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Ressuscitação cardiopulmonar com a utilização do desfibrilador externo semi-automático: avaliação do processo ensino-aprendizagem

Resucitador cardiopulmonar con utilización del disfibrilador externo semiautomático: evaluación del proceso enseñanza-aprendizaje

Resumos

Estudos demonstram que a sobrevida após uma parada cardíaca diminui 10% para cada minuto de atraso na desfibrilação, e que a taxa de sobrevivência é de 98% quando ela é conseguida em 30 segundos. No atendimento de uma parada cardíaca, é primordial que seja incluído no treinamento a utilização dos desfibriladores externos semi-automáticos (DEA). O objetivo deste estudo foi comparar a Habilidade Psicomotora e o Conhecimento Teórico de leigos na técnica da ressuscitação cardiopulmonar (RCP) utilizando o DEA, antes e após treinamento. A amostra constituiu-se de 40 funcionários administrativos de uma instituição pública que receberam treinamento da técnica da RCP, utilizando o DEA, em laboratório. O aumento significativo de acertos nos itens do instrumento de avaliação da Habilidade Psicomotora e do Conhecimento Teórico, após o treinamento, indica que houve melhora no desempenho dos participantes.

Cardioversão elétrica; Parada cardíaca; Ressuscitação cardiopulmonar; Ensino; Aprendizagem


Los estudios demuestran que la sobrevida después de un paro cardíaco disminuye el 10% por cada minuto de atraso en la desfibrilación y que la tasa de supervivencia es del 98% cuando se consigue en 30 segundos. En la atención de un paro cardíaco es primordial que se incluya en la capacitación la utilización de los desfibriladores externos semi-automáticos (DEA). El objetivo de este estudio fue comparar la Habilidad Psicomotora y el Conocimiento Teórico de legos en la técnica de la resucitación cardiopulmonar (RCP) utilizando el DEA, antes y después de la capacitación. La muestra estuvo formada por 40 empleados administrativos de una institución pública que recibieron capitación en la técnica de RCP, utilizando el DEA, en laboratorio. El aumento significativo de aciertos en los ítems del instrumento de evaluación de la habilidad Psicomotora y del Conocimiento teórico, después de la capacitación, indica que hubo mejora en el desempeño de los participantes para realizar la RCP con el uso del DEA.

Cardioversión eléctrica; Paro cardíaco; Resucitación cardiopulmonar; Enseñanza; Aprendizaje


Studies demonstrate that, for every minute delayed on defibrillating a heart arrest patient, survival chances decrease by 10%, and that the same chances of survival are 98% effective when it is employed within 30 seconds. While attending a heart arrest patient, it is crucial that the use of external semi-automated defibrillator (AED) is included in the training. The purpose of the present study is to compare Psychomotor Ability and the Theoretical Knowledge of lay people on cardiopulmonary resuscitation (CPR) using AED, before and after training. This sample was composed of 40 administrative workers of a public institution that were trained on CPR technique using EAD, as an experiment. The significantly higher scores in the assessment instrument items of Psychomotor Ability and Theoretical Knowledge, after training, indicates that the participants have presented improvements in their performances.

Electric countershock; Heart arrest; Cardiopulmonary resuscitation; Teaching; Learning


ARTIGO ORIGINAL

Ressuscitação cardiopulmonar com a utilização do desfibrilador externo semi-automático: avaliação do processo ensino-aprendizagem

Resucitador cardiopulmonar con utilización del disfibrilador externo semiautomático: evaluación del proceso enseñanza-aprendizaje

Ana Maria Kazue MiyadahiraI; Ana Paula QuiliciII; Carmem da Costa MartinsIII; Giane Leandro de AraújoIV; Josikélem da Silva Sodré PelliciottiV

IDocente. Professora Titular do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo (EEUSP). São Paulo, SP, Brasil. encana@usp.br

IIEnfermeira do Instituto do Coração (INCOR) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (HC-FM-USP). São Paulo, SP, Brasil. ana.quilici@incor.usp.br

IIIEnfermeira. Aluna do XVI Curso de Especialização de Enfermagem em Cuidados Intensivos da Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo (EEUSP). São Paulo, SP, Brasil. gianeleandro@uol.com.br

IVEnfermeira. Aluna do XVI Curso de Especialização de Enfermagem em Cuidados Intensivos da Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo (EEUSP). São Paulo, SP, Brasil. gianeleandro@uol.com.br

