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Estudo preliminar das relações entre duração da parada cardiorrespiratória e suas consequências nas vítimas de trauma

Preliminary study of the relationship between the cardiopulmonary arrest time and its consequences in patients who underwent trauma

Resumos

Foi proposta desta pesquisa obter subsídios para iniciar ou manter manobras de reanimação cardiopulmonar (RCP) especificamente em vítimas de trauma. A duração da parada e reanimação cardiopulmonar de sobreviventes foi descrita, assim como, o desempenho cerebral e mortalidade dessas vítimas 24, 48 e 72 horas após tais eventos terem ocorrido. Com os resultados dessa caracterização estudou-se a relação entre tempo de parada e reanimação cardiorrespiratória, e, mortalidade. Os dados foram obtidos em plantões no Pronto Socorro do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Grande parte das vítimas (93,4%) apresentaram trauma grave e a principal "causa mortis" foi trauma crânio-encefálico. A sobrevivência ao período de 72 horas foi de 10%. A avaliação de 72 horas, das vítimas sobreviventes a parada cardiorrespiratória (PCR) de causa traumática mostrou mau desempenho cerebral dessas vítimas no período. A sobrevida após o primeiro episódio de PCR relacionou-se mais consistentemente com o tempo de PCR das vítimas de trauma do que o tempo de RCP. O tempo de PCR <4 minutos e de RCP <20 minutos relacionou-se a uma sobrevida superior a 72 horas.

Parada cardio-respiratória; Trauma


The proposal of this research was to obtain parameters to start or maintain cardiopulmonary resuscitation (CPR) in victims of trauma. The duration of the cardiac arrest and the CPR of the survivors was described, as well as the cerebral performance and the mortality of these victims 24, 48 and 72 hours after these events had happened. With the results of this caracterization the relation between duration of cardiac arrest time, CPR and mortality were described. Data for this report were coleted in Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo emergency departament. A big amount of the victims (93, 4%) presents severe trauma and main cause of death was brain injury. Survival at 72 hours after CPR was 10%. The assessment, during the 72 hour period, of the survivors from cardiac arrest of traumatic cause has shown bad cerebral performance of those victims in that period of time. The survivor after the first episod of CPR was strongly related to cardiac arrest time when compared with CPR time. The time of cardiac arrest ¡Ü 4 minuts and CPR ¡Ü 20 minuts was related to survival more than 72 hours.

Heart arrest; Trauma


ARTIGO ORIGINAL

Estudo preliminar das relações entre duração da parada cardiorrespiratória e suas consequências nas vítimas de trauma

Preliminary study of the relationship between the cardiopulmonary arrest time and its consequences in patients who underwent trauma

Andréia BertelliI; Márcia Regina BuenoII; Regina Márcia Cardoso de SousaIII

IAluna de Graduação da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, monitora bolsista junto a FAPESP - Fundação de Amparo a Pesquisa o Estao de São Paulo

IIAluna de Graduação da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, monitora voluntária o projeto

IIIProfessor Doutor junto ao Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo

RESUMO

Foi proposta desta pesquisa obter subsídios para iniciar ou manter manobras de reanimação cardiopulmonar (RCP) especificamente em vítimas de trauma. A duração da parada e reanimação cardiopulmonar de sobreviventes foi descrita, assim como, o desempenho cerebral e mortalidade dessas vítimas 24, 48 e 72 horas após tais eventos terem ocorrido. Com os resultados dessa caracterização estudou-se a relação entre tempo de parada e reanimação cardiorrespiratória, e, mortalidade. Os dados foram obtidos em plantões no Pronto Socorro do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Grande parte das vítimas (93,4%) apresentaram trauma grave e a principal "causa mortis" foi trauma crânio-encefálico. A sobrevivência ao período de 72 horas foi de 10%. A avaliação de 72 horas, das vítimas sobreviventes a parada cardiorrespiratória (PCR) de causa traumática mostrou mau desempenho cerebral dessas vítimas no período. A sobrevida após o primeiro episódio de PCR relacionou-se mais consistentemente com o tempo de PCR das vítimas de trauma do que o tempo de RCP. O tempo de PCR < 4 minutos e de RCP < 20 minutos relacionou-se a uma sobrevida superior a 72 horas.

UNITERMOS: Parada cardio-respiratória. Trauma.

