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Distância do domicílio ao local de exercício físico não influenciou a aderência de 796 participantes

Resumos

FUNDAMENTO: Uma das dificuldades para a manutenção da aderência de longo prazo a exercícios é a distância entre domicílio e local de exercício. OBJETIVO: Determinar, para um programa de exercício físico supervisionado (PES) privado, a influência da distância domicílio-PES sobre a aderência. MÉTODOS: Foram identificados 976 sujeitos e selecionados 796 que atendiam aos critérios de inclusão. A distância domicílio-PES foi obtida pelo Google Maps. A aderência foi determinada em quartis (meses): de 1 a 4, 5 a 12, 13 a 36 e mais de 36. As condições clínicas foram estratificadas como: saudáveis; obesos e/ou hipertensos e/ou dislipidêmicos e/ou diabéticos sem doença coronariana; coronariopatas e outros agravos como câncer, pânico e doenças respiratórias. A distância domicílio-PES foi dividida em (km): até 1, entre 1 e 3, entre 3 e 10, e mais de 10. Para a análise estatística, utilizaram-se a ANOVA Kruskal-Wallis e o quiquadrado. RESULTADOS: Dos participantes, 46% residiam até 3 km, 39% entre 3 e 10 km e cerca de 15% moravam a mais de 10 km do local de realização do PES. Não foram encontradas diferenças entre as medianas dos meses de permanência no PES em função da distância domicílio-PES (p = 0,11). CONCLUSÃO: Para um determinado PES privado da cidade do Rio de Janeiro e funcionando de segunda a sábado com livre escolha de horário, a distância domicílio-PES não influenciou na aderência dos participantes. Isso provavelmente se deveu à qualidade do serviço prestado e/ou a ausência de opções mais próximas do local de domicílio dos participantes. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)

Reabilitação; treinamento; exercício; coronariopatia


BACKGROUND: One of the difficulties in maintaining long-term adherence to exercise is the distance from home to the place of exercise. OBJECTIVE: To determine, for a private supervised exercise program (PSEP), the influence of the home-PSEP distance on adherence. METHODS: We identified 976 individuals and selected 796 who met the inclusion criteria. The home-PSEP distance was obtained by the Google Maps. Adherence was determined by quartiles (months): 1-4, 5-12, 13-36 and more than 36. The clinical conditions were stratified as healthy, obese and/or hypertensive and/or dyslipidemic and/or diabetic patients without coronary disease; coronary artery disease patients and other health problems like cancer, respiratory disease and panic. The home-PSEP distance was divided into (km): up to 1, 1 to 3, 3 to 10 and more than 10. For the statistical analysis, we used the Kruskal-Wallis ANOVA and the chi-square test. RESULTS: Of respondents, 46% lived up to 3 km, 39% lived between 3 and 10 km and about 15% lived more than 10 kilometers from the place of the PSEP. No differences were found between the medians of the months of participation in the PSEP as a function of home-PSEP distance (p = 0.11). CONCLUSION: For a given PSEP in the city of Rio de Janeiro, open from Monday through Saturday with free choice of time, the home-PSEP distance did not influence the adherence of participants. This was probably due to the quality of the service and/or lack of places closer to the participants’ home. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)

Rehabilitation; training; exercise; coronary artery disease


Distância do domicílio ao local de exercício físico não influenciou a aderência de 796 participantes

Antonio Cesar Cabral-de-OliveiraI,III; Plínio Santos RamosIV,V; Claudio Gil Soares de AraújoI,II

IPrograma de Pós-Graduação em Ciências do Exercício e do Esporte - Universidade Gama Filho - Brasil

IICLINIMEX - Clínica de Medicina do Exercício, Rio de Janeiro, RJ - Brasil

IIIUPAFISE - Departamento de Educação Física - Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE - Brasil

IVSUPREMA - Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG - Brasil

VHospital Therezinha de Jesus, Juiz de Fora, MG - Brasil

Correspondência Correspondência: Antonio Cesar Cabral-de-Oliveira Núcleo de Pós-Graduação em Educação Física Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos Av. Marechal Rondon, s/n Jardim Rosa Elze CEP 49100-000 São Cristóvão/SE - Brazil E-mail: cabral@infonet.com.br, cabral@ufs.br

RESUMO

FUNDAMENTO: Uma das dificuldades para a manutenção da aderência de longo prazo a exercícios é a distância entre domicílio e local de exercício.

