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Fatores que apoiam e não apoiam a permanência de mães acompanhantes em unidade de pediatria hospitalar

Factors that support and don't support the permanence of accompanying mothers in a hospital pediatric unit

Factores que apoyan y no apoyan la permanencia de madres acompañantes en unidad pediatrica hospitalar

Resumos

Avaliou-se os fatores que apoiam ou não a permanência de mães acompanhantes em unidade pediátrica. Seis entrevistas foram realizadas junto às mães e analisadas quanto aos temas. Os fatores que apoiam a mãe acompanhante são: a presença de outros familiares (principalmente o pai da criança), a possibilidade de alimentar-se gratuitamente no hospital, a confiança na equipe hospitalar e a atenção que lhe é por esta equipe. Os fatores que não apoiam a mãe são: a doença do filho; a preocupação com as outras responsabilidades (por exemplo: outros filhos, afazeres domésticos); a impossibilidade de sono e repouso; a falta de atenção da equipe e a impossibilidade de receber visitas.

Mãe acompanhando filho no hospital; Hospitalização; Criança; Cuidado


The factors that do or don't support the permanence of accompanying mothers in a pediatric unit were evaluated. Six interviews were held with the mothers and analyzed according to the themes. The factors that support the accompanying mother are: count on presence of other family members (mainly the child's father), the possibility of free meals at the hospital; trust the hospital team and being heeded by this team. The factors that don't support the mother are: child's illness; worry about other responsibilities (other children and house chores) impossibility to sleep and rest; lack of attention from the hospital team and the impossibility to receive visits.

Mother with child in hospital; Hospitalization; Child; care


Se evaluó los factores que apoyan la permanencia de madres acompañantes en unidad pediátrica. Seis entrevistas fueron realizadas junto a las madres y analizadas cuanto a los temas. Los factores que no apoyan la madre son: la enfermedad del hijo; la preocupación con otras actividades (por ejemplo, otros hijos y quehaceres domésticos); imposibilidad de sueño y reposo; la falta de atención del equipo hospitalar y la imposibilidad de recibir visitas. Los factores que apoyan la madre acompañante son: poder alimentarse gratuitamente en el hospital; confiar en el equipo hospitalar; recibir atención del mismo; y contar con la presencia de otros familiares (principalmente el padre del nino).

Madre acompañando hijo en hospital; Hospitalización; Niño; Cuidado


ARTIGO ORIGINAL

Fatores que apoiam e não apoiam a permanência de mães acompanhantes em unidade de pediatria hospitalar

Factors that support and don't support the permanence of accompanying mothers in a hospital pediatric unit

Factores que apoyan y no apoyan la permanencia de madres acompañantes en unidad pediatrica hospitalar

Liamara da Silva SiqueiraI; Cecilia Helena de Siqueira SigaudII; Magda Andrade RezendeIII

IEnfermeira da Pediatria do Hospital Universitário da USP, graduada pela Universidade de São Paulo em 2000. E-mail: liamarasiqueira@yahoo.com.br

IIProfessor Assistente do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da EEUSP, área de saúde da criança. E-mail: csigaud@bol.com.br

IIIProfessor Doutor do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da EEUSP, área de saúde da criança. E-mail: marezend@zipmail.com.br

RESUMO

Avaliou-se os fatores que apoiam ou não a permanência de mães acompanhantes em unidade pediátrica. Seis entrevistas foram realizadas junto às mães e analisadas quanto aos temas. Os fatores que apoiam a mãe acompanhante são: a presença de outros familiares (principalmente o pai da criança), a possibilidade de alimentar-se gratuitamente no hospital, a confiança na equipe hospitalar e a atenção que lhe é por esta equipe. Os fatores que não apoiam a mãe são: a doença do filho; a preocupação com as outras responsabilidades (por exemplo: outros filhos, afazeres domésticos); a impossibilidade de sono e repouso; a falta de atenção da equipe e a impossibilidade de receber visitas.

Palavras-chave: Mãe acompanhando filho no hospital. Hospitalização. Criança. Cuidado.

