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A enfermagem frente a acidentes de trabalho com material potencialmente contaminado na era do HIV

The nursing team and occupational accidents with potentially contaminated material in the era of HIV

Resumos

Realizou-se esta investigação, com os objetivos de identificar a ocorrência de acidentes de trabalho com material pérfuro-cortante potencialmente contaminado, entre enfermeiros e auxiliares de enfermagem de um Hospital de ensino geral do interior do Estado de São Paulo; relacionar a ocorrência destes acidentes com a categoria profissional e anos de trabalho na instituição; identificar o tipo de material pérfuro-cortante causador do acidente e identificar as condutas tomadas após o acidente, pelo acidentado. Para a coleta de dados, através de entrevista individual, utilizou-se um formulário estruturado onde registrava-se, a causa atribuída ao acidente, o período de atuação do profissional acidentado, o objeto causador, a conduta tomada após o acidente. Evidenciou-se que as Precauções Padrão ou as antigas Precauções Universais não são utilizadas como deveriam, conferindo portanto, risco à equipe de enfermagem. Considera-se que esta equipe necessita de orientações específicas através de educação continuada sobre o assunto.

Risco Ocupacional; HIV; Precauções Padrão; Acidentes pérfuro-cortantes


This investigation was carried out in order to: identify the occurrence of professional accidents with perforate cutting potentially contaminated material among nurses and nursing auxiliaries that work in a general teaching hospital in the interior of the state of São Paulo. The other objectives were: to associate the occurrence of accident with the professional category and period of work; to identify the type of perforate cutting material most involved in accidents, to identily the attitudes taken by the person accidented. The data were collected on individual interview based on a structured formulary in which the following information was registered: the probable reason of accident, how long the professional has been working on such function, the material involved in the accident, the actions taken after the accident. It was evidenced that the Standard Precautions or the Universal Precautions as they used used to be nominated are not being used as they should be. Such attitude brings risks to the nursing team. We think that this team needs specific orientations through continuing education concerning the theme.

Occupational risk; HIV; Standard precautions; Perforate cutting accidents


ARTIGOS ORIGINAIS

A enfermagem frente a acidentes de trabalho com material potencialmente contaminado na era do HIV* * Trabalho inserido no Projeto Integrado - CNPq (Processo Nº 522182/ 94-1)

The nursing team and occupational accidents with potentially contaminated material in the era of HIV

Elucir GirI; Fabiana Prado Potiens CostaII; Adriana Maria da SilvaIII

IEnfermeira, Professor Associado junto a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - USP

IIEnfermeira junto ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP. Bolsista de Iniciação Científica, junto ao CNPq

IIIEnfermeira junto ao Hospital Beneficência Portuguesa e Hospital São Paulo, Ex Bolsista de Iniciação cientifica junto ao CNPq

RESUMO

Realizou-se esta investigação, com os objetivos de identificar a ocorrência de acidentes de trabalho com material pérfuro-cortante potencialmente contaminado, entre enfermeiros e auxiliares de enfermagem de um Hospital de ensino geral do interior do Estado de São Paulo; relacionar a ocorrência destes acidentes com a categoria profissional e anos de trabalho na instituição; identificar o tipo de material pérfuro-cortante causador do acidente e identificar as condutas tomadas após o acidente, pelo acidentado. Para a coleta de dados, através de entrevista individual, utilizou-se um formulário estruturado onde registrava-se, a causa atribuída ao acidente, o período de atuação do profissional acidentado, o objeto causador, a conduta tomada após o acidente. Evidenciou-se que as Precauções Padrão ou as antigas Precauções Universais não são utilizadas como deveriam, conferindo portanto, risco à equipe de enfermagem. Considera-se que esta equipe necessita de orientações específicas através de educação continuada sobre o assunto.