ABSTRACT

The proposal of this research was to obtain parameters to start or maintain cardiopulmonary resuscitation (CPR) in victims of trauma. The duration of the cardiac arrest and the CPR of the survivors was described, as well as the cerebral performance and the mortality of these victims 24, 48 and 72 hours after these events had happened. With the results of this caracterization the relation between duration of cardiac arrest time, CPR and mortality were described. Data for this report were coleted in Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo emergency departament. A big amount of the victims (93, 4%) presents severe trauma and main cause of death was brain injury. Survival at 72 hours after CPR was 10%. The assessment, during the 72 hour period, of the survivors from cardiac arrest of traumatic cause has shown bad cerebral performance of those victims in that period of time. The survivor after the first episod of CPR was strongly related to cardiac arrest time when compared with CPR time. The time of cardiac arrest ¡Ü 4 minuts and CPR ¡Ü 20 minuts was related to survival more than 72 hours.

UNITERMS: Heart arrest. Trauma.

INTRODUÇÃO

Por muitos anos tem se utilizado manobras de RCP e técnicas avançadas de suporte vital para salvar vidas. É, entretanto objetivo da equipe de ressuscitação não somente salvar a vida da pessoa, mas também possibilitar uma sobrevivência com qualidade após a PCR.

Decidir quando iniciar, manter ou desistir das manobras de reanimação cardiorrespiratória tem sido um constante problema ético dos profissionais da equipe de saúde e dos socorristas de forma geral. Ter subsídios para predizer resultados é uma forma mais segura para tomar decisões sobre esse e outros aspectos do tratamento e cuidado.

Poucos são os critérios pelos quais a morte pode ser imediatamente definida com segurança, ou, que determinam quando cessar as manobras de reanimação em indivíduos "não ressuscitáveis". Porém, a decisão de não iniciar ou manter a reanimação deve ser realizada com base no conhecimento profissional e não deve ser arbitrária. A razão para desistir deve ser suficientemente firme e eficientemente sustentada, uma vez que pode causar questionamentos médico, legal, ético e social.

Uma questão não resolvida é se um médico ou socorrista deve iniciar as manobras de reanimação cardiorrespiratória quando crê que essa conduta não irá prolongar a vida ou que manterá uma vida sem qualidade. Estudos de resultados da PCR dentro de hospitais têm mostrado que certos grupos de pacientes não sobrevivem. Tais pacientes incluem aqueles com oligúria, câncer com metátese, septicemia, pneumonia e choque agudo2, 5. Tempo de PCR. Maior que 5 minutos, duração dia RCP > 20 minutos, história de insuficiência cardíaca congestiva ou diabetes mellitus, idade maior que 45 anos e causa não cardíaca para PCR têm sido relacionados com mortalidade 5, 10, 12,18.

O julgamento que a vítima é "não ressuscitável" tem sido fundamentado na sua resposta às condutas de Suporte Vital Básico e Avançado 2,21. Entretanto, outros critérios também têm colaborado nessa decisão e eles incluem a duração da parada e reanimação cardiorrespiratória, idade do paciente, e a presença ou ausência de certos sinais neurológicos. O uso de tais critérios é baseado na capacidade de recuperação do cérebro, e ainda que aceitos, são bastante questionados.

Durante a PCR, a isquemia devido a diminuição do fluxo de sangue oxigenado para o tecido cerebral é de extrema importância para seus resultados. O cérebro tem muito poucas reservas de substâncias essenciais, como a glicose e o oxigênio. Consequentemente, todas as funções que requerem energia cessam dentro de poucos minutos após a PCR. Lesões extremamente sérias, tais como necrose neuronial e edema cerebral, ocorrem se não houver rapidamente suprimento de energia para o cérebro 7, 14, 16.

Na parada cardíaca, a maior frequência de altas hospitalares tem sido encontrada no grupo de pacientes em que as manobras de reanimação foram iniciadas dentro de 4 minutos da parada e as demais condutas de Suporte Avançado de Vida num período até 8 minutos.

Por outro lado, estudos de efetividade da circulação indicam que o débito cardíaco durante a PCR é cerca de 30% quando comparado ao fluxo cardíaco normal. O sangue é desviado para o cérebro durante este período de baixo débito cardíaco promovendo cerca de 90% do fluxo normal desse órgão, porém, as alterações dos componentes sanguíneos devido ao prejuízo funcional de outros órgãos e a hipoxemia decorrente do shunt direito esquerdo durante a reanimação cardiopulmonar, ocasionam, no decorrer do tempo de RCP, lesões cerebrais 7,16,17,21.

