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Mais um Passo na Educação Médica nos Países de Língua Portuguesa

Palavras-chave
Doenças Cardiovasculares; Educação Médica/tendências; Publicações/tendências; Escolas Médicas; Carga Global da Doença; Fatores de Risco; Expectativa de Vida; Fatores Socioeconômicos.

Em 2016, o Journal of the American Medical Association (JAMA) publicou uma edição temática sobre educação médica, na qual Golub,11 Golub, R. M. Looking Inward and Reflecting Back. JAMA, 2016;316(21):2200-3. em seu editorial, salientou a importância de se olhar para o passado para se antever o futuro. Esse autor ressalta que as mudanças que ocorrem na sociedade, como a globalização das etnias, das normas culturais e dos sistemas de saúde, irão requerer novos modelos educacionais que sejam abrangentes, criativos e inovadores para melhorar a qualidade da educação médica e da assistência ao paciente.11 Golub, R. M. Looking Inward and Reflecting Back. JAMA, 2016;316(21):2200-3.

Desse modo, o ensino médico tem sido alvo de mudanças recentes, com o objetivo de se adequar às novas demandas populacionais, que apresentam grandes desafios decorrentes das desigualdades regionais na distribuição da força de trabalho em saúde. Esses profissionais deverão ser treinados para abordar patologias com complexidade crescente e ter habilidades para liderar equipes interprofissionais, que precisam ser custo-efetivas quanto às evidências transculturais, para melhor servir às populações assistidas.22 Green M, Wayne DB, Neilson EG. Medical Education 2020-Charting a Path Forward. JAMA.2019;322(10):934-5.

Assim, a formação médica tornou-se estratégica para fortalecer os sistemas de saúde, especialmente nos países de média e baixa renda. Os relatórios Human Resources for Health: Overcoming the crisis, produzido por Joint Learning Initiative, e o World Health Report 2006: working together for health, produzido pela Organização Mundial da Saúde (OMS),33 World Health Organization (WHO): The World Health Report: working together for health. [Acessaed in 2019 Oct 10] Available from: http://www.who.int/whr/2006/en/
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estimaram escassez de quase 4,3 milhões de médicos, parteiras, enfermeiros e trabalhadores de apoio em saúde em todo o mundo, sendo essa escassez mais acentuada nos países mais pobres, em especial na África subsaariana. O segundo relatório estabeleceu um plano de ação para os dez anos subsequentes, em que os países poderiam construir suas forças de trabalho em saúde com a ajuda de parceiros globais.

Ainda que os governos dos países de língua portuguesa (PLP) na África tenham investido recursos para melhorar o ensino e reter médicos em seus países de origem, pouco avanço pôde ser observado.44 Fronteira I, Sidat M, Fresta M, The rise of medical trainingin Portuguese speaking African countries. Hum Resour Health. 2014 Nov 3;12:63. Segundo o relatório da OMS de 2018, Global strategy on human resources for health: workforce 2030, descrevendo um incremento de 13,1% nos profissionais de saúde na África entre 2013 e 2016, o aumento no número de médicos naqueles países foi pequeno.55 World Health Organization. (WHO). Executive Board. Human resources for health Global strategy on human resources for health: workforce 2030. [Accessed in 2019 Oct 10]. Available from: http://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_files/EB144/B144_26-en.pdf?ua=1
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Esse mesmo documento propõe iniciativas a serem implementadas pela OMS para melhorar a formação de profissionais de saúde com base na colaboração entre países que desenvolveram modelos exitosos.55 World Health Organization. (WHO). Executive Board. Human resources for health Global strategy on human resources for health: workforce 2030. [Accessed in 2019 Oct 10]. Available from: http://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_files/EB144/B144_26-en.pdf?ua=1
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Com o objetivo de estimular o desenvolvimento e a cooperação multilateral entre seus países-membros, a Comunidade de Países de Língua Portuguesa, em seu Plano Estratégico de Cooperação em Saúde,66 Ferrinho P, Hartz Z. O PECS: instrumento estruturante da reflexão e da cooperação em saúde entre os Estados membros da CPLP. An Inst Hig Med Trop. 2016;15(supl 1):S5-S6. propõe incentivo para a formação de redes de cooperação para o ensino médico, com apoio às iniciativas nos níveis de graduação, pós-graduação e pesquisa.77 Carvalho A, IJsselmuiden C, Kaiser K, Hartz Z, Ferrinho P, et al.Towards equity in global health partnerships: adoption of the Research Fairness Initiative (RFI) by Portuguese-speaking countries. BMJ Glob Health 2018;3:e000978. Com essa estratégia, reafirma a língua portuguesa como denominador comum transcultural para a partilha de conhecimento científico. No entanto, as distâncias, a falta de contextualização dos problemas locais e as falhas de financiamento dificultaram a comunicação entre os PLP e, por consequência, o estabelecimento efetivo dessas redes de cooperação.66 Ferrinho P, Hartz Z. O PECS: instrumento estruturante da reflexão e da cooperação em saúde entre os Estados membros da CPLP. An Inst Hig Med Trop. 2016;15(supl 1):S5-S6.