ABSTRACT

The factors that do or don't support the permanence of accompanying mothers in a pediatric unit were evaluated. Six interviews were held with the mothers and analyzed according to the themes. The factors that support the accompanying mother are: count on presence of other family members (mainly the child's father), the possibility of free meals at the hospital; trust the hospital team and being heeded by this team. The factors that don't support the mother are: child's illness; worry about other responsibilities (other children and house chores) impossibility to sleep and rest; lack of attention from the hospital team and the impossibility to receive visits.

Keywords: Mother with child in hospital. Hospitalization. Child and care.

RESUMEN

Se evaluó los factores que apoyan la permanencia de madres acompañantes en unidad pediátrica. Seis entrevistas fueron realizadas junto a las madres y analizadas cuanto a los temas. Los factores que no apoyan la madre son: la enfermedad del hijo; la preocupación con otras actividades (por ejemplo, otros hijos y quehaceres domésticos); imposibilidad de sueño y reposo; la falta de atención del equipo hospitalar y la imposibilidad de recibir visitas. Los factores que apoyan la madre acompañante son: poder alimentarse gratuitamente en el hospital; confiar en el equipo hospitalar; recibir atención del mismo; y contar con la presencia de otros familiares (principalmente el padre del nino).

Palabras-clave: Madre acompañando hijo en hospital. Hospitalización. Niño. Cuidado.

INTRODUÇÃO

A relação entre mãe e filho vem sendo estudada há cerca de 50 anos, tendo sido exaustivamente constatado que a separação abrupta de ambos pode acarretar sérios prejuízos à saúde da criança.

Robertson apud Bowlby 1 (1967), que realizou a observação de crianças de 2 a 3 anos de idade, antes, durante e depois de uma temporada fora do lar. Estas crianças estiveram separadas de suas mães por semanas ou meses em ambientes tais como, hospitais ou instituições de assistência infantil, nos quais não tinham uma mãe substituta estável. Durante a pesquisa o autor ficou profundamente impressionado pela intensidade da aflição e desolação que observou nestas crianças e pela extensão e duração dos distúrbios que apresentaram no regresso ao lar.

Outro autor extremamente importante que também estudou o tema foi Spitz 2 . Segundo este autor, a "simples" presença da mãe, age como um estímulo para as respostas do bebê; sua mínima atenção, mesmo quando não está relacionada com o bebê, age como um estímulo. Durante o primeiro ano de vida, experiências e ações intencionais constituem provavelmente a mais decisiva influência no desenvolvimento de vários setores da personalidade do bebê. Concluiu que, a presença da mãe suscita reações no bebê e, igualmente, a presença do bebê evoca reações da mãe.

Bowlby 1 , após estudos realizados sobre a relação mãe e filho, concluiu que é essencial para a saúde mental das crianças pequenas um relacionamento íntimo, carinhoso e contínuo com sua mãe (ou substituto permanente da mãe), através do qual ambos sintam satisfação e prazer.

Considerando estes estudos e muitos outros que foram e continuam sendo realizados nas últimas décadas, a Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP) lançou no Brasil, em 1988, a campanha "Mãe Participante", que é a possibilidade de a mãe permanecer junto a seu filho quando hospitalizado (Cipriano; Fisberg 3 ). Na mesma época, este direito foi incorporado ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em seu artigo 10 (São Paulo 4 ).

Nós, profissionais de Enfermagem, percebemos que a permanência da mãe ao lado do filho hospitalizado é importante tanto para a criança, que se sentirá mais segura e amparada, quanto para a mãe que estará acompanhando de forma participativa este processo de recuperação de seu filho. Além do estresse causado à criança, exaustivamente estudado, a hospitalização pode ser altamente estressante também para os pais, os quais reagem com diferentes graus de ansiedade (Bezerra; Fraga 5 ). Estes autores salientam que, quando os pais não recebem apoio psicológico, eles podem desenvolver um estado de desespero, ficando impossibilitados de ajudar efetivamente a criança.

Para Neira Huerta 6 o principal fator que contribui para o bem-estar das mães acompanhantes é o relacionamento, tanto no que se refere à manutenção do relacionamento mãe e filho, quanto ao relacionamento significativo com a equipe hospitalar.

De acordo com nossa vivência percebemos que, não são somente estes os fatores que apoiam (ou que podem apoiar) a mãe acompanhante. A acomodação (possibilidade de repousar, comer, tomar banho etc.), por exemplo é importante, o que também foi observado por Neira Huerta 6 . Mas, até que ponto influi? E além destes fatores potencialmente apoiadores (ou não), haveria outros?

