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Perfuração do ventrículo direito por cabo de marca-passo de fixação passiva

RELATO DE CASO

Perfuração do ventrículo direito por cabo de marca-passo de fixação passiva

Diego Chemello; Anandaraja Subramanian; Benedict M Glover; Douglas Ing

Toronto General Hospital, University Health Network

Correspondência Correspondência: Douglas Ing 200, Elizabeth Street 3 rd floor, room 503A Toronto General Hospital Toronto, ON. M5G 2C4 E-mail: douglas.ing@uhn.on.ca

Palavras-chave: Ventrículos do coração/lesões; ventrículo direito/lesões, ferimentos e lesões; ferimentos perfurantes.

Subacute ventricular perforation is a rare complication of pacemaker or implantable-cardioverter defibrillator implantation. However, it can be life threatening. The development of small-diameter active fixation leads may be associated with increased risk for delayed right ventricular perforation. Additionally, the management of this complication has been poorly described. We report an unusual case of subacute right ventricular perforation caused by a passive fixation lead.

Perfuração ventricular subaguda é uma complicação rara do implante de marca-passo ou desfibrilador cardioversor implantável (DCI). Entretanto, ela pode ser potencialmente fatal. O desenvolvimento de cabos-eletrodos de fixação ativa de pequenos diâmetros pode estar associado com o aumento de risco de perfuração tardia ventricular. Além disso, o tratamento dessa complicação tem sido pouco descrito. Reportamos um caso pouco usual de perfuração subaguda de ventrículo direito, causada por um cabo-eletrodo de fixação passiva.

Introdução

Perfuração miocárdica é uma complicação rara da implantação de marca-passo ou desfibrilador cardioversor implantável (DCI) e geralmente ocorre quando da inserção do cabo-eletrodo1,2. O uso prévio de eletrodo temporário para marca-passo parece aumentar o risco de perfuração miocárdica3. O desenvolvimento de cabos-eletrodos de pequenos diâmetros e mecanismos de fixação ativa resultou no aumento da rigidez da extremidade dos eletrodos, potencialmente aumentando a taxa desse evento pouco comum4. Descrevemos um caso pouco usual de perfuração miocárdica subaguda causada por um cabo-eletrodo de fixação passiva. Em um paciente hemodinamicamente estável, sinais e sintomas sugestivos de perfuração são apresentados, bem como o manejo terapêutico.

Relato de caso

Uma paciente de 77 anos de idade foi submetida ao implante de marca-passo de dupla câmara devido a episódios de pausa sinusal e síncope (Zephyr XL, St Jude Medical Inc, St Paul, MN, USA). Um cabo-eletrodo 7-French de fixação passiva (St Jude IsoFlex S 1646-T) foi inserido através da veia subclávia esquerda e posicionado no ápice do ventrículo direito sem quaisquer complicações imediatas (Figuras 1A e 1B).


A sensibilidade ventricular e atrial foi medida a 1,0 e 10,4 milivolts, respectivamente. Os limiares de estimulação (volts/milissegundos) foram 1,0/0,5 e 0,5/0,5 nos eletrodos atrial e ventricular, respectivamente. As impedâncias estavam dentro dos limites normais (eletrodo atrial 429 ohms e ventricular 727 ohms). Trinta dias após o implante a paciente se apresentou ao Setor de Emergência devido à dor torácica de início repentino no quadrante direito inferior. Não havia evidência de síndrome coronária aguda. À interrogação, o marca-passo revelou sensibilidade diminuída e perda de captura com alto débito de estimulação no VD (7,5 volts a 1,5 ms), bem como estimulação diafragmática intermitente. O raio-x de tórax obtido em incidência póstero-anterior revelou que o cabo-eletrodo do VD estava fora da silhueta cardíaca (Figura 1C). Além disso, a incidência lateral mostrou o eletrodo em um aspecto posterior pouco usual (Figura 1D). A tomografia computadorizada de tórax com reconstrução tridimensional confirmou a perfuração do VD pelo cabo-eletrodo através do ápice do VD, com 7 cm do eletrodo posicionado fora do coração. Não havia derrame pericárdico (Figura 2A e 2B). A paciente foi submetida è remoção do eletrodo e reposicionamento em local levemente diferente no ápice do VD. Um dreno pericárdico também foi inserido para monitorar sangramento. O eletrodo mostrou ondas R de 21,1 milivolts com uma impedância de 707 ohms e limiar de estimulação de 0,5 volts a 0,6 milliamperes. O período pós-operatório não apresentou intercorrências. O dreno pericárdico foi removido após drenagem mínima e a paciente recebeu alta.


