Acessibilidade / Reportar erro

Mundo Real da Intervenção Coronariana Percutânea no Sistema de Saúde Pública no Rio de Janeiro: Como Podemos Melhorá-lo?

Palavras-chave
Doença da Artéria Coronariana; Intervenção Coronária Percutânea/economia; Mortalidade; Morbidade; Sistema Único de Saúde (SUS) / economia; Epidemiologia

As doenças cardiovasculares (DCV) são atualmente a principal causa de morte no Brasil11 Mansur, A P, Favarato, D. Mortalidade por doenças cardiovasculares no Brasil e na região metropolitana de São Paulo: atualização 2011. Arq Bras Cardiol. 2012; 99(2):755-61. e no mundo,22 Sanchis-Gomar F, Perez-Quilis C, Leischik R, Lucia A. Epidemiology of coronary heart disease and acute coronary syndrome. Ann Transl Med. 2016;4(13):256. com 80% dos casos33 Bovet P, Paccaud, F. Cardiovascular disease and the changing face of global public health: a focus on low and middle income countries. Publ Health Rev. 2012;33(2):397-415. ocorrendo em países de baixa e média renda. Ela afeta negativamente as economias desses países,44 World Health Organization.(WHO). Global status report on noncommunicable diseases 2010. Burden:mortality, morbidity and risk factors. Geneva;2010. P.9-31. com reduções do Produto Interno Bruto (PIB), e aumentos da carga sobre os sistemas de saúde já precários. Os fatores de risco associados às DCV são amplamente evitáveis, e a conscientização55 Chow CK, Teo KK, Rangarajan S, Islam S, Gupta R, Avezum A, et al. Prevalence, awareness, treatment, and control of hypertension in rural and urban communities in high-, middle-, and low-income countries. JAMA. 2013;310(9):959-68. e o aumento do acesso aos cuidados primários de saúde para a prevenção66 Joshi R, Jan S, Wu Y, MacMahon S. Global inequalities in access to cardiovascular health care: our greatest challenge. J Am Coll Cardiol. 2008;52(23):1817-25. são fatores-chave para reduzir os eventos.

O presente estudo avaliou as taxas de mortalidade em pacientes submetidos à intervenção coronariana percutânea (ICP) tanto na doença coronariana estável (DF) como nas síndromes coronarianas agudas (SCA) no Sistema Único de Saúde (SUS) no período de 1999 a 2010. Ele fornece dados interessantes sobre os desfechos de mortalidade nesses pacientes, dividindo-os por sexo, faixa etária e tipo de intervenção (angioplastia coronariana por balão, implante de stent com stents convencionais e ICP primária para IAMST). Ele tem limitações evidentes: trata-se de uma coorte populacional retrospectiva; seus dados foram extraídos de diferentes bases de dados, e as informações tiveram que ser pareadas (internações versus atestados de óbito, que não estão no mesmo conjunto de dados); o desfecho mortalidade foi morte por qualquer causa, e embora os autores citem que a causa da morte foi dividida em dois grupos (morte cardiovascular e qualquer outra causa), não está claro quais dados foram utilizados; não há informações sobre comorbidades, doença de vaso único versus doença multiarterial, ou medicamentos prescritos; e pacientes com mais de uma ICP foram excluídos.77 Souza e Silva CG, Klein CH, Godoy PH, Salis LHA, Souza e Silva NA. Sobrevida em até 15 anos de homens e mulheres após intervenção coronariana percutânea paga pelo Sistema Único de Saúde no Estado do Rio de Janeiro, em 1999-2010. Arq Bras Cardiol. 2018; 111(4):553-561

Os autores também afirmam que, em comparação com outros estudos.88 Weaver WD, Reisman MA, Griffin JJ, Buller CE, Leimgruber PP, Henry T, et al. Optimum percutaneous transluminal coronary angioplasty compared with routine stent strategy trial (OPUS-1): a randomised trial. Lancet. 2000;355(9222):2199-203.

