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Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) Causada por COVID-19: Um Fator Regional

Palavras-chave
Doenças Cardiovasculares; COVID-19; Síndrome Respiratória Aguda Grave

A doença causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, identificada na China no final de 2019 e denominada COVID-19 (do inglês coronavirus disease), foi declarada como uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em março de 2020, acumulando mais de 20 milhões de casos confirmados no Brasil, e mais de 583 mil mortes causadas por complicações da doença, até o final da semana epidemiológica 35, em 04 de setembro de 2021.11 Guan WJ, Ni ZY, Hu Y, Liang WH, Ou CQ, He JX, et al. Clinical Characteristics of Coronavirus Disease 2019 in China. N Engl J Med. 2020;382(18):1708-20. doi: 10.1056/NEJMoa2002032.
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–33 Segundo a OMS, o Brasil é o terceiro país com mais casos confirmados da SARS-CoV-2, ficando atrás somente dos Estados Unidos da América e Índia,11 Guan WJ, Ni ZY, Hu Y, Liang WH, Ou CQ, He JX, et al. Clinical Characteristics of Coronavirus Disease 2019 in China. N Engl J Med. 2020;382(18):1708-20. doi: 10.1056/NEJMoa2002032.
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33 Secretária de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico Especial: Semana Epidemiológica 35 - 29/8 a 4/9/2021 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; c2021 [cited 2021 Oct 02]. Available from: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/boletins-epidemiologicos/numeros-recentes.
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a qual é também considerada um país emergente e com problemas socioeconômicos semelhantes aos enfrentados pela população brasileira.

Os sintomas da infecção pelo SARS-CoV-2 podem variar desde uma Síndrome Gripal (SG), com sinais e sintomas leves como febre, tosse, congestão nasal e fadiga, até uma Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), com sintomas como dispneia, saturação de O2 ≤ 93%, frequência respiratória ≥ 30 respirações por minuto, pressão arterial de oxigênio (PaO2) /fração inspirada de oxigênio (FIO2) < 300, linfopenia e edema alveolar.44 Phua J, Weng L, Ling L, Egi M, Lim CM, Divatia JV, et al. Intensive Care Management of Coronavirus Disease 2019 (COVID-19): Challenges and Recommendations. Lancet Respir Med. 2020;8(5):506-17. doi: 10.1016/S2213-2600(20)30161-2.
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,55 Wang T, Du Z, Zhu F, Cao Z, An Y, Gao Y, et al. Comorbidities and Multi-Organ Injuries in the Treatment of COVID-19. Lancet. 2020;395(10228):e52. doi: 10.1016/S0140-6736(20)30558-4.
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No Brasil, foram notificados cerca de 1 775 816 casos de SRAG por COVID-19, sendo que 32,2% dos casos evoluíram para óbito.66 Secretária de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico Especial: Semana Epidemiológica 36 - 5/9 a 11/9/2021 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; c2021 [cited 2021 Oct 02]. Available from: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/boletins-epidemiologicos/numeros-recentes.
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Entre os 342.636 óbitos de SRAG por COVID-19 notificados em 2021 até a semana epidemiológica 36, 59,5% apresentavam pelo menos uma comorbidade, sendo as doenças cardíacas, doenças cerebrovasculares, hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus (DM), as mais frequentes.66 Secretária de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico Especial: Semana Epidemiológica 36 - 5/9 a 11/9/2021 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; c2021 [cited 2021 Oct 02]. Available from: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/boletins-epidemiologicos/numeros-recentes.
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,77 Li J, He X, Yuan Y, Zhang W, Li X, Zhang Y, et al. Meta-Analysis Investigating the Relationship Between Clinical Features, Outcomes, and Severity of Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2 (SARS-CoV-2) Pneumonia. Am J Infect Control. 2021;49(1):82-9. doi: 10.1016/j.ajic.2020.06.008.
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Diante da alta prevalência das doenças cardiovasculares (DCVs), principalmente entre os idosos e sua associação com o desenvolvimento de quadros graves da doença, Paiva et al.,88 Paiva KM, Hillesheim D, Rech CR, Delevatti RS, Brown RVS, Gonzáles AI, et al. Prevalence and Associated Factors of SARS by Covid-19 in Adults and Aged People with Chronic Cardiovascular Disease. Arq Bras Cardiol. 2021; 117(5):968-975. tiveram como objetivo descrever a prevalência de SRAG por COVID-19 e analisar os fatores associados a essa condição em adultos e idosos com DCV crônica no Brasil até a 30a semana epidemiológica de 2020. Os autores utilizaram dados fornecidos pelo Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe) e incluíram pessoas acima de 18 anos com DCVs hospitalizados com SRAG. Neste estudo, foram incluídos 116 343 pacientes, sendo que 61,9% foram diagnosticados com SRAG por COVID-19. Os autores encontraram características clínicas, sinais e sintomas semelhantes aos descritos na literatura.99 Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RVD, et al. Prevalence of Systemic Arterial Hypertension and Diabetes Mellitus in Individuals with COVID-19: A Retrospective Study of Deaths in Pernambuco, Brazil. Arq Bras Cardiol. 2021;117(2):416-22. doi: 10.36660/abc.20200885.
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Os fatores associados a SRAG por COVID-19 foram febre, tosse, internação em unidade de terapia intensiva, uso de suporte ventilatório invasivo e não invasivo, e infecção nosocomial. Os resultados do estudo apontam maior prevalência de SRAG na faixa etária acima de 60 anos e na região Sudeste do Brasil.

