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Valor prognóstico da troponina I de alta sensibilidade versus troponina T nas síndromes coronarianas agudas

Resumos

FUNDAMENTO: Apesar da superior precisão diagnóstica das troponinas cardíacas de alta sensibilidade, seu valor prognóstico ainda não foi validado contra troponinas cardíacas convencionais. OBJETIVO: Testar o valor prognóstico da troponina I de alta sensibilidade (TnI-as) em comparação com a troponina T convencional (TnT-c) no cenário de síndromes coronarianas agudas sem supradesnivelamento do segmento ST (SCA). MÉTODOS: No momento da admissão, uma amostra de plasma foi coletada de 103 pacientes consecutivos com angina instável ou infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST. Nessa amostra, a troponina foi medida tanto pelo método TnI-as quanto pelo método TnT-c. O valor prognóstico das duas troponinas foi comparado em relação à ocorrência de evento cardiovascular maior, definido como o composto de morte, infarto agudo do miocárdio não fatal ou angina instável refratária durante a internação. RESULTADOS: Durante uma hospitalização mediana de 8 dias (intervalo interquartil = 5-11), a incidência de eventos cardiovasculares foi 10% (5 mortes, 3 infartos não fatais e 2 anginas refratárias não fatais). Troponina I de alta sensibilidade predisse significativamente eventos cardiovasculares, com C-estatísticas de 0,73 (95% CI = 0,59-0,87), à semelhança da TnT-c (0,70; 95% CI = 0,55-0,84) - P = 0,75. A definição de troponina positiva que proporcionou melhor acurácia prognóstica foi TnI-as > 0,055 mg / L e TnT-c > 0,010 mg / L, com sensibilidade de 90% e especificidade de 52% para ambos os ensaios. CONCLUSÃO: Troponina I de alta sensibilidade prediz eventos cardiovasculares de forma semelhante à troponina T convencional no cenário de SCA. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)

Síndrome coronariana aguda; troponina; prognóstico


BACKGROUND: Despite superior diagnostic accuracy of high-sensitivity cardiac troponins, their prognostic value has not been validated against conventional cardiac troponins. OBJECTIVE: To test the prognostic value of high-sensitivity cardiac troponin I (hs-cTnI), compared with conventional cardiac troponin T (cTnT) in the setting of non-ST elevation acute coronary syndromes. METHODS: At hospital admission, a plasma sample was collected from 103 consecutive patients with unstable angina or non-ST elevation acute myocardial infarction. In this sample, troponin was measured both by hs-cTnI and cTnT methods. Their prognostic value was compared as to the occurrence of major cardiovascular events, defined as a combination of death, nonfatal acute myocardial infarction or refractory unstable angina during hospitalization. RESULTS: During median hospitalization of 8 days (interquartile range = 5 - 11), the incidence of cardiovascular events was 10% (5 deaths, 3 non-fatal myocardial infarctions and 2 non-fatal refractory anginas). High-sensitivity troponin I significantly predicted cardiovascular events, with a C-statistics of 0.73 (95% CI = 0.59 - 0.87), similarly to cTnT (0.70; 95% CI = 0.55 - 0.84) - P = 0.75. The definition of positive cardiac marker that provided the best prognostic accuracy was hs-cTnI > 0.055 µg/L and cTnT > 0.010 µg/L, with equal sensitivity of 90% and specificity of 52% for both assays. Positive hs-cTnI was associated with 17% incidence of events, compared with 2% in patients with negative hs-cTnI (P = 0.02). CONCLUSION: High-sensitivity troponin I predicts cardiovascular events similarly to conventional troponin T in the setting of non-ST-elevation ACS. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)

Acute coronary syndrome; troponin; prognosis


Valor prognóstico da troponina I de alta sensibilidade versus troponina T nas síndromes coronarianas agudas

Luis Cláudio Lemos CorreiaI, II; Fábio L. SodréIII; José C.C. LimaIII; Michael SabinoI, II; Mariana BritoI, II; Guilherme GarciaI, II; Mayara MarauxI, II; Alexandre C. SousaI, II; Márcia Noya RabeloI, II; J. Péricles EstevesIII

IFaculdade de Medicina da Bahia

IIHospital San Rafael

IIIHospital Português, Salvador, BA, Brasil

Correspondência Correspondência: Albuquerque de Figueiredo Neto • Rua Rui Ribeiro Mesquita - Ed. Dom Gabriel, apto 402 - Calhau - 65075-260 - São Luiz, MA - Brasil E-mail: jafneto@cardiol.br, jafneto@terra.com.br

RESUMO

FUNDAMENTO: Apesar da superior precisão diagnóstica das troponinas cardíacas de alta sensibilidade, seu valor prognóstico ainda não foi validado contra troponinas cardíacas convencionais.

