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Cirurgia da endocardite em valva aórtica: opção para tratamento de abscesso aórtico

Resumos

FUNDAMENTO: A grande diversidade de apresentações anatômicas encontradas em pacientes com endocardite infecciosa, especialmente nos que desenvolvem abscessos do anel aórtico ou fistulas intracardíacas, tem sido um complicador para o tratamento cirúrgico dessa doença. Por esse motivo, os cirurgiões têm desenvolvido opções táticas para sua correção. A consciência geral de que a retirada do tecido infectado promove uma limpeza radical, o aparecimento de colas biológicas que facilitam o fechamento dos abscessos e o surgimento de novos substitutos valvares melhoraram o resultado do tratamento. OBJETIVO: Demonstrar mais uma opção no tratamento do abscesso aórtico, para casos selecionados, tubo valvulado em posição infra-coronariana. MÉTODOS: Empreendemos a técnica em três pacientes: em dois, empregamos tubo valvulado com prótese mecânica, e em um, com prótese biológica. Dois pacientes necessitaram procedimentos associados com troca da valva mitral em um deles e plástica da valva tricúspide no outro. Todos eram reoperações de próteses em posição aórtica. RESULTADOS: A evolução cirúrgica e pós-operatória imediata foi satisfatória com os três recebendo alta da Unidade de Terapia Intensiva para o quarto. Um dos pacientes evoluiu para óbito durante a internação em razão de co-morbidades graves que já apresentava no pré-operatório, relacionadas a varizes de esôfago e comprometimento hepático. Os outros dois apresentam boa evolução no pós-operatório tardio. CONCLUSÃO: Acreditamos que essa opção seja mais uma alternativa para o tratamento de abscessos com grande comprometimento de estruturas do anel aórtico e da continuidade mitro-aórtica.

Endocardite; cirurgia torácica; valva aórtica; abscesso


BACKGROUND: Patients with infective endocarditis show a large diversity of anatomical presentations, which has been a complicating factor for the surgical treatment of this condition, especially in those who develop abscesses in the aortic ring or intracardiac fistulae. For this reason, surgeons have been developing tactical options to repair it. There is consensus around the fact that the removal of infected tissue promotes radical cleaning, and that the outcome of the treatment has been improved by the manufacture of biological glues which facilitate the closure of abscesses and by the creation of new valve replacements. OBJECTIVE:To demonstrate yet one more treatment option for aortic abscess for selected cases: a valved conduit placed in infra-coronary position. METHODS: We employed the technique in three patients: in two of them we employed a valved conduit with a mechanical prosthesis and in one of them a valved conduit with a biological prosthesis. Two patients needed associated procedures such as replacement of mitral valve in one of them and tricuspid valvoplasty in the other. All cases involved reoperation of prostheses in aortic position. RESULTS: The progression during surgery and in the early postoperative period was satisfactory and the three patients were discharged from the Intensive Care Unit and were sent to hospital rooms. One of the patients progressed to death during hospital stay due to severe comorbidities which were present in the preoperative period, and which related to esophageal varices and hepatic involvement. The other two progressed well in the late postoperative period. CONCLUSION: We believe that this option is yet one more alternative for the treatment of abscesses with great involvement of aortic ring structures and mitro-aortic continuity.

Endocarditis; thoracic surgery; aortic valve; abscess


ARTIGO ORIGINAL

CIRURGIA CARDÍACA - ADULTOS

Cirurgia da endocardite em valva aórtica - opção para tratamento de abscesso aórtico

Antoninho Sanfins ArnoniI,II; Renato Tambellini ArnoniI,II; Paulo Paredes PaulistaI; Victoria E. MartinezI; Antonio Flavio Sanches AlmeidaI; Camilo Abdulmassih NetoI; Jarbas Jackson DinkhuysenI; Mario IssaI; Paulo ChaccurI; Luiz Carlos Bento de SouzaI

IInstituto Dante Pazzanese de Cardiologia - São Paulo, SP - Brasil

IIHospital Professor Edmundo Vasconcelos - São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Antoninho Sanfins Arnoni Rua Borges Lagoa, 1.450, Vila Clementino 04038-905, São Paulo, SP - Brasil E-mail: aarnoni@hpev.com.br

RESUMO

FUNDAMENTO: A grande diversidade de apresentações anatômicas encontradas em pacientes com endocardite infecciosa, especialmente nos que desenvolvem abscessos do anel aórtico ou fistulas intracardíacas, tem sido um complicador para o tratamento cirúrgico dessa doença. Por esse motivo, os cirurgiões têm desenvolvido opções táticas para sua correção. A consciência geral de que a retirada do tecido infectado promove uma limpeza radical, o aparecimento de colas biológicas que facilitam o fechamento dos abscessos e o surgimento de novos substitutos valvares melhoraram o resultado do tratamento.

