Acessibilidade / Reportar erro

Espessamento Mediointimal nas Carótidas e Femorais para Detectar Aterosclerose em Pessoas que Vivem com o Vírus da Imunodeficiência Humana

Resumo

Fundamento:

Pessoas que vivem com o HIV (HIV +) têm maior prevalência de aterosclerose e a desenvolvem mais precocemente do que a população geral.

Objetivos:

Foi avaliar e comparar as prevalências de aterosclerose avaliada pela medida da espessura mediointimal (EMI) das carótidas comuns e femorais, e do índice tornozelo-braquial (ITB) nos grupos controle e HIV com e sem inibidores de protease (IPs).

Métodos:

Foram incluídas 80 pessoas com HIV + [40 usavam IPs e 40 não] e 65 controles. O diagnóstico de aterosclerose foi determinado pela medição da EMI (carótidas e femorais) e do ITB. Fatores de risco clássicos para aterosclerose e específicos para o HIV foram comparados entre os grupos, usando testes estatístcos. O valor de p ≤ 0,05 foi cosiderado significativo.

Resultados:

A EMI > P75 ou presença de placa foi mais elevada no grupo de HIV sem IP que no controle (37,5% vs 19%, p = 0,04). A análise comparativa mostrou diferença significativa (p=0,014) na EMI nas artérias carótidas entre HIV + com IPs (0,71 ± 0,28 mm), sem IPs (0,63 ± 0,11 mm) e controles (0,59 ± 0,11 mm), A EMI na femoral não teve diferença significante entre os grupos. Não houve diferença significante entre os grupos controle e de HIV + quanto ao ITB. No entanto, observou-se uma diferença significativa (p=0,015) no ITB entre os grupos HIV + sem IPs (1,17 [1,08 - 1,23]), e controles [1,08 (1,07 - 1,17)].

Conclusão:

Em pacientes com HIV, a aterosclerose é mais prevalente e parece ocorrer mais precocemente, com características distintas, em comparação a indivíduos HIV-negativos.

Palavras-chave:
Doenças das Artérias Carótidas; Aterosclerose; Espessura Íntima-Média Carotídea; HIV; Índice Tornozelo-Braço

Abstract

Background:

The prevalence of atherosclerosis is higher in HIV-positive people, who also experience it earlier than the general population.

Objectives:

To assess and compare the prevalence of atherosclerosis evaluated by the intima-media thickness of carotid and femoral arteries, and by the ankle-brachial pressure index (ABPI) in HIV patients treated or not treated with protease inhibitors (PIs) and controls.

Methods:

Eighty HIV+ subjects (40 using PIs and 40 not using PIs) and 65 controls were included in the study. Atherosclerosis was diagnosed by (carotid and femoral) ITM measurement and ABPI. Classical risk factors for atherosclerosis and HIV were compared between the groups by statistical tests. A p ≤ 0.05 was considered significant.

Results:

An IMT > P75 or the presence of plaque was higher in the HIV+ than in the control group (37.5% vs 19%, p = 0.04). Comparative analysis showed a significant difference (p=0.014) in carotid IMT between HIV+ with PIs (0.71 ± 0.28 mm), without PIs 0.63 ± 0.11 mm and, and controls (0.59 ± 0.11 mm). There was no significant difference in femoral IMT between the groups or in ABPI between HIV+ subjects and controls. However, a significant difference (p=0.015) was found between HIV+ patients not treated with PIs (1.17 [1.08 - 1.23]), and controls 1.08 [1.07 - 1.17]).

Conclusion:

In HIV patients, atherosclerosis is more prevalent and seems to occur earlier with particular characteristics compared with HIV-negative subjects.

Keywords:
Carotid Artery Disease; Atherosclerosis; Carotid Intima-Media Thickness; HIV; Ankle Brachial Index

Introdução

Indivíduos que vivem com HIV (HIV +) têm condição de vida diferente da população livre de infecção no que diz respeito à morbimortalidade por aterosclerose e eventos cardiovasculares a ela associados.11 Friis-moller N, Reiss P, Sabin CA, Weber R, Monforte A, El-Sadr W, et al. Class of antirretroviral drugs and the risk of myocardial infarction. N Engl J Med. 2007;356(17):1723-35.,22 Bozkurt B. Cardiovascular toxicity with highly active antirretroviral therapy: review of clinical studies. Cardiovasc Toxicol. 2004;4(3):243-60. A doença cardiovascular (DCV), particularmente aterosclerótica, é mais prevalente e precoce em HIV+, quando se compara à população sem infecção.33 Grinspoon SK. Metabolic syndrome and cardiovascular disease in patients with human immunodeficiency virus. Am J Med. 2005;118(Suppl 2):23S-28S.

4 Triant VA, Hang L, Hadigan C, Grinspoon SK. Increased acute myocardial infarction. J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(7): 2506-12.
-55 Fichtenbaum CJ. Does antiretroviral therapy increase or decrease the risk of cardiovascular disease? Curr HIV/AIDS Rep. 2010;7(2):92-8.

Os fatores de risco tradicionais para DCV são: idade, sexo masculino, tabagismo, diabetes mellitus (DM), dislipidemia e hipertensão arterial sistêmica (HAS). Estudos demonstram que esses fatores podem ser mais prevalentes nas pessoas com HIV.66 Ingle SM, May MT, Gill MJ, Mugavero MJ, Lewden C, Abgrall S, et al. Impact of risk factors for specific causes of death in the first and subsequent years of antiretroviral therapy among HIV-infected patients. Clin Infect Dis. 2014;59(2):287-97.,77 Law MG, Friis-Moller N, El-Sadr WM, Weber R, Reiss P, D'Arminio Monforte A, et al; D:A:D Study Group. The use of the Framingham equation to predict myocardial infarctions in HIV-infected patients: comparison with observed events in the D:A: D study. HIV Med. 2006;7(4):218-30.