OBJETIVO: Testar o valor prognóstico da troponina I de alta sensibilidade (TnI-as) em comparação com a troponina T convencional (TnT-c) no cenário de síndromes coronarianas agudas sem supradesnivelamento do segmento ST (SCA).

MÉTODOS: No momento da admissão, uma amostra de plasma foi coletada de 103 pacientes consecutivos com angina instável ou infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST. Nessa amostra, a troponina foi medida tanto pelo método TnI-as quanto pelo método TnT-c. O valor prognóstico das duas troponinas foi comparado em relação à ocorrência de evento cardiovascular maior, definido como o composto de morte, infarto agudo do miocárdio não fatal ou angina instável refratária durante a internação.

RESULTADOS: Durante uma hospitalização mediana de 8 dias (intervalo interquartil = 5-11), a incidência de eventos cardiovasculares foi 10% (5 mortes, 3 infartos não fatais e 2 anginas refratárias não fatais). Troponina I de alta sensibilidade predisse significativamente eventos cardiovasculares, com C-estatísticas de 0,73 (95% CI = 0,59-0,87), à semelhança da TnT-c (0,70; 95% CI = 0,55-0,84) - P = 0,75. A definição de troponina positiva que proporcionou melhor acurácia prognóstica foi TnI-as > 0,055 mg / L e TnT-c > 0,010 mg / L, com sensibilidade de 90% e especificidade de 52% para ambos os ensaios.

CONCLUSÃO: Troponina I de alta sensibilidade prediz eventos cardiovasculares de forma semelhante à troponina T convencional no cenário de SCA. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)

Palavras-chave: Síndrome coronariana aguda, troponina, prognóstico.

Introdução

Marcadores de necrose miocárdica são importantes indicadores para diagnóstico, avaliação de risco e decisão terapêutica em pacientes com síndromes coronarianas agudas sem supradesnivelamento do segmento ST. Recentemente, ensaios de alta sensibilidade foram desenvolvidos com imprecisão menor que 10%, abaixo do percentil 99 de uma população normal de referência1,2.Quanto maior a sensibilidade, melhor a capacidade de detectar pequenas quantidades de necrose miocárdica. No entanto, não é uma garantia de maior precisão, porque as maiores sensibilidades ocorrem geralmente à custa de baixas especificidades3. Assim, é consenso que os métodos que empregam troponina de alta sensibilidade devem ser validados por estudos científicos antes de sua implementação generalizada4.

Quanto ao diagnóstico, testes da troponina de alta sensibilidade foram validados como testes de precisão superior na definição de dor torácica aguda5,6. Embora dados preliminares sugiram que os testes de alta sensibilidade possuem valor prognóstico7, eles nunca foram comparados com o valor prognóstico das troponinas convencionais atuais nas síndromes coronarianas agudas. A fim de avaliar se a troponina I de alta sensibilidade (hs-cTnI) oferece um valor prognóstico similar ou superior à troponina T convencional (cTnT) em pacientes com síndromes coronarianas agudas sem supradesnivelamento do segmento ST, medimos a troponina por meio de ambos os testes na admissão de 103 pacientes e os eventos cardiovasculares foram registrados durante a hospitalização.