OBJETIVO: Demonstrar mais uma opção no tratamento do abscesso aórtico, para casos selecionados, tubo valvulado em posição infra-coronariana.

MÉTODOS: Empreendemos a técnica em três pacientes: em dois, empregamos tubo valvulado com prótese mecânica, e em um, com prótese biológica. Dois pacientes necessitaram procedimentos associados com troca da valva mitral em um deles e plástica da valva tricúspide no outro. Todos eram reoperações de próteses em posição aórtica.

RESULTADOS: A evolução cirúrgica e pós-operatória imediata foi satisfatória com os três recebendo alta da Unidade de Terapia Intensiva para o quarto. Um dos pacientes evoluiu para óbito durante a internação em razão de co-morbidades graves que já apresentava no pré-operatório, relacionadas a varizes de esôfago e comprometimento hepático. Os outros dois apresentam boa evolução no pós-operatório tardio.

CONCLUSÃO: Acreditamos que essa opção seja mais uma alternativa para o tratamento de abscessos com grande comprometimento de estruturas do anel aórtico e da continuidade mitro-aórtica.

Palavras-chave: Endocardite/cirurgia, cirurgia torácica, valva aórtica, abscesso.

Introdução

O tratamento cirúrgico da endocardite vem sofrendo modificações com a evolução da medicina em geral e da cirurgia cardíaca em particular. Os diagnósticos mais precisos e a antibioticoterapia com medicamentos mais eficazes e mais precocemente instalados têm evitado a formação de abscessos, uma grande complicação da correção cirúrgica. No princípio, o tratamento era feito com reforço do local do abscesso com pontos ancorados em barras de teflon, o que não trazia bom resultado nos casos de grandes abscessos. O implante de próteses em posição supra-coronariana e realização de pontes de safena1 foi outra solução, mas em jovens trazia problemas quanto à durabilidade das pontes e deixava a região doente sem tratamento adequado. O uso de dacron para fechar os abscessos foi outra proposta utilizada com melhores resultados2. Com base nessa experiência, foi utilizado o pericárdio bovino3 com a mesma finalidade, com a facilidade do manuseio do tecido e a possibilidade de usá-lo parcialmente ou em todo o anel e implantando a prótese com pontos passados no mesmo. A técnica apresentou bons resultados. O aparecimento de cola biológica facilitou e melhorou os resultados, quando empregada para bloqueio da loja abscessada que ficava entre o tecido do doente e o pericárdio.

A grande melhoria dos resultados veio quando os cirurgiões começaram a tratar o abscesso como uma cirurgia oncológica, com ampla ressecção do tecido infectado, e reconstruções as mais difíceis, mas também as mais completas seguidas. As próteses, tanto biológicas como mecânicas, contribuíram para o sucesso tardio dos procedimentos, graças ao seu desenvolvimento e aparecimento de substitutos valvares com preparo, conservação e desenhos modernos.

A cirurgia de Ross4, o uso de homoenxertos autólogos ou heterólogos5, as próteses stentless6 trouxeram mais uma contribuição para o arsenal utilizado no tratamento da cirurgia dos abscessos do anel aórtico.

Nosso objetivo neste trabalho é apresentar uma opção para o tratamento de tão grave doença, com emprego de tubo valvado infra-coronariano na sua correção, implantado como se fosse uma prótese stentless. A possibilidade de uso de prótese mecânica nesse tubo dá uma chance de escolha ao cardiologista e ao próprio paciente, sem necessidade de reimplante de coronárias ou da confecção de pontes de safena.

Além disso, com essa técnica, diminuímos a chance de sangramento pós-operatório, já que as suturas ficam dentro da aorta.

Métodos

Desde janeiro de 2005, três pacientes portadores de endocardite foram operados utilizando tubo valvulado em posição infra-coronariana. Em dois deles, foi utilizada prótese mecânica e, no outro, prótese biológica.

Os três pacientes já haviam sido operados previamente com colocação de próteses.

