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Comparação entre os Efeitos da Ingestão de Sal do Himalaia e de Sal Comum sobre os Valores de Sódio Urinário e Pressão Arterial em Indivíduos Hipertensos

Resumo

Fundamento

O sal do Himalaia (SH) tornou-se uma alternativa popular para o sal de mesa (SM) devido às suas alegações de benefícios à saúde, principalmente para indivíduos com hipertensão arterial. Porém, apesar do aumento do consumo de SH, ainda faltam evidências clínicas que sustentem a recomendação de seu consumo por profissionais de saúde.

Objetivo

Este estudo teve como objetivo comparar o impacto da ingestão de SH e SM sobre a pressão arterial sistólica (PAS), pressão arterial diastólica (PAD) e concentração de sódio urinário em indivíduos com PA.

Métodos

Este estudo recrutou 17 pacientes do sexo feminino com hipertensão arterial que comiam fora de casa no máximo uma vez por semana. Os participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos, para receber e consumir SH ou SM. Antes e depois de cada intervenção, os participantes tiveram sua pressão arterial medida e urina coletada para análise mineral. Um valor de p <0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

Não houve diferenças estatisticamente significativas antes e depois da intervenção SH para PAD (70 mmHg vs. 68,5 mmHg; p = 0,977), PAS (118,5 mmHg vs. 117,5 mmHg; p = 0,932) e concentração urinária de sódio (151 mEq / 24h vs. 159 mEq / 24; p = 0,875). Além disso, a análise entre os grupos não mostrou diferenças significativas após a intervenção em relação a PAS (117 mmHg vs 119 mmHg; p = 0,908), PAD (68,5 mmHg vs 71 mmHg; p = 0,645) ou concentração urinária de sódio (159 mEq / 24h vs 155 mEq / 24h; p = 0,734).

Conclusão

Este estudo sugere que não há diferenças significativas no impacto do consumo de SH em relação ao SM na PA e concentração urinária de sódio em indivíduos com hipertensão arterial.

Pressão Arterial; Hipertensão; Doenças Cardiovasculares; Fatores de Risco; Cloreto de Sódio; Sódio na Dieta; Urinalise

Abstract

Background

The Himalayan salt (HS) has become a popular alternative for the traditional table salt (TS) due to its health benefit claims, particularly for individuals with arterial hypertension. However, despite the increase in HS consumption, there is still a lack of clinical evidence to support a recommendation for its consumption by health professionals.

Objective

This cross-over study aimed to compare the impact of HS and TS intake on systolic blood pressure (SBP) and diastolic blood pressure (DBP), and urinary sodium concentration in individuals with arterial hypertension.

Methods

This study recruited 17 female patients with arterial hypertension who ate out no more than once a week. Participants were randomized into two groups, to receive and consume either HS or TS. Before and after each intervention, participants had their blood pressure measured and urine collected for mineral analysis. A p-value < 0.05 was considered statistically significant.

Results

There were no statistically significant differences before and after the HS intervention for DBP (70mmHg vs. 68.5mmHg; p=0.977), SBP (118.5 mmHg vs. 117.5 mmHg; p= 0.932) and sodium urinary concentration (151 mEq/24h vs. 159 mEq/24; p=0.875). Moreover, the between-group analysis showed no significant differences after the intervention regarding SBP (117mmHg vs 119 mmHg; p=0.908), DBP (68.5 mmHg vs. 71mmHg; p= 0,645) or sodium urinary concentration (159 mEq/24h vs. 155 mEq/24h; p=0.734).

Conclusion

This study suggests that there are no significant differences on the impact of HS consumption compared to TS on blood pressure and sodium urinary concentration in individuals with arterial hypertension.