Métodos

População de estudo

Pacientes consecutivos admitidos em nossa unidade de terapia coronariana intensiva em razão de angina de peito instável ou de infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST, entre agosto de 2008 e setembro de 2009, foram considerados candidatos para o estudo. Os critérios de inclusão foram definidos como início do desconforto típico no tórax de pelo menos 5 minutos, nas primeiras 48 horas, ausência de supradesnivelamento do segmento ST e pelo menos um dos seguintes critérios objetivos: (1) troponina positiva em qualquer uma das três dosagens seriadas realizadas no primeiro dia de internação, definida como cTnT > 0,030 µg/L, que corresponde ao valor acima do percentil 99 de uma população de referência saudável e com imprecisão total de 10% (Definição Universal de Infarto)8; (2) alterações eletrocardiográficas isquêmicas consistindo de infradesnivelamento transitório do segmento ST (> 0,05 mV) ou inversão de onda T (> 0,1 mV); (3) documentação prévia de doença arterial coronariana, definida como uma histórico definitiva de infarto do miocárdio ou obstrução coronariana > 50% na angiografia. Mediante o cumprimento dos critérios para inclusão no estudo, os pacientes assinaram o consentimento esclarecido. O protocolo de estudo está em conformidade com as diretrizes éticas da Declaração de Helsinki de 1975, conforme consta da aprovação prévia do Comitê de Ética em Pesquisa em Humanos da Instituição.

Protocolo laboratorial

Apenas a primeira medição de troponina foi avaliada como um marcador de prognóstico em nosso estudo. A amostra de sangue coletada imediatamente na chegada ao hospital (pronto-socorro) ou no momento da chegada à unidade de terapia coronariana (se o paciente foi internado a partir do próprio hospital) foi utilizada para a medição de troponina T, que foi utilizada na prática clínica. Em seguida, a mesma amostra foi armazenada a -70 °C para a medição futura da troponina I de alta sensibilidade. A troponina cardíaca T foi medida por imunoensaio por eletroquimioluminescência (Roche Diagnostics Corporation, Indianápolis, Indiana, EUA), com um limite de detecção de 0,010 µg/L, valor de referência do percentil 99 inferior a 0,010 µg/L e coeficiente de variação (CV) de 10% a 0,030 µg/L8. A troponina I de alta sensibilidade foi avaliada por imunoensaio por quimioluminescência VITROS (Ortho-Clinical Diagnostics, Rochester, NY, EUA), com um limite de detecção de 0,012 µg/L, valor de referência do percentil 99 de 0,034 µg/L e CV de 10% a 0,034% µg/L8.

Desfechos clínicos

Os indivíduos foram acompanhados durante a internação a fim de identificar a recorrência de eventos cardiovasculares, que foram julgados pelos investigadores, independentemente da impressão do médico. Como desfecho primário, eventos cardiovasculares maiores durante a internação foram definidos como a combinação de óbito, infarto agudo do miocárdio não fatal ou angina instável refratária. O infarto do miocárdio como desfecho foi definido como uma nova onda Q ou elevação de troponina T no período de internação, apesar dos valores normais durante as primeiras 24 horas. Para pacientes com infarto na admissão, um novo pico de massa CK-MB (> 50% do valor anterior e acima do valor normal) foi necessário para o diagnóstico de reinfarto. Angina refratária durante a hospitalização foi definida como dor precordial recorrente pelo menos duas vezes, embora terapia com nitratos e antiangina garantisse o consumo de oxigênio controlada.

Análise dos dados

Considerando as distribuições não normais, as troponinas cardíacas foram descritas como mediana e intervalo interquartil. As precisões de hs-cTnI e cTnT na previsão de eventos cardiovasculares hospitalares foram testadas pela C-estatística (área sob a curva característica de operador receptor), sendo esta considerada significativa se estatisticamente diferente de 0,5. A C-estatística de hs-cTnI foi comparada com cTnT pelo método proposto por Henley e McNeil9. Utilizando os pontos de corte de melhor desempenho prognóstico para a definição de troponina positiva, a sensibilidade, a especificidade, o valor preditivo negativo e o valor preditivo positivo foram calculados para hs-cTnI e cTnT. A concordância entre os dois ensaios na definição de troponina positiva foi avaliada pelo teste Kappa. O Valor Prognóstico do Escore de Risco GRACE10 foi calculado de duas maneiras: primeiro, utilizando hs-cTnI como o marcador de necrose e, segundo, utilizando cTnT. Os dois escores GRACE tiveram sua C-estatística comparada pelo método de Henley e McNeil. Além disso, a troponina positiva foi definida por dois outros critérios: valores acima do percentil 99 da população de referência, a uma impressão de 10%; e qualquer valor detectável. Sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo e valor preditivo positivo também foram calculados para essas duas definições alternativas de hs-cTnI e cTnT positivas. A significância estatística foi definida como um valor de P < 0,05. O SPSS Statistical Software (versão 9.0, SPSS Inc., Chicago, Illinois, EUA) e o MedCalc Statistical Software (versão 9.3.2.0, MedCalc Software, Mariakerke, Bélgica) foram usados para a análise de dados.

