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Caso 6/2007: choque no pós-operatório imediato após aposição de stent em aneurisma de aorta torácica

CORRELAÇÃO ANATOMOCLÍNICA

Caso 6/2007 - choque no pós-operatório imediato após aposição de stent em aneurisma de aorta torácica

André Luís Veiga de Oliveira; Rodrigo Geraldo do Nascimento; Paulo Sampaio Gutierrez

Instituto do Coração do Hospital das Clínicas - FMUSP, São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Vera D. Aiello InCor – Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 05403-000 – São Paulo, SP E-mail: anpvera@incor.usp.br

Palavras-chave: Choque, período pós-operatório, stents, aneurisma de aorta torácica.

Mulher de 72 anos queixava-se inicialmente de dor precordial irradiada para dorso, em pontada, não relacionada a esforços, por um ano. Havia também tosse e dispnéia noturnas. Sabia ser portadora de hipertensão arterial e fazia uso de 75 mg de captopril e 25 mg de hidroclorotiazida. Era tabagista.

A investigação médica incluiu angiotomografia (23.5.2005) que revelou aumento do mediastino em razão de volumoso aneurisma de aorta torácica na sua croça e porção descendente com diâmetro transversal de 9 cm, e com 7 cm de comprimento e trombose mural; além de aneurisma da junção toracoabdominal com dimensões 5 cm por 4 cm. Foi detectado derrame pleural bilateralmente.

A paciente foi, então, encaminhada ao InCor para tratamento de aneurisma de aorta.

O exame físico (10.6.2005) revelou pressão arterial 120/80 mmHg, freqüência cardíaca 100 bpm; a ausculta pulmonar normal e cardíaca revelou sopro sistólico em áreas aórtica e mitral; não havia alterações no exame abdominal. Os pulsos dos membros estavam com amplitude diminuída.

O eletrocardiograma (ECG) (10.6.2005) mostrou ritmo sinusal, 95 bpm, sobrecarga de câmaras esquerdas, distúrbio de condução intraventricular do estímulo, tipo bloqueio do ramo esquerdo e alteração da repolarização ventricular (fig. 1).


A paciente foi internada com indicação de tratamento cirúrgico urgente.

A radiografia (11.6.2005) revelou alargamento do mediastino, área cardíaca normal e não havia alterações dos campos pulmonares.

Os exames laboratoriais (11.6.2005) mostraram 12,6 g/dl de hemoglobina, 40% de hematócrito, 12.300 leucócitos/mm³ (65% neutrófilos, 8% eosinófilos, 1% basófilos, 19% linfócitos e 7% monócitos), 224.000 plaquetas/mm³, 1,8 mg/dl de creatinina e 83 mg/dl de uréia. O exame de urina e o coagulograma não revelaram anormalidades.

O ecocardiograma (16.6.2005) revelou diâmetros da raiz de aorta 25 mm; do átrio esquerdo 28 mm; diastólico do ventrículo esquerdo (VE) 43 mm; e sistólico 29 mm. A fração de ejeção do ventrículo esquerdo foi estimada em 60%, com motilidade preservada das paredes. Havia aneurisma de aorta com imagens sugestivas de trombo em seu interior.

A cinecoronariografia demonstrou estenose de 50% na coronária direita e no ramo descendente posterior da coronária direita, sem lesões em tronco de coronária esquerda, nem em seu ramo interventricular anterior; contudo, havia lesão de 40% no ramo circunflexo.

Após a cinecoronariografia houve elevação dos níveis de creatinina, a qual chegou até 2,8 mg/dl em 20 de junho, com posterior redução para 2,1 mg/dl, bem como elevação da uréia para 121 mg/d e posterior recuo para 82 mg/dll. Também apresentou progressiva anemia com leucocitose (17.6.2005) - 10,9 g/dl, 34% de hematócrito e 21.400 leucócitos/mm³ (84% neutrófilos, 1% eosinófilos, 8% linfóciotos e 7% monócitos). O exame de urina revelou proteinúria de 0,4 g/l, leucocitúria de 30.000/ml e cilindrúria (880/ml de hialinos e 330/ml de granulosos).

À endoscopia digestiva alta detectou-se gastrite erosiva moderada em antro.

Houve aparecimento de dor em hipocôndrio direito, que juntamente com a febre foi atribuída à possível quadro de colecistite aguda.

