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Processo de enfermagem: fatores que dificultam e os que facilitam o ensino

Nursing process: factors that difficult and factors that facilitate the teaching

Resumos

Trata-se de um estudo que teve como objetivo, identificar como é oferecido o ensino do processo de enfermagem nas Escolas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo. A população foi composta de 247 docentes. Na metodologia de estudo foi elaborado um questionário, que foi enviado aos 899 docentes das 32 instituições públicas e privadas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo. Os resultados permitiram constatar que os fatores que dificultam o ensino do processo de enfermagem foram numericamente maiores que os que facilitam. Entretanto, o ensino do processo de enfermagem, apesar das dificuldades apresentadas, tem sido oferecido pelos docentes das escolas públicas e privadas do Estado de São Paulo.

Processo de enfermagem; Ensino superior


The present study intends to identify how the teaching nursing process in the Graduation Schools of the São Paulo State are presented. The population was composed of 247 docents. As part of the methodology a questionnaire was elaborated. It was sent to 899 docents of the 32 public and private nursing schools of the São Paulo State. The results demonstrated that the factors that difficult the teaching of the nursing process were bigger in number than the factors that facilitate. However, the teaching of the nursing process, despite the presented difficulties, has been offered to the teachers of public and private schools of the São Paulo State.

Nursing process; Higher education


ARTIGOS ORIGINAIS

Processo de enfermagem: fatores que dificultam e os que facilitam o ensino* * Trata-se de parte da dissertação "Ensino do processo de enfermagem nas escolas de graduação em enfermagem do Estado de São Paulo, apresentada à EEUSP em 1999. Este trabalho foi subvencionado pelo CNPq.

Nursing process: factors that difficult and factors that facilitate the teaching

Magda Cristina Queiroz Dell'AcquaI; Ana Maria Kazue MiyadahiraII

IProfessor Assistente do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Medicina de Botucatu -UNESP. mqueiroz@fmb.unesp.br

IIProfessor Titular do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem - USP/SP. Orientadora do estudo

RESUMO

Trata-se de um estudo que teve como objetivo, identificar como é oferecido o ensino do processo de enfermagem nas Escolas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo. A população foi composta de 247 docentes. Na metodologia de estudo foi elaborado um questionário, que foi enviado aos 899 docentes das 32 instituições públicas e privadas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo. Os resultados permitiram constatar que os fatores que dificultam o ensino do processo de enfermagem foram numericamente maiores que os que facilitam. Entretanto, o ensino do processo de enfermagem, apesar das dificuldades apresentadas, tem sido oferecido pelos docentes das escolas públicas e privadas do Estado de São Paulo

Palavras-chave: Processo de enfermagem. Ensino superior.

ABSTRACT

The present study intends to identify how the teaching nursing process in the Graduation Schools of the São Paulo State are presented. The population was composed of 247 docents. As part of the methodology a questionnaire was elaborated. It was sent to 899 docents of the 32 public and private nursing schools of the São Paulo State. The results demonstrated that the factors that difficult the teaching of the nursing process were bigger in number than the factors that facilitate. However, the teaching of the nursing process, despite the presented difficulties, has been offered to the teachers of public and private schools of the São Paulo State.

Keywords: Nursing process. Higher education.

1 INTRODUÇÃO

Atuar no ensino de graduação em enfermagem, enquanto docente da disciplina Enfermagem Médico- Cirúrgica, trouxe a re flexão que participar efetivamente da formação desses futuros profissionais é uma tarefa de grande responsabilidade, por compreender que o ensino pode oferecer elementos importantes para a prática profissional. É oportuno que se desenvolvam estudos e análises sobre a formação dos profissionais; daí o interesse em estudar o ensino do processo de enfermagem, vislumbrando-o como um instrumento de trabalho, que tenta através de uma linguagem comum caracterizar e facilitar o processo de cuidar.POTTER;PERRY (1989); CHRISTENSEN;KENNEY (1995) referem que o processo de enfermagem é um método para a organização e prestação do cuidado de enfermagem. Na literatura há outras denominações, sendo Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) e Metodologia da Assistência de Enfermagem (MAE), termos que genericamente são utilizados, para se referir a forma de organizar a assistência, embora, conceitualmentenão se caracterizam como sinônimos.