O primeiro deles foi operado em 1994 para substituição de valva aórtica por prótese mecânica de bola associada à ampliação da raiz da aorta. Tinha na ocasião 13 anos de idade. Em janeiro de 2005, apresentou-se com quadro de endocardite na prótese em posição aórtica com grande abscesso periprotético. Foi realizada substituição da prótese e correção do abscesso com emprego de tubo valvulado com prótese mecânica de duplo disco. Foi associada correção de abscesso de valva tricúspide, com conservação e plastia da mesma (fig.1 e 2 ).


O segundo estava sendo submetido à segunda reoperação. Na primeira cirurgia em 1975, com 17 anos de idade, recebeu prótese biológica em posição aórtica e comissurotomia mitral. Foi reoperado em 1979 com troca da prótese em posição aórtica por Starr Edwards e implante de prótese biológica em posição mitral. Vinte e sete anos depois, desenvolveu endocardite na prótese em posição aórtica com grande abscesso e comunicação com o átrio esquerdo. Como no momento da cirurgia não tivéssemos disponível próteses stentless, que já havíamos usado anteriormente na correção de abscessos, e apoiados pela experiência inicial com tubo valvulado, resolvemos implantar tubo Haemashield, que foi valvulado com prótese biológica. A prótese em posição mitral foi substituída por outra prótese biológica.

O terceiro havia sido operado em 1986 por endocardite e, na ocasião, foi implantada prótese mecânica de bola, correção de aneurisma do seio de Valsava e ampliação da raiz da aorta com pericárdio bovino. Contava na ocasião 17 anos. Apresentava agora grande abscesso na região periprotética. Na correção utilizamos tubo valvulado Haemashield com prótese mecânica de duplo disco.

Todos os casos foram operados por meio de esternotomia mediana. As aderências com o pericárdio foram liberadas sem acidentes. A circulação extracorpórea foi instalada de maneira habitual com canulação da aorta ascendente e duas cânulas no átrio direito. Foi utilizado oxigenador de membranas da Edwards, modelo Vital.

A aortotomia foi semelhante à que temos utilizado para tratamento da valva aórtica sem complicações, ou seja, uma incisão transversal, dirigida para a comissura entre os folhetos coronariano esquerdo e não-coronariano ou para a posição que ela estaria antes da troca valvar.

A proteção miocárdica foi feita com cardioplegia anterograda cristalóide hipotérmica nos óstios coronarianos. O paciente foi esfriado no máximo a 32 graus Celsius. Os tempos de circulação extracorpórea e anoxia foram respectivamente 135-97, 120-90, e 90-70. Nenhum paciente apresentou bloqueio atrioventricular.

Os três pacientes evoluíram bem no pós-operatório imediato, sendo extubados e recebendo alta para o quarto. O paciente número dois apresentou hemorragia digestiva alta, sendo reencaminhado à Unidade de Terapia Intensiva. A endoscopia mostrou gastrite hemorrágica e varizes de esôfago que foram esclerosadas. Evoluiu com encefalopatia hepática vindo a óbito com 26 dias de pós-operatório. Tratava-se de paciente com cirrose hepática, diabetes tipo I e historia pregressa de hemorragia digestiva alta por varizes de esôfago. A indicação da cirurgia para tratamento da endocardite deveu-se à gravidade do caso do ponto de vista cardiológica e da estabilização do quadro hepático no momento da indicação.

Os outros dois pacientes evoluíram bem, recebendo alta hospitalar, com ecocardiograma mostrando bom resultado pós-operatório, e sem sinais de recidiva da endocardite. Ambos estão oligossintomáticos até o momento, um com acompanhamento de 24 meses, e outro de 17 meses.

Discussão

A endocardite tem sido considerada por muitos anos uma doença de difícil diagnóstico e tratamento desafiador, especialmente com relação aos abscessos do anel aórtico.

Os critérios de Duke7 vieram auxiliar a definição diagnóstica e são largamente recomendados quando da suspeita da doença. Utilizam o ecocardiograma para analisar o envolvimento endocárdico e consideram critérios maiores e menores, sendo o diagnóstico considerado definitivo na presença de dois critérios maiores, ou um maior e três menores, ou ainda com cinco critérios menores. É possível haver um critério maior e um menor ou três menores.

Inúmeros consensos8 têm procurado definir como diagnosticar e como tratar essa doença que, se não tratada, pode levar a complicações sérias e com mortalidade elevada.