Discussão

A perfuração por cabo-eletrodo é uma condição relativamente rara (0,3-1%) do implante de marca-passo e DCI. A perfuração geralmente ocorre em 24 horas após o implante, mais comumente com cabos-eletrodos de fixação ativa e no aspecto atrial5. Acredita-se que a perfuração tardia seja muito rara. O curso clínico é extremamente variável, com alguns pacientes apresentando-se completamente assintomáticos, enquanto outros podem desenvolver tamponamento cardíaco e instabilidade hemodinâmica6,7. Os preditores clínicos associados com a perfuração por cabo-eletrodo são o uso de marca-passo temporário, eletrodos helicoidais e uso de corticosteróides3. Os preditores potenciais para perfuração tardia, particularmente associados com cabo-eletrodo de fixação passiva, incluem eletrodos de diâmetros menores, posicionamento septal ou apical, bem como alto grau de frouxidão no eletrodo ventricular. No presente caso, o raio-x de tórax, após o implante inicial (Figura 1A) mostrou o eletrodo posicionado no ápice do VD e aparentemente com frouxidão ideal. Entretanto, a incidência lateral mostra um ângulo distal no eletrodo do VD, que poderia aumentar a tensão no eletrodo, causando a perfuração (Figura 1B).

Na maioria dos pacientes, os eletrodos podem ser retirados sob fluoroscopia e monitoração cuidadosa. Embora controversa, a inserção de um dreno pericárdico profilático é baseada no julgamento clínico. O risco emergente de derrame pericárdico e tamponamento cardíaco nessas situações, bem como a presença de apoio cirúrgico pode favorecer a decisão de inserção profilática de dreno. Um aspecto interessante observado é que a progressão da tecnologia resultou no desenvolvimento de cabos-eletrodos de pequenos diâmetros, com desenhos modificados, aumentando a rigidez na extremidade desses eletrodos3,8, o que está relacionado ao aumento no número de perfurações em pacientes que recebem implante de marca-passo ou DCI9,10.

O presente caso descreve uma paciente com perfuração recente de eletrodo de fixação passiva sem instabilidade hemodinâmica. É importante que o cardiologista preste atenção a pequenos sinais que podem sugerir perfuração por cabo-eletrodo, considerando que os grandes sinais, tais como derrame pericárdico, não estão necessariamente presentes. Dor torácica ou abdominal superior e baixa impedância à interrogação do marca-passo, bem como sensibilidade diminuída ou falha na captura da câmara envolvida são achados suspeitos.

Finalmente, a decisão de implantar eletrodos com base somente em seu tamanho não é justificada, pois as complicações mais recentes descritas ocorreram com os modelos mais novos de marca-passo ou eletrodo de DCI.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo foi parcialmente financiado pela CAPES.

Vinculação Acadêmica

Este artigo é parte de tese de Doutorado de Diego Chemello pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Referências

Artigo recebido em 14/09/09; revisado recebido em 18/11/09; aceito em 12/03/10.

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  • Correspondência:

    Douglas Ing
    200, Elizabeth Street
    3
    rd floor, room 503A
    Toronto General Hospital
    Toronto, ON. M5G 2C4
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jun 2011
    • Data do Fascículo
      Maio 2011
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