Dessa forma, pensou-se na possibilidade de realizar uma pesquisa com mães acompanhantes de crianças internadas em unidade de pediatria de um hospital geral com a finalidade de conhecer como percebem eventuais situações de apoio e não apoio.

METODOLOGIA

Esta pesquisa foi de caráter qualitativo exploratório, realizada junto à seis mães acompanhantes de crianças internadas há quatro dias ou mais na unidade de internação pediátrica de um hospital escola geral da cidade de São Paulo.

Este hospital-escola, público e estadual, integrado ao Sistema Único de Saúde (SUS) , tem como objetivos o ensino, a pesquisa e a assistência à população. Desde sua inauguração, em 1981, utiliza a sistematização da assistência de Enfermagem e a filosofia da instituição baseia-se no modelo de assistência definido por Wanda Horta em, 1979 e na teoria do auto-cuidado de Dorothéia Orem (Universidade de São Paulo 7).

A unidade de internação pediátrica contava, na época da realização do estudo 2° semestre de 2000, com 31 leitos. Cada enfermaria comportava, aproximadamente, 5 crianças internadas. Nesta unidade é estimulada, como pudemos perceber, a presença de um acompanhante da criança, preferencialmente a mãe, pelo vínculo que, comumente, se estabelece entre mãe e filho, cuja importância já descrevemos no início. O pai permanecia como acompanhante quando a mãe estava impossibilitada.

Para garantir a continuidade do tratamento após a alta hospitalar era desenvolvido um trabalho de orientação com a mãe acompanhante.

As mães foram entrevistadas usando-se duas perguntas norteadoras: "O que ajuda a Senhora durante a permanência do seu filho(a) no hospital?" e "O que atrapalha a Senhora durante a permanência do seu filho(a) no hospital?". As entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética do hospital em questão e as entrevistas foram realizadas respeitando os princípios éticos estabelecidos na Resolução n° 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS)8

As entrevistas foram analisadas de acordo com a análise temática de conteúdo (Minayo 9 ). Os temas reconhecidos nas falas das mães forram agrupados em três categorias principais, que são:

1ª) Como a mãe se sente no hospital;

2ª) Influência da infra-estrutura hospitalar;

3ª) Como a mãe vê o cuidado à criança.

RESULTADOS

A primeira categoria COMO A MÃE SE SENTE NO HOSPITAL evidenciou os diversos estados emocionais e físicos que a mãe acompanhante vivencia no período de hospitalização. Observamos que todas as mães experimentavam cansaço físico, ora por não conseguirem dormir (pelo estado de saúde de seu filho), ora porque as suas condições de acomodação eram inadequadas. Havia confortáveis poltronas de descanso para as mães, porém em quantidade insuficiente. Cada enfermaria tinha um número de poltronas inferior ao de crianças internadas. Isto causava disputa entre as mães e inevitáveis atritos. As que não conseguiam poltronas, passavam a noite em cadeiras de plástico sem o mínimo de conforto. O serviço de Enfermagem não interferia nesta situação que era totalmente resolvida pelas mães.

Além das condições físicas inadequadas, todas as mães externaram a preocupação com o filho doente e acamado, situação esta que contribuía sobremaneira para o aumento do seu cansaço.

Algumas mães clarificaram o quanto é importante para elas ter alguém próximo para dividir esse momento difícil. Assim, vimos a importância do horário de visitas. O pai tinha acesso à visita das 13 às 19 horas, e não podia passar a noite com a criança e a mãe. A visita dos outros familiares era feita das 15 às 17 horas, horário em que, infelizmente, a maioria das pessoas está trabalhando e não pode comparecer. Assim, este esquema de visitas era percebido pelas mães como não apoiador.

Oliveira 10 em seu estudo sobre mãe acompanhante constatou a importância da família para aquela. A autora observou que a família constitui-se em uma rede de apoio muito importante. A família oferece o apoio para que a mãe consiga permanecer junto ao filho hospitalizado. Esse apoio foi demonstrado no estudo como: conforto, tranqüilidade, ajuda financeira, possibilidade de assumir para a mãe o cuidado da casa e das outras crianças e, por vezes, até o revezamento da mesma no hospital.