Unitermos: Risco Ocupacional, HIV/ AIDS, Precauções Padrão. Acidentes pérfuro-cortantes,

ABSTRACT

This investigation was carried out in order to: identify the occurrence of professional accidents with perforate cutting potentially contaminated material among nurses and nursing auxiliaries that work in a general teaching hospital in the interior of the state of São Paulo. The other objectives were: to associate the occurrence of accident with the professional category and period of work; to identify the type of perforate cutting material most involved in accidents, to identily the attitudes taken by the person accidented. The data were collected on individual interview based on a structured formulary in which the following information was registered: the probable reason of accident, how long the professional has been working on such function, the material involved in the accident, the actions taken after the accident. It was evidenced that the Standard Precautions or the Universal Precautions as they used used to be nominated are not being used as they should be. Such attitude brings risks to the nursing team. We think that this team needs specific orientations through continuing education concerning the theme.

Uniterms: Occupational risk, HIV/AIDS. Standard precautions. Perforate cutting accidents.

INTRODUÇÃO

Paralelamente ao surgimento da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) entre pessoas com fatores de risco determinados, foram sendo diagnosticados casos entre profissionais da saúde, isentos de fatores de risco na vida pessoal, ou seja não apresentavam comportamentos sexuais inseguros, e nem tinham sido expostos a fatores que envolviam a via sanguínea ou transmissão vertical. Esses profissionais tinham sido expostos apenas ocupacionalmente a sangue de pacientes infectados (NEEDLESTICh, 1984; CDC, 1987a).

Esta infecção conseqüente a riscos através de atividade ocupacional suscitou muitas inquietações, a ponto dos Centers for Disease Control preconizarem recomendações específicas acerca da transmissão do HIV em estabelecimentos de assistência à saúde (CDC, 1987b).

Embora considerável progresso tenha sido observado sobre o entendimento do risco ocupacional e HIV, conforme apontam MARCUS; BELL (1997), os profissionais da saúde e principalmente os trabalhadores da enfermagem, têm enfrentado desafios diversos, como por exemplo a resistência a utilização de Equipamentos de Proteção Individual, à subestimação do risco em se infectar.

O indicativo da infectividade via ocupacional,embora seja baixo, não isenta os trabalhadores da enfermagem de medos, angústias, inquietações, mesmo porque dentre os profissionais da saúde, os da enfermagem são um dos grupos que mais se expõe a situações de riscos. Esta observação pôde ser constatada em (MACHADO et al. 1992 e CDC 1994),

Os primeiros autores estudaram 36 funcionários que foram vítimas de acidentes de trabalho por material potencialmente contaminado pelo HIV. Os referidos acidentes foram notificados no período de 1987 a 1990, em Ribeirão Preto - SP. Dos acidentados, 19 (52,78%) eram auxiliares de enfermagem e 7 (19,45%) eram enfermeiros, Após seguimento clínico e sorológico, nenhuma soroconversão ocorreu.

Os CDC (1994) receberam até dezembro de 1994 a notificação de 42 casos de transmissão ocupacional documentada, dos quais 13 (30,95%) foram entre enfermeiros.

A prática de enfermagem precisa continuar cada vez mais tendo como alvo um cuidar humanístico, porém norteado por normas que visam à implementação de medidas preventivas que protejam o profissional. Nesse sentido, considerando-se que a produção de conhecimentos gerados na década de 80 era muito intensa, ou seja as descobertas sobre o comportamento do HIV e sua evolução eram freqüentes, as precauções estabelecidas foram submetidas a varias revisões pelos CDC, sendo a última denominada de precauções padrão, conforme refere (GARNER, 1996).

Essas precauções são medidas profiláticas, que devem ser empregadas por todos que lidam ou têm contato com pacientes, independente do diagnóstico ou estado presumido de infecção, Aplicam-se não só ao sangue, bem como a todos fluidos corpóreos, secreção, excreções, pele não intacta, mucosa, contendo ou não sangue visível.

As precauções padrão consiste em:

• Lavagem das mãos antes e após o contato com o paciente e entre diferentes procedimentos no mesmo paciente, após o contato com sangue e outros fluidos corpóreos, equipamentos ou artigos contaminados, e após a remoção das luvas.

• Uso de luvas para prover uma barreira protetora e prevenir contaminação das mãos ao contato com sangue e outras feridas corpóreas.

• Uso de aventais limpos, não estéreis, para proteger roupas e superfícies corporais, sempre que for prevista contaminação com sangue e outros fluidos corporais.