Ainda que estudos realizados com sobreviventes após PCR tenham associado tempo de reanimação e duração da PCR com resultados desse evento, poucas análises têm se direcionado especificamente às vítimas de trauma.

Nos últimos anos, os acidentes e as violências são responsáveis por índices alarmantes de morbidade, mortalidade e incapacidade. Embora as pessoas jovens e presumivelmente hígidas sejam as mais envolvidas nesses eventos, sua violência leva frequentemente a quadros de grande gravidade seguidos de PCR ou morte.

Procurando-se subsídios para iniciar ou manter manobras de ressuscitação cardiopulmonar especificamente nessas vítimas, apresenta-se a seguir a proposta do presente estudo.

OBJETIVOS

• Descrever o desempenho cerebral e mortalidade de vitimas de trauma que apresentaram PCR, 24, 48 e 72 horas após o retorno da circulação espontânea.

• Verificar tempo de Parada e reanimação cardiorrespiratória das vítimas que tiveram retorno ao ritmo cardíaco, após esses eventos.

• Verificar as possíveis associações entre tempo de PCR e seus resultados, imediatamente e 72 horas após PCR, assim como, entre resultados nesse período e tempo de reanimação.

SUJEITOS E MÉTODOS

A população de estudo foi constituída por vítimas de trauma admitidas para tratamento no Pronto Socorro do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) que apresentaram PCR durante o atendimento hospitalar ou pré-hospitalar.

Os dados foram coletados por meio de entrevistas com a equipe de saúde, observação, consulta à registros de prontuário e avaliação direta das vítimas.

A coleta de dados foi realizada por bolsistas de iniciação científica após orientação e padronização, mediante autorização da Instituição. O estudo foi prospectivo, sendo os dados coletados de agosto de 1996 à março de 1997, durante fins de semana em rodízio de plantões iniciado na sexta feira às 19 horas encerrando aos domingos no mesmo horário.

O instrumento utilizado como roteiro para coleta de dados está apresentado no ANEXO I ANEXO I e permitiu a obtenção de informações tanto para este estudo, como para outros complementares, pertencentes a mesma temática.

No registro de dados nesse instrumento, tempo ou duração dia PCR, foi considerado como o intervalo entre o colapso e início da RCP (nenhum fluxo sanguíneo). Tempo ou duração da RCP foi estabelecido como o intervalo entre o início da RCP e o retorno da circulação espontânea (baixo fluxo sanguíneo) 5,18.

Para coleta de dados foi realizado seguimento de 72 horas das vítimas de trauma que atenderam os critérios de inclusão da população. Neste seguimento, óbitos e recidivas de PCR foram registrados. Nas vítimas sobreviventes foi realizada avaliação do desempenho cerebral, 24, 48 e 72 horas após retorno a circulação espontânea, utilizando-se a Escala de Desempenho Cerebral. Esta escala, uma modificação de um grupo de Pittsburg da Escala de Resultados de Glasgow (Glasgow Outcome Scale) tem sido utilizada como instrumento de avaliação de desempenho cerebral após parada cardiorrespiratória 5,9,12,18. Descrição de suas categorias e critérios de inclusão estão presentes no instrumento em anexo ANEXO I utilizado para coleta de dados.

Posteriormente, as vítimas que faleceram antes da alta hospitalar foram rastreadas no instituto Médico Legal para complementação dos dados sobre a natureza das lesões através das descrições nos laudos de autópsia.

Os dados obtidos no presente estudo foram tratados através de processamento computadorizado e apresentados em forma de tabelas e figura.

Para estabelecer a gravidade do trauma utilizou-se o manual da ABBREVIATED INJURY SCALE (AIS) versão de 19901.

A AIS é um sistema de base anatômica que classifica cada lesão por região corpórea e estabelece um escore que indica gravidade de lesão anatômica específica. É uma escala de seis pontos que varia de AIS 1, lesão mínima, à AIS 6, lesão gravíssima geralmente intratável1.

A gravidade do trauma das vítimas foi determinada através do INJURY SEVERITY SCORE (ISS). O ISS é um escore matematicamente calculado a partir do AIS que tem sido bastante aceito para quantificar a gravidade do trauma. Para cálculo do ISS, é estabelecido o escore mais alto para cada uma das regiões corporais. Calcula-se então o ISS, que é resultado da soma dos quadrados dos escores AIS mais altos das três regiões diferentes do corpo mais gravemente traumatizadas1.