A base da ciência enfermagem é a sua estrutura teórica. O Processo de Enfermagem enquanto método, utiliza-se dessa estrutura e a aplica na prática. Tal abordagem deve ser deliberativa para solução de problemas e exige como requisito habilidades cognitivas, técnicas e interpessoais, com o objetivo de satisfazer às necessidades do cliente e família (SMITH; GERMAIN, 1975).

O Processo de Enfermagem tem na sua estrutura três grandes dimensões, que são analisadas como: propósito, organização e propriedades. O propósito principal do processo é oferecer uma estrutura que atenda às necessidades individualizadas do cliente, família e comunidade. Para que isso ocorra deve existir uma relação interativa entre o cliente e o enfermeiro, tendo como foco o cliente. A organização, como anteriormente mencionada, é a dimensão que conta com as cinco fases do processo. Como propriedades, são abordadas seis: ser intencional, sistemático, dinâmico, interativo, flexível e baseado em teorias (IYER; TAPTICH; BERNOCCHI-LOSEY, 1993).

Esses elementos citados são importantes, pois proporcionam ao enfermeiro alguns pontos para a reflexão sobre a estrutura que se operacionaliza, através das etapas do processo de enfermagem, realizando-o de forma que não seja mecânica, mas integrada.

É importante visualizar essas etapas inseridas em um contexto mais amplo na profissão, fazendo parte de uma proposta metodológica para o cumprimento das atividades do enfermeiro, auxiliando na tomada de decisões, prevendo e avaliando as conseqüências. Para a utilização de forma eficiente das etapas do processo, há necessidade da aplicação dos conceitos e teorias de enfermagem, das ciências biológicas, físicas e comportamentais e das humanas, para que se tenha um substrato racional ao tomar decisões, fazer julgamentos e nas relações interpessoais e ações de enfermagem (STANTON; PAUL; REEVES, 1993).

Ao discutir sobre o processo de enfermagem julga-se essencial comentar os modelos conceituais de enfermagem, que têm como objetivo organizar o pensamento do enfermeiro, sua observação e interpretação da realidade. Também visam fornecer uma estrutura sistemática e racional às atividades, direcionando as pesquisas para questões relevantes sobre o fenômeno (paciente, ambiente, saúde e enfermagem), mostrando soluções a problemas e fornecendo critérios gerais para se saber quando um problema foi resolvido. Além disso, as teorias de enfermagem especificam para os enfermeiros a missão e os limites da profissão. Elas clarificam o domínio das responsabilidades de enfermagem e permitem aos praticantes e/ou profissionais documentar serviços e resultados (HUCKABAY, 1991).

A necessidade de descrever, explicar, predizer e controlar os fenômenos com o propósito de um referencial próprio da enfermagem, fez com que na década de 50 surgissem os primeiros trabalhos de Hildegard Peplau, Virginia Henderson e Martha Rogers. Entre 1964 e 1981, pelo menos 22 modelos conceituais ou teorias de enfermagem foram publicados nos Estados Unidos (KIMURA, 1989).

No Brasil, como pioneira, destaca-se Horta; com a contribuição na realização de estudos e pesquisas desde a década de 60. Na década de 70 a referida autora propõe o modelo de assistência com base na teoria das necessidades humanas básicas (GUTIERREZ, 1981; SOUZA, 1981).

Wanda de Aguiar Horta apoiou-se em colocações conceituais, proposições e princípios que fundamentam a ciência da enfermagem. O processo é abordado numa sistematização de 6 fases que são dinamicamente inter-relacionadas, com o objetivo de assistir aos clientes, família e comunidade de forma individualizada (HORTA, 1979).

Diante da contribuição dos estudos realizados por Horta no Brasil, da realidade da profissão em outros países e do contexto atual, é coerente pensar também sobre o que dispõe o exercício profissional. Após a promulgação da Lei 7.498, de 25/06/86, referente ao exercício da enfermagem, dispõe o Art. 11, como atividades exclusivas do enfermeiro a "consulta de enfermagem; prescrição da assistência de enfermagem; cuidados diretos de enfermagem a pacientes graves com risco de vida; cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas" (BRASIL, 1986).

Sob esse contexto, parte-se da premissa que a sistematização da assistência de enfermagem deve ser incorporada à prática, como uma possibilidade relevante para se cumprir o que orienta e determina a lei do exercício profissional.