• Uso de máscara e protetor ocular, visando à proteção respectivamente do nariz e boca e olhos durante procedimentos e situações com pacientes onde é provável gerar jatos, respingos, etc, de fluidos corporais.

• Proteção contra objetos pérfuro-cortantes, no sentido de não reencapá-los após o uso, descartá-los em recipiente de paredes duras, próprio para o descarte e localizado o mais próximo possível do leito, não desconectar agulha da seringa para desprezar.

• Equipamentos utilizados na prestação de cuidados aos pacientes, que contenham sangue e outros líquidos corporais, devem ser manuseados com cuidados e sua utilização em outro paciente deve ser precedida de limpeza e/ou desinfecção.

Não obstante o risco seja baixo e já existam recomendações quimioprofiláticas para casos de exposições ocupacionais ao HIV (CDC, 1996), o profissional deve precaver-se de riscos advindos de fatores institucionais ou pessoais, tais como negligência, desinformação, tabus. Ao estabelecimento de normas devem ser acrescentados fatores fundamentais para efetivarem a proteção dos profissionais, a saber: bom senso, conscientização, adequadas condições de trabalho, disponibilidade de equipamento de proteção individual, A educação continuada é uma estratégia importante para o alcance desses requisitos.

Consequentemente, situações indesejáveis para o paciente, como assistência inadequada norteada porpreconceitos, desinformação, medos, bem como situações onde haja maior exposição aos riscos ocupacionais para o profissional de saúde, podem ser evitados.

Frente ao exposto, propôs-se realizar este trabalho tendo como objetivos:

1. identificar a ocorrência de acidentes de trabalho com material pérfuro-cortante potencialmente contaminado entre enfermeiros e auxiliares de enfermagem;

2. relacionar a ocorrência (lestes acidentes com a categoria profissional e anos de trabalho na instituição;

3. identificar o tipo de material pérfuro cortante que causou o acidente;

4. identificar as condutas tomadas após o acidente, pelo acidentado.

MATERIAL E MÉTODO

Dos 234 enfermeiros e 610 auxiliares de enfermagem lotados em um Hospital geral, de ensino do Estado de São Paulo, no ano de 1996, 80 (34,19%) enfermeiros e 80 (13,11 %) auxiliares de enfermagem que trabalham nas Unidades de Internação de Clínica Médica, Clínica Cirúrgica, Ginecologia e Obstetrícia, Centro Cirúrgico, Centro de Terapia Intensiva, Pediatria, Ambulatórios Gerais e Unidade de Emergência constituíram a amostra desta investigação. O tamanho amostral foi definido aleatoriamente.

Os critérios estabelecidos para seleção dos sujeitos foram: desempenhar a função de enfermeiro ou auxiliar de enfermagem na referida instituição, estar em exercício ativo no período determinado para a coleta de dados, aquiescer em participar da pesquisa.

Para a coleta de dados utilizou-se um formulário estruturado (ANEXO 1ANEXO 1). Através de entrevistas individuais procedeu-se à coleta de dados, cujas respostas eram imediatamente registradas no referido instrumento.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos 80 (100%) enfermeiros entrevistados, 41 (51,25%) referiram ter tido algum acidente ocupacional com material pérfuro-cortante potencialmente contaminado no período de 1990 a 1996, e 39 (48,75%) mencionaram nenhuma ocorrência deste tipo de acidente (Tabela 1).

Referente aos enfermeiros que se acidentaram, 27 (33,8%) atuam na profissão há pelo menos 10 anos, Um total de 8 (10,0%) atuam de 5 a 10 anos como enfermeiro e 6 (7,5%) há menos de 5 anos, Quanto aos 39 que nunca se acidentaram, 17 atuam nessa categoria profissional em período inferior a 5 anos.

Cabe ressaltar que 27 (33,8%), ou seja a maioria dos enfermeiros que relataram acidentes, exercem, a profissão há 10 anos ou mais, ao passo que dentre os que nunca se acidentaram, grande parte (43,5%) apresentam tempo de exercício profissional inferior a 5 anos.