Blood Pressure; Hypertension; Cardiovascular Diseases; Risk Factors; Sodium Chloride; Sodium Chloride,Dietary; Urinalysis

Introdução

A hipertensão (HTN) é um dos principais fatores de risco para doença cardiovascular (DCV), e afeta mais de 35% da população brasileira acima de 40 anos de idade.11. Malachias M, Souza W, Plavnik F, Rodrigues C, Brandão A, Neves M, et al. 7a Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial (SBC, SBH, SBN, 2016). Arq Bras Cardiol. 2016;107(3):1–103. Já está bem estabelecido que o tratamento da HTN pode reduzir o risco de eventos cardiovasculares e, por isso, essa medida é considerada uma das principais estratégias na saúde pública para o controle das DCVs.

A ingestão de sódio é um fator de risco modificável chave na HTN.22. Sacks F, Svetkey L, Vollmer W, Appel L, Bray G, Harsha D, et al. Effects On Blood Pressure Of Reduced Dietary Sodium And The Dietary Approaches To Stop Hypertension (DASH) diet. J cardiopulm Rehab. 2001;21(3):176. Estudos mostram que uma elevada ingestão de sódio está associada a níveis mais elevados de pressão sanguínea, e uma ingestão baixa ou moderada pode estar associada a níveis mais baixos.22. Sacks F, Svetkey L, Vollmer W, Appel L, Bray G, Harsha D, et al. Effects On Blood Pressure Of Reduced Dietary Sodium And The Dietary Approaches To Stop Hypertension (DASH) diet. J cardiopulm Rehab. 2001;21(3):176.

3. Pimenta E, Gaddam KK, Oparil S, Aban I, Husain S, Dell’Italia LJ, et al. Effects of dietary sodium reduction on blood pressure in subjects with resistant hypertension: Results from a randomized trial. Hypertension. 2009;54(3):475–81.
-44. Graudal N, Hubeck-Graudal T, Jurgens G. Effects of low sodium diet versus high sodium diet on blood pressure , renin , aldosterone , catecholamines , cholesterol , and triglyceride (Review) Summsry revire for main comparison. Cochrane Database of Systematic Review. 2017;(4):1–25. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda atualmente uma ingestão de sódio de 2g por dia;55. World Health Organization.WHO. Guideline : Sodium intake for adults and children. World Health Organization (WHO), Geneva; 2012. contudo, em muitos países, o consumo de sal é mais que o dobro.66. Poirier P, Ph D, Wielgosz A, Ph D, Morrison H, Ph D, et al. Association of Urinary Sodium and Potassium Excretion with Blood Pressure. N Engl J Med. 2014;371(7):601–11. No Brasil, por exemplo, a média de consumo de sódio é de 4,7 gramas por dia, sendo a maioria originária do sal de mesa (SM) e temperos (74,4%).77. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE) Pesquisa de Orçamento Familiar 2008-2009. Rio de Janeiro; 2011.

Nesse contexto, o sal do Himalaia (SH) tornou-se uma alternativa popular para o SM tradicional, particularmente para indivíduos hipertensos. As mídias sociais tornaram-se parte do cenário da saúde pública, sendo usadas para acessar, compartilhar, e espalhar informações médicas, e responsáveis por mudanças recentes no comportamento em saúde. Nesse contexto de consumo excessivo de mídia, alavancado pelo aumento de propagandas de alimentos via mídias sociais, muitos benefícios à saúde foram atribuídos ao SH, sem evidência científica robusta, contribuindo para a moda do SH.88. Centola D. Social Media and the Science of Health Behavior. Circulation. 2013;127(21):2136-44.

Aqueles que defendem o consumo do SH para o controle da HTN baseiam-se no fato de o sal não ser refinado e seus efeitos benéficos. A explicação é que, diferentemente do sal tradicional, o SH reteria uma concentração maior de minerais tais como ferro, magnésio, cálcio, zinco, e potássio, os quais são inversamente associados com valores de pressão arterial.99. Aburto NJ, Hanson S, Gutierrez H, Hooper L, Elliott P, Cappuccio FP. Effect of increased potassium intake on cardiovascular risk factors and disease: Systematic review and meta-analyses. BMJ (Online). 2013;346(7903):1–19.