VEnfermeira do Hospital Sírio Libânes. Aluna do XVI Curso de Especialização de Enfermagem em Cuidados Intensivos da Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo (EEUSP). São Paulo, SP, Brasil. josikelem_sodre@hotmail.com

Correspondência Correspondência: Ana Maria Kazue Miyadahira Rua Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Estudos demonstram que a sobrevida após uma parada cardíaca diminui 10% para cada minuto de atraso na desfibrilação, e que a taxa de sobrevivência é de 98% quando ela é conseguida em 30 segundos. No atendimento de uma parada cardíaca, é primordial que seja incluído no treinamento a utilização dos desfibriladores externos semi-automáticos (DEA). O objetivo deste estudo foi comparar a Habilidade Psicomotora e o Conhecimento Teórico de leigos na técnica da ressuscitação cardiopulmonar (RCP) utilizando o DEA, antes e após treinamento. A amostra constituiu-se de 40 funcionários administrativos de uma instituição pública que receberam treinamento da técnica da RCP, utilizando o DEA, em laboratório. O aumento significativo de acertos nos itens do instrumento de avaliação da Habilidade Psicomotora e do Conhecimento Teórico, após o treinamento, indica que houve melhora no desempenho dos participantes.

Descritores: Cardioversão elétrica; Parada cardíaca; Ressuscitação cardiopulmonar; Ensino; Aprendizagem.

RESUMEN

Los estudios demuestran que la sobrevida después de un paro cardíaco disminuye el 10% por cada minuto de atraso en la desfibrilación y que la tasa de supervivencia es del 98% cuando se consigue en 30 segundos. En la atención de un paro cardíaco es primordial que se incluya en la capacitación la utilización de los desfibriladores externos semi-automáticos (DEA). El objetivo de este estudio fue comparar la Habilidad Psicomotora y el Conocimiento Teórico de legos en la técnica de la resucitación cardiopulmonar (RCP) utilizando el DEA, antes y después de la capacitación. La muestra estuvo formada por 40 empleados administrativos de una institución pública que recibieron capitación en la técnica de RCP, utilizando el DEA, en laboratorio. El aumento significativo de aciertos en los ítems del instrumento de evaluación de la habilidad Psicomotora y del Conocimiento teórico, después de la capacitación, indica que hubo mejora en el desempeño de los participantes para realizar la RCP con el uso del DEA.

DESCRIPTORES: Cardioversión eléctrica; Paro cardíaco; Resucitación cardiopulmonar; Enseñanza; Aprendizaje.

INTRODUÇÃO

Considerando-se que grande número das paradas cardíacas ocorre em ambiente extra-hospitalar, certamente é fundamental que a população leiga esteja familiarizada com as técnicas e prioridades no atendimento de ressuscitação(1). O envolvimento do cidadão comum, nessas circunstâncias, é a única forma de se reverter a atual realidade, notadamente em países de marcada carência no atendimento à saúde, como o Brasil.

Na presente contemporaneidade, as novas Diretrizes Internacionais de Emergência e Ressuscitação, o International Liaison Committee on Resuscitation (ILCOR), o comitê da American Heart Association (AHA) e o do European Resuscitation Council (ERC) consideram a desfibrilação um procedimento de suporte básico de vida, dentro e fora do ambiente hospitalar(2). O Suporte Básico de Vida (BLS), em sua essência, visa o atendimento imediato das situações de emergência, em geral, a parada cardiorrespiratória (PCR).

Tais diretrizes têm abrigo na etiologia dessas emergências cardiológicas, pois, a principal causa de parada cardíaca no adulto é a fibrilação ventricular (FV) que tende a evoluir para a assistolia em poucos minutos. O único tratamento realmente eficaz para esses casos é a desfibrilação elétrica realizada o mais rápido possível, considerando-se que a probabilidade de sobrevivência de um indivíduo com parada cardíaca por fibrilação diminui de 7% a 10% por minuto(1).

Desde 1992, a AHA desenvolveu o conceito de corrente de sobrevida, que preconiza uma série ordenada e encadeada de procedimentos durante o atendimento a uma parada cardiopulmonar(2-3). A cadeia de sobrevivência é composta de quatro elos e, para o sucesso na RCP, todos eles são importantes. Inclui: o acesso rápido, que visa o reconhecimento e a comunicação imediata da ocorrência, para obter ajuda; a ressuscitação cardiopulmonar (RCP) rápida, ou seja, abertura de vias aéreas, ventilação e circulação sanguínea que devem ocorrer tão breve quanto possível; a desfibrilação rápida com a identificação e o tratamento da FV e, por fim, a aplicação das técnicas do suporte avançado de vida (SAVC) que visa o controle das vias aéreas e medicamentos apropriados ao ritmo cardíaco diagnosticado.

