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Assistência domiciliaria ao idoso: perfil do cuidador formal - parte I

The home care of elderly: caregiver profile - part one

Asistencia domiciliar al anciano: perfil del cuidador formal - parte I

Resumos

O idoso fragilizado, mantido em seu domicílio, requer cuidados específicos, os quais são realizados muitas vezes por pessoas contratadas, pelas famílias, sem necessariamente terem formação específica e são comumente denominadas cuidadores formais. Frente o aumento da oferta de trabalho destas pessoas e a escassez de literatura sobre seu perfil, desenvolvemos um estudo com 41 anunciantes que ofereceram seus serviços em dois jornais de maior circulação no município de Campinas, São Paulo, com os seguintes objetivos: 1. caracterizar estes cuidadores e 2. verificar as atividades propostas para a assistência ao idoso. No presente trabalho são apresentados os dados referentes as características dos cuidadores quanto: ao sexo, a idade, a formação e experiência anterior, disponibilidade de horário e remuneração exigida.

Idosos; Cuidados domiciliares de saúde; Cuidadores


The frail elderly, maintained in its home, request specific cares, wich are accomplished many times by people contracted, denominated formal caregivers. With the increase of offer of these people's work and the shortage on its profile, we developed a study with 41 advertisers that offered its services in two newspapers of larger circulation in the city of Campinas, São Paulo, with the following objectives: 1. to characterize these caregivers and 2. to verify the activities proposals for care to the elderly. In the present work the referring data are presented the caregivers' characteristics as: to the sex, the age, the formation and previous experience, schedule readiness and demanded remuneration.

Elderly; Home nursing; Caregivers


El anciano debilitado, mantenido en su habitación, carece de cuidados específicos, los cuales han sido realizados muchas veces por personas contratadas, denominadas cuidadores formales. Frente al aumento de oferta e trabajo de estas personas y a la escasez de literatura sobre el perfil, desarrollamos un estudio con 41 anunciantes que ofrecieron sus servicios dos periódicos de grande circulación en el municipio de Campinas, San Pablo, con los siguientes objetivos: 1. caracterizar estos cuidadores y 2. verificar las actividades propuestas para la asistencia al anciano. El presente trabajo presenta los datos referentes a las características de los cuidadores con respecto a: sexo, edade, formación y experiencia previa, disponibilidad de horario y remuneración exigida.

Ancianos; Asistencia domiciliar; Cuidadores


ARTIGOS ORIGINAIS

Assistência domiciliaria ao idoso: perfil do cuidador formal - parte I* * Parte do trabalho de Iniciação cientifica com financiamento da FAPESP(Proc. N 5 97/13702-9) Tema livre apresentado no 51º Congresso Brasileiro de Enfermagem, realizado de 02 a 07 de outubro de 1999, Florianópolis, SC.

The home care of elderly: caregiver profile - part one

Asistencia domiciliar al anciano: perfil del cuidador formal - parte I

Kozue KawasakiI; Maria José D'Elboux DiogoII

IAluna do Curso de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP

IIEnfermeira. Professor Assistente Doutor no Departamento de Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas. Email:mariadio@uol.com.br

RESUMO

O idoso fragilizado, mantido em seu domicílio, requer cuidados específicos, os quais são realizados muitas vezes por pessoas contratadas, pelas famílias, sem necessariamente terem formação específica e são comumente denominadas cuidadores formais. Frente o aumento da oferta de trabalho destas pessoas e a escassez de literatura sobre seu perfil, desenvolvemos um estudo com 41 anunciantes que ofereceram seus serviços em dois jornais de maior circulação no município de Campinas, São Paulo, com os seguintes objetivos: 1. caracterizar estes cuidadores e 2. verificar as atividades propostas para a assistência ao idoso. No presente trabalho são apresentados os dados referentes as características dos cuidadores quanto: ao sexo, a idade, a formação e experiência anterior, disponibilidade de horário e remuneração exigida.

Palavras-chave: Idosos. Cuidados domiciliares de saúde. Cuidadores.