10. Kolte D, Vijayaraghavan K, Khera S, Sica DA, Frishman WH. Role of Magnesium in Cardiovascular Diseases. Cardiol Rev. 2014;22(4):182–92.
-1111. Livingstone KM, Lovegrove JA, Cockcroft JR, Elwood PC, Janet E, Givens DI, et al. Evidence from the Caerphilly Prospective Study. Hypertension. 2013; 61:42-7.

Apesar do aumento no consumo do SH e seus supostos benefícios à saúde, ainda há pouca evidência científica que apoiem recomendações clínicas por profissionais da saúde. Assim, o presente estudo teve como objetivo comparar o impacto do SH e do SM sobre a pressão arterial, e sobre concentrações urinárias de sódio e potássio de indivíduos com hipertensão arterial.

Métodos

Delineamento do estudo

Este estudo foi um ensaio randomizado do tipo crossover que comparou os efeitos da ingestão de SH e de SM sobre as concentrações de sódio urinário e da pressão sanguínea de indivíduos hipertensos. Foram recrutadas mulheres hipertensas com idade entre 40 e 65 anos de idade a partir de um serviço multidisciplinar para o manejo da HTN. Os critérios de inclusão foram: residir em uma região metropolitana de uma cidade brasileira, sem mudanças no tratamento medicamentoso para HTN por no mínimo 60 dias.

Os cálculos foram baseados em dados prévios sobre os efeitos da redução da ingestão de sódio sobre a pressão arterial.33. Pimenta E, Gaddam KK, Oparil S, Aban I, Husain S, Dell’Italia LJ, et al. Effects of dietary sodium reduction on blood pressure in subjects with resistant hypertension: Results from a randomized trial. Hypertension. 2009;54(3):475–81. O tamanho amostral foi calculado para comparação das médias, considerando um tamanho do efeito de 1,56,33. Pimenta E, Gaddam KK, Oparil S, Aban I, Husain S, Dell’Italia LJ, et al. Effects of dietary sodium reduction on blood pressure in subjects with resistant hypertension: Results from a randomized trial. Hypertension. 2009;54(3):475–81. alfa de 0,05 e poder do teste (1-β) de 90%, e o resultado foi de 10 participantes em cada grupo.

Foram excluídos pacientes com insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral nos últimos seis meses, infarto agudo do miocárdio nos últimos três meses, diabetes mellitus não controlada (hemoglobina glicada acima de 8%), doença hepática, hipotiroidismo, doença renal crônica, doenças psiquiátricas não estabilizadas, usuários de drogas ilícitas, e alcóolatras, bem como pacientes que, mais que uma vez por semana, preparavam suas refeições utilizando um sal diferente daquele fornecido no estudo.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital das Clínicas de uma universidade brasileira (069428/2017), e todos os pacientes assinaram o termo de consentimento. O estudo foi conduzido seguindo a Resolução número 446 de 2012.1212. Brasil.Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução no 466, de 12 de dezembro de 2012, que trata sobre as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União [Internet]. 2012 [cited 2016 Nov 21];12:59. Available from: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/...

Antes e após cada intervenção (SH e SM), os participantes compareceram a duas visitas, com um intervalo de 3-4 dias entre elas, conduzidas pelo mesmo pesquisador. Antes do início da intervenção, exames bioquímicos foram solicitados aos participantes que não possuíam registros de exames recentes, e medidas antropométricas (peso, altura, e circunferência da cintura), e características demográficas foram coletadas de todos os participantes incluídos no estudo. Na primeira visita, os participantes foram aleatoriamente alocados a utilizar SH ou SM (Figura 1). Após quatro semanas de intervenção, e mais duas semanas livres (washout), os participantes foram passaram a receber o sal alternativo por mais quatro semanas de intervenção. Durante o período de washout, os participantes foram orientados a manter sua dieta usual e consumirem o sal a que estavam habituados.

Figura 1
Fluxograma da randomização dos pacientes.

Ainda, antes e após cada intervenção, foi fornecido a cada participante um aparelho de pressão arterial para a realização das medidas, bem como um frasco coletor de urina para a coleta de urina em 24 horas. Após três a quatro dias, os participantes retornaram ao centro de pesquisa com o aparelho de pressão e a urina coletada.