9 Boden WE, O'Rourke RA, Teo KK, Hartigan PM, Maron DJ, Kostuk WJ, et al; COURAGE Trial Research Group. Optimal medical therapy with or without ICP for stable coronary disease. N Engl J Med. 2007;356(15):1503-16.
-1010 Sedlis SP, Hartigan PM, Teo KK, Maron DJ, Spertus JA, Mancini GB, et al. Effect of ICP on long-term survival in patients with stable ischemic heart disease. N Engl J Med. 2015;373(20):1937-46. O presente estudo apresentou taxas de mortalidade mais elevadas, atribuindo isso às dificuldades de extrapolar resultados de ensaios clínicos randomizados (ECR) para a prática no mundo real. Embora a validade externa dos ECR e a generabilidade de seus resultados sejam uma questão conhecida,1111 Rothwell PM. External validity of randomised controlled trials: "To whom do the results of this trial apply?". Lancet. 2005;365(9453):82-93. também é razoável considerar a precariedade do SUS, com acesso restrito à atenção primária e à medicina preventiva, oferta instável de medicamentos, indisponibilidade de stents farmacológicos e estrutura insuficiente de atenção secundária e terciária à saúde. Acima de tudo, as precárias condições socioeconômicas e de educação contribuem para um cenário em que há muitos fatores de confusão para essas taxas de mortalidade mais altas. Também temos que considerar que não há evidências de que a ICP para DCE reduza a mortalidade quando comparada com o tratamento clínico otimizado;88 Weaver WD, Reisman MA, Griffin JJ, Buller CE, Leimgruber PP, Henry T, et al. Optimum percutaneous transluminal coronary angioplasty compared with routine stent strategy trial (OPUS-1): a randomised trial. Lancet. 2000;355(9222):2199-203. portanto, talvez um desfecho primário melhor possa ser eventos cardíacos e cerebrovasculares maiores (ECCM) do que apenas morte, embora seja compreensível que a falta de um registro unificado, com informações completas, torne isso praticamente impossível.

Por fim, seria interessante investigar os custos das doenças cardiovasculares para o SUS e comparar a carga financeira das DCV no Brasil àquela de outros países.1212 Tarride JE , Lim M, DesMeules M, Luo W, Burke N, O'Reilly D,et al. A review of the cost of cardiovascular disease. Can J Cardiol. 2009;25(6):195-202.

Além de suas limitações, o presente estudo tem pontos fortes: um grande número de indivíduos, um longo tempo de acompanhamento e um cenário do mundo real. Ele deve ser usado para gerar perguntas em vez de fornecer respostas, e é um grande passo em direção à oferta de melhor atendimento aos nossos pacientes no Brasil.

  • Minieditorial referente ao artigo: Sobrevida em até 15 Anos de Homens e Mulheres após Intervenção Coronariana Percutânea Paga pelo Sistema Único de Saúde no Estado do Rio de Janeiro, 1999-2010

References

  • 1
    Mansur, A P, Favarato, D. Mortalidade por doenças cardiovasculares no Brasil e na região metropolitana de São Paulo: atualização 2011. Arq Bras Cardiol. 2012; 99(2):755-61.
  • 2
    Sanchis-Gomar F, Perez-Quilis C, Leischik R, Lucia A. Epidemiology of coronary heart disease and acute coronary syndrome. Ann Transl Med. 2016;4(13):256.
  • 3
    Bovet P, Paccaud, F. Cardiovascular disease and the changing face of global public health: a focus on low and middle income countries. Publ Health Rev. 2012;33(2):397-415.
  • 4
    World Health Organization.(WHO). Global status report on noncommunicable diseases 2010. Burden:mortality, morbidity and risk factors. Geneva;2010. P.9-31.
  • 5
    Chow CK, Teo KK, Rangarajan S, Islam S, Gupta R, Avezum A, et al. Prevalence, awareness, treatment, and control of hypertension in rural and urban communities in high-, middle-, and low-income countries. JAMA. 2013;310(9):959-68.
  • 6
    Joshi R, Jan S, Wu Y, MacMahon S. Global inequalities in access to cardiovascular health care: our greatest challenge. J Am Coll Cardiol. 2008;52(23):1817-25.
  • 7
    Souza e Silva CG, Klein CH, Godoy PH, Salis LHA, Souza e Silva NA. Sobrevida em até 15 anos de homens e mulheres após intervenção coronariana percutânea paga pelo Sistema Único de Saúde no Estado do Rio de Janeiro, em 1999-2010. Arq Bras Cardiol. 2018; 111(4):553-561
  • 8
    Weaver WD, Reisman MA, Griffin JJ, Buller CE, Leimgruber PP, Henry T, et al. Optimum percutaneous transluminal coronary angioplasty compared with routine stent strategy trial (OPUS-1): a randomised trial. Lancet. 2000;355(9222):2199-203.
  • 9
    Boden WE, O'Rourke RA, Teo KK, Hartigan PM, Maron DJ, Kostuk WJ, et al; COURAGE Trial Research Group. Optimal medical therapy with or without ICP for stable coronary disease. N Engl J Med. 2007;356(15):1503-16.
  • 10
    Sedlis SP, Hartigan PM, Teo KK, Maron DJ, Spertus JA, Mancini GB, et al. Effect of ICP on long-term survival in patients with stable ischemic heart disease. N Engl J Med. 2015;373(20):1937-46.
  • 11
    Rothwell PM. External validity of randomised controlled trials: "To whom do the results of this trial apply?". Lancet. 2005;365(9453):82-93.
  • 12
    Tarride JE , Lim M, DesMeules M, Luo W, Burke N, O'Reilly D,et al. A review of the cost of cardiovascular disease. Can J Cardiol. 2009;25(6):195-202.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov 2018
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br