Tal resultado pode sugerir que as Escolas de Enfermagem estejam cada vez mais valorizando a necessidade da sensibilização dos profissionais sobre a proteção individual. De maneira semelhante, os próprios enfermeiros parecem incorporar de maneira mais fácil e compreensiva as recomendações acerca de precauções em cuidados de saúde. RONK et al (1994) constataram que um grupo de enfermeiros que exercem a profissão entre 6 e 10 anos referiram estar menos familiarizados com as precauções padrão e consequentemente menos susceptíveis a acreditar que o emprego de tais precauções reduz o risco de exposição ocupacional ao HIV e HVB.

Quanto aos 80 auxiliares de enfermagem participantes da investigação, 34 (42,50%) referiram já ter tido acidente de trabalho com material pérfuro-cortante e 46 (57,50%) mencionaram nenhuma ocorrência.

Dentre os auxiliares de enfermagem que se acidentaram 27 (33,75%) exercem a profissão há 10 anos ou mais, enquanto 33 (41,25%) dos auxiliares que referiram nunca terem se acidentado, também enquadram-se neste período de atuação profissional.

Isto vem denotar que os auxiliares de enfermagem e os enfermeiros com tempo de serviço mínimo de 10 anos destacam-se entre os que foram vítimas de acidentes.

Na prática profissional cotidiana depara-se com certa freqüência com verbalizações de funcionários que expressam a subestimação do risco e das conseqüências dos acidentes com material pérfuro-cortante. Portanto, o fato do maior número de acidentes entre profissionais que trabalham há um período longo (acima de 10 anos) pode ter como justificativa educação continuada insuficiente, falta de sensibilização e conscientização pessoal, supervisão contínua e sistemática da prática insuficiente, a percepção individual sobre o risco, a desvalorização das ações preventivas e consequentemente a qualidade de vida.

O tempo de experiência profissional longo parece ser um indicativo de dificuldades para acatar as precauções padrão, pois os conceitos aprendidos em sua formação, hoje tornaram-se obsoletos e a mudança de comportamentos não ocorre facilmente.

SAGHAFI et al (1992) e RONK et al. (1994) constataram entre os profissionais estudados a alteração de suas práticas de proteção quando sabiam que o paciente é soropositivo ao HVB ou HIV. Embora estejam cientes das precauções padrão, só as empregavam frente a riscos identificados, o que logicamente pode comprometer a segurança destes profissionais.

Quanto ao tipo de material que causa o acidente considerando-se os 41(100,0%) dos enfermeiros que referiram ter sido acidentados, tem se que 40 (97,56%) mencionaram a agulha como objeto causador dos acidentes e 1 (2,44%) referiu frasco de vidro utilizado para dreno de torax. Dos 34 (100,0%) auxiliares de enfermagem que se acidentaram, 33 (97,06%) mencionaram a agulha e 1 (2,94%) destacou a lâmina de bisturi.

Percebe-se assim que dentre os materiais pérfuro-cortantes, a agulha é o instrumento que mais propiciou a ocorrência de acidentes. Assim, esses dados vem concordar com os resultados já apresentados por (MACHADO et al., 1992; KOPFER; MC GOVERN, 1993).

Soma-se ainda o aspecto o profissional da enfermagem ser um dos trabalhadores que muito se expõe a este tipo de risco, pelo fato de sua prática cotidiana envolver trabalho constante com agulha.

É oportuno lembrar que antes do conhecimento do HIV no mundo, os acidentes por picada de agulha eram subestimados, embora sabidamente poderiam contribuir para a transmissão de muitos patógenos veiculados pelo sangue que igualmente conferem agravos importantes à saúde.

A SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA (1995) destaca que acidentes com agulha merecem atenção cada vez maior no mundo. Aponta também, a preocupação dos Centers for Disease Control no que refere à notificação dos acidentes e a monitorização dos infectados, bem como a necessidade do emprego de medidas preventivas efetivas pelos profissionais, visando assim à prevenção da transmissão ocupacional não só do HIV, mas também do vírus das hepatites B e C. A infectividade do vírus da Hepatite B gira em torno de 30% ao passo que o risco médio de se adquirir o HIV por exposição percutânea é de 0,3%. Esta taxa eleva-se a depender da característica da exposição, ou seja, ferimento profundo, sangue visível no material causador do ferimento, material previamente colocado em veia ou artéria de paciente, paciente-fonte que tenha falecido dentro de 60 dias após o acidente.