Composição do sal

Nós analisamos nove amostras de SH e três amostras do SM obtidas de mercados de uma região metropolitana no Brasil, para verificar a iodação e concentração de minerais. Todas as amostras analisadas foram fortificadas com iodo.

A marca de SH cujo teor de sódio foi o mais próximo da média obtida de todas as amostras de SH foi escolhida para a intervenção (SH da Intervenção: 371,92 mg de sódio/g, 1,8 mg de potássio/g, 1,7 de magnésio/g, e 25,1 mcg de iodo/g), e a marca de SM escolhida foi a mais popular e comumente consumida pela população brasileira (SM da Intervenção: 435,93 mg de sódio/g; 0,37 mg de potássio/g; 1,42 de magnésio/g; e 150 mcg de iodo/g).

Composição dos alimentos

O consumo alimentar foi avaliado por um registro alimentar de três dias aplicado durante ambas as fases de intervenção para analisar o consumo de minerais que poderiam afetar a pressão arterial, tais como cálcio, magnésio, potássio e sódio. Os dados foram analisados utilizando-se o programa Dietbox®, baseado nas tabelas de composição de alimentos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1313. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2008-2009 : tabelas de composição nutricional dos alimentos consumidos no Brasil / Rio de Janeiro; 2011. e Tucunduva,1414. Philippi ST. Tabela de composição de alimentos: suporte para decisão nutricional. 6a ed. Barueri (SP);Manole; 2017.sendo que a segunda foi usada somente na ausência de um alimento específico nas tabelas do IBGE.1313. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2008-2009 : tabelas de composição nutricional dos alimentos consumidos no Brasil / Rio de Janeiro; 2011.

Análises de urina

Cada participante recebeu um frasco de 2 litros para coleta de urina 24 horas, e foi instruído tanto verbalmente como por escrito, para coletarem uma amostra de urina de 24 horas. A primeira urina do dia foi descartada, e todas as outras ao longo do dia foram coletadas até a primeira urina da manhã seguinte, que foi incluída, aproximadamente à mesma hora da primeira urina do dia anterior. A urina foi analisada no laboratório da Universidade Federal de Goiás usando uma técnica de membrana não seletiva.1515. Oesch U, Ammann D, Simon W. Ion-Selective Membrane Electrodesfor Clinical Use. Clin Chem.1986;1459(8):1448–59.

Análise da Pressão arterial

As medidas de pressão arterial sistólica (PAS) e a pressão arterial diastólica (PAD) foram obtidas utilizando-se um aparelho digital semiautomático (OMRON 705 CPINT, Illinois, EUA), seguindo a 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial.11. Malachias M, Souza W, Plavnik F, Rodrigues C, Brandão A, Neves M, et al. 7a Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial (SBC, SBH, SBN, 2016). Arq Bras Cardiol. 2016;107(3):1–103. Todos os pacientes realizaram monitorização residencial da pressão arterial (MRPA), seguindo a 4ª Diretriz Brasileira para MRPA.1616. Sociedade Brasileira de Cardiologia V diretrizes de monitorização ambulatorial da pressão arterial (mapa) e III diretrizes de monitorização residencial da pressão arterial (mrpa). Arq Bras Cardiol. 2011;97(3):1-23. Os participantes foram instruídos a realizarem medidas de 24 horas, três pela manhã e três à tarde, por quatro dias. Os testes foram considerados válidos se o mínimo de 15 medidas corretas fosse realizado durante o período.

Uso de sal

Os participantes receberam de um a dois quilos (dependendo da média de consumo familiar mensal) de SH ou de SM, de acordo com o grupo em que foi alocado. Após o período de washout, os participantes receberam a mesma quantidade do outro sal.

Os participantes foram orientados a usarem somente o sal fornecido durante a intervenção, e a devolverem o sal remanescente ao centro de pesquisa no final do período de intervenção, para se estimar o consumo médio por pessoa.