Resultados

Características da população

Cento e três pacientes foram estudados, com idade de 68 ± 13 anos, 50% do sexo masculino. Como critério de inclusão, 59% foram diagnosticados como tendo infarto do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST, e o restante, como angina instável. Em média, os pacientes tiveram risco intermediário para eventos isquêmicos recorrentes, com um Escore de GRACE de 120 ± 37. Além disso, uma fração de ejeção < 45% foi observada em 19% e doença arterial coronariana grave (lesão trivascular ou estenose da artéria coronária principal esquerda) em 39% daqueles que foram submetidos a angiografia. Disfunção renal grave (clearance de creatinina < 30 mL/min) esteve presente em 13%, mas apenas dois pacientes estavam em diálise crônica. As características basais são apresentadas na tabela 1. Durante uma hospitalização mediana de oito dias (intervalo interquartil = 5 - 11), a incidência de eventos cardiovasculares foi de 10% (5 óbitos, 3 infartos do miocárdio não fatais e 2 anginas refratárias não fatais).

O atraso de tempo médio entre o início dos sintomas e a coleta de sangue para medir a troponina cardíaca foi de 4,8 horas (intervalo interquartil = 2,5 - 12). Na admissão, o nível médio de hs-cTnI foi de 0,060 µg/L (010-0,590 µg/L), enquanto a mediana de cTnT foi de 0,010 µg/L(0-0,090 µg/L). Níveis detectáveis de troponina I (> 0,012 µg/L) foram observados mais frequentemente do que níveis detectáveis de troponina T (> 0,010 µg/L), respectivamente 77% versus 52% (p < 0,001). Igualmente, a prevalência de hs-cTnI acima do percentil 99 com CV de 10% (0,034 µg/L) foi de 58%, em comparação com apenas 36% de troponina T > 0,030 µg/L (p < 0,001). Assim, de acordo com a definição universal de troponina positiva (percentil 99), hs-cTnI esteve mais elevado do que cTnT.

Valor prognóstico de hs-cTnI versus cTnT

A troponina I de alta sensibilidade mostrou-se preditora significativa de eventos cardiovasculares com uma C-estatística de 0,73 (IC 95% = 0,59 - 0,87, p = 0,02), à semelhança de cTnT (0,70; IC 95% = 0,55 - 0,84; p = 0,04); P = 0,75 para comparação entre as curvas (fig. 1). De acordo com a curva ROC, a definição de marcador cardíaco positivo que forneceu a melhor precisão prognóstica foi hs-cTnI > 0,055 µg/L e cTnT > 0 µg/L.


Com base em nessas definições, hs-cTnI apresentou sensibilidade de 90%, especificidade de 52%, com valor preditivo negativo de 98% e valor preditivo positivo de 17% para eventos cardiovasculares durante a hospitalização. Nesse sentido, hs-cTnI esteve associado com uma incidência de 17% de eventos, em comparação com 2% em pacientes com hs-cTnI negativo (risco relativo = 8,2; IC 95% = 1,1 - 62; p = 0,02). A cTnT positiva rendeu números iguais em relação à precisão e à incidência de eventos (tab. 2 e fig. 2). Portanto, tanto a C-estatística quanto a análise de dicotomização sugerem que hs-cTnI e cTnT apresentam precisão prognóstica semelhante.


A concordância entre os dois ensaios na definição de troponina positiva foi de 82% (Kappa = 0,63; IC 95% = 0,47-0,79; p < 0,001): ambos os testes foram positivos em 44 pacientes, 10 pacientes tinham apenas hs-cTnI positiva, 9 pacientes apenas cTnT positiva, e ambos os métodos foram negativos em 40 pacientes. A incidência de eventos foi de 22%, 0%, 0% e 3% em cada um desses quatro grupos, respectivamente (p = 0,02) fig. 2).