A ultra-sonografia do abdome (17.6.2005) revelou litíase de vesícula biliar e renal. Foi feito o diagnóstico de colecistite aguda e foram iniciados os antibióticos ceftriaxona e metronidazol, os quais foram mantidos por 10 dias.

Nova avaliação laboratorial (27.6.2005) revelou creatinina 1,6 mg/dl, uréia 56 mg/dl, potássio 3,9 mEq/l, sódio 141 mEq/l, hemoglobina 10,3 g/dl, hematócrito 34%, 16.900 leucócitos/mm³ ( 82% neutrófilos, 4% eosinófilos, 1% basófilos, 9% linfócitos, 4% monócitos) e 427.000 plaquetas/mm³.

A paciente foi operada na manhã de 29.6.2005. A cirurgia consistiu do implante de prótese endovascular com stent pelo arco aórtico. Houve bloqueio atrioventricular total seguido de parada cardíaca na saída da circulação extracorpórea, e após 30 min de manobras de ressuscitação houve recuperação de batimentos, contudo em bloqueio atrioventricular total (BAVT), com necessidade de marcapasso cardíaco em modo atrioventricular e doses elevadas de dopamina (20 µg/kg/min), amrinona (0,75 µg/kg/min), noradrenalina (2,1 µg/kg/min) e adrenalina (0,5 µg/kg/min).

As medidas hemodinâmicas revelaram índice cardíaco de 1,9 l.kg-1.min-1, resistência vascular sistêmica 18 UWood, resistência vascular pulmonar 3,6 UWood, pressão arterial média 61 mmHg e pressão venosa central 21 mmHg.

A gasimetria revelou pH 7,20, pCO2 55 mmHg, saturação de O2 58,5%, bicarbonato de sódio 33 mEq/l e excesso de bases (-) 6,7 mEq/l. O lactato foi 128 mmol/l.

O eletrocardiograma (29.6.2005) pós-parada e com marcapasso desligado mostrou ritmo sem onda P, com variação da forma dos complexos QRS, freqüência 100 bpm, complexos QS em I, II e aVF, e em V1 a V3, com supradesnivelamento de segmento de ST em I, II, aVF, V5 e V6 (fig. 2).


Algumas horas após apresentou taquicardia ventricular sustentada, refratária à xilocaína, à amiodarona e à cardioversão elétrica, e a paciente apresentou algum tempo depois parada cardíaca em atividade elétrica sem pulso, que não respondeu às manobras de ressuscitação e faleceu.

Aspectos clínicos

Trata-se de paciente do sexo feminino, 72 anos, hipertensa e tabagista, que se apresentava há um ano com quadro de dor torácica, em pontada e irradiada para o dorso, não relacionada aos esforços, associada à tosse e dispnéia noturna.

Inicialmente, devemos nos deter na origem e nos diagnósticos diferenciais de dor torácica. Várias doenças podem se apresentar com esse quadro, desde causas cardíacas (angina), vasculares (aneurisma, hipertensão pulmonar), pulmonares (pleurites), até doenças gastrointestinais (doença da vesícula biliar, gastropatias), musculoesqueléticas (costocondrites) e psicológicas (síndrome do pânico)1. No caso em questão, a paciente relatava quadro compatível com dor em pontada, irradiada para dorso sem relação com esforços, características essas que podem sugerir doença da aorta. Não devemos esquecer que pelo menos metade dos pacientes portadores de aneurismas é assintomática2. A dor torácica ou a dor nas costas ocorre em 25% dos casos de aneurismas não-dissecantes e resulta da compressão direta de outras estruturas intratorácicas ou da parede torácica ou pela erosão para dentro do osso adjacente. Outros sintomas refletem conseqüências vasculares (regurgitação aórtica, insuficiência cardíaca, acidente vascular encefálico, isquemia de membros inferiores) ou efeito de massa local. Os aneurismas do arco ou da aorta descendente podem comprimir traquéia ou um brônquio-fonte e produzir desvio da traquéia, sibilância, tosse, dispnéia, hemoptise ou pneumonia recorrente2,3.

A paciente foi encaminhada a este serviço com diagnóstico de aneurisma de aorta torácica na sua croça e porção descente e junção toracoabdominal.

