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Diretrizes de avaliação perioperatória e doenças da tireóide

CARTA AO EDITOR

Diretrizes de avaliação perioperatória e doenças da tireóide

Laura Sterian Ward

Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, Campinas, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Laura Sterian Ward Rua Olympio Pattaro, 45 - Barão Geraldo 13085-045 - Campinas, SP, Brasil E-mail: ward@fcm.unicamp.br

Palavras-chave: Doenças da tireóide, diretrizes.

Prezado Sr. Editor,

Lemos com muito interesse as Diretrizes publicadas pelos Arquivos Brasileiros de Cardiologia. A publicação de normas, consensos e diretrizes, em adição às Diretrizes ANS, AMB-CFM, é importante para a especialidade e, sem dúvida, a Cardiologia se destaca ao prover importante fonte de referência acerca de vários assuntos da prática clínica diária.

A recente publicação acerca da avaliação perioperatória de pacientes se enquadra muito bem nesses assuntos práticos e oferece informações preciosas e bem elaboradas, com base na mais recente literatura1. Infelizmente, o trecho referente a doenças da tireoide não acompanha o elevado nível do restante da publicação. Além de citar dados antigos e de pecar pela absoluta falta de familiaridade com o tema abordado, o Capítulo 9.1 comete erros grosseiros que podem levar o leitor a tirar falsas conclusões e a tomar condutas inadequadas. Assim, falta a referência à primeira frase em que os autores afirmam que a incidência de bócio representa de 15% a 30% da população adulta em áreas endêmicas. Talvez a referência adequada se refira aos aborígenes da Malásia ou a remotas regiões na Ásia Central ou na África. De qualquer forma, o bócio endêmico no Brasil foi bastante limitado há várias décadas, graças à introdução do sal iodado, e não existem quaisquer dados que possam dar suporte a essa afirmação introdutória dos autores da diretriz2. Pouco adiante, o artigo ainda menciona prevalência de hipotireoidismo estimada em cinco para cada mil pacientes, mais uma vez sem fornecer qualquer referência. Imaginamos que os autores quiseram dizer cinco casos de hipotireoidismo para cada mil indivíduos. Dois grandes estudos populacionais foram publicados no Brasil e, em ambos, a prevalência de anormalidades no TSH ficou em torno de 10% da população, número similar ao dos grandes estudos populacionais norte-americanos3-6. Essa prevalência atinge o dobro na população de mulheres com mais de 60 anos3. No entanto, mais grave do que a citação de números incorretos, é a afirmação de que a causa mais frequente de hipotireoidismo é iatrogênica, afirmação que demonstra absoluta falta de conhecimento por parte dos autores, refletida ainda em muitos outros pontos do trecho cuja citação seria demasiadamente longa e ainda mais deselegante.

As Diretrizes ANS, AMB/CFM incluem, em sua elaboração, diversos especialistas envolvidos na mesma área de atuação, justamente para evitar que equívocos ou mal-entendidos como os citados ocorram. Talvez a Sociedade Brasileira de Cardiologia deva espelhar-se em tal conduta para a elaboração de suas diretrizes, já que, inevitavelmente, assuntos que envolvem outras especialidades médicas acabarão sendo abordados nessa iniciativa que louvamos e que esperamos que seja mantida.

Prezada Dra. Laura S. Ward,

Agradecemos seu interesse e seus valiosos comentários relativos à II Diretriz de Avaliação Perioperatória da SBC. Em resposta à sua sugestão relativa à composição dos membros responsáveis pela elaboração da Diretriz, concordamos integralmente. A elaboração de recomendações que envolvem tantas especialidades médicas e não médicas deve ser um esforço conjunto. Tal fato está comprovado na relação de autores: foram contempladas cinco áreas de atuação em Medicina e uma em Odontologia na primeira versão e seis áreas em Medicina na segunda versão, em ambos os casos incluindo Endocrinologia.

As ponderações referentes aos dados epidemiológicos e à etiologia de doenças endocrinológicas são pertinentes e devem ser levadas em conta para a elaboração de recomendações para a prática médica, o objetivo primário desta diretriz. Por outro lado, o parecer dos editores da presente diretriz é que essas ponderações não modificam o conteúdo das recomendações encontradas texto.

Bruno Caramelli

Danielle M. Gualandro

Artigo recebido em 19/04/11; revisado recebido em 20/05/11; aceito em 20/05/11.

  • 1. Gualandro DM, Yu PC, Calderaro D, Marques AC, Pinho C, Caramelli B, et al. / Sociedade Brasileira de Cardiologia. II Diretriz de avaliação perioperatória. Arq Bras Cardiol. 2011;96(3 supl.1):1-68.
  • 2. Corrêa Filho HR, Vieira JB, Silva YS, Coelho GE, Cavalcante F dos A, Pereira Mda P. [Endemic goiter prevalence survey in Brazilian schoolchildren 6 to 14 years old, 1994-1996]. Rev Panam Salud Publica. 2002;12(5):317-26.
  • 3. Sichieri R, Baima J, Marante T, de Vasconcellos MT, Moura AS, Vaisman M. Low prevalence of hypothyroidism among black and Mulatto people in a population-based study of Brazilian women. Clin Endocrinol (Oxf). 2007;66(6):803-7.
  • 4. Sgarbi JA, Matsumura LK, Kasamatsu TS, Ferreira SR, Maciel RM. Subclinical thyroid dysfunctions are independent risk factors for mortality in a 7.5-year follow-up: the Japanese-Brazilian thyroid study. Eur J Endocrinol. 2010;162(3):569-77.
  • 5. Canaris GJ, Manowitz NR, Mayor G, Ridgway EC. The Colorado thyroid disease prevalence study. Arch Intern Med. 2000;160(4):526-34.
  • 6. Hollowell JG, Staehling NW, Flanders WD, Hannon WH, Gunter EW, Spencer CA, et al. Serum TSH, T(4), and thyroid antibodies in the United States population (1988 to 1994): National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES III). J Clin Endocrinol Metab. 2002;87(2):489-99.Carta-resposta
  • Correspondência:
    Laura Sterian Ward
    Rua Olympio Pattaro, 45 - Barão Geraldo
    13085-045 - Campinas, SP, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Out 2011
    • Data do Fascículo
      Set 2011
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