ABSTRACT

The frail elderly, maintained in its home, request specific cares, wich are accomplished many times by people contracted, denominated formal caregivers. With the increase of offer of these people's work and the shortage on its profile, we developed a study with 41 advertisers that offered its services in two newspapers of larger circulation in the city of Campinas, São Paulo, with the following objectives: 1. to characterize these caregivers and 2. to verify the activities proposals for care to the elderly. In the present work the referring data are presented the caregivers' characteristics as: to the sex, the age, the formation and previous experience, schedule readiness and demanded remuneration.

Keywords: Elderly. Home nursing. Caregivers.

RESUMEN

El anciano debilitado, mantenido en su habitación, carece de cuidados específicos, los cuales han sido realizados muchas veces por personas contratadas, denominadas cuidadores formales. Frente al aumento de oferta e trabajo de estas personas y a la escasez de literatura sobre el perfil, desarrollamos un estudio con 41 anunciantes que ofrecieron sus servicios dos periódicos de grande circulación en el municipio de Campinas, San Pablo, con los siguientes objetivos: 1. caracterizar estos cuidadores y 2. verificar las actividades propuestas para la asistencia al anciano. El presente trabajo presenta los datos referentes a las características de los cuidadores con respecto a: sexo, edade, formación y experiencia previa, disponibilidad de horario y remuneración exigida.

Palabras -clave: Ancianos. Asistencia domiciliar. Cuidadores.

INTRODUÇÃO

O envelhecimento é um fenômeno do processo de vida que, assim como a infância, a adolescência e a maturidade, é marcado por mudanças bio-psico-sociais específicas, associadas à passagem do tempo. Mesmo sendo universal, varia de indivíduo para indivíduo, sendo essas diferenças, geneticamente determinadas mas também influenciadas, entre outros fatores, pelo estilo de vida, pelas características do meio ambiente e pelo estado nutricional de cada um.(1)

Apesar do envelhecimento populacional ser uma conseqüência natural do desenvolvimento e modernização, no Brasil, transformou-se em um grave problema social observando as condições de vida e bem-estar a que a população idosa está submetida(2)

O processo de envelhecimento traz muitas alterações fisiológicas no organismo do idoso, fragilizando-o e facilitando a instalação de afecções. São, portanto, mudanças normais do organismo do idoso que causam o aumento da vulnerabilidade às doenças e grande dificuldade no restabelecimento da saúde.

A modernização e a melhoria nas condições sociais, econômicas e de saúde, o controle parcial das doenças evitáveis por meio de imunizações e campanhas, e a incorporação de sistemas de saneamento básico ao espaço urbano, levaram à mudanças nos padrões de morbidade e mortalidade. No Brasil a transição epedimiológica apresenta algumas peculiaridades, conforme aponta Chaimowicz (3): temos uma superposição entre as etapas que predominam as doenças transmissíveis e as doenças crônico-degenerativas e ainda encontramos uma contra-transição, caracterizada pela reintrodução de algumas doenças e o aumento de outras como a malária.Ademais, encontramos uma transição prolongada, caracterizada pelos elevados padrões de morbi-mortalidade.

Segundo Veras(4) "a medida que a expectativa de vida aumenta, haverá um aumento drástico e catastrófico na prevalência de distúrbios mentais e doenças crônicas em idosos." Muitas das doenças de fácil cura para um jovem ou adulto tornam-se crônicas e até fatais ao idoso, os sintomas são agravados, pois a fragilidade do organismo é acentuada na velhice e a falha do sistema imune pode causar piora do quadro patológico, interferindo diretamente na sua qualidade de vida.

Uma vez acometido por uma doença crônico-degenerativa, geralmente o idoso requer cuidados especiais, pois torna-se dependente. Nesse momento surge a figura do cuidador, que na maioria das vezes é um membro da família ou amigo próximo que auxilia este idoso, de forma parcial ou integral nas dificuldades ou incapacidades para realizar as atividades de vida diária. Essa pessoa é denominada cuidador informal.(5)

Esse cuidado informal normalmente é reservado para a mulher sendo considerada por Saad (2) como tradicional provedora de cuidados básicos aos idosos dentro da família. No entanto, a estrutura familiar na realidade brasileira vem mudando e a mulher não mais trabalha exclusivamente no lar, ao contrário, engaja-se cada vez mais no mercado de trabalho.

