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Risco da ingesta exagerada de sódio na utilização de espessante para disfagia

PONTO DE VISTA

Risco da ingesta exagerada de sódio na utilização de espessante para disfagia

Tatiana Magalhães de Almeida; Michele F. Canfild Germini; Cristiane Kovacs; Ana Margaret N.G.F. Soares; Daniel Magnoni; Amanda G.M.R. Sousa

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Tatiana Magalhães de Almeida Instituto Dante Pazzanese/Setor de fonoaudiologia Avenida Dr. Dante Pazzanese,500 Vila Mariana cep:04012909 São Paulo-SP E-mail: tatianamagalhaesalmeida@yahoo.com.br, tatiana.almeida@dantepazzanese.org.br

Palavras-chave: Transtornos de Deglutição /complicações, Ingestão de Alimentos, Sódio na Dieta, Espessantes.

A disfagia orofaríngea é um distúrbio de deglutição decorrente de causas neurológicas e/ou estruturais que pode ocasionar alteração da interação social, prazer alimentar do indivíduo, desnutrição, desidratação, quadros infecciosos pulmonares e outros de alta morbidade. Os pacientes com cardiopatias, de diferentes causas, apresentam riscos de desenvolverem disfagia orofaríngea.

Os pacientes cardiopatas são suscetíveis a distúrbios neurológicos como acidente vascular encefálico e ataque isquêmico transitório que podem cursar com disfagia. Outros possíveis fatores de risco para a disfagia orofaríngea na população cardiopata são: intubação orotraqueal prolongada, dependência da ventilação mecânica, presença de cânula de traqueostomia, manipulação ou compressão de pares de nervos cranianos envolvidos no processo de deglutição, uso de medicamentos que potencializam a disfagia, além das mudanças fisiológicas comuns nos pacientes idosos principalmente naqueles com comorbidades, podendo interferir nas diferentes fases da deglutição e contribuir para o aparecimento dos sintomas disfágicos1,2.

O fonoaudiólogo é o profissional habilitado para avaliar e reabilitar a disfagia. Uma vez que a disfagia é diagnosticada, deve ser traçado um programa terapêutico visando deglutição eficiente sem riscos de complicações pulmonares, nutricionais e psicológicas.

Prover uma deglutição segura para indivíduos disfágicos é um desafio que pode ser facilitado com uso de recursos terapêuticos como a adaptação das dietas, com mudanças na consistência, volume, temperatura e sabor. Essas estratégias utilizadas pelos fonoaudiólogos fazem parte da reabilitação da deglutição, pois as mesmas interferem no desempenho sensório motor oral e no trânsito orofaríngeo, minimizando os riscos de aspiração laringotraqueal3.

Mudança na consistência dos alimentos é uma importante ferramenta no tratamento da disfagia e deve ser modificada de acordo com o grau da disfagia, estado nutricional, aceitação alimentar e morbidade do paciente.

O uso de espessante alimentício é um recurso utilizado para o espessamento de líquidos, conduta comum na prática fonoaudiológica, pois a deglutição de alimentos líquidos exige maior controle oral do que outras. A chance de escape precoce do alimento é um dos maiores riscos de penetração e/ou aspiração laringotraqueal4.

De acordo com a padronização da National Dysphagia Diet (NDD)5, os líquidos podem ser espessados em três consistências néctar, mel e pudim, essas são definidas pelo fonoaudiólogo de acordo com o grau da disfagia do paciente. A viscosidade dos líquidos espessados é medida em centipoise (cP) e são categorizadas segundo a NDD em: líquido fino 1-50 cP, néctar 51-350 cP, mel 351-1750 cP e pudim superior 1750 cP.

A quantidade de espessante indicada para cada consistência dependerá das diferentes marcas presentes no mercado.

As equipes de saúde, mais especificamente, nutrição e médica são as responsáveis pela dieta do paciente com objetivo de manter ou recuperar o estado nutricional. O paciente cardiopata muitas vezes necessita de restrição de sódio que deve ser feita com quantidade máxima de 5g de cloreto de sódio por dia, incluindo nesse valor toda a ingesta diária. Os diferentes níveis de restrição são norteados pelo diagnóstico básico, definindo a patologia, bem como, pelo momento clínico de cada paciente. A restrição de sódio poderá ser leve, moderada e severa, em caso de restrição moderada a ingesta deverá ser de 2g sal por dia e na restrição severa sem adição de sal, apenas com o sal intrínseco do alimento6,7.

Assim, é necessário, no manuseio diário dos pacientes, atentar-se à informação nutricional contida na dieta adaptada que será associada ao líquido espessado, principalmente no que se refere ao paciente cardiopata.Essa normatização de qualidade se dá pela presença do mineral Sódio na composição dos espessantes.

A quantidade de sódio presente nos espessantes não é homogênea nem padronizada, variando de acordo com as marcas disponíveis no mercado (Tabela1).