Os resultados de Paiva et al.88 Paiva KM, Hillesheim D, Rech CR, Delevatti RS, Brown RVS, Gonzáles AI, et al. Prevalence and Associated Factors of SARS by Covid-19 in Adults and Aged People with Chronic Cardiovascular Disease. Arq Bras Cardiol. 2021; 117(5):968-975. refletem o que já foi apontado em estudos anteriores.1010 Tavares CAM, Avelino-Silva TJ, Benard G, Cardozo FAM, Fernandes JR, Girardi ACC, et al. ACE2 Expression and Risk Factors for COVID-19 Severity in Patients with Advanced Age. Arq Bras Cardiol. 2020;115(4):701-7. doi: 10.36660/abc.20200487.
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Destaca-se como principal contribuição, os dados de prevalência de SRAG por COVID-19 analisada por cada variável. Observou-se que a maior parte dos casos de SRAG no Nordeste e no Norte foram ocasionados pela COVID-19, um padrão diferente do Sul do país, onde somente 39,9% dos casos foram ocasionados pela COVID-19. Esses resultados demonstram que a prevalência de SRAG por COVID-19 tem um fator regional, refletindo a diferença de acesso ao sistema de saúde e a desigualdade social entre as regiões do Brasil. Um estudo publicado por Baggio et al.,1111 Baggio JAO, Machado MF, Carmo RFD, Armstrong ADC, Santos ADD, Souza CDF. COVID-19 in Brazil: Spatial Risk, Social Vulnerability, Human Development, Clinical Manifestations and Predictors of Mortality - A Retrospective study with Data from 59 695 Individuals. Epidemiol Infect. 2021;149:e100. doi: 10.1017/S0950268821000935.
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em Alagoas, mostrou alta taxa de incidência de COVID-19 nos municípios com os melhores índices de desenvolvimento humano, assim como, nos municípios com alta vulnerabilidade social. Entretanto, as maiores taxas de mortalidade foram observadas nos municípios mais pobres. No norte do país, foram observadas as maiores prevalências de comorbidades em pessoas internadas pela COVID-19, o que explica parcialmente o maior risco de morte nessa região.1212 Andrade CLT, Pereira CCA, Martins M, Lima SML, Portela MC. COVID-19 Hospitalizations in Brazil's Unified Health System (SUS). PLoS One. 2020;15(12):e0243126. doi: 10.1371/journal.pone.0243126.
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,1313 Baqui P, Bica I, Marra V, Ercole A, van der Schaar M. Ethnic and Regional Variations in Hospital Mortality from COVID-19 in Brazil: A Cross-Sectional Observational Study. Lancet Glob Health. 2020;8(8):1018-26. doi: 10.1016/S2214-109X(20)30285-0.
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Somado a isso, precisamos levar em consideração o perfil de morbidade, a infraestrutura de saúde (número de leitos, profissionais capacitados), o acesso aos testes de diagnóstico e o tratamento em UTI com processos qualificados e seguros ao paciente.

A fim de aprimorar a análise realizada pelos autores seria interessante a inclusão dos dados sobre a presença de outras comorbidades, além das DCVs, como nível de atividade física prévia e acompanhamento médico para as DCVs. Além disso, a inclusão de outras comorbidades e o nível de atividade física na análise multivariada, permitiria estabelecer a curva de sobrevivência e mortalidade associado às outras comorbidades, como DM, obesidade, sedentarismo entre outros, as quais são comuns nessa população e possuem um papel importante no desenvolvimento de quadros graves da COVID-19.

  • Minieditorial referente ao artigo: Prevalência e Fatores Associados à SRAG por COVID-19 em Adultos e Idosos com Doença Cardiovascular Crônica

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    Nov 2021
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