A exposição de mucosa íntegra ao fluído contaminado apresenta o risco médio de 0,1% e a exposição de pele íntegra confere um risco inferior a 0,1% (MARCUS; BELL, 1997).

A profilaxia com drogas anti retrovirais pode reduzir a possibilidade deste contágio, desde que seja empregada em tempo hábil e período recomendado. Estudos de caso controle com profissionais de saúde mostram que o uso profilático da Zidovudina (AZT) resultou em uma redução de 79% do risco de soroconversão após acidentes. Este prognóstico depende sobretudo do emprego deste anti-retroviral nas primeiras 2 horas após o acidente e no máximo 24 horas após o mesmo (BOLETIM, 1996), Esta medida profilática implica, sobretudo, na questão do profissional de saúde estar psicologicamente preparado para aceitar este tratamento por quatro semanas, o que muitas vezes percebe-se ser uma decisão difícil, pela falta de preparo emocional e a não conscientização sobre a probabilidade do acidente ocorrer com “ele”.

Ao serem questionados sobre os motivos que determinaram o acidente, observa-se de maneira curiosa as respostas nos Quadros 1 e 2.



ALFABELLA et al. (1996), investigaram em Valência, Venezuela as medidas preventivas referentes à exposição acidental a sangue e fluídos corporais e detectaram que apenas 12% dos enfermeiros e 4% dos auxiliares de enfermagem emitiram respostas corretas acerca de Precauções Universais. Entretanto as recomendações escritas para hospitais e profissionais de saúde na era da AIDS iniciaram em 1983 (CDC, 1983).

Chama a atenção o fato de reencapar agulha ser um dos determinantes mais freqüentes para a ocorrência de acidentes pérfuro-cortantes entre os enfermeiros com 10 anos ou mais de profissão. Este motivo inexistiu entre os graduados dos últimos 5 anos. O descarte e a retirada de agulha após punção endovenosa ou intramuscular também foram destacados como fatores que propiciam acidentes.

Estes acidentes podem ser evitados se a utilização de equipamentos de proteção individual e cuidados com o manuseio de materiais pérfuro-cortantes forem empregados durante a realização dos procedimentos.

Outros motivos referem-se à negligência de profissionais, tais como deixar a agulha desprotegida em lugares indevidos, após a utilização. Certas situações como a condição de agressividade, agitação dos pacientes requerem atenção reforçada. Os motivos foram praticamente os mesmos referidos pelos enfermeiros e auxiliares. São necessárias orientações específicas a estes trabalhadores.

Considera-se que o profissional ao trabalhar com material pérfuro-cortante deve envidar toda a atenção e cuidados para proteger a si próprio e aos colegas e pacientes.

BREVIDELLI (1997) ao estabelecer o diagnóstico de situações de risco de acidentes com agulhas, obteve que a perfuração era o acidente mais frequente entre os profissionais da Saúde, das quais 46% diziam respeito à práticas não recomendadas pelas precauções padrão, e portanto, evitáveis. Encontrou mais de 50% de agulhas reencapadas nos recipientes para descarte. Como situações que geraram a ocorrência de perfurações, menciona a realização ou auxílio de procedimentos, o descarte de objetos pérfuro-cortante em local inadequado, o reencape de agulhas como os três determinantes prioritários, As percepções dos profissionais referentes à barreiras físicas, cognitivas e psicológicas foram as crenças mais importantes para justificarem os referidos comportamentos.

SOUZA; VIANNA (1993) também destacam o reencape de agulha como o maior motivo de acidentes entre auxiliares de enfermagem. Para os enfermeiros o motivo predominante referido foi pressa, cansaço, excesso de serviço, descuido e negligência da equipe médica.