OBJETIVO: Determinar, para um programa de exercício físico supervisionado (PES) privado, a influência da distância domicílio-PES sobre a aderência.

MÉTODOS: Foram identificados 976 sujeitos e selecionados 796 que atendiam aos critérios de inclusão. A distância domicílio-PES foi obtida pelo Google Maps. A aderência foi determinada em quartis (meses): de 1 a 4, 5 a 12, 13 a 36 e mais de 36. As condições clínicas foram estratificadas como: saudáveis; obesos e/ou hipertensos e/ou dislipidêmicos e/ou diabéticos sem doença coronariana; coronariopatas e outros agravos como câncer, pânico e doenças respiratórias. A distância domicílio-PES foi dividida em (km): até 1, entre 1 e 3, entre 3 e 10, e mais de 10. Para a análise estatística, utilizaram-se a ANOVA Kruskal-Wallis e o quiquadrado.

RESULTADOS: Dos participantes, 46% residiam até 3 km, 39% entre 3 e 10 km e cerca de 15% moravam a mais de 10 km do local de realização do PES. Não foram encontradas diferenças entre as medianas dos meses de permanência no PES em função da distância domicílio-PES (p = 0,11).

CONCLUSÃO: Para um determinado PES privado da cidade do Rio de Janeiro e funcionando de segunda a sábado com livre escolha de horário, a distância domicílio-PES não influenciou na aderência dos participantes. Isso provavelmente se deveu à qualidade do serviço prestado e/ou a ausência de opções mais próximas do local de domicílio dos participantes. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)

Palavras-chave: Reabilitação; treinamento; exercício; coronariopatia.

Introdução

A inatividade física e o baixo nível de condicionamento físico têm sido considerados como fatores de risco importantes para uma mortalidade prematura1. Por outro lado, existem evidências suficientes que é possível prevenir e até mesmo alterar o rumo da manifestação da maioria das doenças crônico-degenerativas, com intervenções direta ou indireta sobre os principais fatores de risco modificáveis, tais como a inatividade física2,3, desde que haja aderência adequada ao tratamento. Para efeitos práticos, aderência pode ser entendida como um conjunto de determinantes pessoais e ambientais que possibilita a livre escolha das pessoas em adotarem certa recomendação, o que fortalece o papel do paciente como sujeito ativo, que participa e assume responsabilidades sobre seu tratamento4,5. Na prática, essa questão pode ser ainda mais relevante para pacientes com doenças cardiovasculares de natureza crônica6.

A aderência ao tratamento é fundamental para o gerenciamento de uma doença crônica. Para uma aderência adequada é preciso seguir todas as orientações médicas, que podem incluir, além de tomar a medicação prescrita de forma contínua, modificar o estilo de vida. Não há como negar que muitos pacientes têm dificuldade em seguir o tratamento recomendado. A baixa aderência é um problema mundial, com a aderência aos tratamentos de longo prazo em países desenvolvidos situando-se em torno de 50%. Em países em desenvolvimento, as taxas são ainda menores7-10.

Nesse aspecto, para o sucesso dos programas de intervenção é necessário reconhecer quais são as barreiras que interferem na sua aderência. Algumas barreiras são apresentadas como empecilhos para uma maior permanência de praticantes em programas que utilizam o exercício físico como terapêutica. Estima-se que uma parcela importante dos participantes abandona os programas de exercício físico nos primeiros seis meses11. A literatura também tem apontado que a maioria das desistências ocorre durante os três meses iniciais, com resultados semelhantes em todas as faixas etárias, independentemente do sexo12. Sabe-se também que somente 25% dos potenciais candidatos à reabilitação cardíaca participam de programas formais de exercício físico e, destes, entre 25% a 50% abandonam dentro de seis meses, e até 90% em um ano. Além disso, somente 25% dos que abandonaram os programas estruturados continuam a praticar exercícios físicos suficientes para manter ou melhorar a capacidade cardiorrespiratória13,14.

Uma das possíveis dificuldades para a manutenção da aderência por longo prazo é a distância entre o domicílio e o local de realização dos exercícios. No Brasil, estudos sobre aderência a programas supervisionados de exercício físico são relativamente recentes15,16, persistindo algumas lacunas científicas relevantes.