A pontuação GRACE apresentou a mesma precisão tanto para hs-cTnI quanto para cTnT utilizadas na definição de marcador cardíaco positivo, com base nos melhores pontos de corte. Quando hs-cTnI foi considerada, o Escore de GRACE apresentava uma C-estatística de 0,755 (IC 95% = 0,575-0,935; p = 0,008), quase idêntico ao Escore de GRACE calculado pela cTnT (0,758; IC 95% = 0,575-0,940 ; p = 0,008) - p = 0,86 para comparação entre as curvas.

Precisão prognóstica de pontos de corte previamente definidos

Quando a definição universal de infarto (percentil 99 e CV < 10%) foi utilizada, hs-cTnI > 0,034 µg/L apresentou maior sensibilidade em comparação com o padrão de cTnT > 0,030 µg/L (90% vs. 50%). Por sua vez, hs-cTnI teve menor especificidade do que cTnT (47% vs. 67%). A troponina I de alta sensibilidade > 0,034 g/L esteve associada com 15% dos eventos, em comparação com 2% no restante dos pacientes (p = 0,04), mas cTnT > 0,030 µg/L não esteve significativamente associado com eventos (14% vs. 8%, p = 0,49). Portanto, pela definição universal de infarto, hs-cTnI apresentou melhor desempenho do que cTnT (tab. 2).

Quando qualquer nível de troponina detectável foi tomado como ponto de corte, hs-cTnI > 0,012 µg/L apresentou sensibilidade semelhante a cTnT > 0,010 µg/L (100% vs. 90%), porém com pior especificidade (24% vs. 53%). Indivíduos com hs-cTnI > 0,012 µg/L tiveram 13% dos eventos, em comparação com 0% no restante dos pacientes (p = 0,11), enquanto cTnT > 0,010 µg/L esteve associado com aumento significativo na incidência de eventos (17% vs. 2%; p = 0,02). Portanto, pelos critérios de qualquer nível detectável, cTnT apresentou melhor desempenho em razão de sua maior especificidade.

Em resumo, os pontos de corte predefinidos implicam maior sensibilidade e menor especificidade para hs-cTnI, quando comparado com cTnT. À medida que aumenta o ponto de corte, hs-cTnI tende a funcionar melhor do que cTnT, por causa da melhora na especificidade. À medida que o ponto de corte diminui, hs-cTnI tende a apresentar um desempenho pior do que cTnT padrão, por causa do comprometimento da especificidade.

Discussão

O presente estudo demonstra um desempenho prognóstico semelhante de hs-cTnI e cTnT em pacientes com síndromes coronarianas agudas sem supradesnivelamento do segmento ST, conforme indicado pela comparação das áreas sob as curvas ROC. A relevância desse resultado se baseia no fato de que um ensaio altamente sensível pode sobre da falta de especificidade. Recentemente, essa preocupação foi parcialmente resolvida pela demonstração de que troponinas cardíacas de alta sensibilidade fornecem melhor precisão diagnóstica no cenário de dor precordial aguda, em comparação com ensaios padrão5,6. No entanto, a precisão prognóstica da hs-cTn em pacientes com síndromes coronarianas agudas não tinha sido estabelecida.

Além da comparação das curvas ROC, a sensibilidade e a especificidade foram separadamente avaliadas de acordo com diferentes pontos de corte. Quando a Definição Universal de Infarto foi utilizada para definir os pontos de corte, os dois métodos apresentaram desempenhos diferentes: hs-cTnI apresentou melhor sensibilidade, detectando mais indivíduos com infarto do miocárdio, em comparação com cTnT. Por sua vez, a sensibilidade superior se deu à custa de especificidade inferior. De acordo com o paradigma da prevenção, marcadores prognósticos se concentram especialmente na sensibilidade, enquanto a especificidade se torna um foco secundário. Com base nisso, pode-se concluir que a hs-cTnI é a melhor escolha. Contudo, a Definição Universal de Infarto não se baseia em dados prognósticos. É apenas uma definição arbitrária da doença com base nas propriedades analíticas do teste. Assim, pontos de corte específicos devem ser definidos para fins de prognóstico. Quando os pontos de corte foram ajustados de acordo com o melhor desempenho pela análise da curva ROC, os valores prognósticos dos dois testes não diferiram. Por fim, quando o limite de detecção foi utilizado como pontos de corte, hs-cTnI tornou-se inútil como um marcador de prognóstico, com especificidade quase nula. Isso demonstra que pontos de corte inferiores não são adequados para ensaios de alta sensibilidade, enquanto pontos de corte maiores derivados da análise ROC tendem a melhorar a precisão. Por sua vez, o melhor ponto de corte de cTnT foi igual ao limite inferior de detecção, indicando que pontos de corte mais baixos melhoram a precisão de cTnT. Portanto, a presente análise enfatiza que troponinas cardíacas de alta sensibilidade e convencionais se comportam de maneira diferente e, de forma a maximizar a precisão, os pontos de corte devem ser definidos pelo desempenho prognóstico real de cada método.