O cuidado diário e permanente ao idoso dependente produz perturbações, que por menor que sejam, afetam a vida familiar. A mudança no exercício de papéis, angustiante em virtude do envolvimento afetivo paciente idoso e família, a diminuição do tempo de relacionamento com amigos e vizinhanças, a solidão, a sobrecarga e a frustração por não conseguir colocar em prática seus próprios projetos de vida, fazem parte dessas perturbações que em determinado momento saturam o cuidador de tal forma que volte em busca de alternativas de cuidado como a contratação de um indivíduo para prestar assistência ao idoso. Esses indivíduos são denominados cuidadores formais que não raramente assumem sozinhos a assistência ao idoso, sem ter uma equipe para dividir as responsabilidades da tarefa.(6)

Os cuidadores formais que se habilitam a prestar assistência aos idosos no domicílio nem sempre possuem uma formação adequada para o desempenho dessa função. Muitas vezes são "acompanhantes com prática de enfermagem" segundo eles se autointitulam, conforme dados obtidos por Duarte (7), o que significa que não possuem qualquer curso de enfermagem, seja em nível médio ou superior, mas realizam cuidados de enfermagem, colocando em risco, muitas vezes, a qualidade de vida do idoso.

Estas pessoas não são profissionais pois na área de enfermagem contamos com as seguintes categorias: enfermeiro, técnico de enfermagem e auxiliar de enfermagem. O atendente de enfermagem, considerado "ocupacional", embora seja um trabalhador que não possui formação formal regulamentada, está sendo qualificado por força da Lei n 7.498/86. Mesmo assim, ainda existem no mercado em grande número. Segundo a resolução COFEN- 185 de 1995 só é facultado ao atendente de enfermagem o exercício de tarefas elementares "ações de fácil execução e entendimento, baseadas em saberes simples, ... não envolvem cuidados diretos ao paciente...".

Os profissionais da equipe de enfermagem possuem formação específica para cada categoria (segundo e terceiro grau). Ademais devem ser registrados no Conselho Regional de Enfermagem (COREn), órgão fiscalizador das diferentes categorias. O aumento da população idosa dependente, que necessita de cuidados especiais de forma integral, acrescido da escassez de recursos do sistema de saúde para atender a esta demanda tem favorecido o tratamento no domicílio. Inclusive, a Assistência Domiciliária ou Atendimento Domiciliário é uma das modalidades de atenção ao idoso previstas na Portaria nº 73 de 10 de maio de 2001 da Secretaria do Estado de Assistência Social. Esta portaria regulamenta a atividade, bem como dispõe sobre os recursos humanos necessários para tal modalidade assistencial, com a inclusão da figura do cuidador. No entanto, a falta de profissionais qualificados e a justificativa referente aos altos custos de um serviço particular de enfermagem, têm propiciado discussão no âmbito da gerontologia sobre a criação de novas ocupações e funções de nível médio como "geri sitter" ou assistente de geriatria e gerontologia e o atendente pessoal.(8)

Atualmente, as publicações têm considerado como cuidadores todos os que dispensam cuidados a terceiros sendo então utilizada uma classificação para as multi qualificações desses indivíduos. Segundo a classificação de Wanderley (9), existem vários tipos de cuidadores, listados abaixo com suas particularidades, porém a autora ressalta que não são categorias excludentes, mas sim complementares, podendo o cuidador apresentar mais de uma classificação.

- cuidador remunerado: recebe um rendimento pelo exercício da atividade de cuidar;

- cuidador voluntário: não é remunerado;

- cuidador principal: tem a responsabilidade permanente da pessoa sob seu cuidado;

- cuidador secundário: divide, de alguma forma, a responsabilidade do cuidado com um cuidador principal, auxiliando-o, substituindo-o;

- cuidador leigo: não recebeu qualificação para o exercício profissional da atividade de cuidar;

- cuidador profissional: possui qualificação específica para o exercício da atividade (enfermeiro, terapeuta, etc.);

- cuidador familiar: tem algum parentesco com a pessoa cuidada;

- cuidador terceiro: não possui qualquer grau de parentesco com a pessoa cuidada.

Assim, o cuidador que denominamos formal pode ser entendido nesta classificação como cuidador remunerado, principal, leigo, profissional e terceiro uma vez que nesta classificação sobrepõem-se grau de parentesco, remuneração e formação.