Quanto à conduta tomada após o acidente, observa-se na Tabela 2, que somando-se os totais das duas primeiras condutas aposentadas, 27 (65,85%) enfermeiros notificaram o acidente, dos quais 19 (46,34%) verbalizaram ter "lavado", “desinfetado” ou “espremido” a área topográfica acidentada e notificado ao serviço. Condutas incompletas ou insuficientes como simplesmente lavar ou fazer anti-sepsia foram apontadas por 12 (29,27%) enfermeiros e 2 (4,88%) não tomaram nenhuma conduta. Estes dois últimos dados são preocupantes, pois somando-os tem-se que 14 (34,15%) deixaram passar despercebido este acidente. Ressalta-se ainda o uso do termo desinfetado, utilizado de maneira inadequada.

Quanto aos auxiliares de enfermagem, a maioria, ou seja, 19 (55,88%) referem que apenas lavou, “desinfetou” ou “espremeu” o local, sendo que destes o maior número trabalha na profissão há mais de 10 anos.

Apesar da probabilidade de contaminação via ocupacional ser baixa, cabe ressaltar que ela é diferente de zero. Outro aspecto importante é que à medida que a prevalência da aids e hepatite aumenta, a chance de um profissional da saúde entrar em contato com o HIV através de exposição ocupacional se eleva. Logo a sensibilização dos profissionais quanto a mudança no comportamento e o emprego das precauções padrão é imprescindível, pois desta forma ele pode se precaver não só da exposição ao HIV, bem como de outros patógenos.

Uma experiência bem sucedida apresentada por SIMPSON; JEBAMANI (1996) foi realizada na Índia, onde os autores desenvolveram atividades educativas junto a funcionários de enfermagem através de implementação de protocolos e cartazes dispostos nas áreas de trabalho.

Por outro lado, diversos estudos (JAGGER et al., 1988; BACKER et al., 1990; HENRY et al., 1994; BREVIDELLI, 1997) atestam o ato de reencapar agulhas como prática comum pela equipe de enfermagem.

Será que realmente o tempo de exercício profissional influencia na mudança de comportamento profissional? Há resistência e bloqueios para a incorporação de medidas preventivas que significam não só o uso de Equipamentos de Proteção Individual. adequados bem como a consciência crítica dos riscos?

A equipe de enfermagem precisa ser trabalhada, tendo como meta a sua proteção pessoal bem como do seu paciente/cliente.

E este trabalhar, significa extrapolar a informação e intervir com diferentes estratégias, pois conforme atestam BREVIDELLI et al, (1995) e RODRIGUES et, al. (1995), os profissionais da enfermagem conhecem as medidas de biossegurança, mas não as empregam sistemática e constantemente.

NDUMBE (1996) no trabalho com técnicos de laboratório da África menciona que de um modo geral todos os trabalhadores de saúde precisam ser envolvidos num programa de controle de aids/ HIV.

CONCLUSÕES

Um total de 51,25% dos enfermeiros e 42,50% dos auxiliares de enfermagem entrevistados tiveram algum acidente com material pérfuro-cortante potencialmente contaminado. Estes acidentes foram mais freqüentes entre os profissionais que atuam em período superior a 10 anos na profissão, sendo a agulha o principal objeto causador do acidente, As condutas tomadas após os acidentes, foram em parte as recomendadas pelos (CDC 1987a e BOLETIM, 1996).

O planejamento e a implementação de orientações específicas e sistematizados à equipe de enfermagem se fazem necessárias e urgentes para que estes profissionais adotem o exercício profissional seguro.

- Categoria profissional : Enfermeiro ( ) Auxiliar de Enfermagem ( )

- Anos de formada: < 5 anos ( ) 5 a < 10 anos ( ) 10 ( )

- Assiste diretamente portadores de HIV/ AIDS: ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sabe

- Local de trabalho: ______________________________________________________________

- Data da entrevista: ___/___ /___

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1) Já teve algum acidente com material pérfuro-cortante?

SIM( ) NÃO( )

2) Tipo de material com o qual se acidentou: _______________________________

3) Mês/ Ano o acidente: __________________

4) Motivo o acidente:_____________________________________________________________

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_____________________________________________________________________

5) Conduta tomada:______________________________________________________________

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ANEXO 1

  • *
    Trabalho inserido no Projeto Integrado - CNPq (Processo Nº 522182/ 94-1)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Mar 2010
    • Data do Fascículo
      Out 1998
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
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