Em estudo feito por GUTIERREZ (1989), foram vários os argumentos que os enfermeiros apresentaram, justificando a difícil operacionalização do processo de enfermagem na prática, e um dos fatores já estudados foi a interferência da forma como o conhecimento teórico e prático foi transmitido na graduação, nos resultados da aplicação do processo.

Segundo SOUZA (1981), as informações teóricas e práticas do Processo de Enfermagem durante o curso de graduação, não estão sendo feitas de modo a levar ao conhecimento, a despertar nos alunos a compreensão, a consciência do valor dessa metodologia para a assistência de enfermagem. Ao que parece, estão sendo efetuadas de modo isolado, sem uma ampla concepção de assistência de enfermagem.

No Brasil, o ensino do Processo de Enfermagem nas escolas de graduação e também em cursos de pós-graduação teve seu ponto mais intenso na década de 70. Como já foi visto, de acordo com a evolução histórica da profissão, houve a influência de Horta nesse período em vários acontecimentos e, dentre outras atividades, houve a participação da Professora Horta em 1972, na Escola Ana Neri, que instituía naquele momento o 1° Curso de Mestrado em Enfermagem no Brasil (MEIRELLES, 1987).

Os estudos abaixo mencionados, sobre o ensino da Metodologia Assistencial de Enfermagem, ilustram a importância do tema para determinados Serviços e Escolas de Enfermagem do país.

Assim, em estudo feito junto aos alunos que cursavam a disciplina de Fundamentos de Enfermagem I da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, em 1986, estes descrevem quais foram suas percepções da experiência de ensino da Metodologia Assistencial de Enfermagem, obtendo-se como resposta vantagens e limitações (LAGANA; ARAUJO; SILVA; SANTOS, 1987).

No Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina, em pesquisa realizada por HORR; GONÇALVES; SAUPE (1987) foram identificadas a opinião e a experiência dos enfermeiros docentes e assistenciais, relativas à teoria e ao Processo de Enfermagem de Horta e comparadas estas opiniões atuais às de 1979. Evidenciou-se que a teoria das necessidades humanas básicas de Horta continuou a ser mais utilizada no ensino e na prática desses enfermeiros.

Na década de 80 as autoras SILVA; SANTOS; ARAUJO; LAGANA (1988) realizaram um estudo sobre o ensino da Metodologia da Assistência de Enfermagem em seis escolas de graduação da grande São Paulo, com 70 docentes de disciplinas do tronco profissionalizante e "concluíram que este não tem sido implementado de forma a garantir a competência do futuro profissional para direcionar seu trabalho tendo por base o método científico".

Parte-se também do pressuposto de que o processo ensino-aprendizagem influenciará nos resultados. CHAVES (1993) concluiu, ao analisar o desempenho dos papéis discentes e docentes no curso de graduação em Enfermagem da USP, que embora ambos os grupos aspirem por mudanças significativas em relação ao papel que desempenham, seus comportamentos reiteram os antigos papéis sociais baseados no modelo pedagógico tradicional.

IDE , (1996), quanto às atividades a serem desempenhadas, o docente pode construir uma "trajetória de adesão e a um esquema de representações e de ações peculiar, apto a promover uma gradativa e crescente sintonia com o contexto de trabalho desenvolvido numa cultura institucional específica". Este envolvimento também poderá melhorar os resultados do processo ensino-aprendizagem.

BOCCHI; PESSUTO; DELL'ACQUA (1996) avaliaram as contribuições e dificuldades sentidas pelos alunos de graduação, na utilização do Modelo Operacional de Estudo de Caso, proposto pelas autoras como uma estratégia de ensino utilizado na disciplina Enfermagem Médico-Cirúrgica, que oferece o conteúdo de processo de enfermagem. Obtiveram 70% de respostas reconhecendo o modelo como estratégia de ensino, auxiliando-os na construção do conhecimento teórico-prático. Para ensinar enfermagem e mais especificamente o método do processo de enfermagem, o professor além de acreditar tem que encontrar estratégias que possam favorecer o processo ensino-aprendizagem.

Face à importância do tema em questão, o presente estudo tem como objetivo identificar os principais fatores que dificultam e aqueles que facilitam o ensino do Processo de Enfermagem, segundo os docentes das Escolas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo.