O total de sódio na ingesta diária do liquido espessado irá depender da consistência indicada pelo fonoaudiólogo, do volume de liquido prescrito pela equipe médica e da marca do espessante utilizada. A tabela 1 demonstra exemplos de diferentes marcas de espessante e o volume de sódio nas três consistências: néctar, mel e pudim em uma ingesta diária de 1.500 mL de líquidos.

Apesar da quantidade de sódio diária ingerida na oferta do líquido espessado, nas diferentes possibilidades, não ser alta, conforme os exemplos da tabela 2, esse acréscimo pode comprometer a ingesta total de Sódio em restrições severas ou moderadas. Dessa forma,esse valor deve sempre ser considerado na dieta geral, levando em consideração a restrição mínima de 5g de cloreto de sódio, ou seja, 2.000 mg de sódio/dia6.

É importante que o fonoaudiólogo em parceria com a equipe médica e de nutrição avalie cuidadosamente os pacientes com indicação de líquidos espessados, pensando se o valor de sódio acrescido pelo uso de espessante na dieta geral pode impactar de maneira negativa no quadro clínico do paciente.

Nos casos graves com restrições importantes da ingesta de Sódio, a ingesta relacionada ao espessante, pode ser um fator de impacto significativo sendo essencial que a equipe envolvida considere esse aspecto para a melhor condução terapêutica do caso.

O prognóstico da retirada do espessante é um ponto que deve ser avaliado, sendo o papel do fonoaudiólogo identificar se o paciente tem indicação de interromper o uso do espessante, se fará uso por tempo prolongado ou até contínuo, devendo informar esse dado à equipe médica, que verificará o impacto em cada caso, correlacionando com o tempo de uso.

Outro aspecto que deve ser decidido em equipe é a possibilidade do uso de espessantes naturais, como o uso de frutas que proporcionem uma consistência mais espessa no preparo de sucos e vitaminas; além disso, é possível também que a equipe de nutrição adapte uma dieta que evite alimentos ricos em sódio,além da redução da quantidade de sal no preparo dos alimentos, reduzindo assim o valor de sódio agregado.

Alguns espessantes apresentam em seus rótulos ausência de sódio, podendo a equipe optar por essas marcas. No entanto, existem inúmeras controvérsias no aspecto de qualidade desses espessantes, visto que, o sódio participa ativamente do processo de espessamento.

O valor de sódio agregado ao uso do espessante não deve ser um fator analisado isoladamente, e sim considerando a ingesta total de sódio ao longo de todo o dia; a equipe necessita assistir o paciente em uso de espessante de maneira mais rigorosa, estar atenta e apta para analisar cada caso separadamente, levando em consideração aspectos como as doenças básicas e a condição clínica.

O tratamento ideal para o paciente disfágico não visa apenas garantir uma ingesta segura, mas também um correto aporte nutricional e hídrico, além da consequente melhora do quadro clínico geral do paciente; para isso é necessária a integração da equipe visando uma assistência de qualidade.

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Almeida TM, Germini MFC; Obtenção de dados: Kovacs C, Soares AMNGF; Análise e interpretação dos dados e Redação do manuscrito: Almeida TM; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual: Magnoni D; Apoio institucional: Sousa AGMR.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo recebido em 25/02/13; revisado em 25/02/13; aceito em 03/04/13.

  • 1. Barker J, Martino R, Reichardt B, Hickey EJ,Ralph-Edwards A. Incidence and impact of dysphagia in patients receiving prolonged endotracheal intubation after cardiac surgery. Can J Surg.2009;52(2):119-24.
  • 2. Skoretz SA, Rebeyka DM. Dysphagia following cardiovascular surgery: a clinical overview.Can J CardiovascNurs.2009;19(2):10-6.
  • 3. Ding R, Logemann JA, Larson CR, Rademaker AW. The effects of taste and consistency on swallow physiology in younger and older healthy individuals: a surface electromyographic study. J Speech Lang Hear Res.2003;46(4):977-89.
  • 4. Ozaki K, Kagaya H, Yokoyama M, Saitoh E, Okada S, González-Fernández M, et al. The risk of penetration or aspiration during videofluoroscopic examination of swallowing varies depending on food types. Tohoku J Exp Med.2010;220(1):41-6.
  • 5. The National Dysphagia Diet (NDD). Standardization for optimal care, United States of America: American Dietetic Association; 2002.
  • 6. Bocchi EA, Marcondes-Braga FG, Ayub-Ferreira SM,Rohde LE, Oliveira WA, Almeida DR, et al; Sociedade Brasileira de Cardiologia. III Diretrizbrasileira de insuficiência cardíaca crônica. ArqBrasCardiol.2009;93(1 supl.1):1-71.
  • 7. Gravina CF, Rosa RF, Franken RA, Freitas EV, Liberman A, et al;Sociedade Brasileira de Cardiologia. II Diretrizes brasileiras em cardiogeriatria. ArqBrasCardiol.2010;95(3 supl.2):1-112.
  • Correspondência:

    Tatiana Magalhães de Almeida
    Instituto Dante Pazzanese/Setor de fonoaudiologia
    Avenida Dr. Dante Pazzanese,500 Vila Mariana
    cep:04012909 São Paulo-SP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jul 2013
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