Isto posto, a questão a ser trabalhada recai sobre esses cuidadores formais, qual é o perfil desses cuidadores, suas qualificações e quanto exigem pelo trabalho de cuidador.

Há escassa literatura científica publicada sobre essa questão, no entanto a oferta dos serviços dessas pessoas vêm crescendo visivelmente na imprensa escrita, principalmente nos jornais de grande circulação e em revistas não científicas.

A descrição desses trabalhadores é impres-cindível para conhecermos as características dos indivíduos que dispensam cuidados aos idosos no domicílio.

OBJETIVO

O objetivo desse trabalho é caracterizar o perfil do indivíduo que se oferece para cuidar de idosos em domicílio, no município de Campinas, quanto ao sexo, a idade, a formação e a experiência anterior, disponibilidade de horário e remuneração exigida.

SUJEITOS E MÉTODO

Trata-se de parte de um estudo exploratório realizado com indivíduos que se oferecem para cuidar de idosos em domicílio, localizados a partir de anúncios em jornais de maior circulação.

SUJEITOS DA PESQUISA: Os sujeitos da presente pesquisa foram 41 anunciantes de ambos os sexos que ofereceram seus serviços por meio dos jornais de maior circulação no município de Campinas.

INSTRUMENTO PARA COLETA DE DADOS: Para este trabalho será apresentado a primeira parte do instrumento utilizado para a coleta de dados na pesquisa como um todo. Esta parte visou levantar as características do cuidador como idade, sexo, qualificação, curso preparatório, local da assistência, experiência anterior no cuidado de idosos, disponibilidade de horário, esquema de folgas, trabalho em outro emprego, remuneração exigida e sua relação com agências de emprego de enfermagem .

O termo qualificação foi utilizado para se designar as diferentes categorias dos anunciantes, mesmo considerando que o acompanhante e o atendente de enfermagem não possuam qualificação específica. No item qualificação, o atendente de enfermagem foi assim denominado uma vez que existe no mercado em grande número e continuam a ser assim denominados principalmente quando oferecem seus serviços.

Os dados serão apresentados em tabelas onde foram empregadas as abreviações para as qualificações: E para o enfermeiro, TE para o técnico, AE ao auxiliar, AT para o atendente e AC para o acompanhante.

PROCEDIMENTO PARA A COLETA DE DADOS

Os anúncios foram obtidos através dos jornais Correio Popular e Diário do Povo, por serem considerados os de maior circulação na cidade de Campinas. O período de coleta foi de três meses, com início no mês de julho e término em setembro de 1998. A estratégia usada para a coleta de dados foi a

entrevista através do contato telefônico, realizado uma vez por semana, embora os anúncios fossem recortados diariamente. Muitos desses anúncios se repetiram no decorrer do período, assim dos 74 recortes, foram realizados 44 contatos telefônicos sendo três deles de agências de enfermagem. No entanto, nem sempre o número telefônico anunciado correspondia ao local de contato do anunciante. O entrevistado era informado sobre a realização da presente investigação, garantindo o seu anonimato e respeitando a não concordância do mesmo em participar desse trabalho. Com o objetivo de homogeneizar a necessidade dos cuidados a serem dispensados pelo cuidador, foi apresentado a ele, uma situação hipotética de uma idosa necessitando de cuidados.

Durante a coleta de dados foram excluídos os anúncios de agências de enfermagem, totalizando três, que ofereciam indivíduos de várias qualificações (auxiliares, atendentes de enfermagem e acompa-nhantes) e que atendiam não somente a idosos, mas politraumatizados e pacientes com câncer e Aids.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados serão apresentados e discutidos seguindo o roteiro do instrumento utilizado na coleta de dados.

Segundo a Tabela 1, a maior parte dos anunciantes (48,8%), encontra-se na faixa etária entre 31 a 40 anos, seguido de 41 a 50 anos (21,9%), 51 a 60 (17,1%) e 21 a 30 anos (12,2%).

Agrupando-se a faixa etária compreendida entre 31 a 50 anos, observa-se que a maioria dos anunciantes está em idade produtiva, ou seja, de exercer um trabalho, o que auxilia na renda familiar através da reintegração da mulher ao mercado de trabalho, uma vez que nesta faixa etária predominante a maioria já possui filhos e estes já não estão tão dependentes dos cuidados maternos.

