Acurácia; Escore Grace; Escore TIMI; Anatomia coronariana
Prezado Editor,
Em artigo recente, dos Santos e cols. concluíram que em pacientes com síndromes coronarianas agudas "os escores de risco se correlacionam com gravidade da doença coronária"11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM, Londero HJ, Xavier RM, Pereira MP, et al. Correlation of risk scores with coronary anatomy in non-STelevation acute coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7.. Essa aparente conclusão positiva esconde o baixo desempenho desses escores em predizer doença coronariana obstrutiva, por duas razões. Primeiro, diante de uma situação diagnóstica (presença de doença coronariana ≥ 50%), o enfoque clínico deve ser em acurácia; segundo, associação (descrito no artigo como correlação) não garante acurácia.
O enfoque principal desse trabalho deveria ser as medidas de acurácia, como área abaixo da curva ROC, que variaram de 0,56 a 0,70. Embora estatisticamente significantes, esses valores indicam baixa acurácia do ponto de vista diagnóstico. Corroborando esses achados, em recente artigo publicado neste mesmo periódico, nosso grupo concluiu que "o grau de associação [entre escores e anatomia coronária] não é suficiente para que os escores de risco sejam preditores acurados dos resultados da angiografia"22. Barbosa CE, Viana M, Brito M, Sabino M, Garcia G, Maraux M, et al. Accuracy of the GRACE and TIMI scores in predicting the angiographic severity of acute coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2012;99(3):818-24..
As diferentes conclusões em dois trabalhos de achados semelhantes se deve à percepção de que significância estatística (associação verdadeira) e relevância clínica (acurácia) não representam exatamente o mesmo fenômeno.
Referências
-
1dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM, Londero HJ, Xavier RM, Pereira MP, et al. Correlation of risk scores with coronary anatomy in non-STelevation acute coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7.
-
2Barbosa CE, Viana M, Brito M, Sabino M, Garcia G, Maraux M, et al. Accuracy of the GRACE and TIMI scores in predicting the angiographic severity of acute coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2012;99(3):818-24.
Carta-resposta
Quando no estudo de Santos e cols.11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. conclui-se que os escores de risco se correlacionam com a anatomia coronariana, levam-se em consideração todas as análises realizadas: análise estatística de correlação utilizando o método não paramétrico de Spearman22. Siegel S, Castellan NJ. Nonparametric statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 1988. e a habilidade preditiva desses em discriminar quem terá ou não a possibilidade de lesão coronariana ≥ 50%, que foi determinada, inicialmente, pelo teste não paramétrico de Mann-Whitney22. Siegel S, Castellan NJ. Nonparametric statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 1988. e, posteriormente, avaliada pela estatística-C (área sob a curva ROC)33. Fletcher RH, Fletcher SW, Wagner EH. Epidemiologia clínica - bases científicas da conduta médica. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 2009.. Como apresentado nos resultados, o estudo enfatiza as duas análises: avaliação da existência de relação entre os escores de risco e a anatomia coronariana (Tabela 3)11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. e a habilidade preditiva dos escores em discriminar quem terá ou não lesão coronariana ≥ 50% (Gráfico 1)11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7.. Portanto, a palavra "correlação", citada no manuscrito11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7., foi utilizada como a "relação entre os escores de risco e a anatomia coronária".
Os escores de risco TIMI44. Antman EM, Cohen M, Bernink PJ, McCabe CH, Horacek T, Papuchis G, et al. The TIMI risk score for unstable angina/non-ST elevation MI: a method for prognostication and therapeutic decision making. JAMA. 2000;284(7):835-42. e GRACE55. Granger CB, Goldberg RJ, Dabbous O, Pieper KS, Eagle KA, Cannon CP, et al; Global Registry of Acute Coronary Events Investigators. Predictors of hospital mortality in the global registry of acute coronary events. Arch Intern Med. 2003;163(19):2345-53.,66. Eagle KA, Lim MJ, Dabbous OH, Pieper KS, Goldberg RJ, Van de Werf F, et al; GRACE Investigators. A validated prediction model for all forms of acute coronary syndrome: estimating the risk of 6-month postdischarge death in an international registry. JAMA. 2004;291(22):2727-33. não foram desenvolvidos primariamente para determinar a habilidade preditiva de lesão coronariana, e sim para eventos clínicos adversos. Portanto, não se pode esperar um forte poder de discriminação desses quando se avalia lesão coronariana ≥ 50% ou qualquer outra variável diferente dos eventos clínicos específicos do modelo original. Apesar dessa observação, ainda assim, eles apresentaram habilidade que não pode ser desprezível77. Ohman EM, Granger CB, Harrington RA, Lee KL. Risk stratification and therapeutic decision making in acute coronary syndromes. JAMA. 2000;284(7):876-8. para discriminar quem terá ou não lesão coronariana ≥ 50%: escore de risco TIMI área sob a curva ROC 0,704; escore GRACE hospitalar área sob a curva ROC 0,623; escore GRACE em seis meses área sob a curva ROC 0,562.
Uma interessante observação é que para o escore de risco TIMI a área sob a curva ROC no estudo de Santos e cols.11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. foi maior que para os eventos específicos do modelo original de desenvolvimento (área sob a curva ROC de 0,65)42. Siegel S, Castellan NJ. Nonparametric statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 1988.. Da mesma forma, o escore de risco TIMI, apesar de sua limitada habilidade preditiva77. Ohman EM, Granger CB, Harrington RA, Lee KL. Risk stratification and therapeutic decision making in acute coronary syndromes. JAMA. 2000;284(7):876-8. para eventos clínicos adversos, em decorrência de sua importância clínica e praticidade, é um dos modelos mais utilizados no mundo e recomendado pelas diretrizes nacionais e internacionais.