Assim, o objetivo do presente estudo foi determinar a influência da distância domicílio Programa de Exercício Supervisionado (PES) sobre a aderência a um programa de exercício físico supervisionado privado.

Métodos

O presente estudo se caracteriza como um survey, com utilização de dados secundários. De um PES privado e em funcionamento regular desde 1994, com supervisão médica presencial e dados clínicos criteriosamente registrados, foram inicialmente identificados os 976 participantes que frequentaram sessões entre 2001 e 2010. Dentre esses participantes, foram selecionados 796, sendo 546 homens e 250 mulheres, que atendiam aos seguintes critérios de inclusão: a) endereço domiciliar nos municípios do Rio de Janeiro ou de Niterói; e b) disponibilidade de dados detalhados referentes à condição clínica. Os 180 indivíduos (18,4%) que foram excluídos residiam em diversos outros municípios do estado do Rio de Janeiro ou em outros estados e participaram do PES em situações especificas, como férias ou em uma fase inicial do tratamento de sua enfermidade. Dados pessoais obtidos na avaliação inicial do PES permitiram identificar, de forma simplificada, a presença e o padrão de atividade laboral e a formação profissional dos pacientes.

O prédio onde se localiza o PES é de fácil acesso com pontos de ônibus e estação de metrô próximos, além de possuir estacionamento rotativo próprio. A menor distância do trajeto domicílio-PES obtida pelo software Google Maps (Google Inc. Estados Unidos) foi utilizada para estratificar os participantes.

Inicialmente, a amostra foi dividida em quartis pelo tempo de participação no PES, correspondendo a: 1 a 4 meses (Q1), 5 a 12 meses (Q2), 13 a 36 meses (Q3) e mais de 36 meses (Q4) e comparadas em relação às quatro seguintes variáveis: idade, sexo, condição clínica e distância domicílio-PES.

Especificamente em relação às condições clínicas, os participantes foram estratificados como: I – saudáveis; II – obesos e/ou hipertensos e/ou dislipidêmicos e/ou diabéticos sem doença coronariana; III – coronariopatas e IV – presença de outros agravos como câncer, pânico e doenças respiratórias. Quanto à distância domicílio-PES, a estratificação foi: A - até 1 km; B - entre 1 e 3 km; C - entre 3 e 10 km e D – mais de 10 km.

Antes de iniciar o PES, os participantes foram submetidos a uma avaliação que incluía exame clínico, espirometria e eletrocardiograma de 12 derivações em repouso, avaliação cineantropométrica (medidas antropométricas, avaliação de composição corporal, força e potência muscular e da flexibilidade), teste de exercício de quatro segundos e teste cardiopulmonar de exercício máximo, cujos dados subsidiaram a prescrição individualizada das sessões de exercício.

O PES era desenvolvido em ambiente climatizado, com controle da temperatura ambiente entre 21 e 24º C e umidade relativa do ar variando entre 40 e 60%. As sessões incluíam exercícios aeróbicos, de fortalecimento muscular, de flexibilidade, de equilíbrio e coordenação motora, com uma duração típica entre 60 e 75 minutos. Como característica importante deste PES, os participantes frequentavam de três a seis vezes por semana e tinham uma ampla liberdade de dias e horários para realizar as sessões, dentro do período de funcionamento regular da clínica – 15 horas nos dias úteis e 9 horas aos sábados, em um total de 84 horas semanais.

Para a análise estatística, os dados mensurados em escala nominal são apresentados pela frequência e percentual da distribuição, enquanto que para os de escala razão e distribuição paramétrica, foram calculadas as médias, desvios-padrão e mínimos e máximos. Para comparar as medianas de meses de participação dos quatro quartis, foi utilizada a ANOVA Kruskal-Wallis. O quiquadrado contrastou as distribuições dos participantes quanto à idade, sexo, condição clínica e distância domicílio-PES pelos quartis do número de meses de participação no PES. Estipulou-se o nível de significância em 5% de probabilidade.

Resultados

A mediana do tempo de permanência dos participantes no PES foi de 12 meses, em uma distribuição não paramétrica, com uma média de 27 meses. As características demográficas e clínicas dos participantes estão descritas na Tabela 1. Observa-se que havia um predomínio de participantes do sexo masculino, sem que, todavia, houvesse diferença entre as idades dos participantes dos dois sexos (media ± desvio-padrão): 62,3 ± 13,1 e 63,4 ± 13,6 anos (p = 0,145). Não houve diferenças quanto à aderência ao PES pela idade (p = 0,974) e pelo sexo (p = 0,160).