Com relação ao ISS, os traumatizados têm sido subdivididos em 3 grupos: pacientes com ISS entre 1 a 15, têm sido categorizados como vítimas do trauma leve, de 16 a 24 como trauma > 25 moderado e como trauma grave. 8,23

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Durante os 67 dias em que foram realizados plantões de alunos monitores vinculados ao grupo de pesquisa, 30 vítimas de trauma, que apresentaram PCR, foram admitidas no Pronto Socorro do Instituto Central do HCFMUSP. As paradas cardiorrespiratórias que essas vítimas apresentaram ocorreram tanto em unidades hospitalares (intra-hospitalares), como no local do acidente ou durante transporte para o hospital (extra-hospilalares). A maioria das vítimas era do sexo masculino (n=22), com idade variando de 19 a 86 anos. A média de idade foi de 36,7 ± 17,0 anos. Quando considerado o local em que ocorreu a primeira PCR verificou-se que a maioria (66,7%) dessas ocorrências foram extra-hospitalar.

Quanto à gravidade do trauma, determinada pelo ISS, 93,4% apresentou trauma grave (ISS > 25), um trauma moderado (ISS > 16 e < 25) e outro trauma leve (ISS <16). Essa última vítima, além de lesões em superfície externa teve como diagnóstica fratura de fêmur direito, entretanto, evoluiu para óbito em consequência a tromboembolismo pulmonar.

Nas outras 27 vítimas que foram a óbito no período de observação foram constatadas as seguintes "causa mortis": trauma crânio-encefálico, 10 vitima; hemorragia interna, 7 vítimas; politraumatismo, 7 vítimas; choque traumático, 2 vítimas e embolia pulmonar, 1 vítima.

Das 30 vítimas participantes do presente estudo, 18 (60%) não sobreviveram ao P processo de reanimação e 12 (40%) tiveram restabelecimento do ritmo cardíaco. Tal resultado difere daquele apresentado por FULTON et al 10. Esses autores analisaram 245 vítimas de trauma que apresentaram PCR intra e extra-hospitalar e observaram que 54 (22%) tiveram retorno de ritmo cardíaco após esse evento. No presente estudo o percentual de sobrevida após a 1º PCR assemelha-se ao apresentado por BEDELL et al4. Esses autores analisaram 294 pacientes com diferentes diagnósticos clínicos e verificaram sobrevivência de 44% dos reanimados após o 1º processo de RCP.

Na figura 1 observa-se que dos 12 sobreviventes, 7 tiveram morte biológica em 24 horas, um apresentou morte encefálica nesse período, uma vítima morreu entre 48 e 72 horas e foram 3 aqueles que sobreviveram ao período de 72 horas. Nenhuma das vítimas que apresentou mais que uma PCR,, durante o seguimento, sobreviveu ao período de 72 horas. Dos 3 sobreviventes, 2 obtiveram na última avaliação de desempenho cerebral pontuação 4, indicativo de estado vegetativo persistente ou coma e um obteve pontuação 3 indicando incapacidade grave. Um dos sobreviventes que obteve pontuação 4 nesse período, recebeu alta hospitalar cerca de 2 meses após a ocorrência da PCR. o outro, após um período de internação similar, foi transferido para hospital de retaguarda. O sobrevivente com pontuação 3 evoluiu para óbito cerca de 86 horas após a PCR, tendo como "causa mortis" politraumatismo e septicemia.


No estudo de FULTON et al 10, entre as 54 vítimas que sobreviveram ao P processo de RCP, 31 apresentaram segunda ou terceira PCR. Todos que apresentaram mais que uma PCR, morreram. Houve 6 (2,4%) sobreviventes. Quinze (6,1%) vítimas foram considerados como sobreviventes em potencial à medida que tiveram sucesso na RCP e sobreviveram ao tratamento inicial, morrendo posteriormente na sala de recuperação ou na unidade de terapia intensiva.

ROSEMURGY et al 19 estudando 138 vítimas de trauma que apresentaram PCR extra-hospitalar verificaram que nenhuma vítima sobreviveu à internação. Tal resultado difere do presente estudo à medida que dentre os três sobreviventes no período de 72 horas, 1 apresentou PCR extra-hospitalar e sobreviveu à internação na fase aguda de tratamento. Resultados apresentados por FULTON et al 10, mostraram que 4 dos seus sobreviventes necessitaram de RCP no local do acidente.

Segundo MURPHY et al 13, o sucesso na RCP, definido como sobrevivência após a alta hospitalar, tem variado de 0% a 30%. Esses autores realizaram um estudo com 503 vítimas com mais de 70 anos e observaram que 112 (22%) sobreviveram inicialmente a PCR, mas somente 19 (3,8%) tiveram alta hospitalar.