A terapia antirretroviral altamente ativa (TARV) está associada a uma variedade de efeitos adversos, sendo esses pró-aterogênicos e também associados à DCV.88 Hasse B, Ledergerber B, Furrer H, Battegay M, Hirschel B, Cavassini M, et al. Morbidity and aging in HIV-infected persons: the Swiss HIV Cohort study. Clin Infect Dis. 2011;53(11):1130-9.,99 Hajjar LA, Calderaro D, Yu PC, Giuliano I, Lima EM, Barbaro G, et al. [Cardiovascular manifestations in patients infected with the human immunodeficiency virus]. Arq Bras Cardiol. 2005;85(5):363-77. Enquanto alguns autores sugeriram que os inibidores de proteases (IPs) podem estar associados à aterosclerose precoce e DCV,1010 Depairon M, Chessex S, Sudre P, Rodondi N, Doser N, Chave JP, et al. Prematureatherosclerosis in HIV-infected individuals-focuson protease inhibitortherapy. AIDS. 2001;15(3):329-34. e outros demonstraram que medicações mais modernas alteram menos o perfil lipídico e, assim, têm menor influência sobre o aumento do risco cardiovascular por disfunção endotelial.1111 Ballocca F, Gili S, D'Ascenzo F, Marra WG, Cannillo M, Calcagno A, et al. HIV infection and primary prevention of cardiovascular disease: lights and shadows in the HAART era. Prog Cardiovasc Dis. 2016;58(5):565-76. Ao comparar HIV +, dislipidêmicos, tratados com IP com o grupo controle saudável, autores não encontraram diferença na função endotelial entre os grupos.1212 Nolan D, Watts GF, Herrmann SE, French MA, John M, Mallal S. Endothelial function in HIV-infected patients receiving protease inhibitor therapy: does immune competence affect cardiovascular risk? Q J Med. 2003;96(11):825-32.

A medida da espessura mediointimal (EMI) é um marcador não-invasivo e precoce da aterosclerose, cujo aumento que pode refletir em um maior risco cardiovascular.1313 Polak JF, Pencina MJ, Pencina KM, O'Donnell CJ, Wolf PA, D'Agostino RB. Carotid-wall intima-media thickness and cardiovascular events. N Engl J Med. 2011;365(3):213-21. Essa medida é um preditor independente de DCV e pode ser considerada como marcador para avaliação de aterosclerose subclínica, inclusive em HIV +.1414 Polak JF, Pencina MJ, O'Leary DH, D'Agostino RB. Common carotid artery intima-media thickness progression as a predictor of stroke in multi-ethnic study of atherosclerosis. Stroke. 2011;42(11):3017-21. A artéria femoral comum e a subclávia direita também vêm sendo estudadas como locais para a medida da EMI e sugeridas como marcadores mais precoces de aterosclerose.1515 Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64.

16 Held C, Hjemdahl P, Eriksson SV, Björkander I, Forslund L, Rehnqvist N. Prognostic implications of intima-media thickness and plaques in the carotid and femoral arteries in patients with stable angina pectoris. Eur Heart J. 2001;22(1):62-72.
-1717 Engelhorn CA, Engelhorn AL, Cassou MF, Zanoni CC, Gosalan CJ, Ribas E, et al. Intima-media thickness in the origin of right subclavian artery as an early marker of cardiovascular risk. Arq Bras Cardiol. 2006;87(5):609-14.

O índice tornozelo-braquial (ITB) é um método simples, não-invasivo, de alto valor preditivo para doença arterial periférica (DAP) e doença cardíaca. Valores inferiores a 0,9 estão associados a um significativo aumento do risco cardiovascular, independente de outros fatores de risco.1818 Spácil J, Spácabilová J. The ankle-brachial blood pressure index as a risk indicator of generalized atherosclerosis. Semin Vasc Med. 2002;2(4):441-5.

A detecção de aterosclerose subclínica possibilita um manejo mais adequado de HIV + com risco de desenvolver eventos cardiovasculares.

Neste estudo, o objetivo principal foi avaliar a prevalência de aterosclerose por meio da medida da EMI das artérias carótidas comuns e femorais, e do ITB. O objetivo secundário foi comparar fatores de risco clássicos de aterosclerose e específicos do HIV entre os grupos que utilizavam ou não IP.

Métodos

Desenho e população do estudo

Este é um estudo transversal, prospectivo e analítico que recrutou HIV + em uso de TARV com ou sem IPs no período de junho de 2015 a fevereiro de 2016. A amostra foi definida empiricamente pelos autores com base na literatura sobre o tema,1919 Andrade AC, Ladeia AM, Netto EM, Mascarenhas A, Cotter B, Benson CA, et al. Cross-sectional study of endothelial function in HIV-infected patients in Brazil. AIDS Res Hum Retroviruses. 2008;24(1):27-33.,2020 Eira M. Avaliação de ateromatose subclínica em pacientes HIV/aids: determinação da velocidade de onda de pulso e da espesura médio-intimal de carótidas. [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2009. e incluiu 40 HIV + em uso de TARV com IP, 40 HIV + em uso de TARV sem IP e 65 controles.

Etapas do estudo

Os pacientes foram selecionados no ambulatório de Doenças Infecciosas e Parasitárias da instituição de acordo com os critérios de inclusão e exclusão. Visando um parâmetro de referência para comparação das medidas nos indivíduos com HIV, foram incluídas 65 pessoas saudáveis (controle), sendo essas pareadas com os pacientes por gênero e idade (40 pacientes com HIV em uso de IPs com 40 controles e 40 pacientes sem IPs com 25 controles). Os indivíduos com HIV são inscritos no programa de prevenção, controle e tratamento da AIDS, e os controles eram acompanhantes dessas pessoas.

