A Forma Correta de Identificar a Má Aptidão Cardiorrespiratória: Olhar Para a Direita

Disfunção Ventrículo Direito; Aptidão Cardiorespiratória; Infarto do Miocárdio; Reabilitação Cardíaca; Teste de Esforço/métodos; Ecocardiografia Doppler/métodos

O ventrículo direito (VD), anteriormente conhecido como ventrículo esquecido, vem ganhando cada vez mais atenção como forte indicador de pior prognóstico em doenças cardíacas.¹,² Além das implicações prognósticas, a disfunção do VD está associada à pior aptidão cardiorrespiratória (ACR), independentemente de outras variáveis anatômicas e funcionais.³,⁴ Infelizmente, as estratégias atuais de tratamento para a insuficiência do VD não conferem os mesmos benefícios clínicos e prognósticos da insuficiência do ventrículo esquerdo (VE),⁵,⁶ o que justifica novas estratégias de tratamento.

Ramirez et al.,⁷ acessaram esse importante tópico estudando a função do VD em 109 pacientes com infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST), sua associação com ACR e sua melhora após reabilitação cardíaca (RC) em um centro em Monterrey, México. Seu objetivo principal foi avaliar a associação entre a função do VD e a ACR nesta população, e os objetivos secundários foram analisar a ACR antes e depois de um programa de RC em pacientes com ou sem disfunção do VD. A tolerância ao exercício foi avaliada através do teste de esforço cardiopulmonar, a função longitudinal do VD por meio da medida ecocardiográfica da onda S’ Doppler do anel tricúspide e da excursão sistólica do plano do anel tricúspide e a função radial do VD por meio da variação da área fracionada do VD. A população era predominantemente do sexo masculino (83%), com IAMCSST da parede anterior (55%), com mediana da fração de ejeção do VE de 49% e com função normal do VD (90%). Eles demonstraram associação e correlação entre disfunção radial e longitudinal do VD e ACR antes e depois da RC. O principal achado do estudo é que a disfunção do VD, seja radial ou longitudinal, após IAMCSST e antes da RC, foi associada à ausência na melhora de pelo menos 1 Equivalente Metabólico (MET) após um programa de RC (p = 0,028 para disfunção radial do VD e p = 0,008 para disfunção longitudinal do VD). Os autores concluíram que a disfunção do VD em pacientes com IAMCSST está associada e correlacionada com pior capacidade de exercício e classe funcional antes da RC e que a RC melhorou a ACR. Isto ajuda a identificar um subgrupo de pacientes com maior risco de serem sintomáticos, com pior prognóstico e possivelmente melhores candidatos à RC.

O estudo de Ramirez et al.,⁷ merece alguns comentários. Primeiro, a amostra é pequena, especialmente de pacientes com disfunção do VD, o que poderia limitar compreensão real da associação da disfunção do VD e da ACR após IAMCSST. Em segundo lugar, as conclusões foram sem uma análise multivariada: existem variáveis concorrentes, como a função do VE, que também estão associadas à ACR, e não poderíamos concluir com precisão se apenas a disfunção do VD poderia explicar a má ACR e a ausência de melhora após a RC independentemente de outros fatores. Terceiro, mais recentemente, a deformação longitudinal (strain) da parede livre do VD é considerada uma variável superior na avaliação da disfunção do VD devido à sua capacidade de detectar disfunção precoce do VD e com menor variabilidade inter e intraobservador.²,⁸ A avaliação da disfunção do VD com este método ecocardiográfico poderia influenciar as conclusões.

De fato, algumas limitações poderiam dificultar a interpretação e aplicação das conclusões destes autores. No entanto, os resultados estão alinhados com outros estudos que confirmam a importância da função do VD nas doenças cardíacas e o impacto combinado da disfunção do VD e da ACR.²,⁹

Pesquisas futuras nesta área deveriam incluir a avaliação combinada do teste de exercício cardiopulmonar e da ecocardiografia para melhor compreender a fisiopatologia da disfunção do VD na limitação do exercício e outros mecanismos concorrentes que poderiam explicar uma pior ACR¹⁰ para reconhecer e tratar esta população adequadamente.