Em algumas situações o anunciante procura conciliar sua jornada de trabalho com os afazeres domésticos, como o exemplo de uma entrevistada jovem que não possuía experiência anterior nenhuma mas queria trabalhar com idosos "sadios" pois teria condições de trabalhar e ao mesmo tempo cuidar do filho recém nascido que não tinha com quem deixar.

Alguns anunciantes relatam que prestam esse tipo de serviço por “falta de opção”, como o exemplo de uma atendente de enfermagem que não consegue obter trabalho em hospitais pois não contratam mais profissionais de sua categoria e como necessita trabalhar, resolveu anunciar seus serviços como cuidadora de idosos. Outro exemplo é a técnica de enfermagem que, desempregada, resolveu anunciar-se como cuidadora enquanto aguarda ser chamada por algum hospital.

Ainda nesta mesma faixa etária, muitas vezes o anunciante já vivenciou experiência anterior no cuidado de parentes, principalmente dos pais e conhecidos. Um exemplo desta situação foi uma entrevistada que cuidou do marido doente e após a sua morte ficou sozinha pois os filhos haviam se casado, então anunciou seu serviço como dama de companhia para idosos, tanto para exercer tal tarefa quanto para ela própria ter uma companhia.

Outra entrevistada relatou que cuidou da avó por muitos anos e agora que ela morreu, sente muita falta de alguém, por isso quer cuidar de outras "avozinhas".

Os resultados apresentam um predomínio da faixa etária de 31 a 40 anos (48,8%) porém a porcentagem de cuidadores entre 41 a 60 anos também foi alta (39%), indo de encontro ao estudo realizado por Felgar (10) com cuidadores de pacientes que sofreram AVC, onde 46,8% dos cuidadores apresentavam entre 40 e 59 anos, concluindo que "pessoas idosas estão cuidando de pessoas idosas".

Houve uma inquestionável predomínio de anunciantes do sexo feminino (n=39) com apenas dois homens que prestam serviços como cuidador.

Esse predomínio de mulheres que se oferecem para cuidar de idosos pode ser justificado pelo fato da mulher ser considerada "tradicional provedora dos cuidados básicos aos idosos dentro da família" (2).

Segundo Silva (11), "na nossa sociedade é usual afirmar que cuidar de casa, de filhos ou de idosos é função da mulher, porque ela é destinada por natureza, para a vida doméstica, para ser mãe e cuidar da família. Assim são atribuídas, às mulheres, funções que são vistas pelo senso comum como funções femininas. O cuidar do outro configura como mais uma das tarefas "naturais da mulher". Conforme Wanderley(9), a mulher primeiro cuida dos filhos, depois do marido e posteriormente dos velhos e doentes.

A prevalência de pessoas do sexo feminino que atuam como cuidadores de idosos também foi observada no estudo realizado por Felgar(10) onde apenas um dos 35 cuidadores era do sexo masculino, confirmando a prevalência da mulher no cuidado.

Isso se comprova ao observar a tradição no predomínio de alunos do sexo feminino nos cursos de auxiliar, técnico e mesmo a graduação em enfermagem, cursos de formação profissional voltado para o cuidado.

A amostra dos anunciantes estudada apresenta um predomínio de indivíduos de baixa qualificação, sendo 53,6% acompanhantes, seguido de 24,3% auxiliares de enfermagem, 12,2% atendentes, 7,35 enfermeiros e 2,4% técnico de enfermagem. O mesmo também foi observado no estudo realizado por Duarte (7) onde 34,38% da sua amostra eram de acompanhantes de enfermagem, 31,04% por atendentes, 31,04% por auxiliares de enfermagem e apenas 3,44%, no caso um indivíduo, possuía o curso de graduação em enfermagem.

Assim, por meio dos dados obtidos verifica-se que a função de cuidador do idoso parece ser um novo e amplo mercado de trabalho, principalmente para a mulher, mesmo sem qualquer qualificação.

Dentre os 41 anunciantes, apenas quatro referiam ter realizado curso específico de "cuidador de idoso" sendo dois auxiliares de enfermagem, dois atendentes de enfermagem e um acompanhante. A maior parte dos anunciantes apresenta algum tipo de curso profissionalizante (graduação, curso técnico, auxiliar e de atendente) caso contrário eram considerados apenas acompanhantes. Observa-se o reduzido número de anunciantes que apresenta curso específico para prestar cuidados ao idoso.