Análise estatística

As análises estatísticas foram realizadas usando o programa SPSS para Windows, versão 20. A normalidade da distribuição dos dados foi testada usando o teste de Kolmogorov-Smirnov, que mostrou que os dados não tinham distribuição normal. Diferenças entre o momento basal e o pós-intervenção em cada grupo foram determinadas pelo teste de Wilcoxon para variáveis não paramétricas. As análises entre os grupos foram realizadas usando o teste de Mann-Whitney para variáveis não paramétricas. A ingestão de sal também foi dividida pela densidade total do nutriente, e as diferenças de ingestão entre os grupos analisadas pelo teste de Mann-Whitney. A estatística descritiva foi usada para todas as variáveis; as variáveis contínuas foram apresentadas como mediana e intervalo interquartil, e as variáveis categóricas como frequência e porcentagem.

A diferença entre os grupos foi testada pela análise por intenção de tratar e por protocolo e, uma vez que não houve diferenças entre as duas análises, somente a análise por protocolo é apresentada no estudo. Um valor de p <0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

Dos 44 pacientes elegíveis, 25 concordaram em participar; sete deles não compareceram na primeira visita e, assim, 18 participantes entraram no estudo. Devido a razões pessoais, dois participantes desistiram antes do início do estudo, e 17 participantes completaram ao menos uma das intervenções. Dos 17 participantes analisados, 14 participaram dos dois braços de intervenção, um somente da intervenção com SM, e dois somente da intervenção com SH, devido a motivos pessoais (Figura 1). Nós analisamos 14 participantes, uma vez que não houve diferença entre a análise por intenção de tratar e por protocolo.

Medidas antropométricas e características demográficas estão descritas na Tabela 1.

Tabela 1
– Características antropométricas dos participantes do estudo (n=17)

A ingestão mediana de sal por pessoa durante as intervenções com SH e SM foi 6,37g e 5,98 g, respectivamente, sem diferença significativa (p=0,808). A duração mediana da intervenção foi 35 dias em ambos os grupos.

Os valores de pressão arterial e concentrações de minerais na urina não foram significativamente diferentes após as intervenções em comparação ao momento anterior à intervenção (Tabelas 2 e 3).

Tabela 2
– Pressão arterial, e concentrações urinárias de sódio, potássio, e cálcio antes e após a intervenção com sal do Himalaia (n=15)
Tabela 3
– Pressão arterial, e concentrações urinárias de sódio, potássio, e cálcio antes e após a intervenção com sal de mesa (n=16)

A análise dos registros alimentares não mostrou diferença significativa na ingestão de sódio, cálcio, magnésio e potássio entre as intervenções SH e SM (Tabela 4). Ainda, a análise entre grupos não evidenciou diferenças significativas na pressão arterial ou concentração de minerais entre SH ou SM antes e após a intervenção (Figuras 2 e 3).

Tabela 4
– Comparação da ingestão mediana de sódio, potássio, magnésio e cálcio dos participantes submetidos à intervenção com sal do Himalaia e à intervenção com sal de mesa (n=14)

Figura 2
Comparação dos valores de pressão arterial sistólica (PAS) e pressão arterial diastólica (PAD) entre os grupos submetidos à intervenção com sal do Himalaia (SH) e sal de mesa (SM) antes e após as intervenções.1 (n=14)

Figura 3
Comparação de sódio (Na), cálcio (Ca), e potássio (K) entre os grupos submetidos à intervenção com sal do Himalaia (SH) e sal de mesa (SM) antes e após as intervenções (n=14) Teste de Mann- Whitney.

Discussão

Em nosso conhecimento, este é o primeiro estudo a investigar os efeitos da ingestão de SH sobre a pressão arterial e concentrações de minerais na urina. Os resultados sugeriram que não houve diferenças significativas intragrupo ou entre grupos antes e após as intervenções.