O critério de inclusão das pessoas com HIV foi um mínimo de cinco anos de tratamento com TARV, e os critérios de exclusão foram antecedentes de doenças cardiovasculares - angina pectoris, infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular cerebral (AVC), ou DAP; internação nos últimos dois meses; dosagem de CD4 muito baixa e/ou carga viral (CV) muito alta. Os controles saudáveis foram selecionados com os seguintes critérios de exclusão: antecedentes cardiovasculares, tabagismo, DM e/ou HAS.

As informações clínicas e dos exames complementares foram coletados por aplicação de questionários. Os prontuários dos participantes foram também consultados para esclarecimentos referentes à terapêutica. Os participantes do estudo tinham escore de risco de Framingham inferior a 10% (baixo risco).

Os fatores de risco para aterosclerose analisados foram: HAS, taba gismo, DM, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia e história familiar de evento cardiovascular - IAM, angina, AVC ou DAP. Para a avaliação de obesidade, realizou-se o cálculo do índice de massa corpórea (IMC), sendo considerado IMC de 18,5 a 24,9 kg/m2 como peso saudável e de 25,0 a 29,9 kg/m2 sobrepeso. Fatores específicos relacionados ao HIV foram: CD4 atual, CV atual, tempo de doença, tempo de trata mento e tipo de TARV.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da instituição. Para os pacientes e controles foi aplicado o termo de consentimento livre e esclarecido.

Protocolo da medida da espessura mediointimal

A avaliação ultrassonográfica da medida da EMI das artérias ca rótidas comuns e femorais comuns foi realizada no modo B do ultrassom (USG) LOGIQ e, DICOM 3.0, AUTO IMT com transdutor linear 12L-RS da General Electric® (GE) por pesquisador "cego". A EMI da carótida comum foi considerada como medida de referência. As carótidas eram avaliadas em cortes transversal e longitudinal, desde o segmento proximal da carótida comum até a bifurcação das carótidas internas e externas. A medida da EMI foi realizada na parede posterior da carótida comum em área livre de placa, e foi definida como a distância entre duas linhas ecogênicas representadas pelas interfaces lúmen-íntima e média-adventícia da parede arterial. Mede-se mais frequentemente a EMI na carótida comum usando-se, como referência, a medida média e, na carótida interna, a medida máxima.1515 Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64. A placa carotídea ateromatosa pode ser definida como uma estrutura focal que se estende no mínimo 0,5 mm para a luz do vaso e/ou mede mais que 50% do valor da EMI adjacente e/ou apresenta uma medida da EMI maior que 1,5mm.1515 Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64. A medida automática da EMI foi realizada nas carótidas comuns direita e esquerda, com software que determina as medidas média, máxima e mínima. Quando identificadas placas ateromatosa, realizou-se a medida automática e manual da EMI. A média da medida automática da carótida comum mais espessada foi definida como referência, seja ela direita (CCD) ou esquerda (CCE). Como a população estudada tinha até 65 anos, a EMI foi considerada espessada se >0,8 mm1717 Engelhorn CA, Engelhorn AL, Cassou MF, Zanoni CC, Gosalan CJ, Ribas E, et al. Intima-media thickness in the origin of right subclavian artery as an early marker of cardiovascular risk. Arq Bras Cardiol. 2006;87(5):609-14.,2121 Godoi ET, Brande CT, Godoi TA, Lacerda HR, Albuquerque VM, Zirpoli JC, et al. Antirretroviral therapy effect in the intima-medio complex and ankle-brachial index in patients infected by HIV. J Vasc Bras. 2012;11(2):123-31.,2222 Godoi ET, Brandt CT, Godoi JT, Melo HR, Godoi JT, et al. Assessment of intima-media complex in carotid, femoral and right subclavian arteries for early investigation of atherosclerosis in HIV-infected patients. Radiol Bras. 2013;46(6):333-40. e também foi calculado o percentil 75 da população estudada.1515 Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64. A presença de placa foi definida quando demonstrada uma EMI >1,5 mm.1515 Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64. Também foi realizada a medida da EMI em artéria femoral comum direita (AFCD) e esquerda (AFCE). Adotou-se a mesma referência para espessamento da EMI da carótida comum e mesmo critério para placas.

Protocolo de aferição do índice tornozelo braquial

O ITB foi calculado após aferição da pressão nos tor nozelos direito e esquerdo. A pressão foi aferida sob visão direta das artérias dorsal do pé e tibial posterior. Para aferição da pressão arterial nos membros superiores (MMSS) e inferiores (MMII) utilizou-se apa relho esfignomanômetro Becton Dickinson® e aparelho de USG Doppler acima descrito. O ITB foi calculado dividindo a maior pressão sistólica do tornozelo pela maior pressão sistólica braquial. O valor do ITB considerado normal foi de 0,9 a 1,3; sendo > 1,3 artérias incompressíveis e < 0,9 DAP.2121 Godoi ET, Brande CT, Godoi TA, Lacerda HR, Albuquerque VM, Zirpoli JC, et al. Antirretroviral therapy effect in the intima-medio complex and ankle-brachial index in patients infected by HIV. J Vasc Bras. 2012;11(2):123-31.

Análise estatística

Na análise estatística, foi aplicado o teste de Kolmogorov-Smirnov para avaliar a normalidade dos dados. Quando houve distribuição normal, as variáveis foram apresentadas como média e desvio padrão e quando não, como mediana e valores máximo e mínimo. Foi realizada análise estatística descritiva e analítica. O valor de p foi considerado significativo quando ≤ 0,05.

Foram calculadas as prevalências de aterosclerose e seus respectivos intervalos de confiança ao nível de 95% nos grupos com e sem HIV e testadas as diferenças pelo teste Qui-Quadrado de Pearson. As Odds Ratios (ORs) foram calculadas tomando como referência o grupo controle e estimadas a OR para cada um dos grupos HIV com e sem uso de IPs.

