janeiro: Medsi; 1993. 478p.

8. 2005 American Heart Association. Guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2005; 112 (22 Suppl): IV-I-IV-211.

9. Currents in emergency cardiovascular care. Highlights of the 2005 American Heart Association Guidelines for Cardiopulmonary Ressuscitation and Emergency Cardiovascular Care. Current in Emergency Cardiovascular Care. 2005-2006; 16: 1-26.

Artigo recebido em 31/01/07; revisado recebido em 15/02/07; aceito em 07/03/07

  • Correspondência:
    John Cook Lane
    Rua Cajá, 230
    13094-334 - Campinas, SP - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Ago 2007
    Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@cardiol.br