Vale ressaltar que o horário de visitas, para estas mães também, era visto como apoio. Os familiares podem melhorar o clima de tensão hospitalar, encorajando a mãe e a criança em muitos momentos.

Outro estado emocional que inevitavelmente vivenciavam era a ambivalência. Era muito difícil para elas assumirem esta escolha de interromper as atividades domésticas para cuidar de um filho hospitalizado. Todas sentem que são insubstituíveis para o filho e sabemos, verdadeiramente, que são. No entanto, as outras responsabilidades que têm em casa (eventualmente em relação a outros filhos) demandam sua atenção, o que gera esse sentimento de impotência. A maioria das mães relatou em suas falas a preocupação com os outros filhos que ficaram em casa, com o marido e corn os afazeres domésticos. Sentem que deveriam estar em dois lugares ao mesmo tempo, precisam fazer esta escolha e isto é muito difícil.

Avaliando o inevitável sofrimento da mãe durante a hospitalização do seu filho, concordamos com Andrade", quando sugere aos enfermeiros que elaborem, juntamente com sua equipe, grupos de apoio destinados às mães, propiciando a elas melhores condições de enfrentamento da situação. O simples fato de serem ouvidas e ouvir o relato de outras mães na mesma situação poderá ajudá-las a transpor este momento com um pouco mais de segurança. O grupo de apoio, além de proporcionar um espaço para as mães, também favorece a interação mãe/equipe de Enfermagem.

A segunda categoria INFLUÊNCIA DA INFRA-ESTRUTURA HOSPITALAR revela como é a infra-estrutura do hospital para receber e manter a mãe acompanhante. As mães dormem ao lado do filho em poltronas ou cadeiras de plástico, tomam banho no banheiro destinado aos pais (situado dentro da própria unidade) e fazem as refeições dentro do hospital, porém fora da unidade. Existe, ainda, um telefone público instalado no corredor do andar da unidade de internação. Relatam, com muita ênfase, o quanto é importante para elas alimentarem-se no hospital gratuitamente. Observei, durante meu estágio, que o hospital fornecia quatro refeições diárias para o acompanhante da criança. Segundo a maioria das mães, as refeições eram de excelente qualidade, para elas, saborosas. O mais importante para estas era o fato de não precisarem despender dinheiro para se alimentarem, uma vez que, muitas apresentavam dificuldades financeiras. As demais mães, que apresentavam condições econômicas satisfatórias, não elogiavam tanto a alimentação como as primeiras. A alimentação era percebida pela maioria das mães como apoio e incentivo. Observamos claramente isto na fala de uma mãe:

"Eu não comi mais porque minha natureza não dava, mas tinha muita comida e muito incentivo."

Outro ponto importante que percebemos, nessa mesma categoria, foi a queixa das mães em relação ao horário de visitas, que era restrito. Sabemos, entretanto, que a visita foi pensada para a criança hospitalizada, mas agora também é para a mãe que a acompanha. Já vimos na categoria descrita anteriormente o quanto é importante para elas a presença de pessoas que as ajudem a transpor melhor esse momento difícil. Faz-se necessário que a Enfermagem sensibilize-se com a situação da mãe acompanhante e proponha estratégias para modificar esta situação.

A terceira categoria COMO A MÃE VÊ O CUIDADO À CRIANÇA retrata a visão da mãe acompanhante em relação ao trabalho prestado pela equipe hospitalar. Neste estudo, as mães externaram a confiança que depositam na equipe de trabalho e percebem que a criança está sendo cuidada e continuará desta forma, independente de sua presença ou ausência. Essa confiança torna-se apoio e segurança para esta mãe, pois sabe que se precisar deixar o hospital por algum momento seu filho será bem cuidado.

Sugano 12 trabalhou com mães, nesta mesma unidade e na mesma época, e obteve o mesmo resultado. Segundo a autora, as orientações e o apoio emocional são duas características que as mães reconhecem como cuidado, mostrando que a Enfermagem se faz perceber de forma mais próxima.