Segundo o consenso da Sociedade Européia de Cardiologia9, três achados ecocardiográficos são considerados de maior importância no paciente com suspeita de endocardite infecciosa, ou seja, a presença de massa ecodensa, móvel em valva, no endocárdio mural ou em prótese implantada anteriormente; a presença de abscessos ou fistulas, ou ainda um novo vazamento em prótese especialmente se implantada há muito tempo.

Apesar de todos esses cuidados, a ocorrência de abscessos aórticos continua sendo uma das complicações mais sérias enfrentadas pelo cirurgião cardiovascular, o que exige as mais variadas atitudes cirúrgicas possíveis na sua correção.

Desde há muito tempo, os cirurgiões têm se dedicado ao tratamento da endocardite infecciosa e de sua grande complicação os abscessos, especialmente os do anel aórtico, utilizando alternativas cirúrgicas na sua correção.

Os primeiros relatos falavam em limpeza do local com reforço na colocação dos pontos para implante da prótese. A colocação da prótese na aorta ascendente fora do anel valvar foi preconizada por Danielson1 em 1974, reforçada por Reitz10 em 1981. O emprego de dacron no fechamento da lesão foi descrito por Bailey e cols. em 19822.

Muitas dessas idéias ainda hoje são levadas em consideração quando da abordagem cirúrgica. Al-Attar e cols.11 publicaram, em 2005, técnica em que fazem a translocação da valva aórtica. Colocam a prótese em posição supra-coronariana, com utilização de pontes de safena ou enxerto artificial para a revascularização. A diferença com a técnica de Danielson está na colocação da prótese em posição supra-coronariana, e a revascularização ser feita o mais próximo possível do óstio coronariano. O local do abscesso é tratado de acordo com a situação encontrada. Após extensa limpeza do local, se o abscesso for pequeno, faz-se plicatura, e se for maior ou múltiplo, trata-se com dacron ou com pericárdio eqüino. O tempo médio de anoxia foi de 138 minutos.

Acreditamos que com a opção que temos utilizado a cirurgia torna-se mais fácil e mais rápida, com o uso do próprio tubo no fechamento dos abscessos e sem necessidade de tratar a rede coronariana com pontes de safena, que podem ter problemas em longo prazo. No grupo de 21 pacientes da série de Nawwar, publicada por Nottin e cols.12, um teve problema com a anastomose do gorotex, tendo que ser reoperado para nova revascularização

Em 198513 publicamos a correção do abscesso com grandes ressecções, limpeza de todo tecido infectado e uso de pericárdio bovino conservado em glutaraldeído, parcial ou em todo o anel para fechamento da descontinuidade mitro-aórtica em casos de grandes abscessos, preservando a valva mitral,

Gunai e cols.14 em 2005 relatam técnica semelhante, com a reconstrução da continuidade mitro-aórtica e preservação da valva mitral em casos de descontinuidade mitro-aórtica.

A necessidade de dupla troca nesses casos dificulta o procedimento, como dizem Oliveira e cols.15, considerando desafiadora, mas necessária, a cirurgia da reconstrução do esqueleto fibroso do coração com dupla troca valvar em pacientes com doenças valvares complexas nas quais nenhum outro procedimento alternativo é possível

David3 utilizava pericárdio autólogo nos pequenos abscessos e pericárdio bovino conservado em glutaraldeído em grandes defeitos.

O uso do pericárdio, especialmente no tratamento de abscessos mais localizados, ainda não foi abandonado e o usamos sempre que necessário. Kim e cols.16 descrevem com sucesso o uso de pericárdio autólogo no tratamento de abscesso aórtico com pseudo-aneurisma do seio de Valsava não-coronariano. Acreditamos que o comprometimento do seio não-coronariano isoladamente seja a melhor opção para a correção com o uso de pericárdio, seja ele autólogo seja bovino conservado.

Choussat e cols.17, em 233 casos de abscessos, sendo 185 aórticos em sua série, dão preferência ao emprego de próteses mecânicas, indicando esse substituto valvar tanto para comprometimento de valvas nativas como para próteses infectadas. A mesma conduta empregam quando a valva mitral é comprometida.

Gaudino e cols.18 também empregaram próteses mecânicas nos seus 20 pacientes e concluíram com seus resultados que os homoenxertos como substitutos de escolha na endocardite não podem ser apoiados pelo seu estudo.

Pomerantzeff e cols.19 preferem o uso de próteses biológicas e a empregaram na maioria dos 68 casos de abscessos em posição aórtica que foram operados.