Houve casos de anunciantes que não referem sua qualificação no anúncio ou auto denominavam-se enfermeiro mesmo não o sendo, uma vez que não é de conhecimento da maioria da população a existência de categorias dentro da enfermagem, assim segundo o senso comum a pessoa que cuida ou exerce atividades de enfermagem são chamados de enfermeiros.

Através das entrevistas foi possível observar que oito dos 41 anunciantes optam pelo cuidado ao idoso em sua própria residência, ao contrário da tradicional assistência no domicílio do idoso. Isso permite que o cuidador assista a mais de um idoso e ao mesmo tempo, aumente sua renda e concilie o cuidado com as atividades do lar.

Na realidade, observa-se atualmente a formação de verdadeiras "clínicas" ou "abrigos" de idosos, freqüentemente denunciados pelos meios de comunicação, onde são "amontoados" em residências comuns, sem as adaptações e as acomodações mínimas e também sem pessoal qualificado para a assistência, tornando freqüente, como descrito por Queiroz (12), os casos de violência e maus tratos contra os idosos nas instituições de abrigo devido ao despreparo dos cuidadores e a carência de recursos.

Entre os 41 anunciantes, 31 afirmam ter experiência anterior com idosos, sendo na maior parte descritas como sendo os pais e os companheiros. Porém não é possível saber que tipo de experiência foi a vivenciada pelos anunciantes e se estas, foram suficientes para se considerarem aptos a cuidar de outros idosos, uma vez que o cuidado é individualizado e elaborado de acordo com a particularidade de cada idoso.

Deve ser ressaltado que a experiência que a maioria dos cuidadores referem possuir é a familiar, que envolve sentimentos, deveres e obrigações que são diferentes das que envolvem a relação profissional, levando a questionar se a experiência que os cuidadores referem possuir enquadra-se com as necessidades do idoso a ser cuidado.

Uma entrevistada que referia tomar conta de idosos, entre outras atividades como fazer faxina em escritório, intitulava-se evangélica e afirmava que a experiência anterior não era essencial, o importante era o amor dispensado ao idoso. De fato, o relacionamento afetivo é um fator de fundamental importância para uma assistência integral ao indivíduo porém não garante a competência para o cuidado, assim como a experiência anterior, pois o cuidado efetivo exige no mínimo uma formação específica.

Não foi possível fazer uma ligação clara entre o esquema de folgas com a disponibilidade de horário e a remuneração com exceção do caso dos anunciantes que cuidam de idosos em suas próprias residências (19,5%) pois dispensam cuidados em período integral e não podem folgar. Houve uma predominância de indivíduos que solicitam uma folga semanal (65,8%), seguido de indivíduos que não solicitam folga (26,8%) e aqueles que solicitam duas folgas semanais (7,3%). Grande parte dos anunciantes (75,6%) estava desempregada sendo esse talvez, um dos motivos pelo qual se oferecem como cuidadores. Uma pequena parcela possui um emprego fixo predominantemente no meio hospitalar (12,1%), além de empregos como doméstica (2,4%), faxineira (2,4%), "baby sitter" (2,4%) e como cuidador de idoso (4,8%) . Isso permite especular o nível de qualificação dos indivíduos que se oferecem para cuidar de idosos e o risco aos quais estes são expostos.

Como visto anteriormente, a maior parte dos anunciantes estava desempregada, o que retrata a atual escassez de emprego pela qual o país tem passado. No meio dessa crise de desemprego, o mercado de trabalho para o cuidador tem se destacado pela sua ampliação e por sua perspectiva promissora, servindo de atrativo para trabalhadores ociosos e para os que buscam por melhores remunerações.

A seguir apresentamos os dados referentes à remuneração dos sujeitos, de acordo com a qualificação e disponibilidade de horário para o trabalho de acompanhante.

Com relação à disponibilidade de horário, houve predomínio da jornada de 12 horas, seguida de 8h e 24h. Dos anunciantes que apresentam disponibilidade de 24h (n=11), oito cuidam de idosos na própria residência (do cuidador) o que permite uma jornada integral. Como do total de anunciantes (n=41), 31 estavam desempregados, esta situação favorecia a jornada de 12h ou de 8h de trabalhos diários.