BEDELL et al 4 mostraram que 14% dos pacientes submetidos à RCP intra-hospitalar sobreviveram até a alta e três quarto deles ainda encontravam-se vivos 6 meses mais tarde.

Segundo a AMERICAN HEART ASSOCIATION3 cerca de 15% dos pacientes hospitalizados em clínicas médicas ou cirúrgicas, em que é tentada a reanimação, sobrevivem.

ROGOVE et al18, realizando seguimento de 6 meses de 774 pacientes que apresentaram PCR observou nesse período mortalidade de 81%. Pacientes pertencentes ao grupo estudado por esses autores tinham diferentes causas para a ocorrência da PCR, não apresentaram, após reanimação, resposta motora perante estímulo doloroso. Foram critérios de exclusão do estudo: apresentar PCR devido à doença intracraniana; coma causado por drogas depressoras do SNC; PCR e hipotermia, também foram excluídos pacientes que foram submetidos a RCP, embora considerados "não ressuscitáveis".

EDGREN etal9 em estudo de seguimento de 262 pacientes que evoluíram em estado de coma, 10 minutos após restauração da circulação espontânea, descreveram mortalidade de 78,5% no, período de 1 ano.

Diferenças na sobrevivência e mortalidade após PCR é observada nos diferentes estudos4,9,10,13,18,19 e podem ser atribuídas tanto a características da população estudada, como também ao método de pesquisa utilizado.

No presente estudo, a sobrevivência de 72 horas ocorreu em 3 vítimas, 10% da população, a sobrevivência à internação hospitalar na fase aguda ocorreu em 2 pacientes 6,6% das vítimas estudadas. Tais resultados embora melhores que os apresentados por FULTON et al10 e ROSEMBURGY etal19, que avaliaram especificamente vítimas de trauma, são menos favoráveis aos apresentados por outras publicações3,4,9,18 que avaliaram pacientes que apresentaram PCR por diferentes causas.

Em relação aos sobreviventes à PCR, vários estudos de seguimento, por 6 meses ou mais, têm relatado diminuição da capacidade cognitiva após esse evento, assim como, na capacidade de realizar atividades da vida diária.4,11,20

Publicações que têm utilizado a Escala de Desempenho Cerebral para avaliar resultados também têm mostrado resultados desfavoráveis após PCR.

BEREK et al5, avaliando sobreviventes admitidos em UTI, após PCR devido principalmente a doença coronariana, verificaram que no período de 4 semanas 17 faleceram. Dos 13 sobreviventes, 11 (36,7%) apresentaram pontuação 1 ou 2 na Escala de Desempenho Cerebral indicativa de boa recuperação ou incapacidade moderada, 1 sobreviveu a esse período com incapacidade grave e outro em estado vegetativo persistente (pontuação 3 e 4 na escala, respectivamente).

ROGOVE et al18 avaliando pacientes 6 meses após PCR, observaram que somente 27% dos 774 avaliados apresentaram boa recuperação neurológica, isto é, obtiveram pontuação 1 ou 2 nessa escala.

EDGREN et al9 examinando resultados com a Escala de Desempenho Cerebral, 48, 72 horas, 10 dias, e, 1, 2, 6 e 12 meses após PCR observaram que dos 109 pacientes que permaneceram sem resposta ao estímulo verbal, no 3º dia após PCR, 13(11,9%) alcançaram pontuação 1 ou 2 na escala; 15(13,8%) nunca superaram a pontuação 3 no seguimento; e, 81(74,3%) permaneceram em estado vegetativo até a morte.

Considerando-se que no presente estudo as 2 vítimas sobreviventes a alta hospitalar encontravam-se em coma no período de 72 horas, desfavoráveis resultados a longo prazo podem ser esperados.

FULTON et al10, embora tenham observado uma sobrevida na alta hospitalar de somente 2,4% da população de traumatizados, afirmam considerar que os 4 sobreviventes com dano neurológico mínimo, observados em seu estudo, justificaram os intensos esforços durante as ressuscitações.

Essa opinião é compartilhada pelos autores do presente estudo, desde que a necessidade de manutenção da qualidade do atendimento durante todas as fases do tratamento e a equidade de direitos a saúde sejam respeitadas.