2 METODOLOGIA

2.1 População/amostra

A população alvo ou amostra deste estudo foi constituída pelos docentes de todas as Escolas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo. Segundo os dados fornecidos pelo Comitê de Ensino Superior de Enfermagem SP (CESE)-apoiado pela ABEn-SP e o Grupo de Investigação em Recursos Humanos Enfermagem (GIRHE)- ligado à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto; atualmente são 32 instituições de ensino com Cursos de Graduação em Enfermagem, sendo designados para esta pesquisa números de 1 a 32 para cada uma delas.

Para as 32 Instituições de Ensino de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo, foram enviados questionários a todos os docentes do tronco profissionalizante, perfazendo um total de 899 docentes.

Do total de 899 docentes, 556 destes são de oito escolas públicas, 343 docentes de 24 escolas privadas. Obteve-se um retorno geral de aproximadamente 27,5% dos questionários enviados, o que resultou em um total de 247 respostas de docentes.

Os critérios para inclusão dos docentes foram: a) - consentir em participar da pesquisa, após os devidos esclarecimentos do estudo; b) - ministrar aula no tronco profissional, nos Cursos de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo.

2.2 Coleta de dados

Coletou-se os dados nos meses de março à julho de 1998, com o auxílio dos representantes de cada instituição.

2.2.1 Instrumento

Para a obtenção dos dados elaborou-se um questionário que foi acompanhado de um ofício construído à luz da resolução 196/96 do Ministério da Saúde, que traz as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo Seres Humanos, esclarecendo sobre os objetivos e os procedimentos que serão utilizados na pesquisa , para que os sujeitos pudessem sentir-se livres para participar ou não da coleta de dados .0 projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Medicina de Botucatu-Universidade Estadual Paulista e obteve-se em ofício 077/98, parecer favorável.

2.2.2 Operacionalização

Inicialmente foi realizado um contato pessoal, por telefone, da pesquisadora com cada diretor (a), coordenador (a) de curso, chefe de departamento ou secretária acadêmica, para solicitar o endereço completo e correto das instituições, bem como o número de docentes do tronco profissionalizante de cada Escola de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo. Nesta oportunidade foi esclarecida a finalidade desta solicitação, e os trâmites da pesquisa no Comitê de Ética.

Após o contato pessoal com estes representantes das 32 instituições, explicando a finalidade e os objetivos da pesquisa, foi solicitado a autorização e colaboração para que os questionários enviados fossem distribuídos aos docentes. Encaminhou-se para todas as escolas um pacote via SEDEX, nominal à pessoa contatada por telefone, contendo os questionários, com os ofícios, em um envelope previamente selado e preenchido com o endereço da pesquisadora para o retorno.

2.3 Tratamento estatístico

Os dados foram eletronicamente compilados em uma planilha de dados pela própria pesquisadora, e utilizou-se do programa Excel/97. Para o tratamento dos dados, usou-se o Software Release 6.12, Statistical Analysis System (SAS).

Fez-se um estudo descritivo observando as freqüências absolutas e percentuais. Calculou-se médias e desvios-padrão referentes aos percentuais de questionários retornados (FISHER; BELLE, 1993).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Fatores que dificultam e/ou facilitam, comentários e sugestões sobre o ensino do processo de enfermagem

Após o encaminhamento de 899 questionários, o total geral de retornos foi de 228 questionários de docentes, já excluídos os 19 questionários, de escolas públicas que retornaram totalmente em branco.

Abordar-se-ão os fatores, que dificultam ou facilitam, bem como, os comentários e sugestões sobre o ensino do processo de enfermagem, por ordem de prioridade, tentando considerar o grau de importância referido às citações dos docentes, sobre os fatores apontados pelos professores que ministram algum conteúdo relativo a esse tema.

Observou-se que do total de 100 citações para primeira prioridade de dificuldades, o percentual mais elevado foi, 45 (45,0%) citações dos docentes, para o item "campo prático não adota o método", conforme TABELA 1. O mesmo fator, "campo prático não adota o método", surgiu com 20 (27,4%) citações dos docentes, despontando como segunda prioridade.

Na seqüência os fatores que dificultam foram decrescendo, na segunda prioridade houveram 73 citações e 38 citações de docentes para terceira prioridade.

LAGANA; ARAUJO; SILVA; SANTOS (1987) encontraram no trabalho que teve por finalidade descrever como o aluno de Fundamentos de Enfermagem era introduzido na prática da metodologia assistencial, as limitações que poderiam ser vistas como dificuldades. Os alunos percebiam a divergência entre o modelo assistencial apresentado pelo docente e o encontrado no campo, e que isto dificultou o entendimento do papel do enfermeiro.