Referências

• ¹
  Pueschner A, Chattranukulchai P, Heitner JF, Shah DJ, Hayes B, Rehwald W, et al. The Prevalence, Correlates, and Impact on Cardiac Mortality of Right Ventricular Dysfunction in Nonischemic Cardiomyopathy. JACC Cardiovasc Imaging. 2017 Oct;10(10 Pt B):1225–36. doi: 10.1016/j.jcmg.2017.06.013
  » https://doi.org/10.1016/j.jcmg.2017.06.013
• ²
  Menegazzo WR, Santos AB, Foppa M, Scolari FL, Barros FC, Stein R, et al. Prognostic value of right ventricular strain and peak oxygen consumption in heart failure with reduced ejection fraction. Int J Cardiovasc Imaging. 2023;39(3):501–9. doi: 10.1007/s10554-022-02747-0
• ³
  Baker BJ, Wilen MM, Boyd CM, Dinh H, Franciosa JA. Relation of right ventricular ejection fraction to exercise capacity in chronic left ventricular failure. Am J Cardiol. 1984;54(6):596–9. doi: 10.1016/0002-9149(84)90256-x
  » https://doi.org/10.1016/0002-9149(84)90256-x
• ⁴
  Groote P, Millaire A, Hossein C, Nugue O, Marchandise X, Ducloux G, et al. Right ventricular ejection fraction is an independent predictor of survival in patients with moderate heart failure. J Am Coll Cardiol. 1998;32(4):948–54. doi: 10.1016/s0735-1097(98)00337-4
  » https://doi.org/10.1016/s0735-1097(98)00337-4
• ⁵
  Houston BA, Brittain EL, Tedford RJ. Right Ventricular Failure. N Engl J Med. 2023;388(12):1111–25. doi: 10.1056/NEJMra2207410
• ⁶
  Harada D, Asanoi H, Noto T, Takagawa J. The impact of right ventricular dysfunction on the effectiveness of beta-blockers in heart failure with preserved ejection fraction. J Cardiol. 2020;76(4):325–34. doi: 10.1016/j.jjcc.2020.05.001
  » https://doi.org/10.1016/j.jjcc.2020.05.001
• ⁷
  Guzman-Ramirez D, Trujillo-Garcia A, Lopez-Rincon M, Lopez RB. Right Ventricular Function and Exercise Tolerance in Patients with ST-Elevation Myocardial Infarction. Arq Bras Cardiol. 2023; 120(9):e20220799. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20220799
  » https://doi.org/10.36660/abc.20220799
• ⁸
  Carluccio E, Biagioli P, Alunni G, Murrone A, Zuchi C, Coiro S, et al. Prognostic Value of Right Ventricular Dysfunction in Heart Failure With Reduced Ejection Fraction: Superiority of Longitudinal Strain Over Tricuspid Annular Plane Systolic Excursion. Circ Cardiovasc Imaging. 2018;11(1):e006894. doi: 10.1161/CIRCIMAGING.117.006894
  » https://doi.org/10.1161/CIRCIMAGING.117.006894
• ⁹
  Di Salvo TG, Mathier M, Semigran MJ, Dec GW. Preserved right ventricular ejection fraction predicts exercise capacity and survival in advanced heart failure. J Am Coll Cardiol. 1995;25(5):1143–53. doi: 10.1016/0735-1097(94)00511-n
  » https://doi.org/10.1016/0735-1097(94)00511-n
• ¹⁰
  Verwerft J, Bertrand PB, Claessen G, Herbots L, Verbrugge FH. Cardiopulmonary Exercise Testing With Simultaneous Echocardiography: Blueprints of a Dyspnea Clinic for Suspected HFpEF. JACC Heart Fail. 2023;11(2):243-9. doi: 10.1016/j.jchf.2022.11.004
  » https://doi.org/10.1016/j.jchf.2022.11.004

• Minieditorial referente ao artigo: Função Ventricular Direita e Tolerância ao Exercício em Pacientes com Infarto Agudo do Miocárdio com Supradesnivelamento do Segmento ST

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  27 Out 2023
• Data do Fascículo
  Out 2023

Histórico

• Recebido
  06 Set 2023
• Revisado
  13 Set 2023
• Aceito
  13 Set 2023