Com o passar dos tempos e o aparecimento de novos substitutos valvares, outras opções terapêuticas surgiram, e o emprego de homoenxertos, ou próteses stentless, tem sido advogado.

Os homoenxertos aórticos são empregados por David20,21, e a valva mitral desses enxertos pode ser utilizada na correção dos defeitos da via de saída do ventrículo esquerdo.

Yankah e cols.22 publicaram o resultado de 17 anos de estudos de reconstrução da raiz da aorta em pacientes com abscesso perianular, com o uso de homoenxertos aórticos criopreservados. A mortalidade operatória foi de 9,3% para casos eletivos, e de 14,3% para os de emergência. Nos 17 anos de seguimento, a mortalidade tardia foi de 7,3%. Trinta pacientes foram reoperados, sendo 11 por infecção residual ou recorrente e vazamento periprotético. Os autores concluíram que o uso de homoenxertos criopreservados promovem uma boa resistência a infecção.

Os homoenxertos, contudo, têm sido questionados na correção de grandes abscessos. Ritter e cols.23 descrevem a persistência de abscesso após correção com homoenxerto aórtico. Joyce e cols.24 relatam fístula entre o ventrículo esquerdo e o átrio direito após uso de homoenxerto aórtico. A persistência da infecção foi reportada por Bauernschmitt e cols.25 quando do uso do homoenxerto aórtico.

O homoenxerto é preferido por vários grupos5,26,27. Niwaya e cols.28 utilizaram tanto o homoenxerto como a técnica de Ross, e consideraram que a escolha da prótese e a técnica operatória dependem da anatomia local, fatores de co-morbidades e preferência do cirurgião.

Concordamos com a afirmativa de Niwaya, e em nosso serviço temos adotado essa tática. A ressecção sempre é ampla e a escolha do substituto valvar ou da forma de reconstruir o defeito é tomada na hora, levando em conta as características do paciente e a anatomia do local. Já utilizamos o pericárdio no fechamento do abscesso, empregando tanto prótese biológica como mecânica, preferindo a mecânica de duplo disco para a posição aórtica. Posteriormente usamos as próteses stentless, e agora estamos optando pelo tubo valvulado infra-coronariano nos casos em que consideramos que essa técnica pode ser utilizada.

O uso de material protético na correção desses abscessos é questionado, mas Hagl e cols.29 advogam seu uso, mostrando resultados comparáveis ao uso de material biológico.

Gontijo e cols.6 utilizaram prótese porcina stentless em 14 casos de endocardite, sem nenhuma recorrência da infecção e considerando esse um excelente substituto para pacientes com lesão do anel. Santini e cols.30 mostram também experiência inicial com esse tipo de prótese com bons resultados

Borbuga e cols.31, em cinco casos de abscesso aórtico, fizeram ampla ressecção anular, reconstruindo o local com pericárdio e implantando prótese stentless com troca de toda raiz da aorta.

Qualquer que seja o substituto valvar empregado, o importante é a ressecção de todo o tecido infectado e a cuidadosa limpeza de toda região.

O emprego de cola biológica em nossos pacientes no fechamento das cavidades tem sido utilizado em todos os casos.

A opção que utilizamos nos últimos casos é o emprego de tubo valvado na posição infra-coronariana. A preferência dos cardiologistas e dos pacientes por próteses mecânicas nos levou a essa tática operatória. Como em todas as cirurgias de abscessos, fazemos uma grande ressecção de todo tecido infectado, com limpeza da região. Em seguida passamos os pontos separados abaixo da região comprometida e implantamos tubo valvulado (Haemashield com prótese mecânica de duplo disco). Na região do abscesso é colocada cola biológica e o anel é tratado com iodo, e o suporte da prótese infiltrado, com antibióticos. A parte superior do tubo é suturada abaixo dos óstios coronarianos como fazemos nas próteses stentless.

Conclusão

Acreditamos que com essa opção aumentamos o nosso arsenal para tratamento dessa grave doença, porém mais tempo é necessário para que possamos avaliar como se comportará no futuro o tubo na posição infra-coronariana, e quais as dificuldades técnicas que teremos caso haja necessidade de troca da prótese ou do tubo.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo enviado em 16/09/2007; revisado enviado em 29/01/08; aceito em 19/02/08.

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  • Correspondência:
    Antoninho Sanfins Arnoni
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    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Ago 2008

    Histórico

    • Recebido
      16 Set 2007
    • Revisado
      29 Jan 2008
    • Aceito
      19 Fev 2008
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