Segundo as condições clínicas, a maioria da amostra (56%) estava composta por integrantes do grupo III (coronariopatas) seguidos, em ordem decrescente, pelos grupos II (hipertensos, dislipidêmicos, obesos e/ou diabéticos) com 34%, IV (outras doenças ou condições clínicas) com 6% e I (saudáveis) com apenas 4%, este último incluindo vários cônjuges de participantes classificados nos outros grupos.

Dentre os 796 pacientes incluídos na análise final dos dados desse estudo, 286 (35,9%) puderam ser classificados como inativos do ponto de vista laboral formal, incluindo aposentados de ambos os sexos e 50 mulheres que se intitularam como "do lar". Embora tenha havido uma natural tendência para que os pacientes mais velhos fossem inativos profissionalmente, isso não foi tão uniforme, já que vários pacientes mais jovens, em função da enfermidade, já tinham sido aposentados. Por outro lado, alguns dos mais idosos, especialmente dentre os que possuíam negócios próprios, continuavam bastante ativos.

Com base nos dados disponíveis para 728 dos 796 pacientes (91,5% da amostra total), quanto à formação e/ou atuação profissional, pode-se verificar que algumas formações mais tradicionais são bastante comuns, com 17,0% de médicos, 14,6% de engenheiros, 9,9% de advogados, representando 41,5% do total. Outras profissões de áreas de exatas, de saúde e economistas, administradores de empresas e contadores somaram 14,1%, enquanto funcionários de carreira pública e militares perfizeram 7% da amostra disponível. Destaca-se ainda o fato de outros 56 pacientes (7,7%) terem se apresentado como proprietários de sua própria atividade – empresários, comerciantes, fazendeiros etc. Uma parcela de 5,3% dos pacientes relatou o magistério como atividade profissional primária, a maioria deles em ensino superior. Apenas 30 outros pacientes (4,2%), sendo dez estudantes, não possuíam formação superior, atuando como profissionais de nível médio.

Em realidade, observou-se que a formação profissional e o relato de estar ou não aposentado pela previdência ou sistemas similares não refletiram precisamente o grau de compromissos formais que pudessem interferir com a aderência dos pacientes ao PES. Em muitos casos, compromissos não profissionais, tais como cuidar da saúde do cônjuge ou ascendentes, foram, por diversas vezes, mais perturbadores da aderência do que horários profissionais rígidos, padrão relativamente incomum nessa amostra de pacientes. Dentro desse contexto e pela provável imprecisão, optou-se por não realizar uma análise específica relacionada a esses aspectos.

Pelo seu potencial de influência na aderência ao PES, outra variável que foi analisada no estudo foi o tipo de morbidade dos participantes. A distribuição dos indivíduos nos diversos quartis de aderência, segundo a condição clínica que apresentavam, está descrita na Tabela 1. Pode-se observar que a maioria dos saudáveis permanece no PES por apenas um ano, enquanto que os portadores de alguma morbidade tendem a aderir ao programa por mais tempo, no entanto, estes resultados foram razoavelmente similares, alcançando apenas valores limítrofes para significância estatística entre os quartis (p = 0,057).

Considerando a distância domicílio-PES, pouco menos da metade (46%) dos participantes residia até 3 km, enquanto 39% tinham o domicílio entre 3 e 10 km e cerca de 15% moravam a mais de 10 km do local de realização do PES. Essa distribuição geográfica dos participantes nos diversos quartis de tempo de permanência no PES está ilustrada na Figura 1. Pode-se observar que percentualmente há muita similaridade (p = 0,414) entre a distribuição dos valores. Quando as medianas dos meses de permanência no PES foram comparadas em função da distribuição dos participantes pelos quatro estratos de distância domicílio-PES, não foram encontradas diferenças (p = 0,11).


Discussão

Um PES caracteriza-se pela situação na qual indivíduos realizam exercício físico prescrito e orientado pelo médico de maneira contínua ao longo da vida. Diferencia-se de um programa convencional de exercício pela supervisão presencial obrigatória de médico qualificado, pela individualização da prescrição clínica do exercício, dentro do princípio da busca da dose apropriada de exercício, na qual serão maximizados os benefícios e minimizados os riscos e efeitos colaterais17. Difere também da reabilitação cardíaca que tem característica de ‘terminalidade’ e está tradicionalmente dividida em quatro fases18.