Em nosso estudo, após ambas as intervenções, não foram observadas alterações significativas na pressão arterial. O SH fornecido aos participantes continha 64,01 mg menos sódio por grama de sal que o SM fornecido. Considerando a média de consumo de sal em cada grupo, a média de ingestão de sódio a partir de SH foi de 2268 mg e de SM 2506 mg por dia. Portanto, a diferença média na ingestão de sódio foi 238 mg por dia, uma redução muito pequena que pode explicar a falta de significância estatística. Drake et al.1717. Drake SL, Drake MA. Comparison of salty taste and time intensity of sea and land salts from around the world. J Sensory Stud. 2011;26(1):25–34. também analisaram a composição do SH e o SM e não encontraram diferenças significativas na concentração de sódio (3,68 x 105 versus 3,81x 105 ppm, respectivamente).1717. Drake SL, Drake MA. Comparison of salty taste and time intensity of sea and land salts from around the world. J Sensory Stud. 2011;26(1):25–34.

Barros et al.1818. de Almeida Barros CL, Sousa ALL, Chinem BM, Rodrigues RB, Jardim TSV, Carneiro SB, et al. Impacto da substituição de sal comum por sal light sobre a pressão arterial de pacientes hipertensos. Arq Bras Cardiol. 2014;104(2):128–35. encontraram diferenças significativas na pressão arterial após a substituição do sal tradicional por sal light. No entanto, o sal light possui 260 mg menos sódio por grama de sal, resultando assim em uma redução maior na ingestão de sódio em comparação ao SH.1818. de Almeida Barros CL, Sousa ALL, Chinem BM, Rodrigues RB, Jardim TSV, Carneiro SB, et al. Impacto da substituição de sal comum por sal light sobre a pressão arterial de pacientes hipertensos. Arq Bras Cardiol. 2014;104(2):128–35. No entanto, Arantes et al.1919. Arantes AC, Ana Luiza Lima Sousa PV de OV, Jardim PCBV, Jardim T de SV, Rezende JM, Lelis E de S, et al. Effects of added salt reduction on central and peripheral blood pressure. Arq Bras Cardiol. 2020;114(3):554–61. analisaram o efeito da redução da ingestão de sódio (6g-4g) sobre a pressão arterial e concentração urinária de sódio em indivíduos hipertensos. Seus resultados estavam de acordo com os nossos; reduções na ingestão de sódio não foram associadas com mudanças significativas na pressão sanguínea.1919. Arantes AC, Ana Luiza Lima Sousa PV de OV, Jardim PCBV, Jardim T de SV, Rezende JM, Lelis E de S, et al. Effects of added salt reduction on central and peripheral blood pressure. Arq Bras Cardiol. 2020;114(3):554–61.

De acordo com a OMS55. World Health Organization.WHO. Guideline : Sodium intake for adults and children. World Health Organization (WHO), Geneva; 2012. e He et al.,2020. He F, Li J, Macgregor G. Effect of longer term modest salt reduction on blood pressure : Cochrane systematic review and meta-analysis of randomised trials. BMJ (Online). 2013;1325(April):1–15. há uma redução na PAS e na PAD após uma redução na ingestão de sódio da quantidade usualmente consumida pela população, 11 gramas por dia, para o valor recomendado, 5-6 gramas por dia.55. World Health Organization.WHO. Guideline : Sodium intake for adults and children. World Health Organization (WHO), Geneva; 2012.,2020. He F, Li J, Macgregor G. Effect of longer term modest salt reduction on blood pressure : Cochrane systematic review and meta-analysis of randomised trials. BMJ (Online). 2013;1325(April):1–15. A ingestão de sódio, estimada pelo método de coleta de urina de 24 horas, foi 3,47 g após a intervenção com SH, e 3,65 após a intervenção com SM. Assim, independentemente do tipo de sal usado, o consumo foi maior que o recomendado pela OMS.55. World Health Organization.WHO. Guideline : Sodium intake for adults and children. World Health Organization (WHO), Geneva; 2012. Apesar de o delineamento do estudo não haver nos permitido acompanhar cada participante e garantir o uso correto de sal, a quantidade média de sal usada por pessoa não pôde explicar a concentração de sódio observada na urina. Nossa hipótese é a de que a ingestão excessiva de sódio deve-se ao consumo de alimentos ultraprocessados, os quais não foram considerados nesta análise. Arantes et al.1919. Arantes AC, Ana Luiza Lima Sousa PV de OV, Jardim PCBV, Jardim T de SV, Rezende JM, Lelis E de S, et al. Effects of added salt reduction on central and peripheral blood pressure. Arq Bras Cardiol. 2020;114(3):554–61. também sugerem que a falta de controle sobre o consumo de alimentos processados e refeições feitas fora de casa provavelmente interfere nos valores de excreção urinária de sódio e pressão arterial.