Para verificar possíveis associações entre tempo de PCR e seus resultados, assim como, entre resultados e tempo de reanimação, considerou-se inicialmente sobrevivência e morte após 1º episódio de PCR. Numa segunda análise do tempo de PCR e RCP e seus resultados, considerou-se: aqueles que morreram em um período inferior a 72 horas após PCR e os que sobreviveram a este período.

Observa-se na tabela 1 que das 30 vítimas estudadas, 12 (40%) sobreviveram ao 1º episódio de PCR, sendo que, entre os sobreviventes, 10 apresentaram tempo de parada ≤ 4 minutos, um apresentou tempo entre > 4 e ≤ 7 minutos e em outro, não foi possível obter a informação. Por outro lado, naqueles que evoluíram para óbito no 1º episódio de PCR, 33,3% obtiveram tempo ≤ 7 minutos, 38,9% ≤ 7 minutos e em 5 (27,8%) não se obteve informação sobre o tempo de PCR; destes, 3 foram situações em que a vítima já se encontrava em PCR quando a equipe de resgate chegou para atendimento no local do acidente; um chegou ao hospital em PCR, sendo trazido por familiares e um, não se pode afirmar o tempo de PCR ainda que este episódio tivesse ocorrido durante atendimento intra-hospitalar.

Como pode-se observar na tabela 2, a maioria dos sobreviventes apresentaram período de reanimação < 20 minutos (66,7%) ; 16,7% apresentaram tempo de reanimação superior a 20 minutos e em 2 (16,7%) vítimas não se pôde obter tal informação: um apresentou PCR em outra unidade hospitalar e outro apresentou PCR durante o transporte. Entre aqueles que morreram no primeiro episódio de PCR, o tempo de reanimação foi em maior frequência > 20 minutos, 44,4%, fato que pode-se compreender quando considera-se as insistentes tentativas dos profissionais de saúde antes de considerar uma vítima inviável de reanimação.

Na análise das tabelas 3 e 4 observou-se que as 2 vítimas sobreviventes que conheceu-se o tempo de PCR e RCP, tiveram tempo de PCR ࣘ 4 minutos e tempo de RCP ࣘ 20 minutos.

ROGOVE et al18, mostraram em seu estudo que tempo de PCR maior que 5 minutos é preditor independente de mortalidade, assim como, curto período de PCR é preditor independente de boa recuperação neurológica. Corroborando com esses resultados BEREK et al5 apontaram que o mais importante determinante das conseqüências após PCR é o tempo de anóxia.

FULTON et al10 referem em seu estudo que a duração da PCR foi < 10 minutos nos sobreviventes à alta hospitalar e que geralmente PCR com duração superior a este tempo foi associada com resultado fatal.

Resultados dos estudos de BEREK et al5 e ROGOVE et al18, também indicam relação entre duração de RCP e conseqüências da PCR. Tempo menor que 20 minutos é associado com melhores resultados.

Tentativas de reanimação com duração superior a 30 minutos, tem resultado em insucesso em diversos grupos analisados4,10,13 embora relatos isolados de sucesso com maior duração de RCP tem sido encontrados na literatura22.

BUCKBERG6 mostra que 20 minutos de isquemia causa lesão cardíaca, e após 40 minutos de persistência dessa condição ocorre dano grave. Por outro lado. GROSWASSER et al11 indicam a importância da anóxia cerebral para pacientes após PCR, quando comparam pacientes sobreviventes à reanimação com vítimas de trauma crânio-encefálico com idade e duração do coma similares. As consequências eram acentuadamente mais desfavoráveis naqueles que foram submetidos a RCP evidenciando assim a importância da anóxia para os resultados após PCR.

CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÃO FINAL

No geral, os resultados do presente estudo apresentam as seguintes indicações.

• Pacientes com PCR por causa traumática raramente sobreviveram até a alta hospitalar, após esse evento.

• A avaliação no período de 72 horas, das vítimas sobreviventes a PCR, de causa traumática mostrou mau desempenho cerebral dessas vítimas nesse período. Resultados de estudo9, realizado em indivíduos inconscientes que sobreviveram à PCR, sugerem 72 horas de observação como o período que permite consistente previsão de incapacidades graves ou estado vegetativo persistente. Tais resultados, acrescidos aos do presente estudo indicam perspectivas sombrias para os sobreviventes avaliados. Entretanto, as peculiaridades das vitimas de trauma podem tornar necessário períodos mais prolongados para o estabelecimento do seu prognóstico, o que só poderá ser indicado com a realização de novas pesquisas na área.