A desfibrilação rápida é o elo da Cadeia da Sobrevivência com maiores probabilidades de melhorar as taxas de sobrevivência. O intervalo de tempo entre a perda da consciência e a desfibrilação é a variável mais importante para a reversão bem sucedida da FV a um ritmo normal(4-5).

Com a introdução dos desfibriladores externos automáticos (DEA), houve a necessidade de se estabelecer um elo a mais entre o leigo e os paramédicos para consagrar a aplicação da desfibrilação precoce com o conseqüente aumento da taxa de sobrevivência. Tais desfibriladores, mais leves e portáteis, permitem que o pessoal de emergência (polícia, bombeiros, estudantes da área de saúde e pessoal de ambulância), sem treinamento avançado e habilidade para o diagnóstico de arritmias, possa intervir em casos de FV. Vários pesquisadores nutrem a esperança de que, com a disseminação de seu uso, os DEAs serão, no futuro, colocados à disposição em lugares públicos e privados, relacionados à possível presença de indivíduos em risco(2,4-6).

Compete à iniciativa da saúde pública, a viabilização do DEA para os leigos, na comunidade, incluindo os necessários treinamentos. Em comunidades americanas, o uso do DEA por socorristas leigos proporcionou taxas de sobrevivência extraordinárias, de até 49%(7). Essa iniciativa representa, possivelmente, o maior progresso isolado no tratamento da parada cardíaca súbita, desde o desenvolvimento da RCP(5).

As atuais políticas de desfibrilação precoce preconizam a instalação de DEA, amplamente disponível e ao alcance de operadores treinados para seu uso. Isso tem demonstrado excelentes resultados como observados em estudos, com altas taxas de ressuscitação bem-sucedida em vítimas de PCR, em cassinos americanos e no aeroporto da cidade de Boston(8-9).

Desse conceito, resultaram os movimentos já observados em países mais desenvolvidos, como nos Estados Unidos da América, onde todos os estados promulgaram uma legislação para encorajar o uso do DEA pelo público leigo. Essa lei, denominada de Lei de Sobrevivência à Parada Cardíaca, oferece proteção judicial a socorristas leigos que utilizam o DEA e a empresas ou outras entidades ou indivíduos que compram um aparelho desse tipo para o acesso público à desfibrilação(10).

Os fatos apontados acima demonstram a importância da educação da população leiga no reconhecimento das emergências cardiológicas e dos procedimentos a serem tomados nas emergências. Nessa composição, é atributo do enfermeiro o dever com o processo de ensino-aprendizagem de pessoas leigas no atendimento da parada cardiorrespiratória com a utilização do DEA. Esse processo envolve uma complexidade de ações, cujo objetivo principal é o desenvolvimento do aprendiz, tanto na área cognitiva quanto psicomotora e afetiva(11-12).

Em contexto de pobreza científica em pertinência a essa área, saliente-se que o primeiro artigo nacional a enfatizar o uso de desfibriladores no suporte básico de vida, em atividade desportiva, lembra da importância da participação da população leiga e dos médicos no atendimento da vítima em parada cardíaca, porém não cita os demais profissionais da área da saúde(13). Acrescente-se a isso que essa penúria de estudos acerca do uso dos desfibriladores atinge a própria Enfermagem, em âmbito nacional, em cujo acervo científico observa-se inexistência de pesquisas.

Corroborando o fato, no estrangeiro, um estudo de revisão da literatura sobre a retenção da Habilidade Psicomotora e do Conhecimento Teórico da RCP, após treinamento, apresentado como dissertação de mestrado na Newham University Hospital, em Londres, revelou que ainda são muito raros os trabalhos divulgados sobre a temática, escritos por enfermeiros(14).

Tendo como convincentes os progressos observados em RCP em países, como os Estados Unidos da América e, em razão de a precariedade da Saúde Pública, no Brasil, não permitir iniciativas para prover campanhas para o treinamento em massa da comunidade e disponibilidade de DEA em locais públicos, vislumbrou-se a iniciativa de se analisar uma estratégia para otimização do processo ensino-aprendizagem da técnica de RCP com uso do DEA.