O termo aneurisma aórtico refere-se a uma dilatação do lúmen aórtico envolvendo um ou mais segmentos. Um dos critérios utilizados o define como uma dilatação localizada e permanente da aorta, que tem diâmetro de pelo menos uma vez e meia o diâmetro normal esperado para aquele determinado segmento4.

Os aneurismas de aorta torácica são classificados pelo segmento envolvido, isto é, o ascendente, o arco ou o descendente. O aneurisma toracoabdominal refere-se aos aneurismas da aorta torácica descendente que se estendem distalmente até a aorta abdominal. Os da aorta ascendente ocorrem mais comumente (60%), seguidos pelos da aorta descendente (40%), enquanto os aneurismas do arco aórtico e os toracoabdominais são menos freqüentes (10%)5.

Quando no arco aórtico, em sua maioria, são contíguos aos aneurismas da aorta ascendente ou descendente. Eles podem ser decorrentes de uma doença aterosclerótica, degeneração médio-cística, sífilis e outras infecções. A causa predominante dos aneurismas na aorta torácica descendente é a aterosclerose, ao contrário dos aneurismas da aorta ascendente que resultam de uma degeneração medial cística (ou necrose medial cística)3,5.

Como resultado dos distúrbios do fluxo ao longo do segmento aneurismático, o sangue pode estagnar ao longo das paredes e, portanto, permitir a formação de trombos murais. Tais trombos podem embolizar e comprometer a circulação das artérias distais. Em alguns casos, pode ser desafiador distinguir trombo mural dentro de um aneurisma aórtico do chamado hematoma intramural localizado, sendo essa entidade considerada por alguns autores como variante morfológica da dissecção aórtica.

A ruptura ou a dissecção é a principal complicação. Tanto a origem quanto a localização podem afetar a sua velocidade de crescimento e sua propensão à dissecção ou ruptura. O tamanho inicial é um preditor importante da velocidade de crescimento do aneurisma torácico6-8. Outros estudos constatam que as chances de ruptura estão aumentadas na doença pulmonar obstrutiva crônica, na idade avançada e quando há dor relacionada ao aneurisma9.

Diante dos fatores expostos previamente, foi indicada internação com a finalidade de tratamento cirúrgico. Exames iniciais demonstraram níveis de creatinina alterados, fração de ejeção de ventrículo esquerdo dentro dos limites de normalidade, sem alterações de contratilidade segmentar e cineangicoronariografia sem lesões coronarianas obstrutivas.

A paciente evoluiu após cineangiocoronariografia com aumento de escórias nitrogenadas, o que pode caracterizar nefropatia induzida por contraste. Essa entidade caracteriza-se pelo aumento absoluto de creatinina e ³0,5 mg/dl ou aumento relativo e ³ 25% acima dos níveis basais, com pico de 48 horas após administração do contraste. Os mais importantes fatores de risco são: idade e³70 anos, doença renal crônica preexistente e diabete melito. Muitos pacientes recuperam a função renal entre uma e três semanas, porém um pequeno percentual recupera parcialmente ou não a recupera10.

A paciente evoluiu durante a internação com quadro de dor abdominal associada a febre e leucocitose e aspectos ultra-sonográficos compatíveis com colecistopatia aguda. Concomitantemente, apresentou quadro de queda dos níveis de hemoglobina, que poderiam ser explicados tanto pelo quadro infeccioso quanto pela gastropatia erosiva evidenciada na endoscopia digestiva alta. Iniciada antibioticoterapia, a paciente apresentou regressão das características clínicas apresentadas, sendo, portanto, liberada para procedimento cirúrgico.

Após estabilização clínica da paciente, optou-se por tratamento cirúrgico com implante de prótese endovascular com stent pelo arco aórtico. Os aneurismas da aorta torácica geralmente são ressecados e substituídos com um enxerto vascular de tamanho apropriado. Os aneurismas do arco aórtico podem ser excisados com sucesso, mas o procedimento permanece desafiador. Geralmente requerem circulação extracorpórea, hipotermia e parada circulatória, sendo associados a considerável morbidade e mortalidade3. Abordagem alternativa é o emprego de endopróteses, apresentando papel importante no tratamento de pacientes que estejam sob risco de ruptura aórtica, mas que de outro lado são maus candidatos a cirurgia11.