Os fatores biopsicossociais que afetam a aderência a um PES podem ser classificados em três categorias: individual, interpessoal e ambiental. Dentre os fatores ambientais, podem ser incluídos a cultura, domicílio, trabalho, ambiente físico e questões de acesso e custos19. A aderência ao exercício físico ajuda a combater a progressão e controle de doenças crônico-degenerativas, mormente as cardiovasculares, em todos os segmentos etários da população. Não obstante essa reconhecida importância, há relativamente poucas intervenções controladas para promover o exercício físico para os mais idosos20 e com influências similares entre as diferentes categorias que interferem na aderência.

Em um PES em que haja controle rigoroso dos dados dos participantes, é possível obter e analisar dados que levem a uma melhor compreensão dos fenômenos que envolvam a prática regular do exercício físico, e, mais particularmente, sobre a aderência.

Muito frequentemente as mulheres estão pouco representadas em estudos sobre o tratamento de doenças cardiovasculares21 e também nos que envolvem reabilitação cardíaca22. No presente estudo, foi observado que havia uma predominância maior no PES do gênero masculino em relação ao feminino. Porém, ao contrário do que tem sido reportado em alguns estudos23,24, nos quais as mulheres apresentam-se menos propensas que os homens a aderir a estes programas, isso não foi verificado nesse estudo, pois não houve diferenças significativas para os participantes dos dois sexos. Dados da literatura sugerem que os abandonos em programas de reabilitação cardíaca podem variar de 40 a 60% ao longo de um período de seis meses25, com a maioria dos estudos relatando taxas mais elevadas de abandono para as mulheres quando comparadas aos homens26. Por outro lado, no presente estudo, em contraposição, o tempo médio de permanência dos participantes no PES foi de aproximadamente 30 meses, denotando um perfil diferenciado de aderência em relação a outras modalidades de programas que oferecem exercício físico para a população.

Discute-se na literatura27 que a variável idade seja um dos fatores individuais que possa interferir no tempo de permanência dos participantes em um programa de atividade física ou de exercício físico. No entanto, é importante salientar, existe uma tendência para uma relação inversa entre a prevalência do hábito de prática regular de exercício físico e a idade, isto é, à medida que esta aumenta, homens e mulheres tendem a ser menos ativos. No presente estudo, a idade dos participantes não influenciou o tempo de permanência no PES.

Vários estudos28-31 sobre aderência a programas de atividade física têm associado algumas morbidades e comorbidades como variáveis intervenientes naquele processo. Este estudo, ao observar essa questão, mostrou que os saudáveis tenderam a permanecer no PES por até um ano, enquanto os não saudáveis, estratificados como grupos II, III e IV, apresentaram uma distribuição de participantes bastante equitativa pelos quartis de tempo de permanência.

Quanto à influência da distância domicílio-local do PES sobre a aderência ao programa, em princípio surpreendentemente, os resultados não confirmaram a existência de qualquer relação. Considerando que no nível ambiental, o fator de aderência mais comumente estudado é o local de realização do exercício, isso é, se o exercício é realizado em casa, individualmente dirigido, ou fora de casa, supervisionado e baseado em protocolos, isso parece impactar na aderência. Ensaios clínicos randomizados parecem apoiar a hipótese de que programas realizados em casa, especialmente os de intensidade moderada, possuem uma melhor aderência32. No entanto, ainda não está objetivamente esclarecido quais são os mecanismos exatos que aumentam esta aderência.

Levando-se em consideração o nível individual, alguns fatores podem ser mais importantes como preditores de aderência a exercício físico, podendo-se citar, dentre eles, a automonitorização e o comportamento passado, ou seja, o hábito de exercitar-se regularmente ao longo da vida32. Nesse contexto, o histórico do hábito do exercício físico ou esporte pode influenciar de modo importante e talvez mesmo prever quem vai ou não aderir a um programa regular. Essa questão não foi objetivamente analisada no presente estudo, mas deverá ser alvo de futuras investigações.