Um marcador prognóstico deve ser analisado juntamente com variáveis clínicas preditivas, como realizado por escores de risco que combinam variáveis, clínicas, eletrocardiográficas e laboratoriais e marcadores de necrose. Dessa forma, comparamos a precisão do Escore GRACE levando em consideração hs-cTnI ou cTnT, ambos definidos pelos melhores pontos de corte. As C-estatísticas dos dois Escores GRACE foram idênticas. Isso representa outra evidência de que hs-cTnI apresenta um desempenho bom o suficiente como marcador prognóstico em pacientes com SCA.

Anteriormente, Bonaca e cols. e Apple e cols. avaliaram o valor prognóstico da troponina de alta sensibilidade no cenário de dor precordial, mas não compararam com as troponinas convencionais7,8. Essa comparação é essencial para avaliar se o novo ensaio deve substituir o ensaio antigo. Keller e cols.5 e Reichlin e cols.6 compararam as troponinas de alta sensibilidade e troponinas convencionais, mas avaliaram especialmente as propriedades diagnósticas em uma amostra heterogênea de pacientes com dor precordial. Aldous e cols.11 demonstraram em um seguimento de dois anos que a troponina de alta sensibilidade apresenta melhor valor de predição em comparação com a troponina convencional. Também Ndrepepa e cols.12 sugeriram o mesmo resultado em um seguimento de quatro anos. Pelo que sabemos, o presente estudo é o primeiro a comparar os ensaios com foco sobre o prognóstico da fase aguda, em uma população bem definida de síndromes coronárias agudas.

A principal limitação do nosso estudo é o tamanho da amostra total e o pequeno número de eventos, que fornece poder estatístico insuficiente para garantir uma probabilidade de erro tolerável tipo II. Portanto, este é um estudo de geração de hipóteses, que deve ser retestado por amostras maiores. No entanto, devemos ressaltar que as áreas sob as curvas ROC foram muito semelhantes entre os métodos, o que contribui para reduzir a probabilidade de erro tipo II. Embora a nossa sugestão seja a importância de definir pontos de corte, a nossa análise é enfraquecida no que se refere a validar valores de referência. Sendo assim, mais estudos são necessários para validar precisamente quais pontos de cortes devem ser usados na definição de prognóstico. De fato, pontos de corte prognósticos podem ser diferentes dos pontos de corte diagnósticos. Além disso, este estudo é limitado por uma medida única e precoce da troponina. Tendo em vista que uma primeira avaliação pode carecer de sensibilidade para as mudanças na troponina, nossos achados não devem ser extrapolados para medições em série.

O presente estudo fornece evidências de que um novo ensaio da troponina de alta sensibilidade possui valor prognóstico comparável ao ensaio convencional. Contudo, não demonstramos superioridade. No entanto, nossos achados, juntamente com o conhecimento prévio que a troponina de alta sensibilidade é superior em termos de diagnóstico, indicam que o novo método pode ser a abordagem preferencial para a avaliação de necrose miocárdica em pacientes com SCA.

Em conclusão, o presente estudo sugere que hs-cTnI possui desempenho prognóstico semelhante a cTnT no cenário de SCA sem supradesnivelamento do segmento ST.

Artículo recibido el 25/10/11, revisado recibido el 25/10/11; aceptado el 21/01/12.

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  • Correspondência:

    Albuquerque de Figueiredo Neto •
    Rua Rui Ribeiro Mesquita - Ed. Dom Gabriel, apto 402 - Calhau - 65075-260 - São Luiz, MA - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Maio 2012

    Histórico

    • Recebido
      25 Out 2011
    • Aceito
      21 Jan 2012
    • Revisado
      25 Out 2011
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