• A sobrevida após o primeiro episódio de PCR relacionou-se mais consistentemente com o curto tempo de PCR das vítimas de trauma do que o menor tempo de RCP.

• O tempo de PCR ࣘ 4 minutos e de RCP ࣘ 20 minutos parecem relacionados a uma sobrevida superior a 72 horas.

FORMULÁRIO PARA COLETA DE DADOS

Identificação.

Nome:___________________________________________________ Rg:______________

Data de entrada: _____________ Hora:______________ Sexo: o Masculino

o Feminino

Idade: _______ □ < 45 anos

□ > 45 < 65

□ > 65 anos

□ outra informação _______________

Procedência da vítima: □ local do acidente

□ residência

□ transferido de outros hospitais.

Hospital____________________________

Transporte_________________________

(empresa)

Atendimento pré-hospitalar: □ unidade do resgate, básica

□ unidade do resgate, suporte avançado

□ outros serviços de resgate terrestre

Descriminar_________________________

__________________________________

(recurso, empresa, pessoal)

□ helicóptero / Águia Uno

□ outros serviços de resgate aéreo

Descriminar_________________________

__________________________________

(recurso, empresa, pessoal)

□ transeuntes / Familiares

□ polícia

□ taxi

□ outro

Descriminar_________________________

Dados sobre o trauma

Causa externa: □ queda da própria altura

□ queda em desnível

□ agressão com arma de fogo

□ agressão com arma branca

□ outros tipos de agressão. Qual_________________________

□ acidente automobilístico - motorista

□ acidente automobilístico - passageiro de auto - frente do veículo

□ acidente automobilístico - passageiro de auto - atrás do veículo

□ acidente automobilístico - atropelado

□ acidente automobilístico - motociclista

□ acidente automobilístico - passageiro de moto

□ outros. Descriminar______________________________

Local do acidente: □ via pública

□ residência

□ trabalho

□ outos. Descriminar___________________________

Diagnóstico de lesão

Tipo de trauma: □ com TCE

□ sem TCE

Lesões diagnosticadas:____________________________________________________

___________________________________________________

___________________________________________________

___________________________________________________

___________________________________________________

Dados sobre a Parada cardiorrespiratória

Data: Hora: Local: □ no local do acidente

□ no transporte

□ em outro lugar

□ no HC

Tempo entre PCR e início das manobras de reanimação:

< 4 minutos □ < 4 minutos

> 4 e < 7 minutos ou □ > 4 e<10

> 7 e < 10 □ > 10 minutos

> 10 minutos □ outra informação__________________

_________________________

Tempo de realização das manobras de reanimação:

< 5 minutos □ < 20 minutos

> 5 e < 10 minutos ou □ > 20 minutos

> 10 e < 20 minutos □ outra informação__________________

> 20 minutos _________________________

Evolução

Respostas à reanimação:

□ morte

□ retorno à circulação e respiração espontânea, sem recidiva de PCR no período de 1 hora

□ retorno à circulação e respiração espontânea, com recidiva de PCR no período de 1 hora.

□ retorno à circulação espontânea, sem recidiva de PCR no período de 1 hora.

□ retorno à circulação espontânea, com recidiva de PCR no período de 1 hora.

□ retorno à circulação com manutenção dependente de drogas vasoativas, sem recidiva de PCR no período de 1 hora.

□ retorno à circulação com manutenção dependente de drogas vasoativas, com recidiva de PCR no período de 1 hora.

Número de recidivas de PCR no período de observação: 24 horas _______

48 horas _______

72 horas _______

Óbito no período de observação: □ SIM

□ NÃO

Caso sim, data________________ Hora____________

DESEMPENHO CEREBRAL

TEMPO APÓS PCR 24 HORAS 48 HORAS 72 HORAS

CATEGORIA

CATEGORIAS DE DESEMPENHO CEREBRAL

(G LASGOW - PITTSBURG CEREBRAL PERFORMANCE SCALE)

(1) CONSCIENTE E ALERTA COM FUNÇÕES NORMAIS OU APRESENTA SOMENTE INCAPACIDADES

(2) LEVES CONSCIENTE E ALERTA COM INCAPACIDADE MODERADA1 1 incapacidade moderada - incapacidade que permite manutenção de vida independente.

(3) CONSCIENTE COM INCAPACIDADE GRAVE2 2 incapacidade grave - incapacidade que acarreta dependência de outrem para realização de atividades.