Na comparação dos fatores de riscos clássicos para aterosclerose entre os grupos, nas variáveis idade e IMC foi utilizada a ANOVA para a comparação das médias, com pós-teste de Bonferroni. Na comparação das medianas, foi utilizado o teste não paramétrico de Kruskall-Wallis. Para as variáveis categóricas foi utilizado o teste Qui-quadrado de Pearson.

Para a avaliação de chance de aterosclerose segundo a condição HIV e uso de IP, foi aplicada análise multivariada de modelo logístico, ajustada pelas variáveis: cor da pele, condição de hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia, DM e IMC. Essas variáveis eram significativamente diferentes entre os grupos.

Para a análise de validação da EMI femoral, a EMI da carótida comum foi adotada como medida de referência, e uma curva ROC foi aplicada para a determinação do cut-off da EMI femoral. As análises foram realizadas pela estatística C (área sob a curva ROC), medidas de sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo (VPP) e negativo (VPN), calculados pelo software Stata versão 12.0.

Resultados

Foram recrutadas 40 pessoas com HIV/AIDS em uso de TARV com IPs (26 homens, idade média de 42,7 ± 8,8 anos), 40 pessoas com HIV/AIDS em uso de TARV sem IP (21 homens, idade média de 42,2 ± 9,1 anos) e 65 controles (37 homens, idade média de 39,7 ± 9,7 anos).

O percentil 75 calculado para os 145 pacientes estudados foi de 0,66 mm. Quando a EMI foi considerada espessada (> 0,66 mm), a análise comparativa da EMI nas artérias carótidas entre controles, HIV + sem e com IPs revelou 0,59 ± 0,11 mm vs 0,63 ± 0,11 mm vs 0,71 ± 0,28 mm, respectivamente com p = 0,014 (Tabela 1). Presença de EMI > P75 ou placa nos controles foi 19,0% (9,1 - 29,0), enquanto nas HIV + sem IP 37,5% (21,8 - 53,2), sendo p = 0,041 (Tabela 1).

Tabela 1
Prevalência de aterosclerose pela espessura mediointimal (EMI) das artérias carótidas comuns e femorais e pela alteração de índice tornozelo-braquial (ITB) entre os indivíduos não portadores do HIV, pessoas que vivem com HIV em uso de terapia antirretroviral com e sem prescrição de inibidor de protease (IP)

A prevalência da EMI > 0,8 mm ou presença de placa aterosclerótica nas artérias carótidas foi de 3,2% (0,0 - 7,6) nos controles e 15,0% (7,0 - 23,0) em HIV +, p = 0,032. Na tabela 1, são demonstradas algumas comparações de medidas da EMI nas artérias carótidas e femorais, e ITB entre os grupos.

Não houve diferença significativa no ITB entre os grupos controle e de HIV +. A comparação entre controles e HIV + sem IP revelou 1,08 (1,07 - 1,17) + vs 1,17 (1,08 - 1,23), p = 0,015. A EMI na artéria femoral entre os grupos controle e de HIV + foi 0,74 mm ± 0,30 vs 0,79 mm ± 0,33, p = 0,373 (Tabela 1).

Com relação aos fatores de risco para aterosclerose, considerando as 80 HIV +, estavam presentes: tabagismo em 6 pacientes (7,5%), HAS em 7 (8,75%), hipercolesterolemia em 15 (18,75%), hipertrigliceridemia em 24 (30%) e DM em 6 (7,5%). O IMC médio se mantinha dentro da normalidade nos HIV + com IPs, no limite inferior de sobrepeso no grupo sem IPs, e classificado como sobrepeso no grupo controle. O IMC nos grupos controle, HIV + sem e com IPs foi 26,2 ± 5,4 vs 25 ± 3,6 vs 24,7 ± 3,7 kg/m2, respectivamente, sendo p = 0,193 (Tabela 2).

Tabela 2
Comparação dos fatores de risco clássicos para aterosclerose entre os indivíduos não portadores do HIV, pessoas que vivem com HIV em uso de terapia antirretroviral com e sem prescrição de inibidor de protease (IP)

O tempo de doença foi significativamente diferente entre HIV + com IPs (13,6 ± 6,2 anos) e sem IPs (7,3 ± 6,8 anos) (p < 0,001). O tempo de TARV foi de 12,1 ± 6,7 anos no grupo com IPs vs 6,6 ± 6,7 anos no grupo sem IP, p < 0,001. Apenas 4 (5%) HIV + tinham CD4 abaixo de 200 e apenas 7 (8,75%) pesquisados tinham CV detectável, sendo a máxima de 3231 cópias (Tabela 3).

Tabela 3
Comparação dos fatores de risco, medidas laboratoriais e relacionadas à infecção pelo HIV entre as pessoas que vivem com HIV em uso de terapia antirretroviral com e sem prescrição de inibidor de protease (IP)

Houve correlação de Pearson positiva entre os EMI da carótida comum e da femoral [ρ = 0,354 (p<0,001)] (Figura1).

Figura 1
Correlação entre as medidas da espessura mediointimal (EMI) da artéria carótida comum e EMI da artéria femoral comum; *Correlação de Pearson = 0,354 (p < 0,001)

Na figura 2, observa-se a curva ROC das medidas da EMI pela artéria femoral considerando-se aterosclerose como a EMI na artéria carótida > 0,66 mm. Usando ponte de corte na femoral de 0,7mm, observou-se sensibilidade de 72,5%, especificidade de 46,6%, área da curva ROC de 0,661e kappa de 14,3% (Tabela 4).

Figura 2
Curva ROC das medidas da espessura mediointimal (EMI) da artéria femoral considerando arteriosclerose uma medida da EMI na artéria carótida comum acima de 0,66mm; *Área sob a curva = 0.6614 (IC95%: 0,563 - 0,760).