Quanto à remuneração (mensal), os valores mencionados pelos sujeitos foram calculados com base no salário mínimo vigente em novembro de 1998 (R$130,00, correspondendo a 108,3 dólares) para permitir melhor comparação dos seus valores. Pelos dados do Quadro 1, observa-se a presença de dois anunciantes (enfermeiro e acompanhante) que não referem a remuneração exigida. Chamamos atenção para o enfermeiro que cobra somente 3,85 salários mínimo (SM) para prestar serviços durante 12h/dia, remuneração próxima ou inferior a de outras categorias, até mesmo dos acompanhantes. Já o técnico de enfermagem cobra o mesmo valor que um dos enfermeiros. Um auxiliar de enfermagem que oferece seus serviços por 8h diárias cobrava o maior valor entre os anunciantes (9,23 SM), o que elevou bastante a média e o desvio padrão dentre esse grupo de anunciantes. A medida que aumenta a disponibilidade de horário dos anunciantes auxiliares, diminui a média do valor cobrado pelos mesmos, sendo a média para 8h de 4,87 SM, para 12 h de 4,36 SM e para 24h de 3,37 SM.


Um dos atendentes de enfermagem que se oferece por 12h cobra o mesmo que um enfermeiro por 8h de trabalho. O atendente de enfermagem exige maior remuneração que o auxiliar para trabalhar 24h, embora para 12h ambos apresentam valores próximos.

A média dos acompanhantes que trabalham por 6h (5,64 SM) excedia a remuneração exigida por todas as outras categorias com exceção de um enfermeiro e do técnico de enfermagem (ambos 6,15 SM), solicitando remuneração superior que a média do mesmo em 24h e também de anunciantes qualificados (enfermeiro e auxiliares).

Através do estudo de Duarte), foi possível comparar os valores obtidos, uma vez que não existem outras bibliografias que abordem essa temática. O referido estudo foi realizado em São Paulo com indivíduos que anunciam seus serviços como cuidadores de idosos nos jornais de maior circulação. Foi observado que, devido as características próprias de uma capital de grande porte como esta cidade, os cuidadores exigiam maior remuneração, quando comparado com o estudo realizado em Campinas. Os anunciantes de São Paulo exigiam a remuneração para morar no emprego (na residência do idoso) com uma folga semanal, porém no estudo realizado em Campinas houve uma grande variedade de opções de respostas, sendo considerado como valor comparativo a maior média dos grupos de anunciantes. A média obtida entre os enfermeiros de São Paulo foi de 10,71 SM comparando com 6,15 SM de Campinas. Quanto ao técnico de enfermagem, este não esteve presente na amostra do estudo da autora em questão. Os auxiliares cobravam 7,32 SM e, 4,87 SM, os atendentes exigiam 6,47 SM e 4,23 SM e os acompanhantes cobravam 5,99 SM e 5,64 SM, sendo o primeiro valor dos anunciantes de São Paulo e o segundo de Campinas.

Com os resultados obtidos, verifica-se que o nível de qualificação não influi na remuneração exigida quando se observa que a média cobrada pelos acompanhantes supera a média dos auxiliares de enfermagem, contrapondo o tradicional discurso de que quanto mais qualificado maior o salário a ser pago ao cuidador. Portanto, na contratação de um cuidador deve ser observado inicialmente o nível de qualificação para que se disponha dos serviços de um cuidador profissional com custo semelhante ou até inferior que de muitos indivíduos sem qualificações, não colocando em risco a saúde e o bem-estar do idoso.

Durante a coleta de dados foram encontrados três anunciantes de agências de enfermagem compostas por auxiliares, atendentes e acompanhantes que atendia não somente a idosos, mas politraumatizados, pacientes com câncer e Aids, os quais não foram incluídos na amostra.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A amostra obtida de 41 anunciantes não deve ser utilizada para generalizar o perfil do cuidador de idoso, porém nos permite traçar algumas considerações.

Este estudo mostrou o perfil de alguns indivíduos que se oferecem para cuidar de idosos no município de Campinas. Foi possível observar a predominância da faixa etária entre 31 a 50 anos e do sexo feminino.