Pai 13 , em pesquisa realizada em outro hospital, também localizado na cidade de São Paulo, obteve resultados diferentes. Percebeu que o cuidado realizado pelos enfermeiros não era de modo algum humanizado. Sua atenção ficava voltada para as atividades burocráticas, sem um planejamento claro quanto aos cuidados. A autora observou nítido afastamento do profissional do cuidado direto à criança e ao familiar. Foi notório que a família jamais mencionou o enfermeiro como prestador de cuidados.

A conclusão final relativa a esta categoria é de que o cuidado da Enfermagem é um fator de apoio à mãe acompanhante.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Através deste estudo obtive o mesmo resultado de Bezerra; Fraga s , que disseram ser a doença da criança geradora de sentimentos de incerteza e dúvida quanto à recuperação total da saúde de seu filho, o que a deixa muito tensa. Quase todas as mães externaram como é dolorido e angustiante para elas acompanhar um filho no hospital. Estes autores concluíram também que a hospitalização da criança provoca na mãe sentimentos ambíguos: por um lado ela sente necessidade de acompanhar seu filho doente, por outro lado, ressente-se de não poder dar assistência aos outros filhos que ficaram em casa. Isto é visto claramente no discurso das mães. E, este é outro fator que causa cansaço na mãe, pois se sente cobrada pelos afazeres domésticos e ao mesmo tempo impossibilitada de fazê-los.

Vale salientar que é a equipe de Enfermagem que passa maior parte do tempo com a mãe, e percebendo essa angústia deve buscar intervir dentro de suas possibilidades. E conhecido que, o fato da mãe ter informações a respeito do estado de saúde de seu filho, dos cuidados que precisa ter com a criança e aquilo que ela pode contribuir e saber as condutas médicas e o porquê delas, pode diminuir bastante sua ansiedade (Neira Huerta 6).

Nesse mesmo contexto, vemos ainda a importância de como transmitir estas informações. Para Oliveira 10 , esta transmissão de informações, muitas vezes, é dificultada pelo próprio profissional que conversa com a mãe em horários inoportunos. Apesar da autora não ter definido o que entende por inoportuno, em nossa experiência, percebemos que estes são os momentos em que a mãe não está preparada ou aberta para ouvir. Somado a isto, constatamos que alguns profissionais utilizam-se de palavras que fogem à compreensão materna. E importante que o enfermeiro reflita a respeito disto: O que deve ser falado é aquilo que a mãe precisa saber e não aquilo que ele julga necessário falar.

Segundo Costernaro; Daros; Arruda1 4 a atenção que é dada pela Enfermagem, aos acompanhantes, é percebida como cuidado, como pudemos constatar também em algumas falas, e concordamos com isto. A mãe acompanhante precisa deste cuidado.

Analisando o cuidado como um todo, além da atenção que deve ser dada e que, segundo as mães, proporciona conforto, percebemos que a instituição hospitalar também é responsável por garantir bem-estar à mãe acompanhante.

Concordamos com os autores supra citados quando descrevem sobre a importância de fornecer alimentação aos acompanhantes dentro do hospital. Segundo os autores, a alimentação para estes precisa ser suprida não somente quando se manifesta a fome, mas, principalmente, para garantir ao ser humano as condições nutricionais e de hidratação essenciais à preservação da vida e funcionamento dos sistemas orgânicos. Certificamos no presente estudo a satisfação das mães em relação à alimentação. Retrataram em suas falas a importância de poderem se alimentar gratuitamente no hospital e com qualidade, além de elogiar o estímulo que recebiam para isso da equipe de Enfermagem, qualificando o tratamento a elas fornecido percebendo isto como apoio, carinho e cuidado.

Percebemos na categoria COMO A MÃE SE SENTE, que ela se vê como cuidadora insubstituível do filho hospitalizado. Cobra-se, constantemente, tanto o cuidado da criança hospitalizada, quanto as demais atividades domésticas.

Arrazola 15 ao descrever o cotidiano sexuado de meninos e meninas em situação de pobreza, constatou que a sociedade impõe tarefas que cabem às meninas e mulheres executarem, como por exemplo, os trabalhos domésticos, o cuidado com os filhos e irmãos mais novos. E ao homem cabe apenas o trabalho que garante o sustento da família. A mulher incorpora a idéia de que é necessário cumprir sua obrigação de "mulher", que é o cuidado da família e do lar. Como a maior parte da população atendida pelo hospital em estudo era de baixa condição econômica pode estar vivendo exatamente esta mesma realidade social. Esta situação aumenta ainda mais o estresse dessa mãe que acaba se sentindo ainda mais cobrada. Percebe a necessidade de estar em dois lugares ao mesmo tempo, cumprindo seu papel, e isto não é possível.