Tabela 4
Acurácia da medida da espessura mediointimal (EMI) das artérias femorais e da EMI das artérias carótidas nos pacientes estudados

Discussão

O presente estudo revelou que a EMI em artérias carótidas foi maior nas HIV + do que nos controles, independentemente do uso de IPs. .

Eira2020 Eira M. Avaliação de ateromatose subclínica em pacientes HIV/aids: determinação da velocidade de onda de pulso e da espesura médio-intimal de carótidas. [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2009. estudou 118 pacientes, sendo esses divididos em 4 grupos (HIV em uso de TARV, HIV sem tratamento - grupo naive, diabéticos não insulino-dependentes e controle). A EMI da carótida direita foi maior no grupo naive, comparado aos grupos TARV e controle (0,55 ± 0,02 mm vs 0,52 ± 0,02 mm vs 0,52 ± 0,02 mm, respectivamente; p<0,001), enquanto a EMI da carótida esquerda foi maior no grupo TARV, comparado aos grupos naive e DM (0,64 ± 0,04 mm vs 0,53 ± 0,04 mm vs 0,52 ± 0,04 mm, respectivamente; p<0,0001). Desta forma, em pacientes com HIV naive ou usando TARV as espessuras carotídeas foram maiores, sendo concordantes com nossos resultados no sentido de maior espessura em pessoas com o vírus quando comparadas a outras pessoas.2020 Eira M. Avaliação de ateromatose subclínica em pacientes HIV/aids: determinação da velocidade de onda de pulso e da espesura médio-intimal de carótidas. [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2009. Outros autores também demonstram maior prevalência de aterosclerose em pessoas com HIV tratadas com TARV.2323 Maggi P, Perilli F, Lillo A, Gargiulo M, Ferraro S, Grisorio B, et al. Rapid progression of carotid lesions in HAART-treated HIV-1 patients. Atherosclerosis. 2007;192(2):407-12.

Nossos achados são diferentes do estudo de Godoi et al.2121 Godoi ET, Brande CT, Godoi TA, Lacerda HR, Albuquerque VM, Zirpoli JC, et al. Antirretroviral therapy effect in the intima-medio complex and ankle-brachial index in patients infected by HIV. J Vasc Bras. 2012;11(2):123-31.,2222 Godoi ET, Brandt CT, Godoi JT, Melo HR, Godoi JT, et al. Assessment of intima-media complex in carotid, femoral and right subclavian arteries for early investigation of atherosclerosis in HIV-infected patients. Radiol Bras. 2013;46(6):333-40. que incluiu 70 pessoas com HIV e 70 controles e revelou não haver diferenças entre os grupos. Entretanto, a população era mais jovem do que no nesse estudo e havia pessoas tabagistas, hipertensas e com DM entre os controles, o que pode ter contribuído para maior medida da EMI.

Pessoas com HIV no nosso estudo tinham valor médio da EMI acima do percentil 75 calculado para população do estudo e esta medida foi maior do que nos controles.

O percentil 75 da EMI depende da população estudada, pois está relacionado ao sexo, raça e idade. No estudo Elsa-Brasil, quando foi avaliado este percentil em indivíduos na faixa etária semelhante a do nosso estudo, de raça parda e do sexo masculino, o percentil 75 foi entre 0,58 e 0,63 mm.1515 Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64.

Em HIV +, a ativação imunológica crônica e a inflamação crônica são associadas ao aumento do risco de aterosclerose. A USG foi um dos primeiros métodos diagnósticos a revelar alta incidência de aterosclerose subclínica em indivíduos infectados pelo HIV quando comparados aos controles não infectados.2424 Longenecker CT, Hoit BD. Imaging atherosclerosis in HIV: carotid intima-media thickness and beyond. Transl Res. 2012;159(3):127-39.,2525 Lacerda HR, Falcão Mda C, De Albuquerque VM, Zirpoli JC, Miranda-Filho DB, de Albuquerque MF, et al. Association of inflammatory cytoquines and endothelial adhesion molecules with imunological, virological and cardiometabolic disease in HIV-infected individuals. J Interferon Cytokine Res. 2014;34(5):385-93.

Existe a hipótese de que a TARV induza a ativação da função endotelial no sentido de promoção de aterosclerose. Desta forma, o HIV, a resposta de reconstituição imune, e a TARV podem promover ativação prematura do endotélio, sendo possivelmente fatores pró-aterogênicos e/ou aceleradores de aterosclerose.2626 Maggi P, Maserati R, Antonelli G. Atherosclerosis in HIV patients: a new face for an old disease? AIDS Rev. 2006;8(4):204-9.,2727 Maggi P, Perilli F, Lillo A, Carito V, Epifani G, Bellacosa C, et al. An ultrasound-based comparative study on carotid plaques in HIV-positive patients vs. atherosclerotic and arteritis patients: atherosclerotic or inflammatory lesions? Coron Artery Dis. 2007;18(1):23-9. A comparação da EMI entre os grupos HIV + com e sem IPs não demonstrou diferença significante no presente estudo. Apesar da hipótese da disfunção endotelial relacionada à TARV, alguns aspectos necessitam de melhores esclarecimentos.

Nolan et al.1212 Nolan D, Watts GF, Herrmann SE, French MA, John M, Mallal S. Endothelial function in HIV-infected patients receiving protease inhibitor therapy: does immune competence affect cardiovascular risk? Q J Med. 2003;96(11):825-32. compararam pessoas com HIV com dislipidemia tratadas com IPs e grupo controle saudável e não encontraram diferença na função endotelial entre os grupos.

Em nosso estudo, apesar de os pacientes com HIV em uso de IP terem tempo de doença e tempo de tratamento significativamente maior que o grupo sem IP, o uso de IPs aparentemente não influenciou na EMI das HIV +.