OBJETIVO

Comparar a Habilidade Psicomotora e o Conhecimento Teórico de leigos na técnica da ressuscitação cardiopulmonar (RCP) utilizando o DEA, antes e após treinamento.

MÉTODO

O estudo foi realizado no Centro de Formação e Aperfeiçoamento em Ciências da Saúde (CEFACS), onde se localiza o Laboratório de Treinamento e Simulação em Emergências Cardiovasculares de uma Instituição Pública Especializada do Município de São Paulo, após aprovação do projeto pela Comissão de Ética e autorização da Instituição (Nº Proc. 402/2004/CEP/EEUSP).

A coleta de dados foi realizada de 18/10 a 10/11 de 2004 pelas pesquisadoras, após padronização e treinamento. Os funcionários da área administrativa do CEFACS foram convidados. Compuseram a casuística aqueles que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: ter disponibilidade, consentir em fazer parte da amostra, não ter conhecimento e/ou não ter manipulado o DEA previamente. Ressalta-se que havia interesse da Instituição em treinar todos os funcionários que têm contato direto com os pacientes, seja profissional da área da saúde ou não.

Para avaliar o desempenho dos participantes, considerou-se como Habilidade Psicomotora a execução do atendimento de uma vítima em parada cardíaca, utilizando manequim (modelo anatômico) e o DEA. Nessa avaliação, foi utilizado um instrumento denominado Avaliação de Habilidade Psicomotora com 17 itens em forma de check-list. E como Conhecimento Teórico, consideraram-se as respostas às 10 questões teórico-práticas (teste de múltipla escolha) por meio do instrumento denominado Avaliação do Conhecimento Teórico. As questões estavam relacionadas: à avaliação da vítima; aos elos da Cadeia de Sobrevivência; à seqüência da utilização do DEA; às contra-indicações e aos procedimentos de segurança na utilização do DEA; manutenção da vítima até a chegada do Serviço Médico de Emergência.

A coleta de dados foi feita em duas fases denominadas 1ª etapa e 2ª etapa, antes e após treinamento, respectivamente. Para a avaliação da Habilidade Psicomotora, simulou-se o atendimento à vítima em parada cardíaca no Laboratório de Treinamento e Simulação.

Na 1ª etapa, os participantes responderam as questões teóricas para a Avaliação do Conhecimento Teórico. Em seguida, realizaram o atendimento da vítima em RCP sem treinamento prévio, no cenário preparado para essa finalidade. Nesse momento, fez-se a Avaliação da Habilidade Psicomotora(10) dos participantes, aplicando-se o instrumento para esse fim.

Ao final da 1ª etapa, ministrou-se aula expositiva e treinamento prático sobre a RCP com a utilização do DEA. Nessa ocasião, as autoras orientaram e esclareceram as dúvidas relacionadas às questões do teste de conhecimento e ao desempenho no atendimento à vítima em PCR. Após o treinamento, os participantes foram, novamente, avaliados com a aplicação dos mesmos instrumentos da 1ª etapa. Essa fase correspondeu à 2ª etapa, isto é, reavaliação do desempenho (Habilidade) e Conhecimento teórico após o treinamento.

Ressalta-se que foi oferecido o DEA, na 1ª e 2ª etapa, mesmo que o participante não o tivesse solicitado, e que, a partir desse momento, foi cronometrado o tempo gasto até a aplicação do 1º choque/desfibrilação.

Os dados foram analisados por meio do teste t pareado. O nível de significância foi de α = 5%.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A amostra foi constituída de 40 participantes com predomínio do sexo feminino (72,5%), adultos jovens, sendo metade (50,0%) solteira. Em relação à escolaridade, a maioria (55,0%) dos participantes possuía ensino médio, seguido de 40,0% dos participantes com ensino superior. Quanto à profissão, 26 (65,0%) eram auxiliares administrativos, seguidos por 8 (20,0%) seguranças e secretárias, e 6 (15,0%) auxiliares de limpeza e de planejamento.

Avaliação da Habilidade Psicomotora (execução)

Os resultados do desempenho dos participantes no atendimento à vítima em PCR estão apresentados na Figura 1.


A Figura 1 mostra que, na 1ª etapa, a execução correta dos itens ocorreu em freqüências relativas variadas, oscilando de 0,0% (Continuar controlando a respiração e sinais de circulação até a chegada do suporte avançado e Colocar a vítima em posição de recuperação com o DEA aplicado) a 72,5% (Pedir ajuda).