Depois de saída de circulação extracorpórea a paciente evoluiu com BAVT seguido de parada cardiorrespiratória (PCR) com retorno a circulação espontânea após 30 minutos. Após a PCR, apresentava-se em choque circulatório com uso de agentes vasoativos em concentrações elevadas. Durante monitorização hemodinâmica, observaram-se índice cardíaco diminuído, concomitante resistência vascular aumentada, com uso de vasopressores, caracterizando-se, dessa forma, síndrome de baixo débito cardíaco no pós-operatório de cirurgia cardíaca.

A síndrome de baixo débito cardíaco no pós-operatório de cirurgia cardíaca pode ser definida como a incapacidade do coração em manter fluxo suficiente para demanda metabólica tecidual. Clinicamente, pode ser caracterizada por hipotensão arterial sistêmica sistólica < 90 mmHg ou por valor 30 mmHg inferior aos níveis basais por um período de 30 minutos. Alterações do nível de consciência, agitação, confusão e coma, diminuição da temperatura dos membros, cianose, livedo reticular e oligúria (diurese < 20 ml/h). Em algumas situações, essa síndrome pode estar presente com PAS superior a 100 mmHg pelo aumento da resistência vascular sistêmica12.

A ocorrência de baixo débito cardíaco no pós-operatório pode estar relacionada à diminuição na pré-carga do VE (tamponamento cardíaco, disfunção de ventrículo direito (VD), diminuição da contratilidade (isquemia ou infarto por má proteção no intra-operatório), taquicardias/bradicardias etc. No caso apresentado encontra-se paciente idosa, com fatores de risco para aterosclerose (idade, HAS, tabagismo), com cineangicoronariografia prévia sem lesões obstrutivas e que evoluiu para BAVT seguido de PCR. O ECG pós-PCR pode ser analisado de duas diferentes formas: presença de ritmo idioventricular acelerado (RIVA), identificado através de complexos ventriculares de fusão (bastante sugestivo de isquemia cardíaca) ou presença de ritmo supraventricular não-sinusal com distúrbio da condução ventricular pelo ramo esquerdo e presença de supradesnivelamento de segmento ST de parede ínferolaterodorsal. Independentemente da forma analisada, a suspeita de lesão isquêmica deve ser fortemente considerada. As causas de isquemia podem ser diversas, a destacar: processo aterosclerótico (e lesões não-obstrutivas podem apresentar maior propensão a ruptura e conseqüente trombose intracoronariana aguda), dissecção de aorta, com dissecção retrógrada para o sistema coronariano e lesões por isquemia e reperfusão após circulação extracorpórea.

A presença de acidose metabólica lática pode ser explicada pela síndrome de baixo débito, culminando com choque circulatório grave e isquemia tecidual importante, principalmente em território esplâncnico, retenção de CO2, e a hipoxemia importante podem representar a presença de doença pulmonar obstrutiva crônica e/ou presença de alteração da troca gasosa alveolar, pelo acúmulo de liquido intersticial.

Pelos dados de monitorização invasiva, podemos apenas concluir que a paciente apresentava-se com índice cardíaco diminuído concomitante a níveis de resistência sistêmica e pulmonar algo elevados e PVC aumentada. Dados de otimização volêmica (através de variáveis dinâmicas, variação de pressão de pulso) ou mais acurados da contratilidade ventricular mediante parâmetros que melhor espelham a função inotrópica (índices de trabalho de VE e VD), análise de dados indiretos que facilitariam diagnósticos diferenciais: onda V gigante na regurgitação mitral), salto oximétrico na presença de comunicação interventricular, equalização de pressões diastólicas no tamponamento cardíaco, poderiam ser de grande utilidade na avaliação clínica e hemodinâmica da paciente, com interpretações mais precisas, verificação mais acurada dos diagnósticos diferenciais e condutas terapêuticas mais adequadas. Não devemos esquecer que os dados de resistência são medidas indiretas, podendo apresentar variações importantes.