Em algumas situações, o tratamento de HIV + pode ser iniciado sem IPs. Neste estudo, é possível que o grupo de pacientes com IPs tenha realizado tratamento prévio sem uso de IPs, o que pode justificar maior o tempo de doença e de tratamento nesse grupo.

A ausência de diferença significante na medida da EMI entre os grupos de HIV + com e sem IP pode ser justificado pelo fato de que os IPs mais modernos estarem menos relacionados aos distúrbios metabólicos e, assim, interferirem menos no aumento do risco cardiovascular por disfunção endotelial.2828 Nguyen ST, Eaton SA, Bain AM, Rahman AP, Payne KD, Bedimo R, et al. Lipid-lowering efficacy and safety after switching to atazanavir-ritonavir-based highly active antiretroviral therapy in patients with human immunodeficiency virus. Pharmacotherapy. 2008;28(3):323-30.,2929 Soriano V, Garcıa-Gasco P, Vispo E, Ruiz-Sancho A, Blanco F, Martin-Carbonero L, et al. Efficacy and safety of replacing lopinavir with atazanavir in HIV-infected patients with undetectable plasma viraemia: final results of the sloat trial. J Antimicrob Chemother. 2008;61(1):200-5.

A TARV tem como princípio o controle viral e estabilização da imunidade do indivíduo, resultando no aumento da expectativa de vida e na redução das infecções oportunistas.11 Friis-moller N, Reiss P, Sabin CA, Weber R, Monforte A, El-Sadr W, et al. Class of antirretroviral drugs and the risk of myocardial infarction. N Engl J Med. 2007;356(17):1723-35. Pessoas com HIV têm alterações cardiovasculares decorrentes da exposição aos fatores de risco clássicos da DCV, infecção pelo vírus e cardiotoxicidade das drogas antirretrovirais.88 Hasse B, Ledergerber B, Furrer H, Battegay M, Hirschel B, Cavassini M, et al. Morbidity and aging in HIV-infected persons: the Swiss HIV Cohort study. Clin Infect Dis. 2011;53(11):1130-9. A população com HIV do presente estudo estava estável do ponto de vista imunológico. A maioria tinha CD4 acima de 200 células/mm3 e apenas sete pessoas tinham CV detectável. Não houve diferença significante entre os grupos com e sem IP quanto aos valores de CD4 e CV.

Estudos têm demonstrado que a aterosclerose em HIV + é mais prevalente e precoce que na população não infectada, e nosso estudo é concordante com esses achados.33 Grinspoon SK. Metabolic syndrome and cardiovascular disease in patients with human immunodeficiency virus. Am J Med. 2005;118(Suppl 2):23S-28S.

4 Triant VA, Hang L, Hadigan C, Grinspoon SK. Increased acute myocardial infarction. J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(7): 2506-12.
-55 Fichtenbaum CJ. Does antiretroviral therapy increase or decrease the risk of cardiovascular disease? Curr HIV/AIDS Rep. 2010;7(2):92-8.

No presente estudo, a prevalência de hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia foi maior no grupo HIV + que usa IPs, o que pode estar relacionado, de alguma forma, com a utilização desse fármaco.

A alta prevalência do ITB > 1,3 em HIV + pode ser mediada pelo envolvimento da elasticidade vascular assim como pela formação de placas de ateroma.1010 Depairon M, Chessex S, Sudre P, Rodondi N, Doser N, Chave JP, et al. Prematureatherosclerosis in HIV-infected individuals-focuson protease inhibitortherapy. AIDS. 2001;15(3):329-34. No presente estudo, não houve diferença significante do ITB entre os grupos de HIV + e controle, mas houve diferença quando comparado o grupo de HIV + sem IP e controle, o que pode ser explicado pelo comprometimento da elasticidade da parede do vaso. O ITB do grupo sem IP ainda estava dentro da faixa de normalidade.

Uma metanálise estudou o ITB em pacientes com HIV. As populações foram selecionadas com critérios variados e não houve consenso em relação aos fatores de risco responsáveis pelo ITB anormal. A prevalência de ITB aumentado foi mais alta do que na população geral. Na população com HIV, não está claro se a alta prevalência de ITB alterado está associada com maior incidência de eventos cardiovasculares.3030 Olalla J, Salas D, De la Torre J, Del Arco A, Prada JL, Martos F, et al. Ankle-brachial index in HIV infection. Aids Res Ther. 2009;6(6):1-5.

A medida da EMI em carótida comum continua a ser a referência quando comparada a outros locais, sobretudo porque estudos que correlacionam aumento do risco cardiovascular e infecção por HIV adotam a medida carotídea, a qual apresenta melhor acurácia. A medida da EMI em femoral comum e origem da subclávia direita também pode ser considerada e sugerida por alguns autores como marcador mais precoce de ateromatose, mas não concilia alta especificidade e sensibilidade, o que foi corroborado por nosso estudo.1616 Held C, Hjemdahl P, Eriksson SV, Björkander I, Forslund L, Rehnqvist N. Prognostic implications of intima-media thickness and plaques in the carotid and femoral arteries in patients with stable angina pectoris. Eur Heart J. 2001;22(1):62-72.,1717 Engelhorn CA, Engelhorn AL, Cassou MF, Zanoni CC, Gosalan CJ, Ribas E, et al. Intima-media thickness in the origin of right subclavian artery as an early marker of cardiovascular risk. Arq Bras Cardiol. 2006;87(5):609-14.,2222 Godoi ET, Brandt CT, Godoi JT, Melo HR, Godoi JT, et al. Assessment of intima-media complex in carotid, femoral and right subclavian arteries for early investigation of atherosclerosis in HIV-infected patients. Radiol Bras. 2013;46(6):333-40.