Esta responsabilidade que ainda é atribuída somente à mulher precisa também ser trabalhada pela equipe de Enfermagem. Socialmente a mulher já se sente cobrada, portanto, não seria terapêutico se nós, enfermeiros, reforçássemos ainda mais esta cobrança. E tempo de compreender o que significa para a mãe acompanhar um filho hospitalizado e as possíveis reações que esta possa apresentar frente a esta situação.

Nesse contexto, é importante ainda fazer corn que o pai sinta-se responsável pelo tratamento da criança tanto quanto a mãe, aproveitando os horários de visita para conscientizá-lo da situação e orientá-lo quanto aos principais cuidados com a mesma. Os dois são igualmente importantes para a criança e a presença do pai será força tanto para a criança quanto para a mãe nesse momento de sofrimento. A mãe não deve suportar sozinha esta situação.

CONCLUSÃO

Tendo em vista os dados coletados e apresentados de forma sistemática foi possível constatar e sentir grande parte daquilo que a mãe acompanhante vivencia durante a permanência de um filho no hospital. Certamente, este estudo irá nos auxiliar na descoberta de um caminho para que possamos oferecer um cuidado humanizado à criança hospitalizada, ressaltando a importância de cuidar da mãe acompanhante.

É importante também que o enfermeiro aproveite a visita do pai (ou até mesmo o fato de estar acompanhando a criança) para interagir com ele de modo que também se sinta responsável e possa de forma mais efetiva apoiar a mãe e a criança, e também ser apoiado, se necessário.

Artigo recebido em 18/07/01

Artigo aprovado em 06/02/02

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  • (2) Spitz RA. O primeiro ano de vida: um estudo psicoanalítico do desenvolvimento normal e anômalo das relaçőes objetais. 2Ş ed. Brasileira. Săo Paulo: Martins Fontes; 1980. p. 119-121.
  • (3) Cipriano MS, Fisberg M. Măe-Participante - benefícios e barreiras. Jornal de Pediatria 1990; 66 (4/5).
  • (4) São Paulo (Estado). Fundo Social de Solidariedade. Direitos da criança e do adolescente. São Paulo: Imesp; 1994.
  • (5) Bezerra LFR, Fraga MNO. Acompanhar um filho hospitalizado: Compreendendo a vivęncia da Măe. Rev Bras Enferm 1996; 49 (4): 611-624.
  • (6) Neira Huerta ER A experięncia de acompanhar um filho hospitalizado: sentimentos, necessidades e expectativas manifestados por măes acompanhantes. Rev Esc Enferm USP 1985; 19 (2):153-171.
  • (7) Universidade de São Paulo. Hospital Universitário: Página de Apresentação. [online] 1997. Disponível em: http://www.hu.usp.br/ (18 jul 2000)
  • (8) Conselho Nacional de Saúde (CNS). Resoluçăo n. 196, 10 de outubro 1996. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Bioética, Brasília, v.4, n. 2, p. 15-25, 1996. Suplemento.
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  • (13) Pai MM. O dia-a-dia na unidade de internaçăo conjunta pediátrica: um olhar para as relaçőes Enfermeira/Familiar participante. [dissertaçăo] Săo Paulo (SP): Escola Paulista de Medicina; 2000.
  • (14) Costenaro RGS, Daros A, Arruda EN. O cuidado na perspectiva do acompanhante de crianças e adolescentes hospitalizados. Esc Anna Nery Rev Enferm 1998; 2 (1/2): 111-126.
  • (15) Arrazola LSD. O cotidiano sexuado de meninos e meninas em situaçăo de pobreza. In: Madeira FR. Quem mandou nascer mulher? - Estudos sobre crianças e adolescentes pobres no Brasil. Rio de Janeiro: Record / Rosa dos Tempos;1997. p. 343-402.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2008
  • Data do Fascículo
    Set 2002

Histórico

  • Aceito
    06 Fev 2002
  • Recebido
    18 Jul 2001
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