Pela Tabela 1, observa-se que há diferença significativa entre as médias totais de acertos na Avaliação da Habilidade, antes (1ª etapa) e após (2ª etapa) treinamento (p < 0,001).

Observou-se melhora significativa da 1ª para 2ª etapa, em todos os itens da seqüência do atendimento na Avaliação da Habilidade Psicomotora. Na 2ª etapa, notou-se aumento nos valores das pontuações totais, traduzindo a melhora do desempenho (Execução) dos participantes após serem submetidos ao treinamento. O que chamou a atenção, nessa etapa, foi que, mesmo após o treinamento, os itens 2 (Pedir ajuda) e 3 (Solicitar o DEA) ainda foram realizados de modo incorreto, 6 (15,0%) e 8 (20,0%), respectivamente.

Estudo semelhante analisou o processo de ensino-aprendizagem de Habilidades Psicomotoras em RCP de 76 estudantes de graduação em enfermagem. Nesse estudo, o item Pedir ajuda também não foi executado por 15,8% dos estudantes, após treinamento(11). De forma mais contundente, em outra pesquisa em que se estudou a desfibrilação precoce executada por enfermeiras, verificou-se que um dos erros freqüentes foi o de não pedir ajuda e desfibrilador, por 69,1% das enfermeiras(7).

Vale ressaltar que, após o treinamento, alguns participantes acharam irrelevante a solicitação de auxílio especializado. Isso se evidenciou quando se analisou o item 2 (Pedir Ajuda) na 2ª etapa, um dos itens no qual eles obtiveram menor acerto, pois se sentiam capazes de realizar a RCP sem atentar para o fato de que necessitariam de ajuda para dar continuidade ao atendimento. Entretanto, considerando-se o índice de acertos nos demais itens, exceto o item 3, infere-se que o treinamento com simulação em laboratório confere ao participante segurança e confiança o que pode ser fonte de motivação para o aprendizado.

A experiência em participar de uma situação real não equivale ao treinamento ou prática em laboratório. O treinamento pode aumentar a autoconfiança, mas é importante perceber que a aparente sensação conferida pela experiência em laboratório pode ser ilusória. Todavia, a capacidade de captar sutilezas, durante o contato com a vítima, de integrar as informações sensoriais com o reconhecimento teórico prático, é essencialmente individual, o que torna a tomada de decisão de: o que, quando e como fazer é algo intransferível(11).

O tempo gasto na utilização do DEA, nas duas etapas, está representado na Figura 2.


A Figura 2 ilustra o tempo médio gasto (cronometrado a partir da entrega do DEA até a primeira desfibrilação/choque) que foi de 48,6 segundos, após o treinamento. Na 1ª etapa, obteve-se tempo médio gasto de 146,76 segundos. Portanto, observou-se melhora na 2ª etapa (após treinamento) em relação à 1ª etapa (antes do treinamento). Não foram encontrados estudos semelhantes para o cotejo desses resultados, na literatura nacional.

Em pesquisa realizada com enfermeiros e fisioterapeutas(15), antes de um treinamento prévio, foi constatado que eles foram capazes de utilizar o DEA, deflagrando o choque em um tempo de 40-l96 segundos e, após o treinamento, o tempo foi reduzido para 41-61 segundos. Já, estudo feito com paramédicos mostrou que, em 94% dos atendimentos, o tempo gasto, desde o reconhecimento da parada cardiorrespiratória, até a aplicação do choque com DEA, foi menor que 90 segundos, após treinamento(16). Dados semelhantes foram observados quando ao analisar o tempo gasto por estudantes de enfermagem, durante o atendimento da PCR com o uso do DEA, verificou-se que o tempo médio foi também menor que 90 segundos, após treinamento(17). Esses dados da literatura internacional corroboram esta pesquisa.

No presente estudo, 17 (42,5%) utilizaram o DEA na 1ª etapa e conseguiram aplicar a desfibrilação, tendo cometido alguns erros. Entre eles, os ítens como Colocar as pás com o DEA desligado, Aplicar as pás auto-adesivas em posição incorreta, Não afastar as pessoas próximas da vítima e Retirar as pás após o primeiro choque. Alguns autores(18) revelaram que enfermeiros e fisioterapeutas não foram capazes de colocar as pás corretamente (53%) ou seguir procedimentos de segurança corretos (67%), antes do treinamento e que após, todos colocaram as pás corretamente e seguiram os procedimentos de segurança na desfibrilação, como observado nos resultados deste estudo.