Quando comparada a medida da EMI da carótida comum com a da femoral, observou-se uma correlação positiva de Pearson, sugerindo uma fraca correlação direta entre as duas medidas. Acreditamos que estudos com maior número de pacientes sejam necessários para melhor esclarecimento dessa correlação. Um estudo demonstrou uma correlação (Pearson) entre artéria carótida comum e artéria subclávia direita, mas essa também não foi forte.1717 Engelhorn CA, Engelhorn AL, Cassou MF, Zanoni CC, Gosalan CJ, Ribas E, et al. Intima-media thickness in the origin of right subclavian artery as an early marker of cardiovascular risk. Arq Bras Cardiol. 2006;87(5):609-14.

Nesse estudo, foi utilizada a curva ROC para comparação de dois testes, sendo um a medida da EMI na artéria carótida comum (usada como referência) e o outro a medida na artéria femoral. A curva ROC permite comparar dois ou mais exames diagnósticos e isso é uma das suas maiores virtudes.3131 Margotto, PR. Curva ROC como fazer e interpretar nos SPSS. [Acesso em 2016 set 19]. Disponível em: http://www.paulomargotto.com.br/documentos/Curva_ROC_SPSS.pdf
http://www.paulomargotto.com.br/document...

Estabelecendo o ponto de corte da EMI ≥ 0,7 mm, foi testada a acurácia da EMI em femoral e carótidas em pessoas com HIV. Com base na sensibilidade, especificidade, VPP e VPN, o EMI na artéria femoral não poderia substituir a medida na artéria carótida e ser usada como referência nessa população.

As principais limitações desse estudo foram: definição empírica do tamanho amostral e o desenho do estudo que não permite estabelecimento de relação causa-efeito. Entretanto, deve ficar registrado que há estudos na literatura sobre o tema que apresentam população menor que a nossa. Poderíamos ainda debater se a não realização da velocidade de onda de pulso e a dilatação fluxo mediada da artéria braquial (DILA), que também são métodos não invasivos de diagnóstico de aterosclerose subclínica, seria ou não uma limitação. Contudo, existem dados mais consistentes sobre a EMI como preditor de risco cardiovascular.1919 Andrade AC, Ladeia AM, Netto EM, Mascarenhas A, Cotter B, Benson CA, et al. Cross-sectional study of endothelial function in HIV-infected patients in Brazil. AIDS Res Hum Retroviruses. 2008;24(1):27-33.,2020 Eira M. Avaliação de ateromatose subclínica em pacientes HIV/aids: determinação da velocidade de onda de pulso e da espesura médio-intimal de carótidas. [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2009.

Conclusões

A maior EMI e maiores prevalências de EMI acima do percentil 75, EMI acima de 0,8 mm ou presença de placa aterosclerótica em HIV + sugerem ocorrência mais precoce da aterosclerose nessa população em comparação a controles saudáveis. Entretanto, não houve diferenças entre os grupos quanto à ocorrência de ITB anormal.

A prevalência de tabagismo foi maior em HIV + sem IPs, enquanto hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia e DM no grupo com IP. O tempo de doença e o tempo de tratamento com TARV foi maior em HIV + com IPs.

A medida da EMI nas artérias carótidas comuns continua a ser a medida de referência na detecção de aterosclerose, pois na correlação com artéria femoral a sensibilidade foi moderada e especificidade baixa.

  • Fontes de financiamento
    O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
  • Vinculação acadêmica
    Este artigo é parte de livre-docência de Emmanuelle Tenório Albuquerque Madruga Godoi pela Universidade Federal de Pernambuco.