WALDOW (1988), em estudo sobre o processo de enfermagem, apontou a integração docente assistencial como um dos requisitos para que o processo de enfermagem fosse efetivo e eficazmente viabilizado, entendendo por isso não a simples prestação de serviço do docente para a instituição. A autora abordou a necessidade de reunirem-se enfermeiros docentes e enfermeiros assistenciais, expondo suas dificuldades e experiências.

ENDERS; SOUZA; FORMIGA; MENEZES (1989) corroboraram dizendo que o ensino teórico-prático da assistência de enfermagem, embora considerando a problemática complexa que é o ensino, os resultados mostraram que naquela realidade caracterizou-se principalmente pela desintegração do ensino teórico-prático, necessitando definição da base conceitual e teórica do exercício da assistência, em conjunto com os enfermeiros docentes e assistenciais.

Como já foi dito, acredita-se que todos os fatores apontados pelos docentes, embora com menores freqüências, devam ser considerados relevantes para uma reflexão, com o intuito de identificar os pontos que precisam ser ultrapassados para se obter melhores condições e resultados para o ensino e aplicabilidade do processo de enfermagem.

Em estudo de GUTIERREZ (1989), sobre a intervenção do enfermeiro: uma análise a partir da prática, a autora concluiu que "desempenhavam um papel importante na forma de intervenção das enfermeiras, a sua formação acadêmica, a sua prática profissional, os seus valores pessoais e a estrutura institucional".

NODA (1992) concluiu em seu estudo sobre o processo de enfermagem de Horta na assistência à criança hospitalizada, quanto à variável fonte de aprendizagem, que a maioria das enfermeiras investigadas relataram que não tiveram aulas teóricas sobre os passos do processo, durante a graduação em enfermagem.

Quanto aos fatores que facilitam o ensino do processo de enfermagem, estão três elencos de prioridades. Dos três, em ordem decrescente houveram 84, 38 e 11 citações de docentes para esses fatores que facilitam o ensino. Os docentes apresentaram numericamente mais fatores que dificultam do que fatores que facilitam o ensino do processo de enfermagem.

Dentre os fatores que facilitam, na TABELA 2, como primeira prioridade ocorreram 21 (25,0%) citações de docentes para "crença do docente no método", 14 (16,7%) citações de docentes para "o aluno percebe o resultado", 12 (14,3%) citações de docentes para "conhecimento prévio de outras disciplinas", 11 (13,1%) citações de docentes para "permite ao aluno uma visão global e individual do paciente". Alguns fatores surgiram em oposição aos que dificultam como: "ter o campo de estágio com o método implantado" e "prática em campo".

Em pesquisa realizada por SILVA; SANTOS; ARAUJO; LAGANA (1988), sobre o ensino da metodologia da assistência de enfermagem nas escolas de graduação em enfermagem da grande São Paulo, as autoras concluíram em entrevista com 70 docentes de disciplinas do tronco profissionalizante que "não tem sido implementado de forma a garantir a competência do futuro profissional, nem para direcionar seu trabalho tendo por base o método científico". Levantou-se como justificativas para não ensinar a metodologia de assistência os itens: "não é crença da disciplina", "a disciplina tem carga horária pequena", "o ensino é de competência de outras disciplinas", "a disciplina não desenvolve ensino prático". Os itens que justificaram o ensino foram: "crença da disciplina"; "filosofia da escola" e "visão global do ser humano".

Com isto, percebe-se grande semelhança dessas expressões às encontradas no presente estudo, mesmo após 10 anos de diferença entre as pesquisas. Verificou-se que os conceitos também se opõem quando questionados os docentes sobre as dificuldades ou justificativas para não ministrar o conteúdo e facilidades ou justificativas para ministrar a metodologia da assistência.

A questão referente aos comentários e/ou sugestões sobre o tema estudado teve no total 118 citações dos docentes, inferior aos 147 docentes do estudo, visto que alguns docentes não fizeram comentários finais, pois já haviam respondido o que' desejavam nas questões relativas aos fatores que dificultam e/ou facilitam o ensino.