(4) COMATOSO OU EM ESTADO VEGETATIVO PERSISTENTE3 3 nesta categoria são incluídos indivíduos que não demonstram evidência de capacidade de resposta significativa. Não obedecem aos

(5) MORTE ENCEFÁLICA4 4 comandos simples e nem pronunciam qualquer palavra. Morte encefálica - morte definida, como tal, pelo Conselho Federal de Medicina e atestada por médico. OU MORTE BIOLÓGICA5 5 morte biológica - inclui pacientes que apresentam, parada respiratória e cardíaca não reversíveis.

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  • 7. CRUZ, D. A. L. M. etal. Reanimação cardiorrespiratória: conceitos e condutas no atendimento o adulto. Rev.Paul. Enf., v.11, n.3, p. 103-10, 1992.
  • 8. DALOSSI, T.; KOIZUMI, M.S. Estuo comparativo da gravidade o trauma de pacientes com ou sem traumatismo crânioencefálico. Rev Bras Neurol, v.30, n.6, p.181-9, 1994.
  • 9. EDGREN, E. et al. Assessment of neurological prognosis in comatose survivors of cardiac arrest. Lancet, v.343, n.8905, p.1055-9, 1994.
  • 10. FULTON, R.L et al. Confusion surrounding the treatment of traumatic cardiac arrest. J. Am. Coll. Surg., v. 181, n, 3, p.209-14, 1995.
  • 11. GROSWASSER, Z. et al. Rehabilitation outcome after anoxic brain damage, Arch Phys Med Rehabil. v.70, p.186-8, 1989.
  • 12. MULLIE, A. et al Predictive value of Glasgow coma score for awakening after out-of-hospital cardiac arrest. Lancet, v.1, n.8578, p.137-40, 1988.
  • 13. MURPHY, D. J. et al. Outcomes of cardiopulmonary resuscitation in the ederly. Ann.Intern.Med. v. 111, p. 199-205, 1989.
  • 14. NEATHERLIN, J.S.; BRILLHART, B. Glasgow coma scale scores in the patient post cardiopulmonary resuscitation. J. Neurosci Nurs.,c v. 20, n.2, p.104-9, 1988.
  • 15. NIEMANN, J.T. Cardiopulmonary resuscitation. N.Engl.J. Med. v.327, n.15,p.1075-80, 1992.
  • 16. PEIXOTO, M.S.P. et al. Ressuscitação cardiorrespiratória; assistência de enfermagem sistematizada. São Paulo, Revinter, 1997. cap.4, p.23-25: Fisiopatologia da parada  cardiorrespiratória.
  • 17. RIBEIRO, L.A.M. et al. Reanimação cardiopulmonar. Arq Bras Cardiol. v.37, n.6, p.481-7, 1981.
  • 18. ROGOVE, H.J. et al. Old age oes not negate good cerebral outcome after cardiopulmonary resuscitation: from the brain resuscitation clinical trials. Crit. Care Med., v.23, n.1, p.18-25, 1995.
  • 19. ROSEMURGY, A. S. et al. Prehospital traumatic cardiac arrest:the costoffutility. J Trauma. v.35, n.3, p.468- 74, 1993.
  • 20. SUNNERHAGEN, K. S. et al. Life after cardiac arrest; a retrospective study. Resuscitation . v.31, n.2, p.135-40, 1996.
  • 21. THOMPSON, R.G. et al. Bystander-initiated cardiopulmonary resuscitation in the management of ventricular fibrillation. Ann. Int Med, v. 90, n.5, p.737-40, 1979.
  • 22. TOVAR, E. A. et al. Successful myocardial revascularization and neurologic recovery in a patient with prolonged refractory cardiac arrest and chronically occluded left internal carotid artery. Tex Heart Inst J., v. 22, n. 3, p.271-3, 1995.
  • 23. YOUNG, W. W. et al. Defining the major trauma patient and trauma severity. J Trauma, v.31, n.8, p.1125-35, 1991.

ANEXO I 

  • 1
    incapacidade moderada - incapacidade que permite manutenção de vida independente.
  • 2
    incapacidade grave - incapacidade que acarreta dependência de outrem para realização de atividades.
  • 3
    nesta categoria são incluídos indivíduos que não demonstram evidência de capacidade de resposta significativa. Não obedecem aos
  • 4
    comandos simples e nem pronunciam qualquer palavra. Morte encefálica - morte definida, como tal, pelo Conselho Federal de Medicina e atestada por médico.
  • 5
    morte biológica - inclui pacientes que apresentam, parada respiratória e cardíaca não reversíveis.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Mar 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 1999
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