As iniciativas de cooperação em saúde pública, especialmente aquelas voltadas para as doenças transmissíveis, vêm enfrentando dificuldades na dependência de fatores como as relações internacionais entre os PLP.88 Carrilo ROA, Silva FRB A Fiocruz como ator da política externa brasileira no contexto da comunidade dos países de língua portuguesa: uma história revelada. Hist cienc saúde.Manguinhos[online]. 2015;22(1):153-69.

9 Buss PM. Cooperação internacional em saúde do Brasil na era do SUS. Ciênc saúde coletiva. 2018;23(6):1881-9.
-1010 Fresta MJ, Ferreira MA, Delgado AP, Sambo MR, Torgal J, Sidat M, Ferrinho P. Estabelecimento de uma rede estruturante da cooperação em educação médica, no âmbito do PECS-CPLP. An Inst Hig Med Trop. 2016;15(supl 1):S27 - S34. Para além disso, há que se considerar a importância das doenças crônicas não transmissíveis, com foco nas enfermidades cardiovasculares. A doença isquêmica do coração é a principal causa de morte na maioria dos PLP, com fatores de risco atribuíveis comuns, como os dietéticos e a hipertensão arterial. Possivelmente os fatores genéticos, os culturais, os inerentes ao hospedeiro, além das grandes desigualdades sociais, poderiam explicar as mortalidades observadas nos PLP.1111 Nascimento BR, Brant LCC, Oliveira GMM, Malachias MVB, Reis G M A, Teixeira RA, et al. Cardiovascular disease epidemiology in Portuguese-Speaking Countries: data from the Global Burden of Disease, 1990 to 2016. Arq Bras Cardiol. 2018;110(6):500-11.,1212 Pinto FJ. Cardiovascular diseases in portuguese: the importance of preventive medicine. Arq Bras Cardiol. 2018;110(6):512-3.

Essas similaridades entre os PLP representariam uma oportunidade de cooperação, contextualizando as demandas locais, para a formação de redes de intercâmbio entre faculdades de medicina de língua portuguesa a fim de possibilitar a disseminação e a adaptação dos modelos já existentes, além da criação de um Programa “Erasmus-like” para os PLP.1313 Oliveira GMM, Lorenzo A, Colombo FMC, Sternick EB, Brandão AA, Kaiser SE, et al. Internationalization is necessary, but is it enough? Arq Bras Cardiol. 2018;111(4):626-8. É nesse sentido que, no próximo mês de novembro, será celebrada, em Lisboa, a assinatura de um acordo de cooperação entre várias faculdades de medicina de PLP, sob a designação de Rede de Cooperação das Escolas Médicas de Língua Portuguesa (CODEM-LP) (Figura 1). Estamos convictos de que tal acordo fortalecerá os laços de colaboração entre as várias escolas médicas, contribuindo para um reforço da medicina acadêmica no espaço da lusofonia.

Figura 1
Logomarca da Rede de Cooperação das Escolas Médicas de Língua Portuguesa.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    Nov 2019
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