As principais complicações da correção de aneurismas de aorta torácica incluem acidente vascular encefálico e hemorragia. O infarto do miocárdio e a insuficiência renal com freqüência surgem sob o maciço estresse não-fisiológico da cirurgia aórtica. As causas mais comuns de morte pós-operatória precoce são o infarto, a insuficiência cardíaca, o acidente vascular encefálico, a insuficiência renal, a hemorragia, a insuficiência respiratória e a septicemia. Idade avançada, cirurgia de emergência, tempo prolongado de clampeamento transversal, diabete melito, cirurgia aórtica prévia e hipotensão intra-operatória são os fatores mais importantes que determinam a morbidade e a mortalidade perioperatórias3. Complicações relacionadas ao implante do stent incluem: escape de fluxo sangüíneo ao redor da prótese, conhecido como endoleak, deslocamento da prótese do seu local de implante, e menos freqüentemente, fratura do stent e infecção intravascular13-15.

No pós-operatório imediato, a paciente evoluiu com quadro de taquicardia ventricular sustentada refratária ao tratamento medicamentoso e à cardioversão elétrica. Os fatores responsáveis poderiam ser isquemia, distúrbio hidroeletrolítico, acido-básico, hipoxemia e efeitos pró-arrítmicos, todos devendo ser pesquisados e corrigidos. Seguiu-se a parada cardiorrespiratória em atividade elétrica sem pulso, a qual pode ser devida à isquemia miocárdica, tamponamento cardíaco, tromboembolismo pulmonar, medicamentos, pneumotórax hipertensivo, acidose, hipercalemia ou hipocalemia, hjipovolemia, hipotermia, hipóxia ou hipoglicemia. A parada foi refratária às manobras de ressuscitação cardiorrespiratória e cerebral.

(Dr. André Luis Veiga de Oliveira, Dr. Rodrigo Geraldo do Nascimento)

Hipótese diagnóstica

Causa do óbito - Síndrome de baixo débito cardíaco ou infarto do miocárdio perioperatório.

Doença de base - Aneurisma de aorta torácica e hipertensão arterial; doenças associadas: nefropatia induzida por contraste e colecistite aguda.

(Dr. André Luis Veiga de Oliveira, Dr. Rodrigo Geraldo do Nascimento)

Necropsia

À necropsia, o principal achado foi grande aneurisma que se iniciava na raiz da aorta, estendendo-se até a croça (fig. 3). Havia sido colocada endoprótese desde a aorta ascendente até o trecho inicial da descendente, e ela estava patente. A porção da aorta descendente a jusante da endoprótese apresentava trombose semi-oclusiva, provavelmente determinando grande dificuldade ao fluxo sangüíneo (fig. 4).



A aorta tinha em toda sua extensão aterosclerose grave, responsável não só por esse aneurisma, como também por dois outros no trecho abdominal, e pela trombose. O estudo microscópico mostrou a presença das placas ateroscleróticas, de trombose superajuntada e de destruição maciça de fibras elásticas (fig. 5). Há fortes evidências de que essa destruição é importante na gênese dos aneurismas16, pois a maior parte dos pacientes com aterosclerose aórtica, mesmo grave, não desenvolve a dilatação, a qual parece ser restrita aos casos em que ocorre a elastólise.


O estudo microscópico do miocárdio detectou, em vários segmentos do ventrículo esquerdo, necrose isquêmica em bandas de contração (fig. 6). A extensão do infarto não pôde ser adequadamente avaliada em razão de seu pequeno tempo de evolução, mas essa lesão foi o fator final desencadeante da morte, por causar bloqueio atrioventricular total e disfunção ventricular.


O infarto foi provavelmente conseqüência de um somatório de fatores: aterosclerose coronariana moderada, com microangiopatia; eventual compressão extrínseca de artérias coronárias pelo aneurisma; e dificuldade abrupta da circulação pela chegada de grande fluxo à região da aorta descendente semi-ocluída por trombo.

Além disso, o estado geral da paciente era complicado pela existência de várias comorbidades: hipertensão arterial sistêmica, nefrite crônica intersticial, litíase renal, colecistite crônica calculosa (que teve surto de agudização pouco antes da morte), doença pulmonar obstrutiva crônica e ainda áreas focais de broncopneumonia.

Diagnóstico anatomopatológico: Aneurismas ateroscleróticos da aorta.

Causa mortis: Infarto do miocárdio com poucas horas de evolução.

(Dr. Paulo Sampaio Gutierrez)

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  • Correspondência:
    Vera D. Aiello
    InCor – Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
    05403-000 – São Paulo, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Abr 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007
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