References

  • 1
    Friis-moller N, Reiss P, Sabin CA, Weber R, Monforte A, El-Sadr W, et al. Class of antirretroviral drugs and the risk of myocardial infarction. N Engl J Med. 2007;356(17):1723-35.
  • 2
    Bozkurt B. Cardiovascular toxicity with highly active antirretroviral therapy: review of clinical studies. Cardiovasc Toxicol. 2004;4(3):243-60.
  • 3
    Grinspoon SK. Metabolic syndrome and cardiovascular disease in patients with human immunodeficiency virus. Am J Med. 2005;118(Suppl 2):23S-28S.
  • 4
    Triant VA, Hang L, Hadigan C, Grinspoon SK. Increased acute myocardial infarction. J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(7): 2506-12.
  • 5
    Fichtenbaum CJ. Does antiretroviral therapy increase or decrease the risk of cardiovascular disease? Curr HIV/AIDS Rep. 2010;7(2):92-8.
  • 6
    Ingle SM, May MT, Gill MJ, Mugavero MJ, Lewden C, Abgrall S, et al. Impact of risk factors for specific causes of death in the first and subsequent years of antiretroviral therapy among HIV-infected patients. Clin Infect Dis. 2014;59(2):287-97.
  • 7
    Law MG, Friis-Moller N, El-Sadr WM, Weber R, Reiss P, D'Arminio Monforte A, et al; D:A:D Study Group. The use of the Framingham equation to predict myocardial infarctions in HIV-infected patients: comparison with observed events in the D:A: D study. HIV Med. 2006;7(4):218-30.
  • 8
    Hasse B, Ledergerber B, Furrer H, Battegay M, Hirschel B, Cavassini M, et al. Morbidity and aging in HIV-infected persons: the Swiss HIV Cohort study. Clin Infect Dis. 2011;53(11):1130-9.
  • 9
    Hajjar LA, Calderaro D, Yu PC, Giuliano I, Lima EM, Barbaro G, et al. [Cardiovascular manifestations in patients infected with the human immunodeficiency virus]. Arq Bras Cardiol. 2005;85(5):363-77.
  • 10
    Depairon M, Chessex S, Sudre P, Rodondi N, Doser N, Chave JP, et al. Prematureatherosclerosis in HIV-infected individuals-focuson protease inhibitortherapy. AIDS. 2001;15(3):329-34.
  • 11
    Ballocca F, Gili S, D'Ascenzo F, Marra WG, Cannillo M, Calcagno A, et al. HIV infection and primary prevention of cardiovascular disease: lights and shadows in the HAART era. Prog Cardiovasc Dis. 2016;58(5):565-76.
  • 12
    Nolan D, Watts GF, Herrmann SE, French MA, John M, Mallal S. Endothelial function in HIV-infected patients receiving protease inhibitor therapy: does immune competence affect cardiovascular risk? Q J Med. 2003;96(11):825-32.
  • 13
    Polak JF, Pencina MJ, Pencina KM, O'Donnell CJ, Wolf PA, D'Agostino RB. Carotid-wall intima-media thickness and cardiovascular events. N Engl J Med. 2011;365(3):213-21.
  • 14
    Polak JF, Pencina MJ, O'Leary DH, D'Agostino RB. Common carotid artery intima-media thickness progression as a predictor of stroke in multi-ethnic study of atherosclerosis. Stroke. 2011;42(11):3017-21.
  • 15
    Freire CM, Alcântara ML, Santos SN, Amaral SS, Veloso O, Porto CL, et al. Recomendação para a quantificação pelo ultrassom da doença aterosclerótica das artérias carótidas e vertebrais: grupo de trabalho do departamento de imagem cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia - DIC - SBC. Arq Bras Cardiol. 2015;28(nº especial):e1-e64.
  • 16
    Held C, Hjemdahl P, Eriksson SV, Björkander I, Forslund L, Rehnqvist N. Prognostic implications of intima-media thickness and plaques in the carotid and femoral arteries in patients with stable angina pectoris. Eur Heart J. 2001;22(1):62-72.
  • 17
    Engelhorn CA, Engelhorn AL, Cassou MF, Zanoni CC, Gosalan CJ, Ribas E, et al. Intima-media thickness in the origin of right subclavian artery as an early marker of cardiovascular risk. Arq Bras Cardiol. 2006;87(5):609-14.
  • 18
    Spácil J, Spácabilová J. The ankle-brachial blood pressure index as a risk indicator of generalized atherosclerosis. Semin Vasc Med. 2002;2(4):441-5.
  • 19
    Andrade AC, Ladeia AM, Netto EM, Mascarenhas A, Cotter B, Benson CA, et al. Cross-sectional study of endothelial function in HIV-infected patients in Brazil. AIDS Res Hum Retroviruses. 2008;24(1):27-33.
  • 20
    Eira M. Avaliação de ateromatose subclínica em pacientes HIV/aids: determinação da velocidade de onda de pulso e da espesura médio-intimal de carótidas. [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2009.
  • 21
    Godoi ET, Brande CT, Godoi TA, Lacerda HR, Albuquerque VM, Zirpoli JC, et al. Antirretroviral therapy effect in the intima-medio complex and ankle-brachial index in patients infected by HIV. J Vasc Bras. 2012;11(2):123-31.
  • 22
    Godoi ET, Brandt CT, Godoi JT, Melo HR, Godoi JT, et al. Assessment of intima-media complex in carotid, femoral and right subclavian arteries for early investigation of atherosclerosis in HIV-infected patients. Radiol Bras. 2013;46(6):333-40.
  • 23
    Maggi P, Perilli F, Lillo A, Gargiulo M, Ferraro S, Grisorio B, et al. Rapid progression of carotid lesions in HAART-treated HIV-1 patients. Atherosclerosis. 2007;192(2):407-12.
  • 24
    Longenecker CT, Hoit BD. Imaging atherosclerosis in HIV: carotid intima-media thickness and beyond. Transl Res. 2012;159(3):127-39.
  • 25
    Lacerda HR, Falcão Mda C, De Albuquerque VM, Zirpoli JC, Miranda-Filho DB, de Albuquerque MF, et al. Association of inflammatory cytoquines and endothelial adhesion molecules with imunological, virological and cardiometabolic disease in HIV-infected individuals. J Interferon Cytokine Res. 2014;34(5):385-93.
  • 26
    Maggi P, Maserati R, Antonelli G. Atherosclerosis in HIV patients: a new face for an old disease? AIDS Rev. 2006;8(4):204-9.
  • 27
    Maggi P, Perilli F, Lillo A, Carito V, Epifani G, Bellacosa C, et al. An ultrasound-based comparative study on carotid plaques in HIV-positive patients vs. atherosclerotic and arteritis patients: atherosclerotic or inflammatory lesions? Coron Artery Dis. 2007;18(1):23-9.
  • 28
    Nguyen ST, Eaton SA, Bain AM, Rahman AP, Payne KD, Bedimo R, et al. Lipid-lowering efficacy and safety after switching to atazanavir-ritonavir-based highly active antiretroviral therapy in patients with human immunodeficiency virus. Pharmacotherapy. 2008;28(3):323-30.
  • 29
    Soriano V, Garcıa-Gasco P, Vispo E, Ruiz-Sancho A, Blanco F, Martin-Carbonero L, et al. Efficacy and safety of replacing lopinavir with atazanavir in HIV-infected patients with undetectable plasma viraemia: final results of the sloat trial. J Antimicrob Chemother. 2008;61(1):200-5.
  • 30
    Olalla J, Salas D, De la Torre J, Del Arco A, Prada JL, Martos F, et al. Ankle-brachial index in HIV infection. Aids Res Ther. 2009;6(6):1-5.
  • 31
    Margotto, PR. Curva ROC como fazer e interpretar nos SPSS. [Acesso em 2016 set 19]. Disponível em: http://www.paulomargotto.com.br/documentos/Curva_ROC_SPSS.pdf
    » http://www.paulomargotto.com.br/documentos/Curva_ROC_SPSS.pdf

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan 2017

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2016
  • Revisado
    29 Jul 2016
  • Aceito
    28 Set 2016
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br