Atenciosamente,
Elizabete Silva dos Santos
Luciano de Figueiredo Aguiar Filho
Luiz Minuzzo
Roberta de Souza
Ari Timerman
Referências
-
1dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7.
-
2Siegel S, Castellan NJ. Nonparametric statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 1988.
-
3Fletcher RH, Fletcher SW, Wagner EH. Epidemiologia clínica - bases científicas da conduta médica. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 2009.
-
4Antman EM, Cohen M, Bernink PJ, McCabe CH, Horacek T, Papuchis G, et al. The TIMI risk score for unstable angina/non-ST elevation MI: a method for prognostication and therapeutic decision making. JAMA. 2000;284(7):835-42.
-
5Granger CB, Goldberg RJ, Dabbous O, Pieper KS, Eagle KA, Cannon CP, et al; Global Registry of Acute Coronary Events Investigators. Predictors of hospital mortality in the global registry of acute coronary events. Arch Intern Med. 2003;163(19):2345-53.
-
6Eagle KA, Lim MJ, Dabbous OH, Pieper KS, Goldberg RJ, Van de Werf F, et al; GRACE Investigators. A validated prediction model for all forms of acute coronary syndrome: estimating the risk of 6-month postdischarge death in an international registry. JAMA. 2004;291(22):2727-33.
-
7Ohman EM, Granger CB, Harrington RA, Lee KL. Risk stratification and therapeutic decision making in acute coronary syndromes. JAMA. 2000;284(7):876-8.
Reply
When Santos et al11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. have concluded that risk scores correlate with coronary anatomy, they considered all analyses performed: statistical correlation analysis with the non parametric Spearman test22. Siegel S, Castellan NJ. Nonparametric statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 1988. and the predictive ability of those scores to discriminate individuals who might and might not have a coronary artery lesion ≥ 50%, which was initially determined by using the non-parametric Mann-Whitney test22. Siegel S, Castellan NJ. Nonparametric statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 1988., and was later assessed by using C statistics (area under the ROC curve)33. Fletcher RH, Fletcher SW, Wagner EH. Epidemiologia clínica - bases científicas da conduta médica. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 2009.. As shown in the results, that study emphasizes both analyses: assessment of the existence of a relationship between risk scores and coronary anatomy (Table 3)11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. and the predictive ability of the scores to discriminate who might have coronary lesion ≥ 50% (Chart 1)11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7.. Thus, the word "correlation" cited in the manuscript11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. was used as the "relationship between risk scores and coronary anatomy".
The TIMI44. Antman EM, Cohen M, Bernink PJ, McCabe CH, Horacek T, Papuchis G, et al. The TIMI risk score for unstable angina/non-ST elevation MI: a method for prognostication and therapeutic decision making. JAMA. 2000;284(7):835-42. and GRACE55. Granger CB, Goldberg RJ, Dabbous O, Pieper KS, Eagle KA, Cannon CP, et al; Global Registry of Acute Coronary Events Investigators. Predictors of hospital mortality in the global registry of acute coronary events. Arch Intern Med. 2003;163(19):2345-53.,66. Eagle KA, Lim MJ, Dabbous OH, Pieper KS, Goldberg RJ, Van de Werf F, et al; GRACE Investigators. A validated prediction model for all forms of acute coronary syndrome: estimating the risk of 6-month postdischarge death in an international registry. JAMA. 2004;291(22):2727-33. risk scores have not been primarily developed to predict coronary lesion, but adverse clinical events. Thus, they are not supposed to have a strong discriminatory power to assess coronary lesion ≥ 50% or any other variable different from the specific clinical events of the original model. Nevertheless, they showed an ability that cannot be overlooked77. Ohman EM, Granger CB, Harrington RA, Lee KL. Risk stratification and therapeutic decision making in acute coronary syndromes. JAMA. 2000;284(7):876-8. to discriminate who will or will not have coronary lesion ≥ 50% as follows: TIMI risk score, area under the ROC curve = 0.704; hospital GRACE score, area under the ROC curve = 0.623; 6-month GRACE score, area under the ROC curve = 0.562.
It is worth noting that, for the TIMI risk score, the area under the ROC curve in the study by Santos et als.11. dos Santos ES, Aguiar Filho Lde F, Fonseca DM Fonseca, Londero HJ, Xavier RM, et al. Correlação dos escores de risco com a anatomia coronária na síndrome coronária aguda sem supra de ST. Arq Bras Cardiol. 2013;100(6):511-7. was greater than that for the specific events of the original model of development (area under the ROC curve = 0.65)44. Antman EM, Cohen M, Bernink PJ, McCabe CH, Horacek T, Papuchis G, et al. The TIMI risk score for unstable angina/non-ST elevation MI: a method for prognostication and therapeutic decision making. JAMA. 2000;284(7):835-42.. Similarly, the TIMI risk score, despite its limited predictive ability77. Ohman EM, Granger CB, Harrington RA, Lee KL. Risk stratification and therapeutic decision making in acute coronary syndromes. JAMA. 2000;284(7):876-8. for adverse clinical events, due to its clinical relevance and practicality, is one of the most used models worldwide, recommended by national and international guidelines.
Sincerely,
Elizabete Silva dos Santos
Luciano de Figueiredo Aguiar Filho
Luiz Minuzzo
Roberta de Souza
Ari Timerman
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jan 2014
Histórico
-
Recebido
30 Jul 2013 -
Revisado
03 Set 2013 -
Aceito
04 Set 2013