Dos comentários sobre o tema, na TABELA 3 obteve-se 37 (31,4%) citações dos docentes, como o percentual mais elevado, para o item "é fundamental ter o cuidado sistematizado" e 29 (24,6%) citações de docentes para "deveria ser ensinado em todas as escolas de graduação". Diante destes resultados infere-se que estes docentes também possam querer que o ensino não apenas ocorra, mais de maneira suficiente e como refletiu WALDOW (1988), de forma realista e, se possível, neutra, ou seja, possibilitando aos alunos o contato com vários enfoques teóricos e modelos, com a finalidade de conhecer as diferentes abordagens, para após formados optarem pela que melhor se adapte a sua filosofia e às características do serviço, da clientela, dos recursos e da especialidade que irão trabalhar.

Outro comentário realizado foi acerca da necessidade de "ter uniformidade entre as disciplinas" com 15 (12,7%) citações dos docentes, evidenciando, para esses docentes, a importância de se ter o conteúdo discutido entre as disciplinas, levantando pontos comuns e propiciando que todas as disciplinas pudessem participar deste processo.

O item "discutir o método criticamente durante o ensino para ter possibilidade dos efeitos benéficos" com 7 (5,9%) citações dos docentes, pode relacionar-se as considerações feitas pelos autores ROPER; LOGAN; TIERNEY (1997) que dizem respeito a acreditar que a metodologia da assistência possa resolver todos os problemas da prática, esperando assim, mais do que ela realmente pode proporcionar.

O item "importante para o desenvolvimento da profissão" com 6 (5,1%) citações de docentes e o item "é um caminho para a autonomia" com 5 (4,2%) citações também foram comentados pelos docentes, sobre o ensino do processo de enfermagem. Para CRUZ (1997), "no contexto das profissões a autonomia é considerada um dos requerimentos para que uma atividade adquira o status de profissão". Este comentário pode proporcionar que se reflita como está a enfermagem enquanto profissão.

Diante dos dados, pôde-se considerar que apesar das dificuldades relatas pelos docentes, para ensinarem o processo de enfermagem, estes colocaram-se de forma favorável para discutir o tema. Isto é avaliado pelas autoras do presente estudo como um fator importante para se ampliar e dar seqüência às discussões e estudos sobre o assunto.

4 CONCLUSÕES

O estudo permitiu as seguintes conclusões:

Em relação aos fatores que dificultam ou facilitam, comentários e sugestões sobre o ensino do processo de enfermagem verificou-se que: o elenco de fatores que dificultam foi decrescendo numericamente, segundo as três prioridades levantadas, respectivamente 100, 73 e 38 citações para a 14 , 2ª e 34prioridades, respectivamente. O tópico "campo prático não adota o método" foi citado por 45 (45,0%) docentes como primeira prioridade, sendo que o mesmo tópico foi citado em segunda prioridade por 20 (27,4%) docentes. Para terceira prioridade surgiu com 10 (26,3%) citações o fator "falta de crença do docente no método". Quanto aos fatores que facilitam o ensino do processo, houve menos citações, também havendo um decréscimo: foram 84, 38 e 11 citações de docentes para a 1ª, 2ª. e 3ªprioridades respectivamente. O item "crença do docente no método" surgiu com 21 (25,0%) citações na primeira prioridade; o item "acreditar que este é um caminho adequado para a profissão" teve 12 (31,6%) de citações e em terceira prioridade destacou-se com 4 (36,4%) citações "o aluno ter uma visão global e individual do paciente". Quanto aos comentários ou sugestões, do total de 118 citações o percentual mais elevado foi de 31,4% para "é fundamental ter o cuidado sistematizado".

Este estudo permitiu identificar os fatores que dificultam e facilitam o ensino deste conteúdo e os comentários e sugestões feitas pelos docentes das Escolas de Graduação em Enfermagem do Estado de São Paulo.

Perante os dados, concluiu-se que o ensino do Processo de Enfermagem, apesar das dificuldades apresentadas, tem sido oferecido pelos docentes das escolas públicas e privadas do Estado de São Paulo.

Considerou-se, desta forma, que o trabalho pôde contribuir na medida em que permitiu divulgar e discutir a importância do tema, bem como oferecer aos professores de enfermagem alguns pontos a serem refletidos, quando estiverem realizando o planejamento e a implementação de suas disciplinas.

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    Trata-se de parte da dissertação "Ensino do processo de enfermagem nas escolas de graduação em enfermagem do Estado de São Paulo, apresentada à EEUSP em 1999. Este trabalho foi subvencionado pelo CNPq.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Dez 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2000
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