Grande parte dos anunciantes refere ter vivenciado o papel de cuidador anteriormente, apesar de apenas quatro afirmarem ter feito curso para cuidar de idosos. Um número considerável de anunciantes (n=8) tem optado em cuidar do idoso em sua própria residência, o que propicia a formação de verdadeiras "clínicas" ou "abrigos" de idosos.

A maioria dos anunciantes esta desempregada, retratando a realidade do país no momento atual, buscando novas frentes de trabalho. Alguns deles submetem-se a remunerações menores e a todos os tipos de atividades para manterem-se empregados.

Foi observado que a qualificação não interfere na remuneração a ser exigida visto que muitos indivíduos sem qualificação (acompanhantes) cobram mais que os auxiliares de enfermagem que possuem qualificação para atuarem como tal.

Aspira-se que outros estudos, com maior número de sujeitos, sejam realizados com a finalidade de obter um perfil mais pormenorizado do cuidador que se oferece para prestar serviços domiciliários à idosos.

Ademais, este estudo aponta para a necessidade dos profissionais envolvidos com a assistência aos idosos estarem atentos quanto a qualificação das pessoas que se dispõem a cuidar dessas pessoas no domicílio, orientando as famílias e desenvolvendo a formação de recursos humanos, na enfermagem, para esta atividade.

Artigo recebido em 21/02/00

Artigo aprovado em 26/10/01

Anexo 1 Anexo 1

  • (1) Vieira EB. Manual de gerontologia: Um guia teórico- prático para profissionais, cuidadores e familiares. Rio de Janeiro: Revinter; 1996.
  • (2) Saad PM. Tendęncias e conseqüęncias do envelhecimento populacional no Brasil. In: Fundaçăo Sistema Estadual de Análise de Dados. A populaçăo idosa e o apoio familiar. Săo Paulo; 1991. (Informe Demográfico, 24)
  • (3) Chaimowicz F. Os idosos brasileiros no século XXI- demografia, saúde e sociedade, Belo Horizonte: Posgraduate;1998.
  • (4) Veras RP, Dutra S. Envelhecimento da populaçăo brasileira: Reflexőes e aspectos a considerar quando da definiçăo de desenhos de pesquisas para estudos populacionais, Rev Saúde Coletiva 1993; 3(1):107-17,
  • (5) Carletti SMM, Rejani MI. Atençăo domiciliária ao paciente idoso. In: Papaleó Netto M. Gerontologia. Săo Paulo: Atheneu; 1996. p.415-19.
  • (6) Neri AL. Bem-estar e estresse em familiares que cuidam de idosos fragilizados e de alta dependęncia, In: Neri AL, organizadora. Qualidade de vida e idade madura. Campinas: Papirus; 1993, p.237-85.
  • (7) Duarte YAO. Cuidadores de idosos: uma questăo a ser analisada. Mundo Saúde 1997; 21(4): 226-30.
  • (8) Campos J. Geri sitter - uma iniciativa pioneira que deu certo. Gerontologia 1993; 1(3):123-4.
  • (9) Wanderley MB. Publicizaçăo do papel do cuidador domiciliar. Săo Paulo: IEE/PUC-SP, Brasília, Secretaria de Assistęncia Social - MPAS; 1998.
  • (10) Felgar JAS. Uma expressăo da linguagem numérica. In: Karsch UMS. Envelhecimento com dependęncia: revelando cuidadores. Săo Paulo: EDUC; 1998. p.47-86.
  • (11) Silva IF, As relaçőes de poder no cotidiano de mulheres cuidadoras. In: Karsch UMS. Envelhecimento com dependęncia: revelando cuidadores. Săo Paulo: EDUC; 1998. p.147-70.
  • (12) Queiroz ZPV. Violęncia contra a velhice - consideraçőes preliminares sobre uma nova questăo social. Mundo Saúde 1997; 21(4): 204-7.

Anexo 1

  • *
    Parte do trabalho de Iniciação cientifica com financiamento da FAPESP(Proc. N
    5 97/13702-9) Tema livre apresentado no 51º Congresso Brasileiro de Enfermagem, realizado de 02 a 07 de outubro de 1999, Florianópolis, SC.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Dez 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2001

    Histórico

    • Recebido
      21 Fev 2000
    • Aceito
      26 Out 2001
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