Compromissos de tempo que incluem o período de deslocamento para e do local do exercício, bem como a facilidade de higiene após a atividade, têm sido colocados também como barreiras à aderência27. Como no PES estudado, aproximadamente 85% residiam a menos de 10 km do local de realização das atividades, o local é bem servido de linhas regulares de transportes urbanos, com destaque para uma estação de metrô distante apenas cerca de 200 metros e as instalações oferecem equipamentos suficientes para garantir a demanda relacionada com a higiene pós-exercício, muito provavelmente isso deve ter impactado sobre os níveis altos de aderência que foram encontrados.

Vale a pena registrar que a atividade física ou exercício físico devem ser executados sistematicamente pelo indivíduo, por iniciativa própria, seja sozinho ou em grupo, para ser eficaz. Além disso, programas livres de atividade física representam desafios únicos em comparação com programas supervisionados. O participante tem uma maior carga de decisão para fazer livremente, do que em um programa de exercício físico. O participante deve determinar quando e onde exercer a atividade e utilizar a sua automotivação para a realização27. Por outro lado, parece claro que há ainda muito a ser feito em relação a aderência às terapias preventivas, sabidamente bastante baixa, relatando que apenas 5% dos adultos se engajam na prática de exercício físico na quantidade recomendada para obter benefícios na saúde33.

Como discutido acima, a participação em programas de exercício físico supervisionado é composta por um conjunto complexo de comportamentos, o que torna difícil identificar que fatores mais contribuem para ou dificultam a aderência, particularmente entre os adultos de meia-idade e os idosos. Preditores de aderência podem ser diferentes para o exercício supervisionado e não supervisionado, além disso, prever a aderência ao exercício supervisionado pode ser particularmente difícil, mesmo em estudos bem controlados34.

Não menos importante, pode-se pontuar que há algumas limitações para este estudo. Alguns participantes, embora tivessem o seu domicílio registrado no PES, frequentavam o local de exercício a partir do local de trabalho e não, obrigatoriamente, a partir de sua residência. Embora não tenha sido possível controlar formalmente essa variável neste estudo de natureza retrospectiva, as melhores evidências disponíveis sugerem que um número muito pequeno e pouco expressivo dos participantes se encontrava na situação única de ir para o trabalho, participar do PES e retornar ao trabalho, até mesmo porque uma parcela grande dos participantes não estava mais envolvido em atividades profissionais regulares e com horários e locais fixos.

Por ser um programa privado, imagina-se que os participantes tinham condições socioeconômicas suficientes para o deslocamento até o PES independente da distância dos seus domicílios. O padrão econômico e cultural dos pacientes era bastante elevado, com a grande maioria tendo nível superior e com atuação profissional ou renda bastante diferenciada. Na realidade, dentre os profissionalmente ativos – em ampla parcela, profissionais liberais ou donos dos seus próprios negócios -, praticamente todos tinham flexibilidade para definir e controlar seus horários profissionais, facilitando assim a aderência ao PES com sistema de livre escolha de horário. Pacientes com outros perfis nesses aspectos poderão ter resultados distintos. A condição clínica utilizada para classificar os participantes foi a registrada no início do programa e, eventualmente, alguns deles mudaram este perfil durante o PES. Assim sendo, as observações extraídas devem ser interpretadas à luz dessas limitações e consoantes com as características desse PES e dos participantes do estudo em tela.

Conclusão

Em suma, os resultados indicam que para um determinado PES privado da cidade do Rio de Janeiro (Copacabana), que funciona de segunda-feira a sábado e com livre escolha de horário pelos participantes, a distância entre o local de domicílio e o local de realização do exercício não influenciou na aderência. Isso talvez seja devido às características dos pacientes e também da qualidade do serviço oferecido e/ou a falta de opções similares que sejam oferecidas em locais mais próximos ao domicílio dos participantes.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo foi parcialmente financiado pelo CNPq e FAPERJ.

Vinculação Acadêmica

Este artigo é parte do projeto de pós-doutorado de Antonio César Cabral de Oliveira pela Universidade Gama Filho.

Artigo recebido em 08/11/11

revisado recebido em 08/11/11

aceito em 28/12/11

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  • Correspondência:

    Antonio Cesar Cabral-de-Oliveira
    Núcleo de Pós-Graduação em Educação Física Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos
    Av. Marechal Rondon, s/n Jardim Rosa Elze
    CEP 49100-000 São Cristóvão/SE - Brazil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2012

    Histórico

    • Recebido
      08 Nov 2011
    • Aceito
      28 Dez 2011
    • Revisado
      08 Nov 2011
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