Fato interessante a ser ressaltado é que, na 1ª etapa (antes do treinamento), os participantes mencionavam a necessidade de realizar a RCP, porém, não sabiam como executar a técnica propriamente dita. Durante o treinamento, o participante poderia exercitar quantas vezes achasse necessário, até que conseguisse sentir-se seguro, sendo o mínimo de vezes de treinamento de 1 e o máximo de 5, com média de 2,2 ± 0,82 vezes.

Avaliação do Conhecimento Teórico (teste)

A Figura 3 demonstra o Conhecimento Teórico dos participantes nas duas etapas da pesquisa.


Observa-se que houve melhora nas respostas à Avaliação do Conhecimento Teórico da 1ª para 2ª etapa, isto é, antes e após o treinamento, conforme a Figura 3. Nas questões 5 e 9 sobre Procedimentos de segurança na utilização do DEA, a freqüência de acertos na 1ª etapa foi baixa 7 (17,5%) e 6 (15,0%), respectivamente. As questões 3 e 6 sobre Avaliação de uma vítima em parada cardiorrespiratória obtiveram maior número de acerto na 1ª etapa (antes do treinamento), respectivamente 27 (67,5%) e 26 (65,0%). Já, na 2ª etapa (após o treinamento), os maiores números de acertos verificam-se nas questões 6 e 9, respectivamente, 38 (95,0%) e 36 (90,0%). Cabe ressaltar que a questão 2 foi aquela em que o número de acertos na 2ª etapa, isto é, após treinamento, foi menor do que antes do treinamento, isto é, na 1ª etapa. Acreditamos que tal resultado tenha ocorrido por ser uma questão cuja terminologia e conceito (questão 2 elos da Cadeia de Sobrevivência) não despertaram interesse e/ou não lembraram por ser relativamente nova no nosso meio.

A Tabela 2 mostra que há diferença significativa entre as médias do total de acertos, antes e após o treinamento na Avaliação do Conhecimento Teórico (p<0,001). Em média, a melhora foi de três pontos ou mais.

Resultados da aplicação de teste escrito sobre RCP em enfermeiros permitiram observar que os erros mais freqüentemente cometidos (52,8%) relacionaram-se às questões sobre o uso do desfibrilador automático. A ocorrência desse resultado estaria relacionada ao fato de que a desfibrilação não era realizada por enfermeiros, no Brasil(7).

Pesquisa que analisou o processo de ensino-aprendizagem de habilidades psicomotoras em procedimento de emergência, técnica de RCP pelos alunos de graduação de enfermagem, verificou melhora significativa no desempenho dos estudantes, após a prática, em relação ao Conhecimento teórico(11). Em estudo semelhante, avaliando-se a equipe de enfermagem, detectou-se melhora significativa no Conhecimento dos enfermeiros da 1ª (antes do treinamento) para a 2ª (após o treinamento) etapa do estudo(3).

A melhora do nível de treinamento da população leiga e de profissionais de saúde tem como conseqüência a redução da mortalidade e da morbidade por doenças cardiovasculares. Essa redução proporciona melhora na expectativa de vida com melhor qualidade(1). Assim, as recomendações mais recentes a favor da desfibrilação precoce destacam que os desfibriladores devam ser disponibilizados às mãos de quem tem a maior probabilidade de presenciar ou identificar precocemente vítimas em FV(2,4-5, 19).

Em síntese, pode-se afirmar que o treinamento do pessoal leigo, em laboratórios adequadamente aparelhados, pode habilitá-lo para o atendimento emergencial em RCP utilizando o DEA, particularmente pela observação da melhora no tempo de atendimento até o primeiro choque/desfibrilação, essencial para a melhoria do prognóstico da vítima. Em que pese essas constatações serem verdadeiras, tendo o respaldo dos mais sérios órgãos internacionais envolvidos, a implementação da presente estratégia, em larga escala, está estreitamente vinculada ao interesse das autoridades governamentais, por ora, muito limitado.

CONCLUSÃO

O presente estudo concluiu que o aumento significativo de acertos nos itens do instrumento de avaliação da Habilidade Psicomotora e do Conhecimento Teórico, após o treinamento, indica que houve melhora no desempenho dos participantes para realizarem a RCP com o uso do DEA.

Recebido: 31/05/2006

Aprovado: 05/11/2007

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  • Correspondência:
    Ana Maria Kazue Miyadahira
    Rua Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César
    CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Set 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Recebido
      31 Maio 2006
    • Aceito
      05 Nov 2007
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
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