Ainda, a ingestão aumentada de sódio observada pode estar relacionada a características da amostra, isto é, indivíduos hipertensos, que possivelmente preferem e consomem mais sal que indivíduos normotensos.2121. Villela PTM, De-Oliveira EB, Villela PTM, Bonardi JM, Moriguti JC, Ferriolli E, et al. A Preferência ao Sal está Relacionada à Hipertensão e não ao Envelhecimento. Arq Bras Cardiol. 2019;113(3):392-9.

Apesar da maior concentração de potássio no SH, o grupo que recebeu esse sal não mostrou concentrações mais altas de potássio urinário ou redução significativa na pressão arterial. Esse resultado corrobora o estudo de Barros et al.1616. Sociedade Brasileira de Cardiologia V diretrizes de monitorização ambulatorial da pressão arterial (mapa) e III diretrizes de monitorização residencial da pressão arterial (mrpa). Arq Bras Cardiol. 2011;97(3):1-23. que não mostrou influência da concentração de potássio do sal light na redução da pressão arterial em indivíduos hipertensos. Uma possível razão para essa controvérsia poderia ser que a recomendação de ingestão de potássio para melhorar a pressão arterial é de 4700 mg, um valor superior que o encontrado no SH.2222. World Health Organization. WHO. Guideline: Potassium intake for adults and children. Geneva; 2012. Assim, a ingestão de potássio deveria ser encorajada por fontes alimentares, tais como verduras e frutas.

Além da ausência de diferenças significativas observada nos parâmetros clínicos entre o consumo de SH e SM, é importante notar que o SH custa até 30 vezes mais que o SM.

Este estudo apresenta algumas limitações, tais como o pequeno tamanho amostral, e a impossibilidade se de controlar a ingestão alimentar dos participantes durante o estudo. Além disso, a ingestão individual de sal pode ter sido superestimada ou subestimada pelo método usado. Ainda, a variabilidade da sensibilidade individual ao sódio não foi medida e, portanto, poderia ser uma limitação. No entanto, nossos achados destacam a necessidade de práticas com base em evidências por parte de profissionais da saúde, uma vez que nem todos os benefícios anunciados nos rótulos foram comprovados cientificamente. Mais estudos são necessários para confirmar nossos achados.

Conclusão

Não houve diferenças significativas na pressão arterial ou na excreção urinária de sódio quando comparadas antes e após as intervenções, ou entre os grupos que receberam SH e SM. Assim, o estudo mostrou que a substituição de SH por SM não foi uma medida eficaz para melhorar os parâmetros de pressão arterial. Mudanças no estilo de vida, incluindo redução na ingestão de sal, e prática regular de atividade física, são ainda as melhores estratégias no controle da hipertensão. Existe uma clara necessidade de mais estudos controlados randomizados, incluindo uma amostra maior, para investigar o impacto do consumo do SH sobre a saúde.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer a Fundação de Amparo à Pesquisa do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás pelo apoio financeiro, e ao professor Paulo Sergio de Souza, da Universidade Federal de Goiás, por conduzir a análise química dos sais usados neste estudo.

Referências

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  • Vinculação acadêmica
    Este artigo é parte de dissertação de mestrado de Isabela Pires Loyola pela Universidade Federal de Goiás.
  • Fontes de financiamento: O presente estudo foi parcialmente financiado pela CAPES.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    Maio 2022

Histórico

  • Recebido
    08 Jun 2020
  • Revisado
    07 Maio 2021
  • Aceito
    16 Jun 2021
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